Decifrando um mistério
― Que foi isso? ― Perguntei.
Todos nos entreolhamos e fomos ao aposento vizinho para ver o que tinha acontecido: vários livros encontravam-se esparramados pelo chão.
Admirado, comentei com Rozendo:
― Esses livros não podiam ter se movido sozinhos!
― Não podiam! Com certeza, não podiam! ― Retrucou o velho abanando a cabeça negativamente.
Mais de uma dezena de livros espalhava-se pelo assoalho. Não poderiam ter escorregado de seu lugar, pois a estante possuía prateleiras largas e sólidas, feitas de peças de madeira antiga e maciça com cerca de dois centímetros de espessura.
― O que você acha? ― Perguntei ao velho jardineiro.
Ele pensou durante alguns segundos; depois respondeu num timbre de voz baixo, porém firme:
― Alguma coisa ou alguém quis chamar a nossa at
Lendo o diárioAssim que cheguei ao meu quarto liguei o computador e comecei a resumir o diário. No início eram as confidências de uma menina adolescente. Depois a narrativa tomou um rumo bastante complexo e enveredou por um caminho insólito; mais à frente tornou-se terrível e dolorosa. Uma verdadeira tragédia! O conteúdo prendeu-me tanto a atenção que não pude parar de ler por nenhum segundo. Quando terminei voltei ao início e fui marcando as páginas e os parágrafos importantes. Para isso utilizei-me do computador, resumindo e comentando alguns trechos. Não quis usar um marcador de texto para não estragar o original.A manhã já ia alta quando terminei a minha tarefa e imprimi o resumo. O corpo estava cansado e doía; os olhos ardiam devido ao esforço. Tomei um copo de leite e fui para a cama, ma
Uma narrativa impressionantePassei os olhos pelas anotações e continuei a contar:“A casa de Samambaias trouxe um novo alento a Isabel. Imediatamente ela entrou em contato com a mãe e exigiu do marido que o professor de música fosse recontratado. O francesinho Pierre Duprée transferiu-se para uma pensão em Samambaias para ficar mais próximo de sua pupila. Fiz uma pequena pausa para explicar:― Estou narrando o mais importante, conforme li no diário de Clara. Portanto as opiniões são dela.“Clara começou a perceber que Isabel, durante as aulas, costumava a apresentar um ar diferente; frequentemente se ruborizava e a prima observava, quase sempre, um olhar furtivo trocado entre Pierre e Isabel. Vira e mexe ambos se retiravam para uma janela onde se debruçavam; ali ficavam conversando, ela e o franc&eci
A tragédiaTambém concordei que deveríamos prosseguir com a narrativa. Sem maiores delongas continuei do ponto em que havia parado:“Clara e João; Isabel e Pierre! Dessa situação somente Clara conhecia toda a extensão daquele drama; o jogo prosseguia; a troca de parceiros fazia parte da maré, do vaivém ditado pela vida. João pensava que estava enganando Isabel, enquanto essa traia João. Era o jogo dos traídos.‘Esta situação foi perdurando por cerca de três anos. Durante esse tempo os relatos de Clara são recheados de lamentações, culpas e revolta. Ela culpava Isabel e, principalmente, a ela mesma, pela desagradável situação criada; ao mesmo tempo confessava sua impotência para reagir, todas as vezes que se aproximava do barão. A paixão d
Fantasmas noturnosDepois de fazer a higiene noturna apaguei as luzes e deitei-me de costas, com a barriga para cima; nessa posição fiquei relembrando vagamente os acontecimentos do dia. Estava com um pouquinho de fome, mas resolvi não comer nada até o dia seguinte. Procurei relaxar ao máximo todos os músculos, membros e órgãos e busquei meditar; agi exatamente conforme eu havia lido em uma revista, isto é, deixei que a mente vagasse em um limbo projetando o mínimo de pensamentos que me fosse possível. Imaginava um lugar calmo às margens de um lago azul de águas tranquilas e cristalinas.Perdi os sentidos e adormeci. Acho que era de madrugada quando pressenti alguém que me tocava o ombro. Sentei-me na cama, mas o quarto não estava escuro como eu imaginava: uma claridade difusa coava de algum lugar ao qual eu não podia distinguir
Afinal, o que é Karma?― Bom dia! Vim chamá-los para o café! ― Exclamou alegre.Levantamos e nos dirigimos para a casinha do quintal. Eu já estava me tornando um freguês assíduo para refeições junto com a família de Rozendo. É lógico que eu não poderia comparar a comida de Maurine com meus congelados. Portanto, resolvi que quando fosse fazer a feira com ela, reforçaria as compras. Assim minha consciência não pesaria tanto.Desta vez o velho preparara os quitutes. Mesmo assim tudo estava perfeito: ovos, queijo assado, doces... um desjejum na medida para se ganhar alguns quilinhos extras.Durante a refeição Maurine e eu colocamos Rozendo a par de nossos ‘contatos imediatos’. Expusemos, com detalhes, tudo o que aconteceu durante a noite, nossos encontros e conclusões.O velho escutou em
Elaborando um planoSaímos da mesa onde fizemos a refeição matinal e fomos para a varanda dos fundos.― O que faremos? ― Inquiri logo que nos encontramos acomodados.Rozendo ponderou:― Em minha opinião, a primeira coisa a fazer é mantermo-nos conscientes da importância da empreitada que se apresenta à nossa frente, unidos e sem temor. Nossa proteção está justamente na confiança que vamos oferecer aos personagens desse drama com o objetivo de solucioná-lo definitivamente.― Concordo ― avaliou Maurine. ― Temos que estabelecer argumentos para convencer, principalmente Raphael, que me parece o mais embrutecido e renitente do grupo. Além disso, Raphael exibe uma inteligência bem desenvolvida, pena que para o mal. Clara e João já se predispuseram a ajudar-nos, o que já representa um grande passo. No momento
Mãe SabinaEla estava sentada em uma espécie de toco com duas cadeiras postadas à frente. As cadeiras eram baixas para que o consulente pudesse ficar à mesma altura da velha. Com isso ela podia encarar cada um diretamente nos olhos. E que olhos! Parece que deixavam as pessoas nuas, verrumando até o âmago, desvendando a alma de cada um. Achei que seria impossível ocultar algo daquela anciã.Trajava apenas um vestidinho de chita, estampado com motivos florais vermelhos. Magra: Canelas secas, seios murchos e os pés descalços bem assentados no piso do aposento. Dentes? Se os possuía estavam guardados em algum lugar dentro da casa; mas o sorriso vazio era franco e sincero.Logo que nos viu sentados iluminou seus olhinhos vivos com um raio de luz aceso no interior de seu coração. As gengivas lisas e gastas abriram-se mostrando satisfa&cc
Explicando fenômenosChegamos ao solar e, imediatamente, colocamos Rozendo a par de nossa missão; o velho escutou o relato com o maior interesse e mostrou-se satisfeito com o arremate final da empreitada:― Eu já esperava que Mãe Sabina tivesse conhecimento de tudo; também fiquei satisfeito com a vinda próxima do perito em assuntos paranormais ― observou.Minha curiosidade fazia a cabeça fervilhar; não me contendo indaguei do velho:― Quando chegamos para consultar Mãe Sabina ela nos disse que ‘eles’ já tinham avisado de que nós iríamos lá. A quem ela quis se referir com ‘eles’, pelo amor de Deus?Rozendo soltou uma boa gargalhada e depois, suspirando, se dispôs a falar:― Mãe Sabina tem trânsito livre e irrestrito no ‘tal’ mundo invisível do qual falamos; ela c