Capítulo 22DanteEla invadiu meu espaço como se sempre tivesse pertencido a ele.Eu estava revendo arquivos, tentando traçar o próximo movimento, quando ouvi a porta do meu quarto bater. E ali estava ela — os olhos queimando, o rosto pálido, mas a postura firme. Luna estava mudando. E, talvez, isso fosse o que mais me assustava.— Você sabia — ela disse, a voz carregada. — Sabia que ele matou sua irmã. E não me disse nada.A dor estava ali, evidente demais pra esconder. Suspirei, sentindo a tensão atravessar meu peito como um ferro quente.— Não é o tipo de coisa que se compartilha com alguém que ainda está decidindo de que lado quer ficar.Ela se aproximou, os passos curtos e decididos. — Eu escolhi, Dante. No momento em que te salvei. No momento em que vi Chiara no chão e não fugi. E você ainda me trata como uma peça descartável.Me levantei devagar. — Eu trato você como alguém que pode morrer a qualquer momento por estar ao meu lado. Não é proteção, Luna. É sobrevivência.Ela me
Capítulo 23LunaNão precisávamos de provas pra saber. Era como sentir a vibração de um terremoto prestes a começar. E eu sabia que ele não deixaria barato. Ainda mais agora que eu tinha cruzado a linha, não só traído, mas me entregado ao inimigo.Me levantei devagar, tentando não acordar Dante. Peguei a camisa dele do chão e vesti, os botões tortos e a gola larga caindo sobre meu ombro. Fui até a janela.A cidade estava viva. Impassível. Como se não tivesse ideia do que estava prestes a acontecer.Encostei a testa no vidro, deixando o frio me trazer de volta à realidade. Eu era parte da guerra agora. E aquilo ali, aquela noite com Dante, tinha sido só uma trégua. Um respiro antes da próxima batalha.— Você anda como se o chão estivesse prestes a desabar — a voz dele me fez estremecer.Me virei e encontrei Dante recostado na cabeceira da cama, os olhos semicerrados, mas atentos. O lençol cobria parte do corpo, mas nada escondia o jeito como ele me olhava. Com uma intensidade que me de
Capítulo 24MarceloNada é mais eficaz do que a verdade misturada à mentira. O veneno só funciona bem quando disfarçado de remédio.Espalhei os boatos com precisão cirúrgica.Usei meus contatos em Curitiba, gente que Dante achava que havia descartado. Um entregador que já fora motorista de confiança, uma secretária que só pensava em sair da periferia, e um velho aliado que devia favores demais para me negar qualquer coisa.A mensagem era simples: um carregamento de armas viria pelo litoral, uma remessa grande demais para passar despercebida. Com nomes falsos, rotas falsas, e um destino que fazia sentido demais para não ser crível.Dante é inteligente. Mas inteligência demais faz o homem querer controlar tudo. E controle, nesse jogo, é ilusão.A verdadeira armadilha é dar a ele aquilo que espera.Enquanto isso, minhas sombras se moviam. Gente infiltrada. Códigos alterados. Informações comprometidas.E no centro de tudo isso… ela.Luna Santiago.A mulher que ousei transformar e que agor
Capítulo 25LunaDuas horas da tarde. Minha mão rabiscava distraída o nome de um dos envolvidos na última operação. A tinta azul manchava o papel, borrando letras que eu não me importava mais em organizar. Meus dedos doíam. O peso do que carregava nos ombros começava a se espalhar pelo corpo inteiro.— Você vai sair — Dante disse, a voz baixa, mas firme. Ele estava encostado no batente da porta, braços cruzados, a expressão neutra demais para ser apenas natural. — Mas não sozinha. Giovanni e Luca vão com você.Levantei os olhos do caderno, minha caneta parando no meio de uma linha. A forma como ele disse aquilo... cuidadosa, contida.— Está me dando liberdade... ou testando minha lealdade?Ele não riu. Não fez nem um gesto. Só me olhou. E esse olhar... era cru, direto, que parecia me atravessar.— Estou te dando escolha. É diferente. Você sabe disso.E eu sabia. A diferença era sutil. Mas real. Liberdade, naquele mundo, era um conceito vago demais. Sempre vinha cercada de olhos, de ar
Capítulo 1LunaTrabalhar para um mafioso nunca foi parte do meu plano de vida, mas planos mudam quando a sobrevivência fala mais alto que a moral. E eu sobrevivo. Sempre. Meu pai dizia que a vida era como um jogo de xadrez. Você não precisa ser a rainha, só precisa saber quando mover suas peças. E eu vinha movendo as minhas com cuidado, desde o dia em que entrei no escritório de Marcelo Rivas: olhos baixos, ouvidos atentos, boca calada. Marcelo era exigente, imprevisível, mas ele confiava em mim. O suficiente para me manter por perto, o suficiente para me fazer sentir indispensável.O relógio marcava 20h47 quando deixei minha mesa, já com os sapatos nas mãos, e segui pelos corredores silenciosos do prédio. Era tarde demais para estar ali, mas um relatório urgente precisava ser entregue antes da reunião da manhã seguinte. A cidade do lado de fora parecia quieta, mas São Paulo nunca dorme de verdade. Sempre há alguém observando, esperando, tramando. E naquela noite, senti isso mais do
Capítulo 2LunaNa manhã seguinte, acordei com a luz dourada atravessando as frestas da cortina, mas não foi a claridade que me tirou do torpor, foi o silêncio. Um silêncio estranho, espesso, como se o mundo lá fora estivesse em pausa e tudo ao meu redor estivesse esperando que eu fizesse o primeiro movimento.Os lençóis ainda estavam macios, os pulsos livres dessa vez, e uma bandeja com café da manhã repousava sobre a mesa ao lado. Frutas cortadas com precisão, suco fresco, croissants quentes. Luxo. Cuidado. Manipulação.Sentei-me com cautela, cada músculo tenso, cada pensamento disparado em direções diferentes. Dante Moretti ainda estava naquele lugar, em algum canto observando. Era o tipo de homem que nunca deixava de ver. Mesmo quando não estava à vista.Peguei uma maçã da bandeja com dedos trêmulos. Morder ou não morder? Comer o que o inimigo te serve era sempre um risco, mas minha fome venceu o orgulho. E no segundo em que dei a primeira mordida, a maçã estalou em minha boca, fr
Capítulo 3 Luna A escuridão que me engoliu foi curta, mas sufocante. Quando acordei, o ar tinha um cheiro novo, couro, madeira polida, e algo mais… perigo. Estava deitada em um sofá de couro escuro, a luz amarelada da luminária ao lado projetando sombras longas nas paredes. Um lugar elegante, silencioso. E estranho demais para ser meu. Me sentei devagar, o coração disparado. Os sapatos tinham sumido. Minha bolsa também. Mas minhas roupas estavam intactas, e isso, por algum motivo, me tranquilizou. Por um instante. — Bom dia, Bella. A voz veio de um canto da sala, baixa, controlada. Dante. Ele estava ali de novo. Sentado em uma poltrona de veludo, um copo de uísque entre os dedos. Terno impecável, cabelo arrumado, olhar predatório.Me encolhi por receio.— Luna, você está com medo? Ele perguntou com a voz rouca, se aproximando devagar de onde estava. Queria sumir, desaparecer, mas reagi com perguntas. . — O que você quer de mim? O que sou para você? — Disse com raiva e curiosid
Capítulo 4LunaA biblioteca de Dante era diferente do resto da casa, mais escura, mais densa, com estantes que iam do chão ao teto, cheias de livros antigos, muitos deles com lombadas em línguas que eu não reconhecia. Ele estava de pé, de costas para mim, olhando pela janela como se o mundo lá fora oferecesse algo melhor que o caos dentro daquela casa.— Já viu o suficiente? — ele perguntou sem se virar.— Vi o suficiente pra saber que você quer me usar tanto quanto Marcelo. — Me aproximei, sem medo. Já tinha ultrapassado essa fase. — A diferença é que você me contou antes. Pontos pela honestidade.Dante virou-se devagar. Seus olhos percorreram meu rosto, meu corpo, como se procurassem sinais de fraqueza. Mas eu estava firme.— Você é rápida. Gosto disso. — Ele apontou para a poltrona à frente da mesa. — Sente-se. Quero te mostrar por que ainda está viva.— Porque sou útil.— Porque é valiosa. E há uma diferença aí, Luna. Uma ferramenta é útil. Mas algo valioso... precisa ser protegi