Agora finalmente iríamos para casa. No carro, o silêncio era espesso, denso. Mesmo que não fosse incômodo, ainda assim me deixava inquieta. Não havia mais nada a ser feito e agora éramos oficialmente marido e mulher. Mesmo que essa condição não mudasse nada entre nós. Eu não conseguia parar de pensar em que eu ficaria todo o tempo ao lado dele depois de tudo o que aconteceu, sem distrações, sem desculpas. Apenas nós dois. Haveria muitos momentos a sós. Talvez fosse isso que pesava no ar. Ao menos era isso que pesava meus pensamentos.
Ele tinha mencionado que não me deixaria sozinha, mas não havia dito com exatidão quais seriam os próximos passos. E então, a questão da casa. Ele pediu que a decisão fosse minha. Eu teria que escolher entre ficar na casa onde eu já estava ou na dele. Mas, estranhamente, eu não sabia o que seria melhor. Dividir um teto com Ryan era uma perspectiva que me as
A quietude na sala de jantar era quase insuportável. O som dos talheres contra os pratos era quase um alívio, preenchendo os espaços vazios que deveriam ser ocupados pelas palavras. Eu olhava para o prato à minha frente, mas mal sentia o sabor da comida. Estava exausta, como se o peso da gravidez e das circunstâncias me esmagassem de uma vez. Eu e Ryan estávamos juntos naquela casa vazia há três dias sem grandes acontecimentos, mas era como se houvesse uma barreira invisível entre nós. Algo havia mudado.Não conseguimos voltar àquela convivência leve que tínhamos antes de toda a confusão da minha partida. Nada era como antes, e nem seria como antes. A convivência tinha criado uma amizade que era difícil de recuperar. Agora havia o fato de que éramos oficialmente marido e mulher, mesmo que isso significasse tão pouco e, ao mesmo tempo, tanto. Eu sabia que ele também sentia isso, mas nenhum de nós parecia disposto a abordar o assunto. Ryan parecia estar retraído, como se qualquer coisa
Depois da conversa com a rainha e de todo o clima tenso que ela trouxe consigo, parecia que algo havia mudado. As coisas haviam se acalmado. Apesar de suas palavras frias e ameaçadoras, parecia que, pelo menos por enquanto, ela havia decidido manter distância e Ryan conseguiu neutralizar parte da pressão que sua mãe colocava sobre nós. A sensação de viver sob uma constante tensão foi substituída por algo mais... cotidiano. Ele finalmente se mudou para a casa onde eu estava hospedada e, mesmo que isso me causasse certo desconforto no início, nossa convivência não estava tão complicada quanto eu havia imaginado. Era estranho, claro, ter ele ali o tempo todo, mas, ao mesmo tempo, sua presença tornava as coisas mais fáceis. Ele tinha uma estranha capacidade de tornar a casa menos vazia. O convívio começou a revelar aspectos de Ryan que eu nunca havia notado antes. Pequenos detalhes na maneira como ele organizava suas coisas ou as rotinas silenciosas que adotava preenchiam os espaços em b
Olhei para o relógio que marcava as três da madrugada. Mesmo assim o aeroporto estava bem movimentado. Manon estava sonolenta e emburrada. Revirando os olhos sempre que me pegava sorrindo entusiasmada. Mas eu não podia (e nem queria) me conter. Eu finalmente iria a Londres para participar de um grande festival gastronômico. E o mais surreal de tudo, é que poderia ter a chance de conhecer Serena Whitmore, uma das maiores chefs da Europa. Se não fosse pela Manon eu estaria saltitando e abraçando a todos estes desconhecidos ao meu redor. Ainda bem que minha melhor amiga está comigo.- Como consegue ficar tão despreocupada? - perguntou - É a chance dos seus sonhos. Ela tinha razão. Era a oportunidade que mudaria toda a minha carreira. Havia muita pressão sobre este evento que poderia mudar toda a minha vida.- E quem disse que eu não estou nervosa? - respondi francamente - Eu posso não conhecer a Serena, ou pior: - pausei para enfatizar a gravidade da situação - ela pode odiar minha comid
O festival iria começar em dois dias, então hoje eu já pude ter acesso a cozinha que me foi designada. Eu e Manon estávamos conferindo os ingredientes, os utensílios e os equipamentos. Eles enviaram uma lista do que estaria disponível, juntamente com um formulário de solicitação para equipamentos extras, caso julgássemos necessário. Parecia tudo em ordem e completo. Eu me formei em gastronomia quando tinha 24 anos. Consegui dois bons restaurantes para começar a trabalhar. Meu trabalho noturno era em uma enoteca, um lugar de apreciação de vinhos que serve pratos dos mais variados tipos para combinar com a bebida. Então havia muitos chefs com que aprender todo tipo de coisa. Durante o dia era num Bistrô duas estrelas que tinha um bom renome na cidade. E foi lá que eu descobri minha paixão pela pastelaria. Chef Marco era um verdadeiro artista, mas, devido à idade, ele decidiu vender o lugar, então tive que deixar o trabalho. Estudei mais alguns anos e me tornei mestre em pastelaria. Tam
Eu não voltei para o meu quarto. Eu estava tão constrangida, que não queria encarar a Manon e contar desse desastre. Eu queria não ter escutado tão bem as últimas palavras que ele disse. Queria pensar que talvez estivesse enganada. Ele está noivo! E eu ia pra cama com ele. Ele correspondeu mais cedo, não disse nada. Ele me chamou para o quarto dele, certo? Não sou eu que estou errada. Não sabia o que pensar…Mais e mais desses pensamentos de culpa e autopiedade embrulhavam minha mente e meu estômago. Comecei a questionar nosso passado, mas se continuasse, poderia enlouquecer. Chamei um táxi e pedi para que me levasse a um bar qualquer. Meu celular começou a vibrar. Era uma mensagem dele: “Onde você está? Eu posso explicar. Por favor!”.Eu o ignorei. Pensei em bloquear seu número, mas antes que eu o pudesse fazer, recebi uma mensagem da Manon preocupada, porque ele tinha ido ao nosso quarto me procurar. Maron: “Tudo bem com você? Onde foi?”Eu: “Estou indo beber, preciso espairecer. De
Para o meu alívio, os dias que se seguiram ao festival foram intensos e cheios de tarefas ininterruptas. Estava indo tudo tão bem, que iríamos precisar de ingredientes extras para o último dia, pois pediram muito mais dos confeitos que fazíamos. Infelizmente, Serena Whitmore não apareceu na minha cozinha. Não sabia se era por conta de suas atividades ou se era pela cena que havia acontecido entre mim e o Matteo. Esperava que ela pelo menos cogitasse experimentar diretamente do salão. Manon tentava me animar constantemente, dizendo o sucesso que estávamos fazendo. Meu nome como Chef poderia estar se espalhando e isso poderia trazer resultados muito positivos para minha carreira e meu restaurante, no futuro. E era tudo no que eu precisava pensar, mas não funcionava tão bem assim dentro da minha cabeça. Todas as vezes que eu fechava os olhos, a sigla R.A. vinha a minha mente, junto com os olhos sedutores daquele homem desconhecido. Eu tentava balançar a cabeça para dispersar os pensamen
Já haviam se passado dois meses desde o festival em Londres. E com ele, todo o drama romântico que estava incluído. Felizmente precisei trabalhar bastante nesse período, então estive ocupada o suficiente para não perceber que o tempo passara tão depressa. Ao menos isso aconteceu melhor do que eu esperava. Graças aos bons frutos gerados dessa grande oportunidade que estavam sendo colhidos. Então mesmo que eu tenha saído com o coração partido, estava sendo fácil seguir em frente. Minha participação no festival fez com que grandes críticos e outros colegas da área me procurassem, então a popularidade do meu trabalho e do meu restaurante cresceu e eu precisava focar na minha carreira mais do que nunca. Na última semana, as lembranças ruins daquele evento nem apareciam mais, já que eu estava sempre ocupada. Contratei mais pessoas, coloquei Manon como chefe de cozinha e eu pude focar apenas na minha especialidade. Estávamos sempre combinando nossos pratos, para que as sobremesas fossem o áp
O primeiro trimestre da gravidez estava terminando. Minha ficha havia caído oficialmente na consulta com minha obstetra. Ouvir o coração do bebê foi como uma virada de chave na minha mente. Ter outra vida dentro de mim era um peso muito grande. E mesmo sabendo que poderia ser apenas os meus hormônios mexendo com meu corpo, eu estava muito feliz e empolgada em ter um filho. Havia se tornado um hábito levar a mão à minha barriga para tentar sentir alguma coisa.E mesmo assim eu não queria pensar tão a fundo sobre o futuro. Haviam muitas decisões e escolhas que estavam longe de chegar e eu precisava seguir um passo de cada vez. Os enjoos já estavam passando, e contanto que eu não carregasse nenhum peso e me alimentar decentemente, eu poderia continuar trabalhando. Manon estava me apoiando muito nisso. Puxando a minha orelha talvez fosse mais preciso. Ela parecia estar doida para dar uma de titia. Era bom saber que eu ia ter alguma rede de apoio. Minha mãe faleceu quando eu era adolescente