2- Caso Novo
Minha quinta-feira foi frenética! Tive vários pacientes complicados no hospital no período da manhã, uma reunião com um fisioterapeuta que me fez sair atrasada do meu emprego matutino e chegar trinta minutos depois do meu horário de entrada na clínica de ortopedia. Por sorte, meu primeiro paciente agendado tinha faltado e com isso consegui desacelerar um pouco, mas fiquei sem almoço e apenas as quatro da tarde consegui comer um lanche na copa.
- Se reabastecendo Carol? – Escutei Luiz, o outro TO da clínica perguntar.
- Sim, não tive tempo de almoçar hoje, meu dia foi uma loucura.
- Sei bem como é! As vezes não dá tempo nem de respirar!
- Verdade! Por isso estou louca pra ir embora, preciso descansar.
- Ainda tem paciente hoje?
- Sim, se não me engano duas pessoas agendadas, mas quem sabe elas não resolvem faltar?
- Às vezes também torço para algum paciente dar o cano, só pra poder ir embora mais cedo.
Luiz comentou de maneira descontraída, mas não prosseguiu a conversa, porque outro terapeuta entrou e eles começaram a falar sobre futebol. Então pedi licença e me retirei, mas antes de voltar a minha sala passei no banheiro para escovar os dentes. Me olhei no espelho, e ainda que tivesse conseguido reproduzir a escova bem elaborada que o cabelereiro havia feito no início da semana, achei que pentear e ajeitar o novo corte era necessário. Também lavei o rosto e retoquei a maquiagem, passando delineador e rímel nos olhos, além de um batom.
- Pronto! Até que para o dia frenético que tive, não estou com uma aparência tão ruim.
Guardei minhas coisas na necessaire e voltei a minha sala. Instantes depois Bartô avisou que o paciente das quatro e quarenta não viria, porém eu não podia ir embora, porque mais uma pessoa estava agendada, olhei para ver quem era e me lembrei que se tratava do amigo do meu chefe. Também recordei de suas palavras me dizendo que o jovem era simpático e comunicativo e com isso pensei que ao menos a hora passaria rápido e logo depois eu poderia ir para o conforto do meu lar, para uma merecida noite de descanso. Com isso em mente, peguei alguns prontuários para evoluir e depois de anexar os documentos, ouvi batidas na porta.
- Pode entrar. – Falei enquanto terminava de assinar um relatório de alta, o carimbei ao mesmo tempo em que ouvi.
- Oi, meu nome é Alexandre. Você é a Carol?
Olhei em direção a porta e estagnei! Afinal um loiro alto, de olhos verdes, e lindo estava parado me encarando. Não consegui responder, e fiquei apenas observando o jovem a minha frente. Ele sorriu e se já era bonito sem fazer isso ao mostrar uma fileira de dentes brancos ficou ainda mais perfeito!
Concentre-se Carol!
Ouvi minha consciência ordenar e tentando não parecer idiota eu respondi.
- Sim, eu sou a Carol. Você deve ser o amigo do Vagner. Ele me disse que você viria. Por favor, pode entrar e se sentar.
O rapaz assentiu sorrindo e caminhou em direção a minha mesa como se fosse um modelo de passarela, usava roupas casuais, cabelo propositadamente desarrumado e barba por fazer compondo um estilo despojado, mas ainda assim sexy. Ele se aproximou e estendeu a mão para mim. Fiquei de pé e imitei seu gesto, mas ao sentir seus dedos apertarem os meus uma sensação diferente percorreu a minha pele, tentei ignorá-la e perguntei:
- Então, você fraturou o punho a cerca de dois meses, não foi?
- Sim. Eu acompanhava a construção de uma casa em Porto Alegre e estava conversando com o mestre de obras quando tropecei. Percebi que iria cair e para não bater o rosto, apoiei as mãos no chão. Não senti nada na direita, mas na esquerda senti uma dor muito forte. Ainda fiquei por mais uma hora lá, mas depois precisei ir para o hospital porque a dor havia aumentado e estava com minha mão inchada. Quando fui atendido, o médico disse que precisava imobilizar porque tinha fraturado o punho, então voltei de Porto Alegre com uma lembrancinha de lá.
Ele sorriu ao olhar para a mão comprometida e eu fiquei encantada com seu jeito, parecia um menino, um menino crescido, mesmo assim lindo e charmoso, que continuou sua narrativa de maneira descontraída.
- Quando cheguei em São Paulo procurei pelo Vagner. Nós somos amigos há muito tempo, então ele me examinou e falou que após retirar a imobilização teria que fazer terapia para melhorar meus movimentos. Confesso que achei que era exagero da parte dele, mas agora que estou sem a tala, estou com dificuldades para mexer os dedos e minha força também está diminuída. Será que vai voltar ao normal?
Levei alguns segundos para responder, estava tão absorta nele, no seu rosto e na sua voz que nem percebi que ele esperava o meu parecer profissional, então meu bom senso falou mais alto novamente. Concentre-se no que realmente é importante Dra. Carolina!
- Bem... primeiro eu preciso fazer a sua avaliação, mas pelo que conversei com o Vagner não acho que você terá complicações. É claro que depois que acontece uma fratura geralmente as pessoas sentem um pouco de dor ou incômodo nos dias mais frios, mas quem sabe você não tem sorte e pula essa parte?
Comentei tentando transmitir confiança, ele esboçou um sorriso.
- Bom, acho que já estou com sorte, porque o Vagner me falou que você é uma excelente terapeuta de mão e muito bonita, se me permite o elogio.
Seus lindos olhos verdes encararam minhas íris castanhas e comuns e isso me inibiu, afinal eu devia ter demonstrado que estava admirada com sua beleza e por isso ele me elogiou, de qualquer modo tentei parecer coerente e falei:
- Obrigada, você é muito gentil. - Além de lindo! Novamente meu bom senso me advertiu por dispersar e eu tentei retomar o foco. - Vou fazer o melhor para te ajudar, mas você também precisa seguir minhas orientações.
Ele acenou em concordância e então eu prossegui.
- Bom, agora é melhor começar a avaliação.
Falei mais para mim mesma do que para o jovem, talvez assim conseguisse de fato me concentrar no meu trabalho, porque mesmo com tanto tempo de formada eu estava tendo dificuldades para manter a atenção no que realmente importava, de qualquer modo peguei o protocolo de avaliação e os instrumentos que usava, e como era costume comecei a preencher os dados pessoais primeiro.
- Qual é o seu nome completo?
- Alexandre Bastos.
- E sua idade?
- Vinte e sete.
Muito jovem, que pena! Concentre-se Carolina!
- Sua profissão?
- Eu sou arquiteto, tenho um escritório em Moema, que divido com um amigo, o Pedro, mas nesse período em que fiquei imobilizado quase o enlouqueci; as vezes eu sou um pouco detalhista e persistente com algumas coisas.
Ele soltou uma risada curta e simpática ao se descrever e eu acabei sorrindo também, mas logo voltei a assumir meu tom austero, ou pelo menos tentei, afinal estava trabalhando e não jogando conversa fora. Então prossegui com a avaliação, peguei a fita métrica para medir o edema na sua mão e depois fiz a goniometria do punho e dos dedos. Também averiguei sua força manual e destreza antes de iniciar as primeiras orientações.
- Alexandre, vou passar alguns exercícios para você fazer em casa, mas antes é preciso fazer a massagem para controlar o edema. Por favor, apoie seu cotovelo na mesa com seus dedos apontando para o teto e deixe sua mão aberta.
Ele fez o que pedi, então peguei a vaselina e espalhei um pouco sobre sua pele. Ao mesmo tempo expliquei.
- Você deve massagear sua mão da ponta dos dedos para o dorso espalhando a vaselina, desse jeito...
Iniciei a massagem, mas no momento em que minha mão começou a tocar a dele senti um arrepio de prazer.
Santo Deus Carolina! O que está acontecendo com você, mulher? Enlouqueceu?
Ajeitei-me na cadeira tentando esquecer as sensações físicas que percorriam meu corpo, e foquei minha atenção na massagem, contudo após breves segundos não resisti e olhei para o rosto do rapaz. Era realmente lindo! Sobrancelhas bem feitas, nariz longo, e lábios convidativos, fazendo os meus entreabrirem levemente, nesse mesmo instante o jovem desviou sua atenção para o meu rosto e por alguns segundos ficamos nos encarando.
Pare com isso Carolina! Ele é seu paciente!
Desviei do seu olhar e voltei a atenção a massagem, até que o jovem reclamou.
- Ai, está doendo!
- Desculpe, mas a massagem não é um procedimento muito agradável, e enquanto seu punho e sua mão estiverem inchados, você vai sentir dor e vai ter dificuldade para fazer qualquer movimento.
Expliquei, além de salientar que mesmo que a massagem fosse incômoda precisava ser feita, assim como todo o resto, então após terminar o procedimento ensinei alguns exercícios para o punho e dedos. Alexandre não teve dificuldade para realizá-los e assim que os finalizou eu perguntei se estava com alguma dúvida, ele negou, então preparei sua agenda com os horários da terapia e entreguei a ele.
- Por hoje é isso. Nossa próxima sessão é na terça, no mesmo horário.
Avisei e me levantei da cadeira, fui até a porta. Alexandre já estava perto de mim, estendi minha mão para me despedir, ele retribuiu o cumprimento, mas também me deu um beijo no rosto, me pegando de surpresa e me deixando meio tonta.
- Então, até terça. Bom fim de semana.
O jovem falou sorrindo e saiu, já eu permaneci de pé na entrada da sala sem entender a razão para o meu coração estar batendo descompassadamente, até que escutei a voz de Bartô.
- Carol, esse seu novo paciente é um gato! Que rosto é aquele? E o corpo? Já fico com calor só de pensar! Você tem sorte, vai ficar a sós com ele duas vezes na semana, mexendo naquela mão... ai meu Deus! Por favor, me diga que o bofe está disponível.
- Você está maluco?! Que história é essa de dar em cima de paciente da clínica? Quer que o Vagner te mande embora? – Rindo repreendi meu amigo, contudo Bartô retrucou.
- Minha querida, por um gato desses, vale a pena até perder o emprego.
Rimos juntos e eu tive que concordar.
- Realmente ele é muito bonito e também é simpático. Deve ter uma namorada em cada esquina.
- Não me diga que ele é hetero, por favor!
- Bartô, sinto que você não está com sorte, pois não acho que ele faça parte do seu time.
Meu colega resmungou, alegando que era sempre assim, que os caras mais bonitos nunca estavam disponíveis, mas logo em seguida mudou de assunto e perguntou se eu poderia lhe dar uma carona, confirmei que o deixaria próximo a sua faculdade como de costume, só precisava ajeitar a sala. Bartô voltou para a recepção e sozinha eu pensei no meu mais novo paciente, em seus olhos verdes como jade e seu sorriso simpático, contudo balancei a cabeça e disse em voz alta.
- Esqueça o rapaz, Carol, é o melhor a fazer.
Entrei no meu apartamento as sete da noite, estava cansada, tinha dirigido por quatro horas seguidas, mesmo assim estava feliz, afinal tinha acabado de voltar do interior, da casa dos meus pais. Graças a Deus ambos estavam bem, dona Carmem e seu Valter tinham sim alguns probleminhas de saúde, mas nada que fosse preocupante, mesmo meu pai que tinha artrite estava vivendo bem. Assim como Camila, minha querida irmã caçula e seu lindo filho, Tiago, que tinha adorado a festa que a mãe preparara para o seu aniversário de três anos. Por isso eu sorri, mas ainda que estivesse bem, torci o nariz ao lembrar do meu novo paciente da clínica de ortopedia. Infelizmente eu tinha pensado nele com frequência durante o final de semana, mesmo ajudando minha irmã a preparar as coisas para a festa de Tiago, volta e meia me pegava pensando no rapaz. Ficava imaginando o que ele estaria fazendo, se estava com sua famíl
Eu devo estar sonhando, eu só posso estar sonhando. Se não como explicar que estou na clínica sozinha com Alexandre? Nós estamos na minha sala e ele está mais lindo do que nunca, conversando comigo e brincando com meus dedos numa atitude muito íntima e descontraída. Não consigo entender o que ele está dizendo, mas a sensação de conforto é imensa cada vez que ele acaricia a minha pele. De repente, ele para de falar, me encara por um instante e vem na minha direção. Seus lábios estão a centímetros dos meus e quando eu penso em protestar, o celular toca. Abri os olhos e constatei que realmente estava dormindo. E o pior, sonhando com meu novo paciente! Olhei o relógio, faltavam quinze minutos para as seis da manhã de sexta-feira. A semana tinha passado tão depressa que nem sequer me dera conta disso. Levantei, tomei banho
Você não fez nada de errado Carol. Eram essas as palavras que eu vinha dizendo para mim mesma desde que acordei na segunda de manhã até agora, mas não estava surtindo muito efeito, pois cada vez que recordava meu momento libidinoso na madrugada de domingo me sentia constrangida. - Como eu pude me deixar levar daquele jeito? - Indaguei-me num tom de voz baixo enquanto caminhava até a recepção da clínica de ortopedia para saber se meu paciente mais complicado tinha chegado. Talvez ele não tenha vindo, afinal estou atrasada e se Alexandre já tivesse chegado com certeza Bartô teria ligado para me avisar. Foi o que imaginei quando cheguei a recepção e não encontrei Alexandre, respirei aliviada, porém ouvi. - Carol, o Alexandre está no toalete. Bartô avisou-me destruindo m
Na quarta-feira à noite encontrei Fernanda no balé. Nós não tínhamos nos visto desde o churrasco porque minha amiga não tinha ido a aula na segunda-feira, porém, quando a professora nos dispensou Fernanda correu na minha direção. - O John me pediu o seu telefone. Posso dar? Arregalei os olhos, sabia que o cara tinha se interessado, mas não imaginava que chegaria a esse ponto. - Ele falou sobre mim? - E como! Ontem fui a um coquetel oferecido pela agência de publicidade dele e quando John teve uma folga fez questão de conversar comigo sobre você. Disse que te achou linda e muito simpática, por isso queria voltar a te ver, então o que me diz? Posso passar seu número? Ponderei por alguns instantes e ao lembrar de Alexandre me senti confusa, porque mesmo eu não podendo ficar com ele, também n&ati
Na quinta-feira antes de sair para o trabalho pensei em bater à porta do meu vizinho para ver como estava, porém, não eram nem seis e meia e achei inapropriada a visita, afinal, até o infeliz episódio da véspera eu conversara pouco com Lucas e Gustavo, na verdade, apenas em duas ocasiões falamos por alguns minutos. A primeira vez no segundo dia após a minha mudança, quando saí para fazer compras e voltei com algumas sacolas pesadas. Lembro-me que ao entrar no elevador eles já estavam e ao me verem com os pacotes me ajudaram. Foi naquele dia que soubemos que éramos vizinhos. Já o outro encontro foi apenas com Lucas, por coincidência na academia de ginástica, contudo o momento foi breve e desde então eventualmente os via quando estava chegando ou saindo para ir trabalhar. De qualquer modo tinha simpatizado com o casal e mais uma vez lamentei o que tinha acontecido com Lucas.<
O domingo amanheceu ensolarado, fazia calor, mas o clima não era sufocante, por isso decidi ir ao parque do Ibirapuera correr. Não morava tão longe como antes, mas também não era tão perto para ir andando, então peguei meu carro e depois de meia hora estava entre árvores e pessoas me exercitando. Corri por alguns minutos, porém, depois de algum tempo precisei descansar. Sentei-me sob a sombra de uma árvore e fechei os olhos. Estava relaxada, sem pensar em nada quando ouvi. - Carol. Por um breve instante achei que estivesse dormindo e mais uma vez sonhando com meu paciente, tentei esquecê-lo, contudo senti um toque no meu ombro e meu nome foi falado em voz alta mais uma vez. Acabei abrindo os olhos, mas ao ver Alexandre sorrindo diante de mim a paz de espírito de minutos antes evaporou. - Você não devia ficar tão distraída. Eu p
Realmente é impressionante como as coisas acontecem! Quando a gente mais quer ignorar determinado assunto, ou no meu caso, pessoa, parece que tudo te faz lembrar do que você quer esquecer. Afirmo isso, porque depois de acordar com uma dor de cabeça terrível na manhã de segunda-feira – eu não tivera uma boa noite de sono – não esperava pelo que estava prestes a acontecer. Estava no hospital trabalhando, concentrada, quando precisei posicionar adequadamente uma das pacientes em sua cadeira de rodas. Era uma mulher pesada e sem ajuda não seria possível ajeita-la corretamente, por isso pedi a sua acompanhante que me auxiliasse, mas ao fazê-lo a cuidadora deixou sobre a mesa de atendimentos a revista que estava lendo, eu acabei vendo sem querer a página aberta, mas ao reconhecer Alexandre na foto perdi o foco. Minha paciente queixou-se da maneira como eu tinha deixado seu br
Mais uma quinta-feira havia chegado, portanto um novo encontro com Alexandre aconteceria no final da tarde. Tentei não me sentir ansiosa com o fato, afinal estava saindo de casa para o meu primeiro emprego e precisava me manter focada. Contudo, lembrar do meu paciente me fez pensar também em John, no simpático inglês que eu tinha dispensado e que tinha sido motivo de discórdia entre mim e Fernanda. Na verdade, não houve um embate escancarado entre nós, mas ontem quando nos vimos na aula de balé notei uma mudança de comportamento comigo. Fernanda era descontraída, comunicativa, enfim, uma pessoa articulada, porém quando tentei conversar, ela se fechou, deu uma desculpa qualquer e não falou comigo, e a atitude dela só podia ser por causa de John. Provavelmente ele contou-lhe da minha recusa e isso deve ter deixado minha amiga aborrecida, mas o que eu poderia fazer? Pedir desc