Estico meu corpo nos lençóis macios da minha cama, sentindo a preguiça me dominar. Abro os olhos e pego meu celular, vendo que são pouco mais de 07:00. Hoje eu não teria que ir trabalhar, o que me dava algumas boas horas de sono a mais e um dia para descansar, mas mesmo assim, acordei cedo, para deixar parte do meu trabalho de amanhã adiantado.
Há pouco mais de um ano trabalho em uma editora na cidade, revisando as obras. Sempre fui apaixonada por livros, desde pequena. Quando a vaga apareceu, fiquei muito feliz. Trabalho em uma área que gosto e recebo bem por isso, além de poder trabalhar de casa na maioria das vezes.
Com cuidado, tiro Hades de cima de mim, saindo da cama. O gatinho acorda, mas logo dorme outra vez, enroscado nos meus lençóis. O adotei à poucos meses atrás, quando apareceu na casa da minha melhor amiga, machucado e com fome. Devido à sua alergia a pêlos, fiquei encarregada de cuidar do pequeno bichinho de pelos escuros.
Sigo para o banheiro e faço minhas higienes, tomo um banho rápido e após me vestir, faço um café para mim. Hades já havia acordado, então encho o seu pote de ração. Vou até a varanda, me sentando em uma das confortáveis poltronas, observando meu jardim, repleto de flores. Ainda tenho algum tempo até começar meu trabalho.
Me mudei para Healdsburg aos dezoito anos, acompanhada da minha melhor amiga, que também vivia lá. Tínhamos acabado de sair do orfanato. Não foi fácil, passamos por vários momentos ruins, mas não desistimos.
Meus pais morreram quando eu ainda era criança, aos quatro anos, em um acidente de carro. Todas as lembranças que tenho deles são muito vagas. Eu estava no carro com eles no momento do acidente, voltávamos do casamento de uma amiga da minha mãe, quando um caminhão invadiu nossa pista e se chocou contra nosso carro, matando meus pais. Como eu estava atrás, os impactos não foram muitos, apenas cortes e arranhões.
Nenhum dos meus parentes quis me adotar, então tive que ir para um orfanato, onde conheci minha melhor amiga, Julie. Quando cheguei, tinha medo de quase todo mundo que se aproximava de mim, até que a conheci. Em uma noite, quando não consegui dormir, ela veio até mim e me entregou sua boneca favorita, dizendo que ela iria cuidar de mim. Desde esse dia nós viramos grandes amigas, brincávamos juntas, estudamos na mesma classe e nos formamos juntas.
Tivemos que trabalhar durante dia e noite para juntar nosso dinheiro e nos mudar, e quando fizemos 18 resolvemos arrumar nossas coisas e ir embora dali. O orfanato era tão precário que não tínhamos dificuldade em conseguir sair, pois todos tínhamos que trabalhar ali. Vendi balas, trabalhei em lojas e em lanchonetes, sempre com o desejo de ir embora, em busca de uma vida melhor.
Nós queríamos um novo começo, uma nova vida em um lugar pequeno, tranquilo, onde pudéssemos viver nossa vida tranquilamente. E então, escolhemos Healdsburg, aqui na Califórnia.
No início não foi fácil, mas tivemos a ajuda de uma pessoa incrível, nosso melhor amigo, Aidan Scott. Com a ajuda dele, conseguimos um emprego na lanchonete de um amigo seu. Não era o melhor trabalho, era muito cansativo, nossos expedientes começavam após o almoço e acabavam às 22:30, mas nos possibilitou pagar nossa faculdade e nossas despesas.
Depois que fiz vinte e um, as coisas melhoraram, pois tive acesso ao dinheiro que meus pais deixaram para mim de herança. Assim, pude comprar a minha casa e guardar o restante, para quando eu precisasse.
Concluí minha faculdade de literatura inglesa a pouco tempo, sempre foi uma das minhas paixões. Quando morava no orfanato, ia todos os dias a biblioteca de lá e passava horas lendo os livros de lá.
Julie também formou-se recentemente, em medicina, na área de pediatria. Hoje em dia é residente no hospital da cidade, fazendo o que tanto ama.
Julie é muito importante para mim, assim como Aidan. Cresci sem amor algum, apenas com o carinho da minha melhor amiga, que me amparou em todos os momentos. Enquanto meus parentes me recusaram, ela me acolheu. E ao me mudar, quando precisávamos de auxílio, Aidan nos acolheu e nos amparou, ficou ao nosso lado e se tornou nosso melhor amigo.
Obviamente, sinto falta dos meus pais. Desejei, por anos — e desejo, até hoje —, tê-los comigo. O amor, carinho e proteção deles, me fez muita falta. As vezes, sonho com eles, felizes. Nesses momentos, me sinto bem, tranquila, pois tenho a certeza de que sempre estarão ao meu lado, me protegendo, mesmo que eu não os veja.
Hades, após comer, vem até mim e sobe no meu colo, em busca de carinho. A tela do meu celular se ilumina ao meu lado, o pego, vendo que havia uma mensagem de Julie, falando que passará aqui mais tarde, após sair do hospital.
Antes que possa responder, a campainha de casa toca. Tiro Hades do meu colo e o deixo na poltrona, indo até a porta, estranhando essa visita. As únicas pessoas que vêm aqui são Aidan e Julie, mas ambos estão trabalhando nesse momento.
Ao abrir a porta, me assusto. Dois policiais estão do lado de fora, me encarando, sérios. Um loiro e um moreno, ambos com pastas e o distintivo em mãos.
— Você é Valentina Hale?
— Sim. Algum problema? — questiono, confusa, os dois policiais que estão parados na minha porta.Um é o completo oposto do outro. Não apenas na aparência física, mas na personalidade. Digo isso pois enquanto o loiro de olhos esverdeados me cumprimenta, simpático, o moreno apenas me observa com uma feição de tédio.— Sou Jared Packard, legista da polícia local. — estende a mão para mim, retribuo seu cumprimento.— Olá. — dou-lhe um sorriso.— Esse é o detetive Alex Heights. — ele apenas acena para mim com a cabeça.— Olá. — ele sequer responde. — Em que posso ajudá-los?— Nós viemos até aqui pois precisamos conversar com a Senhorita, tem um minuto? — assinto.— Claro. Entrem, por favor. — Abro espaço e ambos passam pela porta, sentando no sofá da minha sala. Me sento na poltrona em frente para eles e cruzo as mãos, nervosa.— Certo. Senhorita Hale, recentemente estamos investigando u
— Então, senhorita Hale — a loira, que aparenta ter uns 30 anos, se aproxima de mim sob a mesa e pergunta. —, você não tem nenhuma suspeita de alguém que possa estar cometendo esses crimes? — estende novamente aquelas fotos para mim sob a mesa e eu nego.Estamos na sala de interrogatório, que não tem nada além de uma mesa no centro e duas cadeiras, iluminadas por uma luz meio fraca que pende do teto. As paredes são de um cinza escuro e próximo a porta há uma enorme janela de vidro, que apesar de não enxergar por ela, sei que o Detetive Heights está lá naquela salinha, monitorando cada respiração minha.Quando cheguei a delegacia, logo pela manhã? fui recepcionada pelo detetive Alex, que me guiou até aqui, dirigindo a palavra à mim apenas para que eu fosse até a sala de interrogatório. Não fui apresentada à policial que está a minha frente, e ela parece não se interessar por isso, tudo que ela quer é me forçar a falar algo que não sei.Não sei porq
Termino de colocar algumas roupas na mala, fechando em seguida, enquanto Julie arruma a outra mala, colocando meus produtos pessoais nela.— Isso tudo é uma loucura. — fala, enquanto arruma minha nécessaire. — Como será que vai ser na casa dele?— Sinceramente? Não faço ideia. — sento-me na cama e pego o celular, vendo que ainda são 19:20, Alex falou que passaria aqui às 20:00. — Ele é tão confuso, as vezes é simpático, outras vezes é arrogante, parece não me suportar. Sinto que nossa convivência não será muito boa.— Tina, vai ver ele apenas está confuso com tudo isso, afinal é uma desconhecida que irá morar com ele. — dá de ombros. — Da mesma forma que você não o conhece, ele também não sabe nada sobre você além do que deve ter nos relatórios. É uma experiência nova para ambos, tenha paciência.— Você tem razão.— Sempre tenho. — acerto um travesseiro nela. — Agressiva. — resmunga.— Estou tão nervosa. — deito na cama e e
Estico meu corpo sob os lençóis macios da cama, abrindo meus olhos lentamente e me acostumando com a claridade que entrava pelas portas da varanda. Sento na cama e pego meu celular na mesinha de cabeceira, vendo que eram 07:00 da manhã.Com tudo que estava acontecendo, meu chefe decidiu em consenso com os investigadores que o melhor para mim naquele momento era trabalhar em casa, ou melhor, na casa do Alex. Ou seja, meu trabalho passou a ser complemente de casa, para minha segurança.Em outros dias, acharia isso ótimo. Afinal, quem não gostaria de trabalhar na sua própria casa, cumprindo seus horários? Mas nesse momento, moro em outra casa, com alguém totalmente desconhecido. Sinto-me desconfortável, como um peixe fora d'água.Não consegui dormir pela noite, me senti desconfortável. Não pela cama, ou pelos lençóis. Tudo está perfeito. O problema é que sinto falta da minha casa. Gostaria de que tudo isso fosse resolvido o mais rápido possível, para
Nesses últimos dias, que foram um caos, me senti mais cansado e irritado do que o normal. Afoguei-me no trabalho, em busca de alguma pista, por mínima que fosse, que nos leve ao assassino das garotas.Infelizmente, não encontramos nada. Nenhuma pista, rastro ou até mesmo um pequeno fio de cabelo. Absolutamente nada. É como se, mesmo com todo empenho, estivéssemos no mesmo lugar. Nada aparece, nada se resolve.Como suspeitos, dois nomes foram apontados. Pessoas óbvias, geralmente culpados em casos como esse. O primeiro nome é de Josh Bloom. Namorado de Valentina, na época da faculdade. Pelo que li, nos relatórios feitos pela nossa equipe, o término não foi tão bem aceito por ele. Após uma traição, por parte dele, o relacionamento chegou ao seu fim, mas Josh nunca conformou-se. Tentou, por várias vezes, reatar o namoro, apesar dos protestos d
Envergonhada. Surpresa. Assustada.Essas palavras podem definir como estou nesse momento. Alex, parado atrás de nós, espera uma resposta minha. Me encara com um semblante sério, enquanto sinto-me envergonhada por ser vista falando dele. Minhas bochechas estão vermelhas, tenho certeza, e desejo sumir.— Eu... — não consigo responder. Nenhuma frase é formada em meus pensamentos. Minha voz falha e eu me sinto envergonhada por ele escutar isso.Eu deveria pedir desculpas?— Estou meio ocupada. — diz Margot, saindo de mansinho. Lanço para ela um olhar suplicante, pedindo para que fique. — Vou deixá-los conversar. — sai em direção à cozinha.— Então, Valentina. — chama minha atenção, após a saída da governanta. — Você não respondeu minha pergunta. É assim que você me vê? — repete.Respiro fundo, tentando me acalmar, para conseguir responder. Ele ergue uma sobrancelha, esperando por uma resposta.— Bom, sim
— Ok, me fala mais sobre você. — peço, enquanto pego mais uma batatinha.— O que você quer saber, Valentina? — pega a cerveja, dando um gole e se acomodando melhor no assento, olhando para mim.— Idade?— 28.— Família?— Tenho apenas uma irmã, 3 anos mais nova que eu, ela é médica voluntária no Congo. Meus pais moram em San Francisco, se mudaram quando minha irmã entrou na faculdade.— Você sempre gostou de morar aqui?— Pra ser sincero, sim. — dá de ombros. — Fiz faculdade em Nova York e morei lá por uns meses após a conclusão, mas acabei voltando.— Nunca quis trabalhar lá?— Era meu sonho. — suspira. — Mas tive uma oportunidade de trabalho em Healdsburg, me adaptei ao lugar e hoje me sinto feliz aqui. É calmo, tranquilo e tenho a Margot comigo.— Alex?— Oi.— Quem era a garota do porta retrato? — pergunto, apreensiva. Quando questionei Margot, pela tarde
A volta para casa, ao contrário da ida para a lanchonete, foi em um silêncio absoluto. Enquanto Valentina observava pela janela, perdida em pensamentos, eu tentava me concentrar na estrada. Tentando, durante todo tempo, não pensar em quem nos seguiu. Não pensar em como estive perto do assassino, mas ele escapou.Eu me sinto como um inútil. Ele foi mais ágil, fugiu dali rapidamente. E voltamos ao início, sem pistas ou algo que nos leve ao culpado.Ao estacionar, Valentina desce do carro e me dá boa noite, antes de entrar em casa. Ela parece cada dia mais afetada por todo esse caos que está ao seu redor, cada dia mais quieta. E para ser sincero, entendo seu lado.Além de saber que há uma pessoa atrás dela, soube que algumas pessoas na cidade estão mandando mensagens para ela, como se fosse a culpada por tais atrocidades, após uma postagem em um blog local. Ela está sofrendo com tudo isso e as pessoas ainda a culpam, como se fosse ela a pessoa por tr