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8 - Um leve sabor de lavanda

Não queria admitir para mim mesma que fiquei abalada com todo o acontecimento no aeroporto. Mesmo aceitando que o pior já havia passado, que era encontrá-lo e dizer sobre a gravidez, ter deixado as coisas indefinidas com o Ryan deixou tudo mais angustiante, mesmo que toda a questão precisasse depender se ele faria ou não alguma coisa. E tudo isso junto com a possibilidade de perder uma grande chance da minha carreira parecia demais para mim. 

Decidi tomar um banho. Precisava tentar me manter calma para que minha pressão não subisse e fizesse mal para o bebê. E por mais que eu tenha conseguido amenizar os meus pensamentos sobre isso, toda minha calma não poderia durar muito tempo. Meu celular apitou com a notificação de uma mensagem. Era Matteo. Com todo o drama, e como eu só me comuniquei com a assistente desde o recado dele, havia me esquecido completamente que eu o encontraria novamente. E que provavelmente iremos trabalhar juntos. Meu estômago revirou. Não quis arriscar e tomei logo meu remédio para enjoo antes que eu saísse para tomar o café da manhã. 

Na mensagem ele dizia que passaria no hotel para me buscar. Pensei em responder que não, mas algum lado meu que parecia bem mais racional do que eu poderia imaginar estar, fez eu aceitar a carona. Mandei um simples “ok”. Se o assunto surgisse, e ele com certeza surgiria, poderia ser esclarecido algo, mas eu não vejo como poderia mudar o que eu achava a respeito. Independente das desculpas que ele pudesse dar. Eu não havia feito nada de errado. E ele só mostrou para mim que não era digno de confiança, ao menos no sentido romântico. Já tinha sido uma bobagem ter imaginado as coisas como destinadas só porque eu havia me sentido um pouco mais jovem e apaixonada em seus braços. E mesmo que ele me convencesse e prometesse tudo que eu tinha esperado antes, eu não ia querer lidar com um relacionamento. Principalmente agora, na minha atual situação.

Tentei me fazer parecer apresentável. Eu ainda não tinha visto mudanças no meu corpo, embora eu me sentisse um pouco inchada. É difícil se controlar quando os seus desejos de gravidez são tão acessíveis no seu trabalho. Matteo já me esperava no carro em frente ao hotel. Quando ele me viu me aproximando, saiu do carro e foi em direção ao meu lado abrir a porta para que eu entrasse. Meu coração só começou a palpitar quando ele a fechou e se sentou de frente ao volante. Ele ligou o carro e seguimos em silêncio por um tempo. 

Ele mantinha uma das mãos no volante, mas com a outra ele remexia constantemente em cima da manopla do câmbio. Ela parecia estar pensando em várias formas de puxar o assunto. Deixei claro que não tiraria essa responsabilidade dele.

- Você parece bem. 

Eu estava com o rosto virado para a janela do carro. Tentava contemplar nosso caminho para que não precisasse encará-lo. Então acenei com a cabeça e sem saber se ele havia visto minha confirmação. Se ele tentou quebrar o gelo para que eu tocasse em nosso outro assunto, não foi efetivo. 

- Eu quis vir te buscar para conversarmos sobre nosso último encontro. - eu continuava olhando pela janela, e só acenei com a cabeça novamente - Ela era a minha noiva. Não estávamos nos dando bem. Depois do noivado parecíamos ainda mais incompatíveis. Eu tinha pedido um tempo para ela no dia que eu ia para o festival. E te encontrar me deu certeza de que eu tinha feito a escolha certa. - ele parecia hesitante - Mas ela não tinha entendido dessa forma, então ela apareceu para fazer uma surpresa e… 

Ele decidiu não concluir porque nós dois sabíamos do que esse encontro se tratava. Também não entendia os motivos dele em querer me dar aquela satisfação. Mesmo que ele tentasse melhorar o cenário, ainda parecia tudo muito estranho e errado. Então eu não tinha o que dizer a respeito e continuei em silêncio. 

- Parecia tão certo termos nos reencontrado. Mas eu precisava ter sido honesto com você. - ele continuou - Você consegue me perdoar?

- Talvez algum dia. Eu realmente fiquei muito magoada. 

Foi tudo o que eu consegui dizer. Por mais madura que eu pudesse tentar ser naquele momento, mostrando minha superação, eu ainda me sentia como uma menina boba que cometeu um erro ingênuo. Ele pareceu aceitar a resposta e não conversamos mais no restante do trajeto. De qualquer forma, era outra coisa para virar a página e seguir em frente. 

Não demorou muito para chegarmos ao mesmo castelo de Windsor onde ocorreu o festival. Era um dos castelos reais que a rainha mais gostava para festas, então era onde aconteceria o noivado do príncipe. De certa forma, era agradável voltar a trabalhar em um lugar que me era familiar, mesmo que minha primeira estadia não tivesse durado tanto tempo. Não tive a oportunidade de realmente conhecer e admirar. Talvez ainda não me fosse possível, já que tudo dependeria do meu resultado com a chef Whitmore. Eu estava usando todas as minhas forças para pensar positivo, já que não tive momentos tão otimistas desde que cheguei. 

Antes que entrássemos, Matteo me explicou que hoje seria um estudo da preparação para o banquete. A chefe queria estabelecer prazos, ingredientes, combinações que fossem boas aos gostos dos anfitriões e que tudo representasse uma parte da história do casal. Eu tinha uma noção do que iria acontecer, mesmo nunca tendo trabalhado em uma equipe tão grande e completa. Mas fui lembrada de que haveriam outros dois chefes da minha especialidade que já estavam se parando com a chef Whitmore. E como hoje era o último dia, eu ia ter que dar o melhor de mim para me destacar, ainda sem saber como o poderia fazer. Só esperava que minha capacidade e experiência pudessem me ajudar com isso. 

A cozinha estava começando a ganhar vida, à medida que os ajudantes começavam a organizar os materiais. Serena Whitmore já estava vestida e avaliando o trabalho de todos. Às vezes soltando algumas ordens com um tom de voz bem estridente. Quando me aproximei dela para me apresentar, ela já estava discutindo com outros dois chefes, que pelo contexto, entendi serem meus concorrentes.

- E então? Já chegaram num plano? - chef Whitmore questionava aos dois.

- Eu planejei um sorbet de limão com vinho espumante. - disse um deles nervosamente. - Acho que seria uma excelente opção para limpar o paladar após o prato principal…

Ela levantou a mão para que ele parasse de falar e olhou inquisitivamente para o outro.

- E eu um crème brûlée de maracujá com molho de caramelo salgado. - ele pareceu esperançoso em continuar - A combinação de sabores exóticos e a textura cremosa do crème brûlée certamente seria uma surpresa agradável…

Ela revirou os olhos e bufou inconformada. 

- Nós vamos servir risoto de lagosta com trufas negras. O sorbet de limão vai ser um contraste muito forte  com a riqueza do risoto de lagosta. E o crème brûlée pode ser um pouco pesado. - ela parecia irritada em dizer o que lhe era óbvio - Precisamos de algo mais delicado e equilibrado.

Ela se virou quando viu que eu a esperava. Jogou o mesmo olhar questionador para mim, provavelmente esperando que eu dissesse meu plano. E por mais que eu quisesse ser modesta, eu tinha uma sobremesa perfeita para o que ela precisava.

- Tiramissu de Lavanda e Pistache. - ela parecia interessada, então expliquei - A suavidade do mascarpone misturada com a delicadeza da lavanda e o crocante dos pistaches certamente proporcionaria uma experiência sensorial excepcional. Complementaria o prato principal sem tirar seu destaque. 

- Exatamente! - ela pareceu ter apreciado minha resposta - Consegue mesmo trabalhar com lavanda? 

- Sim chef! - respondi prontamente. 

Usar lavanda na comida era um caminho sinuoso. Você podia deixar a comida com um sabor divino, ou com gosto de sabão. Por isso muitos cozinheiros evitavam utilizá-lo em qualquer coisa que preparem. Entretanto, eu sempre gostei de usar sabores difíceis e era isso o que ajudava a me destacar. E me sentia bastante confiante com minha escolha. Finalmente eu estava em um ambiente que eu podia dominar.  

Ela se virou para os outros chefs e disse para eles que eu coordenaria a preparação. Senti meu rosto corar e pela primeira vez na minha volta para Londres, meu coração palpitava de entusiasmo. Meu olhar encontrou com o de Matteo, e ele acenou de longe como se me parabenizasse. Eu sorri em resposta. Por mais que eu ainda estivesse chateada, nós iríamos trabalhar no mesmo ambiente, então poderia ser a nossa forma de seguir em frente.

Em poucos minutos a cozinha havia se tornado uma balbúrdia de pessoas trabalhando. O banquete de noivado do príncipe Henry seria no próximo fim de semana, e tudo precisava estar pronto e sincronizado dias antes. Pude acompanhar o trabalho da chef Whitmore de perto. Eu mesmo fiquei horas trabalhando para averiguar todas as execuções. No fim, tudo valeu a pena quando ela tinha elogiado minhas técnicas e como o tiramissu tinha ficado delicioso. Acreditei mesmo que eu fosse explodir! Já ao final do dia, ela me chamou para irmos encontrar com nossa anfitriã, para falarmos sobre o nosso menu. 

- Vou te antecipar um conselho: não demonstre muita surpresa. - ela me disse enquanto caminhávamos por um longo corredor branco cheio de adornos dourados nas paredes - Nossa anfitriã não é muito fã de pessoas que se impressionam facilmente. - ela parou hesitante - E ela pode ser bem complicada de lidar. 

Quando passamos pelo arco da porta, entramos num lindo e majestoso salão. Então eu já não havia seguido o primeiro conselho. Era muito difícil não me impressionar, já que eu nunca havia visto um lugar como aquele. As paredes brancas com alguns detalhes marmorizados e outros esculpidos em dourado. Vários quadros com imagens de pessoas antigas ou paisagens remotas. Um grande lustre central que iluminava tudo com uma luz cristalizada. Uma escada que se dividia em duas para chegar ao térreo se mesclando a um grande tapede vermelho. E de uma delas, uma mulher descia. 

- Serena, suponho que você tenha recebido meu recado. 

Era uma mulher jovem. O rosto estava levemente inclinado para cima, o que fazia com que sua expressão parecesse esnobe. Usava um vestido rosa muito bem alinhado e uma tiara da mesma cor segurava a cascata negra de seus cabelos para trás. 

- Sim senhorita Pembroke, por isso estou aqui. Infelizmente não posso atender seu pedido nas atuais circunstâncias. 

- Como é que é? - sua expressão mudou abruptamente com sua indignação - Isso é inaceitável!

- A senhorita já havia aprovado tudo. - chef Whitmore se mantinha firme - Podemos leva-la á cozinha e…

- Eu não quero saber. - disse aumentando o tom da voz - Eu não vou comer algo com gosto de sabão. Isso é inadmissível. 

- Senhorita Pembroke, - eu senti que precisava intervir - eu posso garantir que não vai ficar com gosto…

Ela se virou para me encarar, enfurecida.

- E quem é essa?

A chefe colocou a mão nas minhas costas para me pôr ao seu lado. 

- Essa é a nossa Chef Pâtissier. - eu fiz uma leve reverência sem saber se era o gesto de cortesia correto. Pelo menos eu não ia precisar encará-la - Ela é muito competente. Tenho certeza que a senhorita vai…

- Tudo tem que estar perfeito para o meu banquete e você precisa dar um jeito.

Ela simplesmente se virou e subiu as escadas. Chef Whitmore também estava indignada mas não teve como falar mais nada. Eu ainda estava perdida, não havia entendido o problema com ela. Eu esperei até que ela me explicasse. 

- Ela pediu para mudar praticamente tudo. - disse exasperada - Tudo o que ela já tinha confirmado! - soltou um suspiro - E a sobremesa é impossível de ficar pronta a tempo. 

Ela me entregou um papel cuidadosamente dobrado. Era um recado escrito à mão com o novo menu solicitado. Levei meus olhos em direção à sobremesa e entendi a aflição da minha chefe.

- Isso leva mais de um mês para fazer… - eu não tinha percebido que havia dito em voz alta.

- Foi o que eu disse. - ela respirou fundo e me encarou - Vai arriscar sua carreira nisso?

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