IV

Casamentos deveriam trazer felicidade para todo mundo. A união de duas pessoas que escolheram amar-se para a vida toda deveria ser uma coisa perfeita. A cerimônia entre as cerimônias, em que duas famílias se unem na maior alegria e duas pessoas se unem com o propósito de construir a própria família, com a promessa de que cuidarão sempre um do outro, em que os nossos irmãos estão tão felizes quanto nós estamos. Só que não é exatamente assim. 

— Se alguma coisa acontecer contigo, por favor, liga para mim, estarei sempre disponível para correr e te tirar dos braços de um idiota que não sabe tratar a minha princesa. 

Ver as lágrimas descerem pelo rosto de Karina pelo reflexo do espelho, fez fisgadas dominarem todo o meu corpo, como se fosse mais difícil ver ela mal que me casar com um completo estranho. Viro para olhar diretamente para elas. 

— Não te preocupes, estou bem treinada e qualquer coisa é só vocês me encontrarem em uma delegacia que estarei lá disposta a cumprir uma pena — nós três rimos em meio as lágrimas da minha irmã mais velha. 

— Isso nem é brincadeira, Alana — Karina ralha comigo enxugando as lágrimas com o guardanapo e o máximo de cuidado possível. 

— Não gosto nada de ver que vais passar pela mesma coisa, que eles obrigarão mais uma filha a casar com um estranho somente pelos negócios — Sarah atira o seu corpo todo arrumadinho no sofá castanho e cobre a cara com as mãos. — Bom, pelo menos sabemos o que é mesmo importante na vida deles e definitivamente não somos nós.

A tristeza volta a dominar a sala e vejo Karina de punhos fechados como se fosse dar um soco em alguém e Sarah continua com a cara coberta pelas mãos, mas sei bem que ela não se atreveria a chorar porque isso significa borrar uma maquiagem que levou tempo para escolher. 

— Olha só para ti, com esse vestido lindo e que combina perfeitamente com a tua pele e esses cachos maravilhosos que enchem a tua cabeça — Karina chega perto e me vira para o espelho, toca na minha cintura e pousa a cabeça no meu braço. — Terei imensas saudades de ir para a tua casa te chatear por nada mesmo, te obrigar a cozinhar para mim ou até mesmo deixar a Nica e Nelda para tomares conta. 

Ela tinha toda a razão, de facto estou maravilhosa no vestido cor de pêssego e corte princesa que combina perfeitamente comigo. Realça não só as curvas no meu corpo como esconde imperfeições debaixo dele e me deixa brilhante, a minha pele morena brilha em contraste com o vestido e o cabelo cacheado parcialmente preso deixa um charminho maravilhoso. A cabeleireira definitivamente trabalhou arduamente nisso. 

— Podes continuar a fazer tudo isso, não precisas parar — seguro o rosto de Karina com as duas máos antes de continuar. —, não precisas desistir de deixar as meninas comigo, vou continuar com o meu trabalho em casa, vai tudo correr bem e vou continuar a ter tempo para cuidar delas e incentivar aquelas duas a seguirem os meus passos na arte e podes sempre ir para a minha casa que cozinharei o que tu quiseres. 

Ver o sorriso de ponta a ponta no rosto dela foi o melhor para mim, senti um calor e coragem passar por mim com tudo e apenas sorri como se aquele casamento não fosse um problema. 

— Tudo isso são palavras vazias, quando estiveres na tua casa tudo isso mudará e nem mesmo poderás receber visitas. Casamentos, principalmente os arranjados são coisas difíceis de verdade e não será o teu uma excessão, ninguém é tão especial assim. 

Sarah ri antes de levantar e dar as costas para e quando estava prestes a sair Karina diz a verdade que nem ela aceita. 

— Sarah, ela não vai casar com teu marido e temos uma esperança crepitante de que o esposo dela jamais será tão escroto quanto o teu tão amado Walter. 

Vejo a minha irmã respirar muito rápido como se estivesse furiosa sendo que ouviu somente a verdade. 

— Vocês não sabem de nada — gritou antes de sair e fechar a porta com muita força. 

— Não liga para ela, não mesmo, ela só deu a má sorte de calhar com um escroto como aquele ser e estar presa  — minha irmã mais velha ajeita o meu vestido antes de voltar a sorrir para mim. — Dá sempre o teu melhor, não deixa ele comandar a tua vida e sê tu. Agora chegou o momento. 

 Meu pai para frente a porta aberta com as mãos rentes ao corpo, o terno preto feito sobre medida com o lencinho pêssego no canto esquerdo o deixa muito mais formal. No rosto, nenhum sorriso nem mesmo uma lágrima, ao invés disso, sustenta um olhar pretensioso e estende a mão para mim devagar, mesmo sabendo que estou distante dele. 

— Alana, chegou o momento.

Karina sai antes sem nem o despedir ou sequer cumprimentar. Caminho devagar segurando as bordas do vestido para não arrastarem pelo caminho. Está tudo bem que eu não quero esse casamento, mas não preciso arruinar um vestido maravilhoso. Olho para o meu pai e sem agarrar a sua mão peço licença com os olhos e saio mantendo o passo lento. Fui literalmente entregue em um bandeja então ele que nem espere amor e flores. 

Os vidros da claraboia brilhavam em contato com os raios de sol que entravam por todos os lugares e faziam com que toda a atenção fosse para um único lugar e talvez um dos mais lindos aí, o altar, mas ainda assim, as pessoas viram todas, uma por uma, quando as portas duplas abrem e começo a caminhar. Vejo algumas tias que com certeza limpam lágrimas falsas e estão aqui somente para aproveitar o bom momento e encontrar um assunto para fofocarem depois quando todo o grupo estiver reunido nas tardes de chá em que a minha mãe vai todos os sábados. 

Ouço algumas exclamações de pura satisfação e até mesmo uma voz quase infantil que diz o quão sortudo é o noivo. Claro que estou imensamente feliz por ter esse estatuto, entretanto, não faz com que as coisas sejam menos graves e simplesmente me impeço de mostrar sorrisos falsos. 

Meu coração acelera por curtos segundos quando coloco os olhos no homem posicionado frente ao altar com um terno marrom que enquadra perfeitamente no corpo, sem marcar nada e muito menos ser muito largo, simplesmente o encaixe perfeito. O cabelo preto ondulado curto brilha a distância e, honestamente, não sei dizer se são os raios ou se o cabelo dele brilha mesmo desse jeito a todo o momento. Os olhos arregalados destacam os castanhos claros e ele ser alto deixa as coisas difíceis para uma noiva que escolheu não usar saltos. 

Meu pai sai do lado no exato momento em que sou deixada ao lado daquele homem que cheira tão bem que parece ter tomado um banho em uma perfumaria. Se ele cheirar desse jeitinho ácido, amadeirado e ao mesmo tempo doce, como se todos os cheiros maravilhosos tivessem sido misturados para somente uma pessoa usar, por mim está tudo bem, aceito passar o resto da vida com ele. 

As mãos grandes quase cobrem a minha mão completamente no momento de colocar as alianças e ele não para de olhar mim. O olhar dele é tão penetrante que  temo que ele saiba o quão maravilhoso, cheiroso e bem parecido acho que ele é somente pelo olhar.

O salão de festas é ainda maior que a sala em que aconteceu o casamento e com certeza ainda mais linda. Flores decoravam todos os lugares e as mesas estavam distribuídas de um jeito que dava para ter um círculo grande o suficiente para muitas pessoas dançarem juntas. Porém, o momento seria de duas pessoas somente. 

Ele me puxa para mais perto usando a mão pousada na minha cintura. As mãos dele com certeza não só grandes, mas também são firmes o suficiente para me manter colada a ele em toda a dança. Giramos pelo salão no meio da dança até ela a música terminar e antes que os nossos pais venham ter conosco, ele sussurra no meu ouvido, causando um arrepio intenso no meu corpo todo, antes de sair de perto:

— Se fores tão maravilhosa todos os dias não sei se o saberei lidar.   

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