Capítulo 3
Cresci sendo órfã. Meus pais morreram quando eu ainda era pequena demais para me lembrar de seus rostos.

Tudo o que eu tinha era minha irmã Eliane Almeida, fomos ambas criadas no orfanato da matilha. Ela se apresentou como Ômega, o que tornava nossas vidas ainda mais difíceis.

Quando Renato descobriu que eu era sua companheira, seus pais, o antigo casal Beta da matilha, ficaram horrorizados.

— Uma órfã? — Catarina zombou. — Sem linhagem? Sem status? Com uma irmã Ômega?

Mas Renato se manteve firme.

— Eu só tenho uma companheira nesta vida. — Declarou ele. — E ela é Celeste.

Agora, uma década depois, ele passava a noite segurando Márcio e a mim no porão, como se isso pudesse apagar sua traição.

A manhã chegou cedo demais. Márcio acordou e imediatamente se lançou contra Renato, socos minúsculos voando.

— Márcio, pare. — Segurei-o no meio do ataque. — Não trate seu pai assim.

O rosto de Renato se iluminou. Ele nos abraçou com força.

— Eu amo apenas vocês dois. — Sussurrou ele. — Para sempre. Eu vou fazer tudo certo, eu prometo. Márcio será meu único herdeiro.

Ele levou Márcio para o jardim para treinar, demonstrando pessoalmente posturas de combate e formas de lobo.

Enquanto treinavam, Renato me chamou, estendendo meu celular.

— Ligue para sua irmã. — Disse ele gentilmente. — Sei que sente falta dela.

Pobre, tolo Renato. Ele achava que minha irmã Ômega não representava ameaça para seus planos.

Ele não sabia que Eliane havia encontrado sua companheira seis meses atrás, o Alfa Alexandre Pedreira, da Matilha Lua de Sangue.

Meus dedos tremiam enquanto discava o número dela.

Em breve, muito em breve, meu filho e eu seríamos livres.

Nos dias seguintes, forcei-me a assistir ao tormento de Jandir com Márcio em silêncio. Cada momento esculpia outra cicatriz em meu coração.

— Ajoelhe-se, bastardo. — Jandir zombava no jardim, apontando para suas botas sujas. — Coloque meus sapatos direito. Os dois.

Márcio me olhou, seu rostinho valente apesar de as mãos trêmulas.

— Mais rápido! — Jandir deu um chute nas costelas de Márcio. — Vai ser assim que te tratam na Prisão de Prata de qualquer jeito.

Minhas garras cravaram-se mais fundo nas minhas palmas. O sangue pingava no chão do porão, mas eu não me atrevia a me mover. Ainda não.

Sílvia observava de seu assento no banco do jardim, sorrindo maliciosa enquanto seu filho atormentava o meu.

Naquela noite, meu corajoso e gentil Márcio desceu sorrateiramente com suprimentos médicos roubados.

— Estou bem, mãe. — Sussurrou ele, limpando cuidadosamente os cortes em minhas palmas, feitos pelas minhas garras. — Viu? Estou ficando bom nisso.

Toquei as manchas roxas nos braços dele, onde Sílvia o tinha beliscado. Cada marca parecia uma adaga no meu coração. Algumas estavam ficando amarelas, outras eram recentes, ainda escuras.

— Está doendo muito? — Perguntei, a voz embargada.

Márcio balançou a cabeça.

— Não mais. Sou forte, como você.

Dez intermináveis dias se passaram. A reunião do Conselho da Matilha estava cada vez mais próxima.

Mesmo com Márcio assumindo a culpa, a ansiedade de Sílvia contaminava a casa como uma doença. Ela andava pelos corredores à noite, saltando com as sombras, murmurando sobre exames de DNA e feitiços da verdade.

Finalmente, Renato anunciou sua solução durante o jantar: uma viagem para o exterior com Sílvia e Jandir até que as coisas "se acalmassem."

Enquanto Renato arrumava suas coisas lá em cima, eu segurava Márcio em nosso refúgio no porão, tratando os hematomas mais recentes dele com dedos trêmulos.

— Papai vai embora para sempre? — Perguntou Márcio, seu rostinho jovem confuso com a agitação lá em cima.

— Sim, filho.

Um sorriso iluminou seu rosto – o primeiro sorriso real que eu via em dias.

— Que bom. Eu não gosto mais dele. Ele só machuca você, mamãe. — Inflou o peito. — Quando ele for embora, eu vou te proteger, ao invés dele.

Eu o abracei forte, respirando seu cheiro, memorizando cada detalhe.

— E mamãe vai te proteger para sempre. Não importa o que aconteça.

Renato desceu antes de partir, seu rosto contorcido de relutância. Sentamo-nos na nossa cama estreita, sem olhar para ele.

— Eu volto antes... — Hesitou. — Antes de começar a sentença de Márcio. Vou arranjar tudo, tutores particulares, acomodações confortáveis, a melhor educação que a Prisão de Prata oferece.

Eu acenei com a cabeça, submissa, os olhos baixos.

— O que você achar melhor, companheiro.

A surpresa piscou em seu rosto com minha aceitação fácil. Depois de semanas de briga, minha submissão parecia agradá-lo e ao mesmo tempo incomodá-lo.

Renato permaneceu no porão, nos segurando, como se estivesse memorizando o nosso cheiro.

— Anda logo! — A voz de Catarina ecoou pelas escadas. — Você vai perder o voo!

Renato nos puxou para mais perto.

— Vou trazer presentes para vocês dois. Quando eu voltar, faremos a cerimônia de marcação e vou anunciar Márcio como meu herdeiro. Eu prometo.

— Papai... — A voz de Márcio se quebrou.

Meu coração se despedaçou. Apesar de tudo, meu filho ainda amava o pai. Essas últimas semanas só o ensinaram a esconder isso.

Rápido, puxei Márcio para meus braços, abafando suas palavras contra meu ombro.

— Vai. — Disse suavemente. — Aproveite sua viagem com Sílvia e Jandir. Garanta que o nosso sacrifício tenha valido a pena.

A culpa escureceu os olhos de Renato.

— Vou deixar Gregório aqui, meu guarda mais forte. Me liguem a qualquer momento, para qualquer coisa.

Enquanto carregavam as malas no carro, Gregório se aproximou hesitante.

— Beta Renato, Márcio deve continuar seu treinamento com o instrutor de combate de Jandir enquanto você estiver fora?

A cabeça de Sílvia se ergueu abruptamente.

— Não. O instrutor vem conosco. Jandir precisa de treinamento consistente, mesmo nas férias.

Senti Márcio se enrijecer nos meus braços.

Mas meu corajoso menino forçou um sorriso.

— Tudo bem. Eu posso treinar sozinho.

O rosto de Renato se retorceu com uma nova onda de culpa.

— Quando eu voltar, vou te encontrar um professor ainda melhor, Márcio. Eu prometo.

Palavras vazias. Promessas vazias.

Assisti o carro desaparecer, levando Sílvia, Jandir e meu companheiro embora.
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