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COMIDA BOA ENCHE O CORAÇÃO

Ana

Depois do meu chororô, meu amigo, foi se vestir para comemos nossa pizza, o que é bom, pois estava difícil focar em algo que não fosse seu corpo escultural e nu tão próximo de mim. O que é estranho, não costumo ser tão assanhada.

Me recomponho e coloco a mesa para o nosso almoço. Ele chega e percebo que as roupas ficaram perfeitas, uma blusa de gola alta e um jeans básico. São roupas usadas que arrecado para doar todos os anos aos nessecitados, levando em consideração que ele é um morador de rua, não saí da proposta.

— As roupas serviram, ficaram ótimas — ele fala animado.

Ainda estou analisando a perfeição desse homem. É incrível como ele estava escondido naquela cabeleira toda, parece outra pessoa.

— Sim, ficaram, boas!— falo sem conseguir tirar os olhos dele.

Nosso olhos se encontram e ele disfarça, mas eu, não consigo desviar. Não se trata somente de atração física, a forma como ele me defendeu ainda não sai da minha cabeça, ele parece ser uma boa pessoa.

Fico rubra de vergonha quando noto que fui pega, e mais ainda quando ele sorri de forma tímida com minha reação.

Pego os pratos e começo a organizá-los na mesa.

— Bom, então... va-mos co-mer? Quero dizer... Vamos comer!— tento falar e gaguejo de nervoso duas vezes pra variar.— Cozinhar não é minha praia —tento amenizar — acredita, eu consegui queimar o molho?

Disparo a falar, e ele se envolve com o assunto deixando o clima mais leve entre nós.

— Senti um cheiro de tomate queimado.

Bufo.

— Sinceramente, não costumo cozinhar porque nunca fica bom, quando não queima, passa do ponto ou fica cru...

Ele continua sorrindo.

Por mais que eu tente mudar o foco, é difícil, ainda não consigo acreditar que esse homem é a mesma pessoa que entrou aqui, o sorriso dele é incrível, sua boca é rosada e vejo que seus dentes são perfeitos. Como isso é possível?

— Se você não se importar, eu posso cozinhar.

Paro no mesmo instante e olho pra ele surpresa com o que ele acaba de propor.

— Você cozinha!?— falo num tom exagerado.

Ele me encara como se achasse minha dúvida compreensível .

— Bom, na rua não. Mas quando eu tinha uma casa, eu...— seu tom de voz muda, como se recorda-se de algo. Vejo que ele escolhe as palavras certas, parece não querer falar sobre sua vida.— cozinhava.

Ele evita de me olhar neste momento, então compreendo que não deseja continuar. De repente o clima fica estranho, ele parece triste. Felizmente meu telefone toca quebrando o gelo.

— Se importa?— pergunto sobre a ligação.

— Não, tudo bem — responde aliviado.

Vejo que é Lili, nossa foto em frente ao Cristo Redentor no Rio, surge na tela.

Faço gesto pedindo licença e sigo para o meu quarto, pois tenho muitas coisas para conversar com Lili, ela vai cair dura ao descobrir como minha vida se tornou uma novela mexicana.

Fecho a porta e antes, noto que ele segue pra cozinha. Mesmo curiosa como que ele pretende fazer lá, me jogo na cama a fim de me preparar para o diálogo com minha amiga.

Ligação On

— Nossa, Ana! Você demorou pra atender,estava aqui preocupada. Sabe se lá se aquele homem fez algo com você.

Começo a rir.

— Oi, Lili, quem? Você tá falando do homem do hospital?— falo cheia de ironia, pois é claro que sei de quem ela está falando.

— Claro, Ana. Do jeito que você anda azarada imaginei que esse homem pudesse ter ido atrás de você e feito sabe-se lá o quê.

Acho graça da criatividade da minha amiga, acho que se minha vida fosse uma novela de verdade, não tenho dúvidas alguma de que Lili teria sido a escritora, vai ser dramática assim!

Estou ansiosa para lhe contar tudo, então vou logo falando.

— Bom, você está sentada?— pergunto lhe preparando pra história.

Ela parece curiosa.

— Ana...? O que tá acontecendo?

— Você quer que eu comece, por qual parte? A que eu trouxe o homem pra minha casa, a que ele tomou um belo banho, cortou o cabelo e a barba e se transformou num pedaço de mau caminho? Ou você quer que eu comece pela parte em que Nicolas apareceu aqui no meu apartamento e encontrou meu hóspede só de toalha e agora acredita que ele é meu namorado que conheci no Tinder, e que eu o traí com ele?— Não aguento começo a rir disso tudo. Agora parece ser mais engraçado do que no momento em que tudo aconteceu.

Paro e respiro fundo enquanto ouço minha amiga gritar feito louca do outro lado.

— Ah, Ana. Pare! Isso não pode ser possível!?— mas como ela sabe que estou falando a verdade, começa a xingar completamente chocada com tudo—Puts!Puts! Ana, você é louca? Meu Deus! Nem sei o que dizer.

Continuo rindo.

— Nem eu acredito, poxa não sei como as coisas chegaram a esse ponto.

— Então ele é tão lindo assim por baixo daqueles pêlos todos?

—Lili, de todas as coisas impactantes que te contei você só guardou isso?

— Sério, amiga. Fiquei curiosa. Tudo o que você falou, foi muito importante, principalmente a parte que Nicolas acreditou que você traiu ele com alguém do Tinder, eu dava minha vida pra ver a cara de paspalho dele. Cheque mate, Ana! Você deu seu golpe de mestre! Mas confesso que estou me esforçando para acreditar que aquele homem primitivo, possa ter se tornado um gatão, isso parece impossível!

Rimos juntas, Lili está incrédula, acho compreensível, nem eu acredito ainda nessa perfeição da natureza em minha casa.

Passamos os próximos quarenta minutos conversando sobre tudo, depois combinamos de nos encontrar no Café Mix antes do trabalho, amanhã, como sempre fazemos. Nosso diálogo é interrompido por um cheiro maravilhoso de comida deliciosa que invade meu quarto.

Me perco por um instante na conversa.

— Ana...? Não acredito que você desligou...— Ouço Lili resmungar.

— Amiga, se eu te contar mais uma coisa você também não vai acreditar.

Ela não exita em falar quase em um grito.

— Não me diga que ele está só de toalha de novo? Ana pelo amor de Deus, me manda uma foto.

Fico em risos com a reação da minha amiga e com seu assanhamento.

— Não, sua pervertida! — repreendo ela com tom de brincadeira.— Menina, eu quero dizer que acho que ele está cozinhando.

Falo me levantando e abrindo a porta devagar para conferir. Como eu imaginava, a sala está vazia e o cheiro parece ainda mais incrível.

— Caramba, você tem um homem na sua casa um deus gregoaq e que cozinha. Até que sua vida não parece estar tão ruim assim.

Escuto Lili falar.

Nesse momento percebo que ele  surge na sala, está vestido com meu avental de cozinha e tem um pano de prato nos ombros, se eu contasse isso pra outra pessoa que não fosse minha amiga Lili, diria que estou mentindo. Um homem  que cozinha na minha casa. Fecho a porta rapidamente quando noto que ele vem em direção ao meu quarto. Me sento na cama disfarçadamente e cochicho para Lili que ainda está do outro lado da linha.

— Ele tá vindo, acho que vai me chamar pra almoçar.

Ouço os gritinhos dela eufórica.

Como eu já prévia, ouço batidas de leve na porta.

— Pode abrir.— falo.

E a imagem dele aparece na porta. Intencionalmente ligo a câmera de forma bem discreta e finjo apenas conversar com minha amiga.

— Eu fiz uma comida pra gente.

Disfarço estar surpresa.

— Sério? Nossa, não precisava se incomodar. Mas eu já estou indo, só preciso de um minuto.

— Tá bom. Te espero na mesa.

Ele sai e fecha a porta.

Somente então percebo que estava segurando o fôlego, respiro aliviada e só consigo ouvir a esteria de Lili do outro lado.

—Meu Deus! Não acredito que aquele era o mesmo homem com cara de Serial killer do hospital!? Uaaau, ele é muito gato!

— Eu te falei que ele se transformou!

— Ainda estou sem palavras, mas uma coisa é certa. Preciso te visitar pra ver isso de perto, amiga.

— Tudo bem, fique a vontade. Mas ele só ficará mais dois dias, foi o prazo que combinamos.

— Tudo bem, amiga, vá comer sua comida de verdade enquanto eu vou ficar aqui com essa gororoba do restaurante da esquina, volto pro trabalho em 40 minutos.

Ligação OFF

Nos despedimos e sigo para sala super curiosa em descobrir o que ele cozinhou, afinal meu armário está praticamente vazio. E pelo cheiro ele certamente fez milagre.

Vejo que ele está carregando uma travessa com macarrão e um molho branco com uma mão e se apoiando na muleta com a outra, eu lhe ajudo.

Ele fala gentilmente:

— Pode se sentar, vou te servir, é o mínimo que posso fazer em agradecimento pelas roupas e pela estadia.

— Nada disso, não se esqueça que foi você quem salvou a minha vida.

Fico inebriada com o cheiro, é simples mas parece estar delicioso.

Ele me serve primeiro.

— Vi que você não tem muitos ingredientes, foi o que deu pra fazer, com trigo, alho, cebola, macarrão e manteiga.

Fico com vergonha de seu comentário. Realmente não tenho quase nada na dispensa, e nem dá pra acreditar que dez esse prato apenas com tais ingredientes.

— Eu praticamente não me alimento em casa, sempre peço comida ou como na rua mesmo. Mas prometo que amanhã depois do trabalho eu passo no supermercado.

Coloco a primeira parte na boca. Tenho uma sensação de que vou nas nuvens e volto, minha boca está completamente entregue ao alimento, sinto o sabor do alho, da manteiga e da cebola, Céus! Eu nem gosto tanto de cebola assim.

— Isso está maravilhoso!— falo colocando a segunda colher na boca.

Vejo que ele apenas sorri, como se estivesse acostumado com esses elogios.

— Que bom, que você gostou.

— Eu adorei!

Me levanto e pego uma garrafa de vinho. Esse macarrão merece uma taça. Quando começo a servir ele, sua feição muda, parece constrangido.

— Obrigado, Ana... mas, não bebo.— essas são suas única palavras, frias, e ele continua sua refeição.

Meu amigo é uma incógnita. Se trata de um morador de rua, mas tem um corpo perfeito como o de um atleta, seus dentes são impecáveis, cozinha maravilhosamente, não bebe, não usa drogas e come de uma forma tão elegante com os talheres que fico mais curiosa ainda sobre quem ele é.

Dou um gole em minha taça, o silêncio surge ente nós novamente, isso está se tornando rotineiro. Sei que não devia, mas minha curiosidade é imensa. Não me contenho e pergunto:

— Por quê você mora nas ruas?

Ele continua sua refeição sem me encarar, por um instante penso que não irá me responder.

— Somente durante o dia. A noite sempre passo em albergues.

Sua resposta e curta. Mesmo assim, quero saber mais, continuo...

— Bom... Você não gosta de falar muito sobre si... Mas...

Nesse momento escuto o som da batidas de sua mãos na mesa, apesar de não ser com violência, sei que ele está zangando, parece com o mesmo bronco do hospital.

— Olha, você já sabe que não uso nenhum tipo de drogas e nem sou alcoólatra. Acho que já é o suficiente, não acha?

Fico muda. Engulo seco.

O silêncio paira entre nós novamente. Bebo outro gole do vinho, desta vez viro a taça toda. Estou arrependida, não deveria ter inssistido.

Desta vez ele fala, tentando quebrar o clima que se instaurou.

— Então aquele era seu ex namorado?— Seu tom é leve, acho que sua raiva passou, agora deseja me mostrar que está tudo bem.

Diferente dele que não quer falar sobre sua vida eu despejo tudo o que aconteceu.

— Nicolas é um babaca por quem me apaixonei desde que entrei no trabalho. Ele sempre teve namorada, nuca me deu bola, mas precisou da minha ajuda para uns trabalhos que lhe faria ser promovido, ficamos muito próximos e...— minha voz começa a ficar embargada com as lembranças. Pego a garrafa e coloco mais vinho. Ele me olha com olhar de repreensão como se eu fosse uma criança, mesmo assim continuo:— Parecia que se tornaria sério o que havia entre a gente, na verdade ele me prometeu isso, mas depois que conseguiu a promoção tão querida ele fez sua primeira viagem a trabalho e ... pediu sua namorada em casamento.

Fico entristecida ao falar sobre tudo o que aconteceu. Ele me olha como se importasse.

— Idiota! Esse Nicolas é um imbecil.

Sorrio sem graça.

— Ele foi o culpado de todo meu caos de ontem, fiquei desorientada quando soube do noivado, sai da redação e dirigi feito uma louca sem rumo, passei o dia na rua, ele me ligou afim de se explicar.— meu ouvinte bufa.— inventei a história do Tinder para não perder o pouco de dignidade que me restava. Mas a princípio ele não acreditou é claro.

— Até que ele me viu aqui e você teve a ideia de me usar?

Eu faço cara de pena.

— Me desculpe, mas parecia perfeito a situação.

Ele me olha desconfiado.

— Então me chamo... Mateo?—Fico mais sem graça ainda e apenas sorrio.— Tudo bem, foi bom te ajudar com esse cara. Ele bem que mereceu!

Naturalmente, estamos rindo da situação. Pego minha taça e bebo mais um gole, através do vidro olho mais uma vez para o homem a minha frente, vai ser difícil me acostumar, mas de repente percebo que ele também me olha. Nossos olhos se encontram de uma forma diferente pela segunda vez hoje, num contato visual que dura segundos, até que ele se levanta afim de encerrar primeiro.

Estou sentada sozinha e ainda perdida com o que acaba de acontecer. Foi mais intenso que na primeira vez. Não sei se ele sentiu o mesmo, acho que sim, pois foi ele quem rompeu primeiro.

Me levanto e tampo meu vinho, afim de acabar com isso, talvez eu tenha bebido demais, ou seja carência, ou resultado de tudo o que me aconteceu.

— Acho melhor ir guardar as coisas— falo e ele permanece de costas olhando para janela me evitando.

Passo o resto do dia no quarto, adiantando alguns trabalhos. Não consegui encará-lo, e ele também não tentou nenhuma aproximação. Só pedi que ele fizesse repouso ou seu tornozelo não melhoraria tão fácil.

A noite aqueço a pizza e lhe dou um prato. Ele parece vidrado na tv, como se fizesse tempos que não ficava assim, de frente pra tv num sofá. Isso só estimula mais ainda minha curiosidade sobre quem ele é, e toda sua história. Mas pelo jeito será algo impossível de descobrir e só tenho mais dois dias até ele ir embora.

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