William RodriguesAcordei com o chorinho da Nina, aquele som suave que logo encheu o quarto e aqueceu meu coração. Abri os olhos lentamente e notei que a Pri não estava ao meu lado. — Meu amor… — chamei, mas o silêncio respondeu. Olhei para o relógio e vi que já eram 9:45h.— Bsbababa — minha bonequinha balbuciou, batendo as mãozinhas. Fui até ela, a tirei do berço e a abracei, sentindo aquele cheirinho único de bebê que é impossível de descrever, mas que eu já não sabia viver sem.— Sua mãe deve ter ido tomar café, então, que tal lermos uma história? — perguntei, mostrando dois livrinhos para ela. Ela escolheu "O Patinho de Todas as Cores", e eu sorri, percebendo o quanto minha garotinha já estava crescendo e se tornando uma pessoinha tão decidida.Cada momento com a Nina era mágico. Vê-la interagir com o mundo à sua volta, suas descobertas, suas pequenas vitórias… Era algo que preenchia meu coração de uma forma que eu nunca imaginaria.— Onde está o pato azul? — perguntei, enquanto
Priscila BarcellaEu estava um pouco envergonhada, não vou mentir, mas tentei deixar isso de lado para brincar com as crianças.Estávamos todos juntos no tapete, e procurei todos os jogos que tinha em casa. Não eram muitos, mas o suficiente para nos divertirmos em família.— Eu não quero mais brincar disso — Belinha falou, depois de perder pela terceira vez no Uno. Eu a entendo; além de ser pequena para o jogo, acabou ficando frustrada.— E agora, vamos fazer o quê? — Ítalo perguntou.— Tive uma ideia! Tem uma brincadeira que eu amava fazer quando era criança, junto com a mãe de vocês…— Ah, mãe, nada de brincar de boneca — Ítalo resmungou.— E quem disse que eu tinha uma boneca? Nós não tínhamos dinheiro para comprar brinquedos, então amávamos criar nossos próprios brinquedos quando tínhamos tempo para brincar.— Que legal! Nós vamos fazer brinquedos? — Ítalo perguntou, empolgado.— Vai ser divertido. Eu também fazia isso quando era criança e adorava — Liam disse, sorrindo e abraçand
Priscila Barcella Aquela mulher observava tudo meticulosamente enquanto descíamos as escadas. Ela olhou cada canto da sala e da cozinha com um ar crítico. Meu desconforto era evidente, e Liam logo percebeu. O ambiente estava carregado de tensão. — Crianças, podemos conversar? — a mulher perguntou, e Belinha se agarrou ao Liam com uma força desesperada. — Mamãe, nós somos obrigados? — Ítalo perguntou, os olhinhos cheios de medo. A verdade é que todos nós estávamos desconfortáveis. Ninguém esperava por uma assistente social invadindo nossa casa. — Não, vocês só vão se quiserem, mas eu ficaria muito grata se vocês fossem falar com a assistente social, meu campeão — tentei tranquilizá-lo, mesmo com o coração apertado. — Nossos pais podem ficar com a gente? — ele perguntou, sua voz carregada de esperança. — Eu preciso conversar só com vocês, sem os seus tios... — Mas eu não quero! Eu vou ficar com o papai! — Belinha declarou, determinada, como se sua vida dependesse disso. — Eu pre
William Rodrigues Eu não conseguia entender o que estava acontecendo. Priscila estava nervosa, mas nervosa de um jeito que eu nunca tinha visto. Seus olhos estavam arregalados, cheios de lágrimas, e havia algo neles que me fez estremecer: era puro medo, como se ela tivesse visto um fantasma ou se alguém tivesse voltado dos mortos para atormentá-la. A assistente social, por outro lado, mantinha aquele olhar julgador, frio, como se cada palavra ou movimento de Priscila fossem erros gravíssimos. Era desconcertante. Eu queria ajudar, mas não sabia como. Meu peito apertava ao vê-la naquela condição, abraçada às crianças como se fossem sua única âncora. — Vou pedir para a Ana cuidar das crianças por um tempo, para você se acalmar... — arrisquei, me aproximando com cuidado, tentando ser um porto seguro no meio daquela tempestade. — Não! — Priscila gritou, com a voz embargada e os olhos marejados, apertando ainda mais as meninas contra o peito. — Eu quero ficar com os meus filhos, Liam! El
William Rodrigues — Eu vou para a cozinha pegar um copo de água. — Minhas palavras eram uma tentativa desesperada de escapar do peso opressor daquela sala. A assistente social permaneceu em silêncio, mas o olhar que lançou antes de sair era como uma sombra, carregado de julgamento e algo que eu não conseguia decifrar. Pegou sua bolsa, ajustou a postura com uma calma ensaiada e foi embora sem olhar para trás, deixando para trás uma sala que parecia mais vazia e ao mesmo tempo mais sufocante. Meu olhar foi imediatamente para Priscila. Ela estava imóvel, uma estátua de dor e confusão, os olhos fixos em um ponto distante. Seus braços estavam caídos ao lado do corpo, como se tivessem perdido a força de sustentar o peso de tudo aquilo. E então, meus olhos pousaram nas crianças. Íris, Ítalo e Belinha estavam todos ali, encolhidos no sofá, os rostos cheios de perguntas que eu não sabia responder. Eles sentiam tudo, cada vibração de dor que emanava da mãe deles, mesmo que não compreende
William Rodrigues O silêncio no quarto era sufocante. Ao abrir a porta, meu coração parou por um segundo. Priscila estava encolhida na cama, abraçando os próprios joelhos, o corpo tremendo como se tentasse resistir a um frio que vinha de dentro. Nunca a vi assim. Nunca. O medo em seu olhar era um grito mudo, algo tão avassalador que quase me fez recuar.— Meu amor... — chamei, minha voz saindo trêmula.Ela virou o rosto para o lado, evitando me olhar. Sua voz veio baixa, arranhada pelo desespero.— Eu quero ficar sozinha...— Você não está sozinha, Priscila. — Sentei-me ao lado dela, minha mão tocando seus cabelos com uma suavidade quase reverente. — Você tem uma família agora. Não precisa carregar isso sozinha.Ela soltou uma risada amarga, que morreu antes mesmo de se formar. Seus olhos, úmidos e vazios, se perderam no teto.— Ele devia estar morto... Esse homem... Ele devia estar morto.— Ele não vai te machucar — afi
William Rodrigues Ficamos em silêncio, o quarto envolto em uma calmaria que contrastava com a tempestade que ela havia desabafado minutos antes. Minha mão se movia lentamente pelos seus cabelos, num cafuné suave e ritmado. Eu queria que ela sentisse, em cada toque, que estava segura. Que agora tinha alguém para dividir o peso.Ela fechou os olhos, a respiração ainda irregular, mas começando a se estabilizar. Meu olhar estava fixo nela, absorvendo cada detalhe: os traços delicados que contrastavam com a força que ela carregava, a vermelhidão em suas bochechas ainda marcada pelo choro.Enquanto isso, minha mente vagava. De repente, tudo fazia sentido. A raiva do Max naquele dia na piscina. Ele com certeza sabia de tudo, cada detalhe obscuro do passado dela. Ele deve ter achado que eu a pressionei, que eu a expus a algo que ela não estava pronta para enfrentar. E agora que eu sabia, percebia que, se estivesse no lugar dele, teria sentido o mesmo.— Eu te amo. — A voz dela quebrou o silê
Priscila Barcella Foi bom ter aquele momento com eles. Senti que, de alguma forma, estava mais forte. Há tempos não me sentia assim, e isso me deu a certeza de que, juntos, podemos enfrentar qualquer coisa. Apesar do medo inicial sobre como as crianças reagiriam ao nosso namoro, foi um alívio compartilhar. E no fim, tudo correu melhor do que eu imaginava. Era apenas nós cinco naquela noite, sem interrupções ou pressões externas, vivendo algo que nem sabia que tinha sonhado um dia. Depois de um jantar improvisado com pizza, nos juntamos no sofá para assistir a um filme. O riso fácil das crianças e a presença calorosa de Liam ao meu lado criaram um cenário quase irreal. Uma felicidade tão simples que me deixava zonza. Não demorou muito para todos caírem no sono – e claro, acabamos amontoados na minha cama. Na manhã seguinte, acordei com o corpo pesado e uma dor incômoda na coluna. Mas, ao abrir os olhos e ver aquelas carinhas serenas ao meu redor, percebi que tudo valia a pena.