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O que uma Garota Deve Fazer (Livro 1) - Coisas da Vida
O que uma Garota Deve Fazer (Livro 1) - Coisas da Vida
Por: Kashinabi-Chan
Capítulo 1 - Um novo colégio e uma nova vida

No meu relógio são 01:18 da madrugada. Por que eu estou acordada até agora? Tudo bem, confesso que um dos motivos é que não consigo dormir. Pensamentos rodam cruelmente em minha mente. Um desses “pensamentos” na verdade é apenas um sentimento: raiva.

Meu quarto estava totalmente escuro. Meus olhos, inquietos, batiam em várias partes daquele lugar estranho. Por que lugar estranho? Porque acabei de me mudar. Recentemente, minha mãe aceitou um emprego aqui em Finsta. Um lugar mais cheio de pessoas riquinhas do que árvores. Não nos encaxávamos nessa sociedade de ricos, e, se não fosse por mim... Quero dizer, se não fosse pelo dinheiro que eu guardava na minha poupança, não teríamos comprado essa casa. Juro que minha mãe, Sabrina, ajoelhou para usar o dinheiro que havia lá e, não sei por que, meu coração amoleceu um pouquinho, o suficiente para ela conseguir arrancar meu dinheiro e me obrigar a vir morar nesse lugar estranho.

Me encolhi na cama. A janela estava aberta. Uma brisa gelada entrou por ela. Fui obrigada a deixar minhas amigas, pensei com mais raiva ainda. E pior: nem ao menos tive tempo de passar para elas meu número novo. Isso aconteceu também graças a minha mãe. Ela sempre dizia “aproveite enquanto ainda podemos tirar dinheiro do seu pai. Logo você fará dezoito anos e atingirá a maior idade.” No fim das contas, acabei cedendo e pedi que meu pai comprasse um celular novo pra mim — o que havia acabado de lançar. Claro, ele demorou muito, mas muito mesmo, para comprar esse tal celular e exatamente no dia em que eu ia me mudar, o bendito celular chega pelo correio e a minha mãe praticamente joga meu antigo celular pela janela. Então fui obrigada mesmo a trocar de celular. Minha vida é uma droga, não?

Acho que já dá para perceber uma coisa: meus pais são separados. Eles se separaram graças a quem? Tá, tá... Eu ia dizer que seria culpa da minha mãe, mas tecnicamente não é. A culpa é minha. Tem toda aquela história do tipo: num dia, pouco tempo depois de meus pais terem se casado, Sabrina fica grávida e ai vem às brigas, pois não sabiam o que fazer comigo, sendo que ainda não passava de um zigoto, e por fim vem o divórcio. Isso não foi nada bom para minha mãe, mas foi excelente para meu pai. Depois que eles se separaram, a vida profissional do meu pai deu um salto e puf, ele se casou com outra mulher quando já estava milionário, deixando eu e minha mãe na miséria. Quero dizer, nem tanto assim graças a uma coisa chamada pensão. E essa pensão se transformou em mensalidades do meu novo colégio interno.

Colégio interno... Só essa palavra me dá arrepios. Sim, é uma grande oportunidade para mim fugir da Sabrina por uns tempos e eu estaria feliz se o colégio não fosse em Unílah. Lá é uma cidade basicamente ainda mais cheio de ricos do que em Finsta, ou seja, estou indo para um colégio de mauricinhos e patricinhas; vou sofrer.

Olho para minhas malas, todas jogadas num canto. Eram três. Três que continham todas as coisas que consegui carregar da minha antiga cidade até aqui. Claro, tirando as caixas e mais caixas de mobílias e outros pertences.

O que farei lá?, penso descontraída, olhando para o teto branco do meu quarto. Não duvidava que em poucos dias eu pularia o muro do colégio e fugiria. Solto um risinho baixo. Seria bem divertido.

Levanto da cama. Estava cansada de não estar fazendo o nada. Abro uma das caixas em meu quarto, a procura de qualquer coisa que pudesse me distrair. Acabei encontrando um antigo presente da Geovanna, uma das minhas melhores amigas. Ela me deu quando completei quinze anos. “Quinze anos. Agora é o momento ideal para perder a virgindade e usar roupas curtas, fofinha”, brincara ela, enquanto escolhíamos o vestido que eu usaria na minha festa. “Espero que seu presente seja o melhor de todos!”, desafiei ela, quando estava abrindo o pequeno e lindo papel prateado do presente dela.

Nunca usei aquele diário. Só ocupava um espaço no meu armário que eu chamava de “presentes que nunca vou usar, mas não posso jogar fora.” Era apenas um simples caderno preto, com um lápis prateado incluso. Tinha também uma caneta prateada, para decorarmos a capa do diário como quisermos. Sim, o presente era mesmo meio infantil, mas de alguma forma, tinha um significado para ela e é simplesmente impossível jogar um presente desses fora.

Sentei na cama e com a meia-luz que a lua jogava no meu quarto, comecei a folhear as folhas em branco. Se eu gostasse de escrever, o que escreveria aqui?, penso com um meio sorriso. Uma pergunta meio difícil de responder. Abro na primeira página e rabisco de qualquer jeito “o que uma garota deve fazer.” E o que uma garota deve fazer? Não sei. Aliás, nem sei porque escrevi essa porcaria.

Jogo o diário em direção a caixa onde o encontrei, mas erro o alvo e ele apenas fica perto daquela caixa, ainda aberto na primeira página. Desisto de levantar da cama e jogo o lápis perto dele. Quando me dou conta, estou dormindo.

A primeira coisa que ouço pela manhã, são os gritos da minha mãe. Dou uma olhada em meu relógio e eram 06:17. Hora que eu deveria estar no colégio: 08:00.

Sento na cama, perdida, ainda tentando lembrar quem eu era; o que estava fazendo ali; e o que eu deveria fazer em seguida. Quando eu lembro que me chamo Alessandra, que tenho dezessete anos e que hoje é o meu primeiro dia de aula, continuo parada.

— Alessandra, levanta sua bunda da cama e vem tomar o café da manhã! — gritou Sabrina, provavelmente da cozinha. Dava para ouvir os estalos de gordura. Ela deve estar fazendo algo frito.

Bocejo, ainda no mundo da lua. Minha cama estava tão confortável...

Aos poucos faço minhas pernas se mexerem e vou me arrastando como um zumbi para a cozinha. Uma nota muito importante: fui movida da cama mais pela fome do que por vontade própria.

Chego na cozinha e eu deveria estar mesmo com uma aparência sinistra. Minha mãe levou quase que um susto. Só a forma oval da sua boca já me disse tudo. Ela contrai os lábios para disfarçar minha feiúra pela manhã.

Não vou mentir: ela não é feia. Seus cabelos são negros e lisos, como os meus. Alguns fiozinhos brancos aqui e ali, mas eram bem poucos. Minha mãe é uma pessoa jovem. Não me teve com uma idade muito avançada — aos vinte e cinco anos. Pela manhã, ela deixou os cabelos em coque, deixando de propósito uma mecha solta no rosto. Um vestido de manga até os cotovelos, de listras de tamanhos variados e também de cores como marrom, verde-escuro e bege; a deixava com uma bela aparência logo cedo. Usava saltos marrons.

— Vai aonde desse jeito? — pergunto me sentando a mesa, não que eu me importasse tanto assim, mas era raro os momentos em que eu via minha mãe tão arrumada.

— Irei levar você ao colégio — respondeu ela enquanto colocava um prato a minha frente.

     — Disso eu sei, só quero saber o por quê de estar tão arrumada.

     — E uma mulher não pode se produzir?

     — Pode, mas você não é esse tipo de mulher.

     — E que tipo de mulher eu sou? — Sua pergunta saiu de maneira grosseira e aquilo me irritou.

     — Do tipo ignorante — digo fria, enquanto ela colocava uma panqueca em meu prato.

     Despejei mel e a cozinha continuou no silêncio. Sabrina limpava as panelas e os pratos que havia usado e eu apenas saboreava a panqueca que demorei muito tempo para admitir que estava excelentemente deliciosa.

     Assim que terminei a panqueca — não aquela, três depois da primeira —, levantei e empurrei o prato no chão que se espatifou em diversos pedaços brancos e com resquícios de mel.

     — Alessandra! — sua voz foi uma mistura de raiva e surpresa.

     Continuei a andar para sair da cozinha.

     — Vem aqui agora! — esbravejou ela.

     Saí da cozinha, em direção ao meu quarto, sem me importar as diversas vezes que ela gritou para que eu voltasse.

Assim que cheguei em meu quarto, soltei um risinho satisfeito por ainda continuar ouvindo ela me chamar, mesmo tendo a certeza que eu não voltaria tão cedo.

     Me despi rapidamente para tomar um banho rápido. Puxei uma toalha qualquer do armário e em dez minutos, consegui me banhar com facilidade.

Enquanto pingos de água caiam sobre o chão branco do meu quarto, eu escolhia uma roupa para usar no primeiro dia de aula. O que escolhi foi minha blusa favorita — preta com um coração roxo —, uma calça jeans escura e, para completar meu visual, um tênis All Star preto.

     Fui para o espelho do banheiro e ali comecei a pentear meus cabelos negros. Não vou mentir em admitir que em partes sou rebelde. Claro que hoje já nem tanto. Aos meus quinze anos foi o ápice da minha rebeldia. Como nada do que eu fiz deu muito resultado, acabei deixando de lado essa questão, entretanto, duas marcas dos tempos passados ainda habitam em mim:

     > Mechas azuis;

     > Uma tatuagem de estrela em meu pescoço.                                                              

     Estão aí símbolos típicos de uma rebeldia.

     Com os cabelos penteados, corri de volta para o quarto e... me deparei com o diário ainda aberto naquela mesma página. “O que uma garota deve fazer”. Ainda me pergunto que motivos tive para escrever isso. Balanço a cabeça e acabo ignorando meus pensamentos. Vou até minhas malas e fecho cada uma delas.

     Uma, eu podia carregar nas costas e as outras tinham de ser nas mãos mesmo. Antes de sair do quarto, dei uma olhada de soslaio para o diário.

     — Ah, quer saber, que se dane — digo para mim mesma e largo todas as malas no chão.

     Caminho hesitante até o diário e o pego, juntamente com o lápis e a caneta.

     — O que farei com você, sua coisa insignificante? — pergunto a mim mesma, arqueando uma sobrancelha.

     Avisto uma velha tinta spray roxo-escuro. Mostro um sorrisinho a mim mesma; eu tinha uma idéia. Sacudi a lata, para ver se ainda tinha alguma coisa e começo a pintar o diário.

     Dou uma olhada no relógio e eram 06:57. Meia-hora é tudo que eu preciso, penso, mordendo o lábio inferior de nervosismo.

     A meia-hora passa voando. Toco meu diário e ele ainda estava um pouco úmido, mas aquilo tinha de servir. Pego a caneta prateada e começo a escrever “o que uma garota deve fazer”. Fico um tanto frustrada por a tinta não ser prateada — era preta. Embaixo do título, escrevo “coisas da vida”. E realmente eram coisas da minha vida no colégio de riquinhos que eu ia contar. Dou uma olhada para ver o resultado e não me sinto totalmente satisfeita. Começo a fazer vários rabiscos em diversas partes da capa e logo estava do jeito desleixado que eu havia adorado.

     — Vamos logo, Alessandra! — Sabrina aparece de repente na porta do meu quarto e começa a tossir. — Eu já não te disse para não brincar com a tinta spray?

     Aquilo me deixa irritada.

     — Não sou mais criança. Posso “brincar” com o que eu quiser.

     — Tudo bem, Alessandra — ela diz como se estivesse cansada de discutir. — Venha logo antes que se atrase mais.

     Assinto com a cabeça, sentindo a raiva baixar um pouco. Seguro firmemente o diário, a caneta e o lápis. Pego a mala que eu podia colocar nas costas e minha mãe acaba carregando as outras duas pra mim.

     Coloco a mala que eu estava carregando no porta-malas e entro no carro, sentando no banco do carona.

     Enquanto minha mãe colocava as outras malas, dei uma olhada no resultado do meu diário mais uma vez. Não estava tão ruim e nem tão bom assim. Abro na primeira página de novo e começo a escrever:

Olá, pessoa que está lendo meu primeiro diário...

     Risco de primeira. Aquilo havia ficado horrivelmente horrível.

Seja bem-vindo, caro leitor do meu primeiro diário!

     Acabo riscando também. Sabrina entra no carro poucos minutos depois de eu voltar a pensar em como poderia começar.

     — O que é isso? Você escrevendo em diário? Deuses, não sabia que o fim do mundo estava tão próximo — brinca ela alguns instantes depois de ter dado a partida e começar a dirigir.

     Involuntariamente solto uma risada. Eu tinha que admitir a mim mesma que aquilo era verdade. Nem quando eu era mais nova eu tinha interesse em escrever, principalmente em diários.

     Volto a pensar no que eu poderia escrever para começar. Então tenho uma idéia mais ou menos legal de como eu poderia começar:

21 de Março de 2014

Seja bem-vindo ao primeiro diário de uma garota. Espero que aqui encontre dicas úteis e fúteis que te façam rir ou pelo menos refletir em algo da sua vida. Juntamente com os pedaços da minha vida aos 17 anos. Tenho certeza de que de alguma maneira isso será útil tanto para você quanto para mim.

     Isso sim é um bom começo, penso, satisfeita.

     É então que fecho o diário e começo a prestar atenção na paisagem.

A viagem não foi à melhor coisa do mundo. De vez em quando, minha mãe tentava colocar alguns assuntos para quebrar o silêncio do carro, ainda assim, foi uma total perda de tempo. A viagem foi baseada em respiração, conversas que se perdiam por respostas curtas e sem graças, e suspiros decepcionados.

     Quando tudo não passava de campos e florestas abertas, consegui avistar um muro extenso e logo pude perceber que era o colégio. Fiquei feliz, porém, ao mesmo tempo senti a raiva da manhã voltar. A única coisa que me causava felicidade era que agora tinha arranjado algo para fazer no colégio idiota: escrever no diário.

     Minha mãe foi a primeira a descer do carro, como se não quisesse mais permanecer ali. Se eu estava certa ou não, não me importava muito; eu me sentia assim — queria sair dali o mais rápido possível. Quando me levantei do banco, algo caiu. Meu diário e meu lápis. Estava tão concentrada em fazer as conversas que Sabrina levantava morrerem que acabei esquecendo de anotar alguns detalhes da viagem.

     Fechei a porta do carro e peguei o diário do chão, juntamente com a meu lápis. Anotei tudo da viagem — paisagem, conversas sem graças, pensamentos —, e senti que me fez bem me expressar por palavras, mas não achei nenhum tipo de assunto na viagem que me inspirasse para escrever alguma dica, então pensei em deixar isto para depois.

     Depois de um tempinho olhando para nada em especial, algumas idéias de diversas coisas me visitam e abro o diário para anotar. Enquanto eu escrevia, distraída, eu comecei a andar. O vento fresco só me fazia viajar ainda mais nas palavras que eram produzidas pelas minhas mãos.

     Com tantas distrações, acabei tropeçando e caí com meu diário naquele chão asfaltado do estacionamento.

     — Preste atenção por onde anda, Alessandra! — repreendeu minha mãe, enquanto tirava as minhas coisas do porta-malas.

     Eu me levantei sem dizer uma palavra e fiquei feliz por ninguém ter visto nada. Fiquei tão aliviada que soltei um suspiro de alívio. Nunca dá certo que uma nova aluna acabe sendo falada que fez algo de errado no seu primeiro dia.

     ★Dica 1 = Preste atenção por onde anda. Tente não pagar mico no primeiro dia de aula.★

     Acabei de dar um grande passo. Consegui fazer minha primeira dica. Eu espero que sirva para algo, além de tomar espaço em uma folha em branco.

     Quando minha mãe terminou de tirar as coisas, ela nem me ajudou a carregar nada. Eu tive que carregar três malas gigantes sozinha. Ela saiu com o carro antes que eu pudesse pedir pra me ajudar. E eu pensando que depois dela ter me ajudado lá em casa ela iria me ajudar agora...

     ★Dica 2 = Antes que sua mãe fuja com o carro, peça para ela te ajudar a carregar suas malas.★

     Imagino eu que no primeiro dia de aula, os pais ajudaram seus filhos, mas minha mãe? Nada fez. Não sei o por quê dela ter me ajudado em casa e aqui não. Talvez ela só queria que eu chegasse aqui a tempo e nada mais.

     Dei uma olhada para cima e vi o grante letreiro em arco escrito “Colégio Interno de Unílah”.

     Eu — não sei como —, carregando três malas gigantes, era estranho de se ver até de longe. Uma pessoa normal não carregaria o quarto todo em uma mala, porém, posso concluir de que não sou uma pessoa normal. Eu andava pelo campus na direção de dois prédios que presumi ser onde ficavam os dormitórios.

     — O que você está fazendo? — perguntou um garoto se aproximando de mim. Por que diabos um garoto desconhecido quer falar comigo? Será que ele se assustou tanto assim com as malas e quer saber o motivo de serem tão grandes?

— O que você acha? — eu soava irritada. — Será que eu vou ter que desenhar para você entender que estou carregando três malas gigantes que uma mãe sem coração deixou que eu carregasse? — Eu não conseguia olhá-lo. O peso em minhas costas me impedia de me preocupar com quem quer que fosse que estivesse do meu lado. Não tenho tempo para admirá-lo e ter uma conversa normal.

     — Agora entendi. Sinceramente, achei que era a nova faxineira de quem estavam me falando. — Ele estava me seguindo e esse ato só me fez ter menos paciência.

     — Será que ao invés de achar que eu sou uma faxineira, poderia me ajudar?

     — Não, obrigado. Só de olhar, já dá pra perceber que todas essas malas estão pesadas.

     — Não importa. — Eu joguei uma mala no garoto. Não tinha tempo de implorar educadamente se ele queria me ajudar e já que ele não quis, é melhor jogar. — Agora você vai ter que me ajudar. Ninguém mandou você vir falar comigo.

     ★Dica 3 = Não espere que os outros te ajudem, apenas jogue a mala em cima.★

     — Garota que eu não conheço que atira malas em pessoas desconhecidas, o que você colocou aqui dentro?

     — Apenas coisas — respondi enquanto caminhava para recepção do colégio para que ele me seguisse.

     — Impossível. — Ele tentava ajeitar a mala de uma forma que conseguisse carregar. — Você deve ter colocado pedra aqui ou alguma coisa muito pesada.

     — Pare de reclamar e continue a me ajudar. É o mínimo que pode fazer, já que veio falar comigo, como já lhe disse antes.

     — Me diga logo o que você carrega aqui dentro e eu continuo a te ajudar. — Ele parou de andar no meio do caminho.

     — Ai dentro tem apenas... — parei a frase no mesmo instante que lembrei o que tinha lá dentro.

     Eu não consigo acreditar que no primeiro dia de aula já comecei a pagar mico. O que havia lá dentro que me fez pensar isso? Eu queria revelar, porém, eu estou com vergonha até de escrever, mas vou contar assim mesmo: dentro daquela mala tinha... tinha... tinha... calcinhas. Isso mesmo. Calcinhas. Por que justamente para um garoto eu fui jogar esta mala? Será que eu não poderia ter lembrado que lá continha toda minha roupa íntima? E agora? Como eu vou falar uma coisa dessas? Isso é uma terrível vergonha.

     Bom, pelo menos a mala não está completamente cheia de calcinhas. Só que lá estão todas as minhas... — quer saber, não vou repetir essa palavra de novo —, mas não são tantas assim, ou eu fico na esperança que não. O maior dos problemas é que as calcinhas estão exatamente em cima, então se ele ousar tentar abrir a mala, vai entender meu total nervosismo e desespero.

     ★Dica 4 = Não deixe todas as suas calcinhas dentro de uma mala só e principalmente em cima.★

     — Garota? — chamou ele e isso me fez acordar de meus pensamentos.

     — Oi — respondi normalmente como se aquele problema (o da mala) não existisse.

     — O que aconteceu? Fiquei te chamando várias vezes. — Arqueou uma de suas sobrancelhas, esperando uma resposta de minha parte.

     — Nada — eu estava muito nervosa. Tudo que saiu logo a seguir foi um sorriso amarelo.

     — Que seja, a questão mais importante é que você me diga o que há dentro daquela mala.

     Deixei no chão as outras duas malas que eu segurava e mesmo assim, eu olhava para o chão. Estava envergonhada demais para o olhar.

     — Quer saber, se quiser pode ir embora e me deixar carregar tudo sozinha. Acabei de me dar conta que não preciso mais de sua ajuda — a mentira era clara em minha voz, mas não custava nada tentar.

     — Por quê? O que há de tão estranho dentro de uma simples mala?

     — Nada. Nessa mala não tem nada de incomum — tentei disfarçar.

     Ele jogou minha mala no chão e começou a abrir. Aquilo me deixou surpresa. Ele é curioso a ponto de ter que abrir minha mala? Que ousadia. Eu deveria chamar a polícia — embora não haja polícia alguma aqui por perto —, mas isso tudo está tão divertido que não quero que acabe tão rápido.

     — O que acha que está fazendo? — Eu fui logo tentar impedir. Minhas mãos (fracas) ficaram sobre as suas para tentar impedi-lo. Não adiantou, ele era forte.

     — Não tente impedir, só vai fazer com que eu demore mais. Apenas me deixe terminar de abrir sua mala. Vai ser rápido, prometo.

     — Isso não se faz! — “Principalmente quando tem coisas horríveis ai dentro”, completei mentalmente. Minhas mãos permaneceram persistentes, mesmo que ele as conseguisse tirar muitas vezes, eu voltava a colocá-las sobre as suas.

     — Uma frase não vai me impedir. — Ele continuou a abrir.

     — Por favor, eu te imploro, não abra essa mala. — Eu me joguei no chão e juro que comecei a chorar nos pés dele. Foi o único jeito que encontrei de tentar convencer para que ele parasse ou com que ficasse com pena. Não adiantou.

     — Não pode ser uma coisa tão ruim assim... — Ele parou a frase assim que viu o que tinha dentro.

     ★Dica 5 = Não fique desesperada. São apenas calcinhas. Mas neste caso: EU ESTOU TOTALMENTE DESESPERADA!!!!!!!★

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