— Durante uma tempestade onde o cair da chuva fazia o barulho do rosnar de um lobo e os trovões retumbavam como o rugido de um urso, nasceu em uma comunidade afastada da civilização uma criança tão magra que seus pais achavam que não tinha carne. Era natural de uma tribo chamada Franar, que eram devotos principalmente a Biogu, o espírito da natureza. Por conta das péssimas condições de saúde, eu passava a maior parte do tempo presa à cama, onde desenvolvi uma insatisfação e agressividade enrustida por ter de conviver a maior parte de seus dias junto da sacerdotisa dos franarzianos. Com o tempo e melhorando de saúde, ganhei a permissão de meus pais para iniciar nos treinamentos para me tornar a próxima sacerdotisa, destino que tinha sido revelado no instante que nascera ao som do rugido de um urso. Um dia consegui me colocar de pé sozinha, com muito esforço, no meio da noite enquanto todos dormiam e corri floresta adentro sempre caindo após poucos passos. Usando apenas uma tocha como g
Alabaster Starrock estava lá. Bem na sua frente. A espada sagrada do Sentinela deu um rugido poderoso, que reverberou na mente de todos os presentes e os desestabilizou, menos a Gale, cuja alma se transformava em uma tempestade seca e amargurada, porém, avassaladora. Ele levou sua mão esquerda às costas e sacou Samhain, que emanava uma imponência nunca antes vista, e a apontou para o garoto dos cabelos negros. — O que está fazendo aqui? — o rapaz o questionou friamente enquanto seus dentes trincavam. O dyninse ficou em silêncio. — Quem é esse, agora? — Guido exclamou fingindo irritação, mesmo que na verdade estivesse profundamente assustado com a reação do companheiro, que até então não havia se exaltado nem por um momento. Gale aproximou a lâmina escura do pescoço da nova companhia, o que fez com que o jovem o encarasse nos olhos. Sua face estava suja e ferida, a região cortada por Gaheris também não era uma visão tão agradável quanto ao resto com a cicatrização tomando formato
O jovem Sentinela soltou Alabaster e passou a andar de um lado para o outro sem saber o que dizer, fazer, pensar. Estava perdido. Lembranças que guardava com tanto carinho e que vieram a ser compartilhadas somente havia poucos instantes, agora o feriam como farpas de uma rosa vermelha, que é tão bela a ponto de lhe perfurar a carne e derramar seu sangue.Gale não possuía feridas físicas e o sangue não teria por onde escapar, tornando essa a pior sensação do mundo. Dor, angústia, impotência e sofrimento dentro de um corpo sem vazão para sair, destruindo-o por dentro em uma verdadeira tormenta de emoções. Sua vida parecia uma maré sedenta por desastres e perdas.Não poderia voltar para seu povo e mostrar o quão forte se tornara.O Filho do Outono gritou aos céus com todo o ar e toda força que ainda restava em seu corpo, até que sentir o gosto de sangue na garganta. Ele caiu de joelhos no chão, pois as pernas bambas não eram mais capazes de aguentar seu peso. O rapaz chorava como um bebê
Hanfold, 74 voltas antes da invasão ao Santuário da Luz Os céus resplandeciam naquele início de tarde, acompanhado pela brisa acolhedora dos ventos gelados que refrescavam o corpo de Yew Navarre e os outros sete filhos da Luz junto dele, entre eles, estava o grande Sentinela do Inverno, Rorak. Fazia muitas voltas desde que haviam saído juntos pela última vez, o serviço como Sentinela não era o mais propício a permitir tempo livre, então para os dois, aquela missão era mais do que especial. Montado em seu cavalo negro, Rorak atualmente se encontrava muito mais velho, com um semblante mais sério e responsável, fator este que o elfo considerava ser atribuído à sua longa barba que continha mais fios brancos do que ele poderia se orgulhar. O companheiro de tantas aventuras já estava se preocupando com o próximo Sentinela, e possuía alguns nomes interessantes cotados para assumir seu manto quando partisse, embora todos fossem ainda aprendizes. Tempos instáveis se instalavam no Santuári
— O Julgamento Glacinante de Porlock. Não tinha algo mais previsível para usar? — o aventureiro guardiano zombou do parceiro enquanto este retornava e recebeu um praguejo como resposta. Yew ajudou o amigo a voltar para cima da montaria. — É muito injusto — disse Rorak. — Estou em pedaços, me arrastando, lutando para continuar de pé e você parece não ter envelhecido um ano! — Ainda bem, imagine só se tivesse de te aguentar por mais 200 voltas. — Porlock não foi aquele mago doido que acoplou várias pedras elementais no próprio corpo e virou um deus? — Niaky indagou enquanto chegava perto para escutar a conversa dos dois. — Não, esse foi outro cara. Porlock foi quem tentou reproduzir isso e ficou maluco. — o elfo guardiano respondeu desgostoso e esperou o rival se afastar para questionar seu amigo Sentinela — Seus protetores não conhecem o panteão? Rorak tossiu seco e se deu alguns instantes longos para respirar fundo. — Os sacerdotes não gostam de falar sobre os outros deuses, som
O ranger de algumas estruturas que nunca souberam o significado de “manutenção” os alertou da porta que se fechava rapidamente e os trancaria lá. O elfo da Lua, rápido como um lince, saltou até a mesma e usou o próprio corpo para segurá-la. — Se apressem! — gritou ele. — Não sei quanto tempo aguentarei! Os aprendizes passaram por ele sem hesitar, atravessando a porta e deixando os protetores, o Embaixador e o Sentinela para trás. Zari foi a próxima, a lofidiana agradeceu ao velho amigo sem dizer nada, um simples olhar já era o suficiente para que os dois transmitissem tudo o que sentiam após o longo tempo em que serviram juntos. — Sempre gostou de bancar o corajoso, meu amigo — disse Rorak com o coração pesado. — Irei tomar seu lugar, Niaky. Você pega o Horizonte e… — Yew tentou falar. — Cale a boca, seu fedelho guardiano! — O elfo da Lua o interrompeu. — Estou honrando meu compromisso como um Protetor, e nada me alegra mais do que terminar aqui na casa do pai dos elfos. — Foi o
A voz de Catherine ao fundo o tirou do transe.— Sabe, pequeno Rorak… — disse ela brincando com Samhain. O Sentinela do Inverno estava caído no chão e sangrando. — Embora você não concorde, somos muito parecidos, até posso enxergar muito de mim ao te olhar. Ambos queremos o melhor para nossa terra, a diferença é que meus olhos estão abertos agora. Vejo que a terra será consumida e os oceanos secarão. O Sol desaparecerá e a Lua irá se partir enquanto a eterna escuridão se apodera de Cylch. Todas as almas de nosso mundo, toda a magia, toda a existência não passam de recursos para algo maior do que vocês. Mas eu amo a vida, e por isso tratarei de recriá-la aos meus modos após o Abismo tomar o que é seu por direito!— Nunca! — bradou ele. — Não somos nem um pouco parecidos, sua traidora. — Cuspiu sangue no chão.— Ah, querido, não fale assim! Sabe muito bem que somos o reflexo um do outro, preocupados com o futuro de nossa sobrevivência! Se eu não fizesse isso, o que sobraria de nós após
Yew acordou com um grito, assustando os colegas que se reuniam em volta do mesmo, preocupados ao acompanhar a queda e transe do elfo. Sem fôlego, a primeira coisa que fez foi trazer ar novo daquela região de árvores puras para seus pulmões, embora parecesse não conseguir. Ele agarrou Guido pelo pescoço com olhos arregalados, sendo capaz de enxergar Brianna e Alabaster através de sua pele, e então usou o apoio para erguer o corpo e rastejar desesperado para longe dele. Vomitou. O elfo de olhos esmeralda aparentou sentir-se melhor após expelir tudo o que possuía dentro de si para fora, levando consigo todo mal e a culpa presos durante tanto tempo. Aos poucos, a respiração descompassada passou a se ajeitar e as mãos que tremiam intensamente se acalmavam. Ele engoliu em seco e respirou fundo a fim de se tranquilizar, estava bem agora. Encarando seus companheiros, o Embaixador do Senhor da Luz, agora elucidado por completo de sua vida e das voltas que lhe foram roubadas, enxergava as fa