O silêncio entre eles era espesso, quase palpável.
Não um silêncio comum, mas um carregado de tensão e perguntas não ditas. Amélia continuou comendo, cada mordida trazendo uma avalanche de sentimentos confusos. O medo ainda estava ali, enraizado em seu peito como um espinho que se recusava a sair. Mas a fome era mais forte, e ela não desperdiçaria aquela oportunidade. Cada pedaço de pão que mastigava parecia dissolver um pouco da rigidez em seus músculos. A sensação de comida quente no estômago era algo que ela não sentia há muito tempo. Era quase estranho. Mas a presença de Damian impedia que relaxasse completamente. Ele permanecia parado perto da porta, os braços cruzados sobre o peito largo, observando-a com um olhar indecifrável. Não parecia apressado, nem impaciente. Apenas… atento. Ela não sabia dizer se isso era melhor ou pior. Depois de alguns instantes, ele finalmente falou: — Há quanto tempo você estava sozinha? O som de sua voz quebrou o silêncio como uma pedra atirada em um lago. Amélia não ergueu os olhos. Mastigou devagar, engoliu e respondeu apenas o necessário: — Tempo suficiente. Damian arqueou uma sobrancelha, mas não pressionou. Ela sabia que ele queria mais. Talvez esperasse que ela se abrisse, que contasse sobre os dias intermináveis na floresta, sobre o frio cortante das noites de inverno, sobre a solidão sufocante. Mas ela não lhe daria isso. Ele não precisava saber que, às vezes, o pior não era a fome ou o medo dos predadores — mas sim o silêncio. Um silêncio real, absoluto, que fazia parecer que ela era a única pessoa viva no mundo. Damian permaneceu calado por um instante, como se considerasse suas palavras. Então, perguntou: — Como sobreviveu na floresta? Amélia hesitou. Não queria contar sobre os anos de frio, fome e medo. Sobre as noites em que dormira encolhida em cavernas úmidas ou os dias em que se alimentara de raízes e frutas que mal conhecia. Não queria que ele a visse como alguém fraca. — Aprendi a caçar. — Sua voz saiu mais firme do que esperava. Os olhos de Damian brilharam com algo parecido com interesse. — Caçar? Sozinha? Amélia assentiu. — Com o quê? Ela limpou os dedos no guardanapo de linho antes de responder: — Armadilhas. Faca. Às vezes, apenas com as mãos. Um silêncio carregado se instalou. Por um momento, ela se perguntou se deveria ter falado tanto. Talvez ele estivesse tentando medir suas habilidades. Descobrir se era uma ameaça ou apenas uma garota perdida que ele poderia controlar. Mas então, para sua surpresa, Damian sorriu. Não um sorriso debochado ou cruel. Havia algo genuíno ali. Algo que ela não soube interpretar. — Impressionante. Ela piscou, sem saber como reagir. Ele estava zombando dela? A testando? Ou será que… realmente a admirava por isso? A ideia a desconcertou. Damian deu um passo à frente, apoiando-se casualmente contra a mesa. Seu cheiro — um misto de madeira, terra e algo levemente amadeirado — invadiu o espaço entre eles. Era uma presença firme, inegável. Ele parecia estar sempre no controle, sempre um passo à frente. — Você acha que eu vou te machucar, não é? A pergunta fez os dedos de Amélia apertarem a borda do prato. Ela sentiu o próprio corpo enrijecer, como um animal encurralado. Ele estava certo, é claro. Ela não confiava nele. Como poderia? Mas se havia algo que aprendera ao longo dos anos, era que mostrar medo demais podia ser perigoso. Então, respirou fundo e respondeu com a maior honestidade que conseguiu reunir: — Eu não sei o que pensar de você. Damian inclinou a cabeça levemente, como se estivesse avaliando suas palavras. Por um longo momento, ele apenas a observou. Seus olhos escuros carregavam algo indecifrável — algo que a deixava inquieta. Então, um meio sorriso surgiu em seus lábios. — Bom — ele disse, com um tom quase divertido. — Acho que prefiro assim. E, sem mais explicações, virou-se e saiu do quarto. A porta se fechou atrás dele com um som suave, deixando Amélia sozinha com sua refeição e uma confusão de pensamentos. Seu coração ainda batia acelerado, como se tivesse acabado de escapar de algo. Ela olhou para a comida à sua frente, mas, de repente, não sentia mais tanta fome. O que Damian queria dela? Essa pergunta ecoou em sua mente, como um segredo prestes a ser revelado.Amélia passou o resto da manhã tentando afastar os pensamentos que insistiam em invadir sua mente.Damian.Havia algo nele que a fazia sentir-se inquieta. Ele era perigoso, disso ela tinha certeza. Mas, ao mesmo tempo, havia uma força nele que a atraía de uma forma que ela não compreendia. Seu cheiro, sua presença, o modo como seus olhos âmbar pareciam enxergar além de sua pele… tudo nele despertava nela algo primitivo, algo que não fazia sentido.Ela balançou a cabeça, irritada consigo mesma. Não podia se permitir esse tipo de distração.Decidida a entender melhor o lugar onde estava presa — porque, no fundo, ainda se sentia cativa —, resolveu explorar a casa da matilha. Não era a decisão mais segura, mas, afinal, ela havia sobrevivido anos sozinha na floresta. Um passeio não deveria ser tão desafiador.Caminhou pelos corredores de pedra, observando os detalhes. O lugar era imenso, com móveis de madeira escura, tapeçarias pesadas cobrindo as paredes e janelas amplas que deixavam a lu
O encontro com o Alfa ainda pairava na mente de Amélia como uma sombra persistente. Mesmo depois que ele desapareceu pelo corredor, deixando para trás um rastro de tensão e perguntas sem respostas, ela permaneceu imóvel por um longo instante.O que ele quis dizer com aquilo? "Espero que saiba no que está se metendo."A frase ecoava em sua mente, carregada de advertência e algo mais… algo que ela não conseguia definir. Mas ficar parada remoendo palavras não a levaria a lugar nenhum. Inspirando fundo, afastou as dúvidas e retomou sua caminhada.Ainda não conhecia os limites daquela casa imensa, e algo dentro dela queimava de curiosidade. Seu instinto dizia que, por trás das paredes de pedra e dos olhares desconfiados da matilha, havia segredos esperando para serem descobertos.Ela seguiu explorando.Os corredores pareciam se estender infinitamente, alguns estreitos e escuros, outros amplos e iluminados por janelas altas. Ocasionalmente, ela encontrava uma sala abandonada ou uma passagem
O dia já estava avançado quando Damian subiu as escadas em direção ao quarto de Amélia. O aroma do almoço recém-preparado ainda pairava no ar, misturando-se ao cheiro amadeirado característico da casa da matilha.Ele hesitou por um momento diante da porta fechada. Desde que a trouxera para ali, tinha se esforçado para manter certa distância, dar-lhe tempo para aceitar sua nova realidade. Mas agora… agora queria vê-la.Queria que almoçassem juntos.Damian não saberia dizer ao certo o porquê. Só sabia que aquela garota lhe despertava sentimentos conflitantes — e evitá-la não estava funcionando.Bateu na porta uma vez. Depois outra.Nenhuma resposta.Franzindo o cenho, girou a maçaneta e entrou.O quarto estava vazio.No mesmo instante, algo dentro dele se retesou.O cheiro dela ainda estava ali, fresco no ar, mas a ausência de sua presença fez um frio percorrer sua espinha. Seu olhar percorreu o cômodo rapidamente, procurando qualquer sinal de que ela pudesse ter saído por vontade própr
Amélia sentia o olhar intenso de Damian sobre ela, mas fingia não perceber. Algo nele a desconcertava de um jeito que não conseguia explicar. Ele era enigmático, controlador e, ao mesmo tempo, tinha um jeito estranho de cuidar dela. — Venha — disse ele, levantando-se e estendendo a mão. Ela arqueou a sobrancelha. — Para onde? — Quero te mostrar algo. Amélia hesitou. A casa da matilha já era grande o suficiente para fazê-la se sentir deslocada, e agora ele queria levá-la para outro lugar? Mas sua curiosidade foi mais forte do que a razão. Ela pegou a mão dele com relutância, sentindo o calor de sua pele contra a sua. Damian a guiou por um caminho estreito que passava entre árvores e arbustos bem cuidados. O ar ali era diferente, carregado com um aroma suave de flores misturado ao cheiro amadeirado da floresta ao redor. Quando saíram da trilha, Amélia se deparou com um jardim oculto. Era magnífico. Caminhos de pedras sinuosas cortavam um gramado impecável, levando a pequenos cant
Amélia observava Damian com uma expressão desconfiada. Algo nele havia mudado no instante em que ela riu da pergunta sobre seu "lobo". O jeito como ele a olhava agora era diferente—como se visse nela algo que nem mesmo ela conhecia. — Você está me assustando — ela disse, cruzando os braços. Damian hesitou. Parte dele queria deixar esse assunto para outro momento, mas outra parte sabia que o tempo estava se esgotando. Se ela realmente não sabia a verdade, então era questão de tempo até seu corpo forçá-la a encará-la da pior maneira possível. — Eu preciso que você confie em mim — ele disse, finalmente. Ela riu sem humor. — Você realmente acha que posso confiar em alguém que me trouxe para cá contra minha vontade? Damian segurou o olhar dela, como se tentasse encontrar um jeito de fazê-la entender. — Se eu não quisesse o seu bem, acha que eu me importaria se você soubesse ou não quem realmente é? — Sua voz era calma, mas carregava uma firmeza que fez Amélia vacilar. Ela abriu a
Outro uivo cortou o ar, carregado de algo sombrio e urgente. Damian ficou rígido, os olhos escurecendo com um brilho feroz, como se seu instinto tivesse sido acionado no mesmo instante. Amélia sentiu um arrepio percorrer sua espinha. O som parecia distante, mas, de alguma forma, também próximo o suficiente para fazer seu coração disparar. Ela abriu a boca para perguntar o que estava acontecendo, mas antes que qualquer palavra escapasse, Damian deu um passo à frente. Com um movimento surpreendentemente delicado para alguém tão intenso, ele segurou seu queixo entre os dedos, erguendo seu rosto suavemente. Amélia prendeu a respiração. O olhar dele era diferente agora, mais profundo, mais íntimo. Não havia apenas preocupação em seus olhos, mas algo mais… algo que ela não conseguia decifrar. Então, sem aviso, Damian inclinou-se e encostou seus lábios nos dela. Foi
O coração de Amélia martelava no peito enquanto os olhos frios do estranho permaneciam fixos nela.— O que quer dizer com isso? — sua voz saiu firme, mas por dentro ela lutava contra o medo crescente.O homem inclinou a cabeça levemente, como um predador analisando sua presa.— Você não faz ideia, não é? — Ele riu, um som baixo e cheio de escárnio. — Isso torna tudo ainda mais interessante.Antes que pudesse reagir, ele se moveu. Rápido. Rápido demais.Amélia tentou recuar, mas antes que pudesse dar mais um passo, um estrondo ecoou pela casa.A porta foi arrombada com brutalidade, batendo contra a parede com um impacto que fez as janelas vibrarem.E então, ele estava lá.Damian.Seus olhos brilharam com um dourado feroz, sua respiração pesada e sua presença dominadora preenchendo todo o espaço. O cheiro dele—amadeirado e selvagem—misturou-se ao ar carregado de tensão.E ele estava furioso.
Ótima escolha! Vamos aprofundar a conexão entre Amélia e Damian, explorar as emoções dela e deixar Damian explicar o significado da ligação. Também podemos trazer um pouco mais sobre o estranho, talvez dando pistas sobre quem ele é e por que tem interesse nela. Aqui está a continuação do capítulo:O silêncio entre eles era denso, quebrado apenas pela respiração pesada de Damian. Seus olhos dourados ardiam sobre ela, e a mão quente em seu rosto enviava arrepios por sua pele.Amélia sentia algo crescer dentro de si—uma onda de calor, de anseio, de algo que não conseguia nomear. Seu corpo reconhecia Damian de uma forma que sua mente ainda lutava para entender.— O que está acontecendo comigo? — sua voz saiu mais baixa do que queria, quase um sussurro.Damian deslizou o polegar suavemente por sua bochecha, hesitante, como se estivesse escolhendo as palavras com cuidado.— Você sentiu, não sentiu? — ele repetiu, os olhos intensos nos dela.