Acordo assustada e sem fôlego. Minhas mãos tremem e quando olho para cima, vejo Hannah.
— Você está bem? — pergunta, apavorada.
— Não sei — respondo, confusa. Meu coração está batendo muito rápido. — O que aconteceu?
Hannah solta um suspiro e relaxa seus ombros.
— Foi um pesadelo. Acordei com seus gritos, entrei aqui e vi você se debatendo.
— Me desculpe, Hannah. Nem lembro o que estava sonhando — minto, deito de lado e tento acalmar a minha respiração irregular.
— Como está se sentindo? — pergunta ela.
— Entorpecida — respondo e fecho os olhos. Não consigo sentir nada agora. Quando abro meus olhos, Hannah está olhando fixamente para mim, com preocupação estampada em seu rosto.
Eu realmente gostaria que ela não olhasse para mim desse jeito; isso me faz sentir estranha, como se eu fosse diferente agora. Eu sei que estou, mas podemos apenas fingir que eu não estou?
— Que horas são? — pergunto.
— Quase três da manhã — Hannah responde, e se senta na cama.
— Eu acordei as meninas?
— Não se preocupe com isso.
— Desculpe, Hannah. Não quero estressar você, sei que não é bom para o bebê.
— Não pense assim — Hannah acaricia meus cabelos. — Estou aqui para você.
Deito minha cabeça em seu colo e me permito envolver meus braços em torno dela. Ela beija o topo da minha cabeça antes de perguntar:
— Você quer falar sobre isso?
Eu não falei uma palavra para Hannah sobre o que aconteceu naquele lugar. As coisas que eu vi. Das surras que levei e das cicatrizes que ainda são visíveis. Eu não tenho certeza se consigo falar. Mas sei que eu não quero. Engulo o caroço na minha garganta e simplesmente balanço a cabeça negativamente. Como é que eu vou falar sobre isso? O que eu vou dizer?
Lágrimas começam a encher os meus olhos; lágrimas que eu pensei que não tinha mais. É difícil combatê-las contra o aperto na minha garganta. Hannah deve sentir meu corpo tremer quando beija o topo da minha cabeça mais uma vez e sussurra:
— Grace, não se prenda assim... chore, deixe sair. Estou aqui para você.
Abraço suas pernas com força, em uma tentativa desesperada de me esconder. Esconder-me da nuvem que está subitamente pairando sobre mim. Ela aperta seus braços em torno de mim e eu apenas choro. Choro como um bebê impotente. Hannah não diz uma palavra. Ela simplesmente acaricia meus cabelos e me segura até eu cair no sono.
Harry
Londres, Inglaterra
Quinta-feira, 13 de setembro de 2018
Estou parado na frente da casa onde Grace mora aqui em Londres. Estou nervoso. Não sei como proceder, não sei nem o que fazer. Isso é diferente. Grace é diferente.
Passo uma mão através dos meus cabelos, começo a andar casualmente até a porta e toco a campainha. Aguardo uns segundos até que Grace abre a porta. Ela arregala os olhos e solta um suspiro de surpresa. Eu não havia dito quando viria.
Grace j**a os braços ao redor do meu pescoço, quase me fazendo perder o equilíbrio. Sorrio e passo meus braços ao redor de sua cintura e a puxo para mais perto, levantando-a ligeiramente.
— Meu Deus, como eu senti sua falta — inspiro o cheiro dela, o seu perfume doce e suave, e enterro minha cabeça em seu pescoço.
— Eu senti sua falta mais — Grace suspira, seus braços me apertando, enquanto enche meu rosto de beijos. Rio com a sensação. Beijo seu rosto antes de colocar meus lábios nos dela.
Embora tenha sido apenas alguns dias, eu ansiava por seus beijos. No momento em que seus lábios tocam os meus, sinto como se um peso fosse tirado dos meus ombros. Beijo seus olhos, seu rosto e sua testa.
— Senti – sua – falta – tanto – tanto... — falo, entre beijos.
— Vocês são nojentos e é quase adorável. — Uma voz de mulher nos assusta, fazendo Grace se soltar de mim. Hannah, eu suponho, caminha até a porta da entrada, onde estamos.
— Você deve ser Harry. É tão bom finalmente conhecê-lo. — Ela me puxa em seus braços e envolve-me em um meio abraço, que é o que a barriga permite. Surpreso, abraço-a de volta.
— É bom conhecê-la também — respondo, sem jeito. Ela me solta e olha para Grace, que está explodindo de vergonha. Hannah pisca para ela e nos deixa, me dizendo para ficar à vontade e que precisa descansar.
Quando ela sai, olho para Grace, pego suas mãos e, fechando o espaço entre nós, com seus lábios nos meus novamente, me sinto abençoado. Eu tinha sonhado com ela por tanto tempo, e agora ela está de volta, em meus braços. Uma realidade muito mais agradável do que um sonho poderia ser.
Grace Solto Harry assim que ouço passos descendo as escadas. Jenny me dá um olhar estranho e olha para Harry, franze as sobrancelhas e vai para a cozinha. Lembrei que ela me disse que gosta de garotos loiros e de olhos azuis. Antes que eu pergunte para Harry se Natan veio, ouço uma voz familiar: — Senti sua falta, amiga favorita! — Natan grita e me puxa para um abraço apertado. — Natan! — exclamo. — Onde está Angela? — Ela ainda está em Nova York... — Natan me responde enquanto entramos. — Mas ela estará aqui em algumas semanas. Entrelaço meus dedos com Harry e os acompanho até a sala. Vou até a cozinha, para servi-los com alguma bebida ou alguma coisa e Natan me segue, dizendo que está com muita fome para esperar na sala, enquanto Harry fica admirando os quadros de Hannah e as muitas fotos espalhadas pelas paredes. Quando chego ao balcão, sinto um puxão na minha mão. Olho para baixo e Jenny está tentando esconder-se a
Katherine está pegando flores amarelas do gramado. Ela pega duas de cada vez, e depois as solta no colo de Harry. Ele tinha uma coleção de quase doze, e sorria cada vez que ela vinha até ele. Harry é uma pessoa completamente diferente quando sorri, tão brilhante, como se pudesse iluminar até mesmo os dias mais nublados. — Então, estava pensando... — Natan começa, enquanto descansa a cabeça na mão, deitado de lado no gramado. Ele está puxando folhas da grama e brincando com elas. — Que tal sairmos beber numa noite dessas? — Eu acho uma boa ideia. Só tem que ser no dia da minha folga. — Ótimo! — Natan sorri pra mim. — Então acho que podemos ir para o The Globe. Antes que eu possa dizer alguma coisa, Harry olha para nós com as sobrancelhas franzidas. — Ela não vai para o The Globe. — O que há de errado? — Natan pergunta. Harry olha para ele como se estivesse louco: — É um bar, Natan! Cheio de velhos bêbad
Londres, Inglaterra Sábado, 15 de setembro de 2018 Harry vem me buscar em uma hora, e a minha longa conversa com Sara no telefone mal me deixou tempo suficiente para arrumar meu cabelo. Sara é a minha amiga brasileira, e converso com ela apenas sobre o meu dia a dia aqui. Ela não sabe das outras coisas. Inventei desculpas por ter demorado entrar em contato e ela esqueceu disso no momento que falei do meu encontro hoje. Para ela, Harry é só um cara que conheci em Londres, e que me fez esquecer com quem eu sonhava. Isso bastou para deixá-la feliz. Coloquei o vestido azul marinho que comprei da promoção na King Street. Depois de calçar meu único tênis all star, fui para o quarto de Hannah. Quando eu disse a ela sobre o jantar, ela me ofereceu o livre acesso ao seu closet. Ela estava sempre indo para eventos sociais, deixando-a na posse de alguns acessórios que eu só via através da vitrine no shopping. Me c
Assim que o show termina, Harry já está com seu celular na orelha. Ele liga e desliga duas vezes, e suspira, irritado. — O que foi? — pergunto e ele dá de ombros, coçando a parte de trás do pescoço. — O idiota, que abre a porta dos fundos, não está atendendo. Estamos presos aqui até que ele retorne, porque eu não vou sair pela entrada da frente com você. Franzo a testa. Por que ele está com raiva? — Posso ir primeiro. Pegar o seu carro e- Harry me interrompe, com o tom de voz firme: — Grace, nós não vamos sair pela frente. Pensei em perguntar por que ele estava sendo tão resistente. Quer dizer, os fotógrafos não estavam esperando por mim. Eu poderia entrar e sair sem que eles sequer levantem suas câmeras. Passei por situações piores na Tailândia, eu posso lidar com alguns fotógrafos. — Vamos lá — Harry diz, acenando com a cabeça para as portas do saguão. — Eu vou tentar ligar novamente. Você precis
— Eu não achei que seria esse tumulto... — Sim — Harry suspira novamente. — É assim que eles são o tempo todo, então, quando eu te pedir para fazer algo, me escute. Engulo em seco, concordando com a cabeça. — Não faça isso de novo — Harry diz depois de ligar o carro. Forço um sorriso e respondo: — Desculpe. Eu só... eu só queria ir embora. — Então você deveria ter me dito. Respiro fundo e pergunto: — Quem era ela? — Tiffany... eu costumava sair com ela, antes de... antes de tudo. — Ela era a sua namorada? Harry para no sinal vermelho e olha para mim. — Não. Nunca tive uma namorada antes de você... ela era alguém que eu chamava quando queria sexo — Harry responde. Fico em silêncio e olho para a janela. — O que elas disseram? —pergunta, ainda olhando para mim. — Quero dizer, o que fez você querer sair daquele jeito? — Isso não é importante — sussurro. — É importante para mim. <
Londres, Inglaterra Sábado, 15 de setembro de 2018 A porta do elevador está prestes a se fechar nas costas de Harry quando entro, e depois que ela se fecha, e antes que eu possa impedir minha loucura, aperto o botão de parar. — Grace, você está louca? — Harry pergunta. — Você realmente precisa que eu responda a essa pergunta? — Eu preciso lembrar que você tem pavor de pequenos lugares apertados? — Não, não tem necessidade — resmungo, olhado ao redor — estou muito ciente. — Grace — Harry diz, com gentileza. — E se nós permitirmos que o elevador se mova de novo, antes que você tenha uma pane mental? Afasto a ideia da minha cabeça. Tenho outras coisas em mente. — Me desculpe — digo. — Tudo bem — Harry diz, sem entender. — É só apertar o botão... — Não, não por isso. Pelo que eu disse antes. Sinto muito que eu tenha feito você se sentir como se não fosse sufici
Volto para casa de Hannah, com Harry me seguindo, somente para devolver o carro e então volto com Harry para o apartamento dele. Quando chego, vou direto deitar em sua cama enquanto ele vai ao banheiro. Faz semanas desde que eu dormi com ele, então sua cama é um conforto bem-vindo. Acho que vai ser sempre um conforto para mim. Eu ainda tenho problemas para dormir sozinha. Mesmo com as pílulas para dormir que comprei, minhas noites são inquietas e muitas vezes tenho flashes daquela casa quando eu fecho meus olhos. Os flashes não são quase tão ruins quanto os pesadelos, mas eles ainda são um lembrete constante da turbulência na minha vida. Depois que nos acomodamos para dormir, tenho dificuldade para manter meu cérebro desligado. Toda vez que fecho meus olhos, vejo Derek na minha frente. O homem que eu matei com um tiro na cabeça. Quanto mais eu tento e luto contra os pensamentos, mais vivos eles se tornam. Ele está bem aqui comigo, dentro da minha mente. Então a figur
Londres, Inglaterra Domingo, 16 de setembro de 2018 Na manhã seguinte, Harry me leva até a casa de Hannah. Agora ele está sentado em frente ao balcão, comendo os donuts que compramos no caminho, em um silêncio confortável. O episódio da madrugada foi quase esquecido, por enquanto. Sei que Harry vai me fazer ir para uma consulta com o terapeuta mais tarde. Eu estava me servindo uma xícara de café quando ouvi a porta da frente sendo aberta, e os passos que parecem de elefante pelo corredor. — Grace! — Jenny grita. — Grace, estamos em casa! Você sentiu nossa falta? Tia Ju me mostrou suas fotos no computador! Você se divertiu no show? Por que você deixou Harry tocar em você?! Você provavelmente tem piolhos agora! Você devia ir ao médico! As fotos que tiraram ontem já estão na internet? Abro um sorriso, e Harry faz uma careta, enquanto Jenny e Katherine invadem a cozinha. — Oh