Enquanto Isabella permanecia mergulhada num sono profundo, abraçada ao lençol e ainda vestindo a roupa da noite anterior, Sofia se movimentava pela cozinha com passos preguiçosos, mas decididos. O cheiro de arroz recém-cozido e tempero caseiro começava a invadir todos os cômodos, dançando no ar até alcançar as narinas de quem estivesse por perto. Ela cantarolava baixinho, tentando afastar a dorzinha teimosa da cabeça que a ressaca ainda insistia em manter.
Preparava-se para acordar Isabella com um prato de comida na mão quando a campainha tocou. O som fez seus olhos se estreitarem, e ela olhou na direção da porta com uma expressão indignada. — As pessoas aqui de Sicília já foram mais educadas — resmungou em voz alta. — Antes, ao menos perguntavam se podiam fazer uma visita. Hoje, simplesmente batem na porta como se morássemos numa república. Mesmo contrariada, seguiu até a porta, limpando as mãos num pano de prato jogado sobre o ombro. Quando espiou pelo olho mágico, o aborrecimento deu lugar a um sorriso iluminado. — Mas olha só quem resolveu aparecer! — disse, abrindo a porta com entusiasmo. — Roberto! Seu cara de pau, já estava achando que tinha se mudado pro deserto. Ele riu, entrando com a naturalidade de quem já conhecia bem o ambiente. — Vim salvar vocês de mais um domingo entediante — respondeu, entregando uma garrafa de vinho que trazia nas mãos. — E espero que tenha comida, porque eu estou morrendo de fome. — Chegou na hora certa — disse ela, fechando a porta e se afastando. — Mas cuidado ao falar alto, ou vai acordar a fera que dorme no quarto. Isabella ainda tá de ressaca brava. — Então vou sussurrar, igual a um monge — brincou ele, sentando-se no sofá com um sorriso sapeca. Sofia riu e voltou pra cozinha. O clima parecia ter mudado por alguns instantes, como se a presença de Roberto trouxesse uma trégua à tensão que pairava no ar desde a visita de Donavan. Mas lá em cima, no quarto, Isabella ainda se remexia inquieta, como se algo em seus sonhos não a deixasse descansar completamente… Isabella acordou num rompante ao escutar o toque insistente do seu celular. O som ecoou como marteladas dentro da sua cabeça ainda pesada pela noite anterior. Tonta, com os olhos semiabertos e o rosto amassado contra o travesseiro, ela tateou até encontrar o aparelho em meio aos lençóis bagunçados. Atendeu sem ao menos verificar de quem era a ligação. — Alô… quem é? — murmurou, esfregando os olhos e tentando colocar os pensamentos em ordem. A voz rouca e provocadora do outro lado da linha fez seu corpo gelar. — Boa tarde, minha bela adormecida. Pela rouquidão da sua voz, posso dizer que lhe acordei. Ela franziu o cenho, ainda sem processar. — Vai falar quem é, não, seu palhaço? — rebateu, com o humor típico de quem odeia ser acordada. — Tome cuidado com essa língua afiada, Isabella. Não sou um homem que tolera desrespeito. Só queria saber se gostou das flores… Nesse instante, a ficha caiu como um balde de água fria. O arrepio percorreu sua espinha, os sentidos voltaram num estalo e a boca entreaberta deixou escapar um sussurro de espanto: — Que porra eu fiz? A resposta veio carregada de sarcasmo e poder. — Sim, sou eu, Isabella. Achou que era quem? Por acaso estava esperando outra pessoa? Ela se endireitou na cama, ainda mais confusa com a ligação. A voz dele… ela conhecia, mas ainda parecia irreal. — Eu... não imaginei que você me ligaria. Me acordou, e eu detesto ser acordada, viu? — Não vai responder minha pergunta? — Não irei. Até porque não lhe devo satisfação nenhuma. Houve um silêncio tenso por um segundo antes dela completar, com aquele toque de ironia na voz: — A propósito… as flores são lindas. — Assim como você! — ele disse com uma convicção que fez seu estômago revirar. — Hoje à noite, Donavan irá buscá-la. Você irá jantar comigo no meu lugar favorito. Isabella arregalou os olhos e olhou para o celular como se tivesse acabado de receber uma ligação de outro planeta. — Como assim? Quem lhe deu permissão para decidir a minha vida assim? Nem sabe se eu quero ver você! Do outro lado da linha, a risada dele foi baixa, arrastada e carregada de autoconfiança. — Não seja assim, posso garantir que será um encontro interessante. E fique satisfeita em saber que nunca mandei flores pela manhã, nem liguei, muito menos convidei outra mulher para um jantar romântico. Ela revirou os olhos e soltou uma risada incrédula. — Olha… você é bonito, parece ter muito dinheiro e poder. Mas eu sou uma garota de classe média que precisa trabalhar pra se manter. Se eu não trabalhar, eu morro de fome. Não tenho tempo pra romances. Na sua vida, eu seria só mais um problema. O silêncio dele foi cortado por uma resposta carregada de sarcasmo e desejo: — São poucos os seus argumentos para me convencer, Isabella. Além do mais… eu adoro um problema na minha vida. Isabella mordeu o lábio, tentando encontrar uma resposta rápida, mas no momento em que abriria a boca, a porta do quarto se abriu de repente, revelando Roberto com seu sorriso debochado. A voz dele ecoou pelo quarto, fazendo Dominic silenciar do outro lado. A respiração pesada e contida do homem pelo telefone se fez presente por um segundo. Um silêncio cortante. — Quem está no seu quarto, Isabella? — ele perguntou, a voz mais grave e baixa. Ela respirou fundo, ajeitando os cabelos e respondendo com um tom neutro. — Um amigo que acabou de chegar… Pausou por um instante e então, com um toque de desafio, completou: — Já que não consegui lhe convencer… Donavan pode vir me buscar. Estarei pronta. A ligação caiu em silêncio. Ela colocou o celular de volta na escrivaninha, respirou fundo e se jogou mais uma vez na cama, observando o sorriso cínico de Roberto enquanto ele se encostava no batente da porta, como quem assistia a tudo e se divertia com o caos. Em um tom curioso, com os braços cruzados e o olhar desconfiado, Roberto se aproximou. — Com quem você estava falando, Isa? Ela suspirou e desviou o olhar, claramente desconfortável. Não queria explicar sobre Dominic, tampouco admitir o quanto aquilo mexera com ela. — Um conhecido… nada demais. — respondeu secamente, evitando qualquer detalhe. Roberto franziu o cenho, estreitando os olhos como se tentasse decifrar a verdade por trás da resposta. Então, com um tom mais baixo e cheio de intenções veladas, ele disse: — Sabe… ainda sinto saudades de você. De ter você por perto. De dormir ao seu lado. As palavras pesaram no ar como uma nuvem densa. Isabella virou o rosto, sentindo o estômago revirar. O passado deles era algo que ela preferia deixar enterrado, mas ele parecia insistente em desenterrá-lo. — Vai procurar sua amante, Roberto. Tenho certeza de que ela pode te oferecer tudo o que você deseja… — disse com frieza, cada sílaba carregada de amargura. Ele ficou sem graça, engolindo em seco. Sentia o orgulho ferido, mas tentava disfarçar com um sorrisinho sem graça. — Estarei na sala… com a Sofia. Vamos almoçar e beber. Se quiser se juntar a nós, você sabe onde me encontrar. Ele se virou para sair, mas antes de dar o primeiro passo, a voz firme de Isabella o chamou. — Roberto. Ele parou e olhou por cima do ombro, esperando algo mais. — Você está proibido de entrar no meu quarto. Nós não temos mais intimidade pra esse tipo de liberdade. Esqueça que já teve. Sem dizer uma palavra, ele assentiu com a cabeça e saiu, fechando a porta atrás de si. O clique da maçaneta soou como um ponto final que Isabella vinha tentando colocar há tempos.Sentado em sua poltrona de couro, Dominic girava lentamente o copo de uísque entre os dedos. O líquido âmbar dançava sob a luz baixa do escritório. Do outro lado da sala, Donavan observava em silêncio, os olhos sempre atentos, como o escudeiro fiel que era.— Dominic… — disse Donavan por fim, quebrando o silêncio. — Não é hora pra distrações. Ainda estamos tentando descobrir quem foi o filho da mãe que roubou nossa carga. Temos homens a interrogar, rastros a seguir, e traições pra cortar pela raiz.Dominic não respondeu de imediato. Levantou-se lentamente, levou o copo aos lábios e tomou o restante do uísque de uma só vez. O gelo tilintou no fundo.— Não são distrações — disse com voz firme. — Não se trata de "mulheres", Donavan. Trata-se dela… Isabella.Donavan ergueu uma sobrancelha, franzindo a testa.— Então é sério…Dominic caminhou até a janela e olhou para os jardins da mansão.— Mas não se engane — continuou ele. — Minha prioridade será sempre a famiglia. Eu não me distraio. E
O silêncio entre Dominic e Donavan à mesa era denso. O jantar havia esfriado, e a tensão do telefonema ainda pairava no ar. Dominic girava o copo de uísque com lentidão, os olhos fixos em um ponto qualquer da toalha branca.Foi quando um lampejo cortou sua mente como uma lâmina: Isabella.— Merda... — murmurou, passando as mãos pelo rosto.Donavan o observava com o canto dos olhos, e um sorriso debochado surgiu no rosto dele.— Pior que um tiro... é uma mulher esquecida.Dominic soltou um riso abafado, mais de frustração que de humor.— Com tudo isso... eu simplesmente esqueci que ela estaria me esperando. — Ele se levantou num ímpeto, jogando a guardanapo sobre a mesa. — Vamos. Ainda dá tempo de salvar essa noite.Donavan ergueu-se em seguida.— Isso se a noite não decidir te matar antes.Ambos caminharam para fora do restaurante. O ar noturno estava pesado, quase como um presságio. A brisa carregava um cheiro distante de gasolina e pólvora — ou talvez fosse apenas paranoia. O Knight
A Sicília sempre foi palco de paixões intensas, promessas perigosas e histórias que desafiam a lógica. No coração dessa ilha banhada por segredos e tradições, Isabella nunca imaginou que sua vida tomaria um rumo tão sombrio e arrebatador. Bastou um olhar. Um encontro. E tudo que ela conhecia desmoronou.Dominic, o homem que carrega o sangue da máfia nas veias, não é alguém que se ama sem consequências. Ele é o tipo de homem que não pede permissão — toma. E ao cruzar o caminho de Isabella, a calma da sua vida foi engolida pelo caos.Ela, com sua doçura e força silenciosa. Ele, com seu passado manchado de sangue e honra. Ambos travados em um destino onde amor e perigo andam lado a lado. Entre flores deixadas pela manhã e jantares interrompidos por tiros, Isabella aprenderá que amar Dominic é dançar na beira do abismo — onde cada passo pode ser o último.Mas talvez... seja exatamente isso que faz o coração bater mais forte.A dor latejava em seus pulsos, amarrados com força demais para p
As luzes da balada piscavam em tons de vermelho e azul, acompanhando o ritmo pulsante da música que ecoava como um coração acelerado. Corpos se moviam ao som da batida, copos tilintavam, risos escapavam por entre a fumaça artificial, e no meio de tudo isso… estava ela.Dominic encostou-se ao balcão com um copo de uísque na mão, o olhar cravado nela como se o resto do mundo simplesmente tivesse deixado de existir.— Você tá obcecado ou apenas entediado? — provocou Donavan ao seu lado, erguendo a sobrancelha ao notar a concentração do amigo. — Porque não é comum te ver tão fixado em alguém.Dominic não respondeu. Apenas ergueu o copo até os lábios, sem tirar os olhos da mulher que dançava no meio da pista. Cabelos soltos, expressão entregue, movimentos sensuais sem serem vulgares. Ela não dançava para chamar atenção, mas por estar sentindo a música… como se naquele instante nada mais importasse.Ele não sabia seu nome ainda, mas já sentia que era dela que viria o caos. A paz nunca o atr
O sol atravessava as cortinas pesadas da sala, insistente como se zombasse da ressaca que tomava conta do ambiente. No sofá, entre almofadas jogadas e garrafas vazias de água, Sofia gemeu alto, apertando as têmporas com as pontas dos dedos.— Ah, minha cabeça... — murmurou, a voz rouca e pastosa. — Por que a tequila parece tão legal na hora e tão maldita no dia seguinte?Com os olhos semiabertos, ela virou o rosto devagar, tentando entender onde estava. Quando reconheceu a sala de Isabella, soltou um suspiro cansado. Seus olhos caíram sobre a amiga, ainda dormindo ali do lado, com a boca entreaberta e a maquiagem completamente borrada, deixando marcas escuras ao redor dos olhos.— Olha só quem virou um panda durante a noite... — disse, soltando um riso fraco.Ela se jogou novamente no sofá, escondendo o rosto no travesseiro, quando de repente a campainha começou a tocar com insistência. Uma, duas, três vezes. Sofia grunhiu.— Não... não, por favor...A campainha tocava como uma marret