A chance

Marta

O estranho está ali, observando-a. Alto, imponente, com um terno impecável que denuncia o seu poder e riqueza. Os sapatos caros brilham sob a luz fraca da igreja. Mas o que mais a assusta são seus olhos, negros como a noite, penetrantes, porém vazios, sem qualquer vestígio de emoção. Um homem lindo… mas que aparenta não ter alma.

— Você quer uma chance, garota? — a voz dele soa firme, inesperada no silêncio da igreja.

Um arrepio percorre a espinha de Marta. Sua mente grita para ter cautela, mas há algo naquele homem… Algo que a faz acreditar que talvez essa seja a resposta que tanto pediu.

— Sim… — sua voz sai hesitante, mas verdadeira. 

— Eu só preciso de uma chance, senhor.

O homem cruza os braços e a encara por um longo momento, como se avaliasse algo dentro dela. Então, ele solta um leve suspiro e diz:

— Venha comigo. Vamos conversar.

Jonathan a estuda por um longo momento, seu olhar cravado nela, como se tentasse decifrar o que há por trás daquela jovem despedaçada. Há algo mais além da miséria em seus olhos. Algo sombrio. Uma dor antiga, tão profunda quanto a dele. 

O coração de Marta martela no peito. Ela deveria confiar nele? Deveria segui-lo? Mas, naquele momento, a verdade é uma só, ela não tem outra opção.

Jonathan

Jonathan está parado diante do altar, encarando o vazio da igreja silenciosa. Hoje completa mais um ano desde que perdeu Aira, a sua esposa, o maior da sua vida, a mãe do filho que nunca chegou a nascer. A lembrança dela o atinge como um soco brutal no estômago, tão real que ele quase sente o perfume suave dela, quase ouve sua risada ecoar pelas paredes antigas daquele templo. Aira era bondosa, cheia de luz, sempre enxergava o melhor nas pessoas. E agora… agora só resta a escuridão.

Seus punhos se fecham ao lado do corpo. Alguns anos se passaram, mas a dor permanece cravada nele, uma cicatriz invisível que pulsa a cada batida de seu coração. Jonathan pensa nela e no filho que nunca conheceu, e a mesma pergunta silenciosa volta a ecoar: O que teria acontecido se aquele dia fosse diferente? Se ele pudesse voltar no tempo…

Então, ele escuta.

Uma voz. Um sussurro entrecortado por soluços.

Jonathan vira a cabeça lentamente e a vê. Uma jovem ajoelhada, o rosto enterrado nas mãos, tremendo como uma folha ao vento. Suas palavras são um punhal invisível, cortando o silêncio da igreja e, de algum jeito estranho, rasgando algo dentro dele.

Por um segundo, Jonathan vê Aira ali. Ouve sua voz doce lhe dizendo que sempre devemos ajudar, que a bondade é a maior riqueza que alguém pode ter. Aira jamais ignoraria essa garota.

E ele? Ele não é como Aira. Não mais.

Não há mais bondade nele. Mas algo o prende ali. Algo o faz avançar, seus passos ecoando no chão frio. A sombra do seu corpo se projeta ao lado dela. A jovem ergue o rosto, e o olhar assustado dela encontra o dele. 

Jonathan parou no instante em que seus olhos encontraram os dela. O choque foi como um soco, violento e inesperado. Mesmo sob a magreza evidente, os traços eram inconfundíveis. 

Os olhos expressivos, carregados de uma intensidade que ele conhecia bem, o olhar denso e inquieto, a mesma hesitação que um dia viu em Aira, como se temesse se entregar completamente ao momento. O coração dele perdeu um compasso, e por um breve instante, o mundo ao redor pareceu se dissolver. Era irracional, impossível… 

Movido por um impulso incontrolável, ele decide que não a deixará ir para as ruas. Seria o destino te dando uma segunda chance? 

Ele vê o pânico inicial dar lugar a uma surpresa silenciosa, uma confusão clara. Ele sabe o que ela vê, uma oportunidade enviada por Deus, mas na verdade ele sabe que sua ação é impulsionada pela lembrança de Aira.  

Ali ele percebe o momento exato em que ela entende o abismo entre eles. Um homem rico. Uma garota miserável. 

— Você quer uma chance, garota? — sua voz soa firme, fria, quebrando o silêncio. A garota estremece visivelmente e se retrai, mas Jonathan não sabe se é medo ou pelo que acabou de oferecer. 

— Sim… — ela balbucia, quase sem voz. 

— Eu só preciso de uma chance. Jonathan a estuda por um longo momento, seu olhar cravado nela, como se tentasse decifrar o que há por trás daquela jovem despedaçada. Há algo mais além da miséria em seus olhos. Algo sombrio. Uma dor antiga, tão profunda quanto a dele. 

— Qual é o seu nome? — ele pergunta, sem desviar o olhar. Ela hesita. Por um segundo, Jonathan jura ver um lampejo de medo puro cruzar seu rosto. 

— Marta… — responde, com um fio de voz. 

Jonathan sente que há mais do que ela revela. Há algo oculto, um segredo enterrado sob a pele magra e o olhar perdido. 

— Venha comigo. Vamos conversar. A incerteza explode no rosto dela, mas há uma entrega silenciosa no modo como ela se levanta, hesitante, como se soubesse que sua sobrevivência depende daquela decisão. Jonathan dá um passo em direção à porta da igreja, sem olhar para trás. 

Seu peito está pesado, a sombra de Aira ainda pairando sobre ele. Ele não sabe por que está fazendo isso. Não sabe o que essa garota significa ou por que ela lhe lembra um passado que tenta enterrar há anos. Mas sabe de uma coisa, esta noite, Marta não dormirá nas ruas. E enquanto caminham juntos para fora da igreja, Jonathan percebe uma sensação incômoda. Não é piedade. Não é empatia. 

É a sensação perturbadora de que, de algum modo, sua vida e a dela sempre estiveram destinadas a se cruzar.

Mas por quê? E então Jonathan se pergunta: 

Será pela lembrança de Aira que ele vai ajudar Marta? 

Essa realmente é a atitude correta?

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