Meu companheiro Renato queria que nosso filhote assumisse a culpa pelo filho do seu primeiro amor e fosse para a Prisão de Prata por cinco anos. O grande salão do Matilha Sombra da Tempestade fervilhava de excitação. O Ancião da Matilha, Gregório Bastos, estava no palco, sua pelagem prateada brilhando sob os lustres. — Na semana passada, a vida de um jovem lobo foi salva pelo corajoso filho do Beta Renato — Anunciou orgulhosamente. — Estamos aqui para honrar esse filhote heroico. Meu coração se encheu de orgulho. Márcio, meu filho de oito anos, apertou minha mão nervosamente. — O jovem herói poderia subir ao palco, por favor? Levantei-me com Márcio, mas congelei. Renato já estava caminhando para o palco, com Sílvia Nogueira e seu filho, Jandir. Meu sangue gelou. Isso não estava certo. Jandir não foi quem salvou aquele filhote. Márcio, sim. — Essa é a minha conquista! — Márcio sussurrou, confuso e magoado. Os olhos de Renato se arregalaram ao nos ver. Eu não deveria estar ali,
Irreconhecível? Eu não esperava que Renato me visse assim. — Então, quebre o laço entre nós. — Disse eu, em um sussurro, no carro. — Deixe Márcio e a mim irmos. — Nunca. — Os olhos de Renato brilharam perigosamente no retrovisor. — Você é minha única parceira. Márcio será meu herdeiro depois do... treinamento dele. Na manhã seguinte, guardas cercaram nossa casa. Renato forçou uma água misturada com prata pela minha garganta. Acônito. Meu lobo uivou de dor antes de cair em um silêncio profundo. Ele fez Márcio beber chá de erva-do-sono. Os olhos do meu filho se fecharam pesadamente, seu corpo pequeno desabando em inconsciência. — É para o bem dele. — Disse Ryan, trancando-nos. — Até o julgamento. Uma dúzia de guardas assumiu posições do lado de fora da porta. No dia seguinte, vozes começaram a subir da parte de baixo. Sílvia e Catarina Vieira, a mãe de Renato. A mão de Catarina estalou contra o meu rosto no momento em que me viu. — Nós tratamos Márcio como nosso própr
Cresci sendo órfã. Meus pais morreram quando eu ainda era pequena demais para me lembrar de seus rostos. Tudo o que eu tinha era minha irmã Eliane Almeida, fomos ambas criadas no orfanato da matilha. Ela se apresentou como Ômega, o que tornava nossas vidas ainda mais difíceis. Quando Renato descobriu que eu era sua companheira, seus pais, o antigo casal Beta da matilha, ficaram horrorizados. — Uma órfã? — Catarina zombou. — Sem linhagem? Sem status? Com uma irmã Ômega? Mas Renato se manteve firme. — Eu só tenho uma companheira nesta vida. — Declarou ele. — E ela é Celeste. Agora, uma década depois, ele passava a noite segurando Márcio e a mim no porão, como se isso pudesse apagar sua traição. A manhã chegou cedo demais. Márcio acordou e imediatamente se lançou contra Renato, socos minúsculos voando. — Márcio, pare. — Segurei-o no meio do ataque. — Não trate seu pai assim. O rosto de Renato se iluminou. Ele nos abraçou com força. — Eu amo apenas vocês dois. — Sussurr
Depois que Renato partiu, rapidamente arrumei o essencial. Minhas mãos tremiam, mas forcei-as a permanecer firmes. — Pegue seus livros favoritos, Márcio. — Sussurrei, colocando roupas dentro de uma bolsa. — Estamos indo embora em breve. Faltavam cinco horas até Eliane e Alexandre chegarem. Eu observava Gregório, o "guarda mais forte" de Renato, estacionado à porta. Liguei para Eliane, pressionando-me contra a parede úmida do porão. — A segurança está apertada. — Não se preocupe, irmã. — A voz de Eliane tinha a firmeza de uma predadora. — Alexandre tem um plano. A Matilha Lua de Sangue está pronta. Márcio pegou o telefone, seu rostinho pequeno se iluminando. — Tia Eliane! Sinto sua falta! O riso de Eliane aqueceu meu coração. — Também sinto sua falta, filhote. Em breve, ninguém mais vai machucar você ou sua mãe. Temos um quarto pronto para vocês dois. A porta do porão explodiu para dentro antes que eu pudesse responder. Catarina desceu as escadas voando, sua transf
O grito de raiva de Catarina perfurou o porão. — Você acha que pode levá-las? Então veja seu sobrinho morrer primeiro! Antes que Alexandre pudesse saltar, ela enfiou uma seringa carregada de prata no pescoço de Márcio. O grito do meu filho vai me assombrar para sempre. A próxima coisa que me lembro é de acordar no salão de cura da Matilha Lua de Sangue. — Não, não me toque! — Me debati contra mãos gentis. — Celeste, você está segura! — A voz de Eliane rompeu o pânico. — Você está em casa, irmã. — Eliane? — Minha voz estava rouca de tanto gritar. Alexandre estava atrás dela, sua enorme figura projetando sombras à luz das velas. Seus olhos queimavam com uma fúria mal contida. Então, a memória atingiu-me como um raio. — Márcio! — Levantei-me rapidamente. — Onde está meu filho? O rosto de Eliane se contorceu. — Os curandeiros estão com ele. Estão tentando- Eu cambaleei para fora da cama, minhas pernas mal me sustentando. — Leve-me até ele. Agora. O salão de cu
Renato me fitou, seus olhos caindo sobre o lugar onde o cheiro de Márcio devia estar. Nosso vínculo de companheiros se retorceu com seu crescente horror.— O que você está fazendo aqui? — Sua voz quebrou, crua de medo. — Onde está Márcio?Ignorei-o, virando-me em direção ao portão, os livros preferidos de Márcio apertados contra o peito. O pingente de lobo dele queimava no meu bolso.A mão de Renato agarrou meu braço, seu aperto era desesperado. O toque que antes trazia conforto agora fazia minha pele se arrepiar.— Celeste, me responda! Onde está nosso filho?O rosnado de Alexandre vibrou pelo chão.— Tire sua mão de cima da minha cunhada, ou eu a arrancarei de seu braço.— Morte. — A voz de Catarina ecoou com uma satisfação cruel, seus cabelos prateados captando a luz da manhã. — O fraco e pequeno assassino não conseguiu lidar com uma dose adequada de prata. Igual à mãe dele, sem linhagem, sem força.Renato vacilou como se tivesse sido atingido fisicamente.— Prata? Não... Não, você
O território da Matilha Lua de Sangue se estendia por três estados, superando em muito as terras modestas da Matilha Sombra da Tempestade.Assistindo pela janela do carro de Eliane, entendi o motivo de Wilmar e Catarina sempre terem temido Alexandre.— Toda a nossa aliança caberia apenas em nossos terrenos de caça. — Explicou Eliane enquanto dirigíamos. — Eles precisam dos nossos recursos para sobreviver, madeira, presas, rotas comerciais.— Bem-vinda à casa, irmã. — Disse Alexandre com carinho.— Sua nova casa. — Disse Eliane suavemente, me conduzindo até uma imensa casa de pedra com um jardim privado. — Alexandre se certificou de que você tenha tudo o que precisa.O curandeiro principal da aliança vinha todos os dias, tentando curar as feridas que a prata havia deixado na minha alma.Meu guarda-roupa foi preenchido com vestidos que eu nunca usaria, e pedras preciosas que não poderiam substituir o que eu havia perdido.Na primeira manhã, encontrei Renato ajoelhado do lado de fora do m
Eu olhei fixamente para o veredicto em minhas mãos, mal acreditando no que estava lendo. Meu vestido de seda, um presente de Eliane, num azul profundo com fios de prata que combinavam com o pingente de Márcio, farfalhou enquanto minhas mãos tremiam.— A Matilha Sombra da Tempestade será absorvida pelo território da Matilha Lua de Sangue. — Disse Alexandre, sua autoridade de Alfa preenchendo a sala. — Fusão completa. As terras deles, seus recursos, tudo.— Eles nunca vão aceitar. — Respondi, embora uma chama de esperança surgisse em meu peito. As pedras preciosas que Eliane havia trançado em meu cabelo captaram a luz, um contraste nítido com os trapos que eu usara no porão.O sorriso de Alexandre era predatório.— Eles não têm escolha. Controlamos os terrenos de caça deles, as rotas comerciais. Se se recusarem, passarão fome. A aliança deles morre.Eliane apertou minha mão, seu próprio traje igualmente majestoso.— Tem mais. Alexandre levará as evidências do assassinato de Márcio ao Con