Todos os anos que tenho dão a experiência suficiente de saber que a senhora e o senhor Onwell fizeram uma porcaria das grandes. Nunca temos reuniões de família, são raríssimas as vezes em que comemos todos juntos e ainda mais raríssimas as vezes em que eles estão realmente interessados no que temos feito da nossa vida. E vendo a cara das minhas irmãs sei bem que não sou a única a pensar que aquilo é uma grande armadilha. Eles fizeram alguma coisa.
— Agora falando sério, vocês já cansaram de tentar nos enrolar e irão, finalmente, falar o que se passa?
Karina, a mais velhas das três filhas maravilhosas feitas pelos Onwell, pousa o garfo no prato perto da faca e cruza os braços lançando o olhar intimidador que ela sabe fazer muito bem. Uma característica muito forte nela é justamente essa, a capacidade de intimidar.
— Karina, que é isso? Nós apenas queremos saber como vocês estão, afinal de contas nunca nos vemos — minha mãe limpa o canto da boca com o guardanapo exalando a elegância e o feitio princesa dominadora que tem dentro dela. — Desde que tu e a Sarah casaram e saíram de casa que tudo ficou vazio e piorou quando a Alana saiu também, a casa não tem mais o ambiente de família. Eu tenho saudades disso.
— Mãe, tens saudades nossas? Tudo bem, podemos resolver isso, mas usar como desculpa para esse jantar de família? Aí já estás a ir longe demais — Sarah dá um gole no vinho na sua taça e inclina no corpo para frente. — Além disso, saímos juntas, as quatro, há dois dias, quanto tempo passou para teres tantas saudades assim?
— Quando fores mãe, perceberás.
Sarah bebe o resto de vinho que sobrou na sua taça em um gole só e olha que não era pouco. Monique Onwell deveria de certeza ser mais sensível, pelo menos com suas filhas, ainda mais sendo a Sarah que se dedica muito a ela para simplesmente ter as suas condições esquecidas como se fosse uma pessoa qualquer.
— Como sempre — dessa vez a resposta sai da minha boca sem nem pensar de verdade. — Podem falar o que quiserem falar, deixem somente que eu termine de comer, as vossas notícias nunca são das melhores.
Se eles têm algo para contar que pelo menos tenhamos os estômagos cheios. Da última vez que tivemos uma reunião de família desse tipo, a Sarah acabou casada com o um ser mascarado. Walter Victory é, de certeza, a pessoa que mais detesto.
— Vocês precisam ser mais pacientes, um jantar de família é para ser desfrutado da melhor maneira possível e não para ser dominado por um clima pesado — meu pai diz em um tom baixo e tão intimidador quanto o de sua filha mais velha, talvez bem mais. — E já que estão tão ansiosas para saber o que gostaríamos de falar para vocês, chegou o momento.
Dona Monique olha para mim com um pesaroso e a repsiração funda não ajudava em nada, em nada mesmo.
— Vocês sabem que a Onwell Corps tem passado por fases extremamente difíceis e esteve ao ponto de declara falência e de certeza seria o fim da nossa família, seria o fim dessa vida boa…
— Mas a empresa recuperou, não? Nós temos visto os lucros que voltou a dar e o quanto voltou a crescer e o reconhecimento de certeza aumentou e claro que tudo isso devido ao aumento de vendas e de serviços — Karina constata antes de descruzar os braços e fixar os olhos nos de meu pai.
— Com certeza, a empresa recuperou, voltou a dar os mesmos lucros e talvez bem mais — ele sorriu e tirou alguma coisa da sua camisa. — Porém, nós sabemos que isso tem sempre um custo, as coisas não acontecem do nada e esse custo foi mais alto do que aquilo que estava disposta a dar.
O olhar dele prende no meu, a minha garganta automaticamente fica seca, as minhas pernas travam e o garfo, preso entre os meus dedos há segundos, está agora pousado na mesa com o mesmo pedaço de carne. Sabia que esse jantar serviria somente para arruinar alguma coisa na nossa vida.
— Infelizmente, tivemos que recorrer a outras pessoas, pessoas até mais poderosas, para poder recuperar tudo isso, para impedir que a empresa declarasse falência e de certeza para manter as coisas como estão — ele respira fundo antes de continuar. — E foi um custo muito alto o que nós tivemos que pagar.
— Fala de uma vez, por favor — Karina volta para a pose intimidadora.
— O preço que nós tivemos que pagar foi entregar a Alana para casar co…
— O quê? — Interrompo antes mesmo de deixar ele continuar. — Quem vai casar? Eu? Isso é loucura, eu não vou casar com ninguém.
— Foi o necessário para salvar a empresa, para salvar a nossa riqueza — ele fica em pé e aponta na minha direção. — Tu vais casar sim, é uma ordem.
— Uma ordem? Por quê? Se queriam tanto fazer um acordo que envolvesse um casamento por que não se entregaram? Por que destruir a minha vida com um casamento que eu não quero e que muito menos conheço a pessoa? Não caso com ninguém para cumprir com os vossos caprichos.
No mesmo momento sinto uma mão pesada contra o meu rosto e o saber metálico se espalha pela minha boca. Vejo a minha mãe parada bem na frente da minha cadeira com o olhar fixo na própria mão.
— Nós te sustentamos por uma vida, deves ser grata por isso e aceitar esse casamento em contestar, passamos todos esses anos a colocar comida para ti todos os dias e com qual dinheiro? Com o dinheiro da empresa que tivemos que salvar com esse acordo, mas ao que parece isso não é o suficiente — ela grita aos quatro ventos sem nem se importar.
— Por acaso pedi para ser colocada no mundo? Não, eu não pedi e foi justamente por isso que fui embora daqui, que decidi me sustentar e viver do meu próprio trabalho — levanto e faço o esforço de não deixar as lágrimas caírem, seria horrível chorar justo no momento em que preciso de toda a força possível. — Não quero casar com ninguém, não casarei com ninguém e me deixem em paz.
Pego as minhas coisas e saio daí na maior preça. Como é que eles são capaz de negociar a liberdade das próprias filhas somente para cobrir as próprias necessidades? Na primeira vez foi somente por um estúpido de um investimento e agora para recuperar uma empresa na qual não verei sequer os tais dos lucros, como é que eles conseguem ser táo insensíveis ao ponto de simplesmente fazer as coisas sem nem pensar na vida da própria filha?
As minhas mãos e os meus pés começam a formigar, o queixo treme sem nem mesmo estar frio e os dentes ranger mesmo não sendo a hora em que estou no sono mais profundo.
— Alana…
Viro e vejo a mulher maravilhosa de vestido vermelho comprido e os saltos altos impróprios para caminhar naquele chão adornado de pedras rugosas e ao mesmo tempo lustrosas.
— Se for para me convencer a casar fica a saber que já tive o suficiente por um dia e de certeza que não preciso de mais drama hoje, por favor, Sarah.
— Ouve — ela pega as minhas mãos e aperta forte nas suas antes de as juntas ao seu peito. — É horrível o que eles fizeram, é verdadeiramente horrível, mas podemos sempre olhar pelo lado positivo, terás alguém para cuidar de ti e te apoiar.
— Tu casaste por um acordo que eles fizeram, por acaso tens alguém que cuida de ti ou te apoie?
Ela não pode vir para aqui tentar me convencer sendo que nem ela é verdadeiramente feliz com esse acordo idiota que eles fizeram.
— Eu não sou, mas não quer dizer que tu não possas ser e não quer dizer que não possas aproveitar para ter uma vida boa, uma vida estável, talvez até começes a tua família de sonho.
— Tu não entendes, pois não? Não quero casar com alguém que não amo, com alguém que pode simplesmente me desprezar ou me usar quando bem entender, quero casar e construir a minha família com alguém que me ame verdadeiramente e contemple a minha companhia, que fique feliz quando apareço ou que simplesmente seja obcecado por mim do mesmo jeito que serei por ele, é isso que eu quero.
Sem perceber sinto as lágrimas a cair pelo meu rosto e ela limpa devagar com os seus dedos delicados e suaves.
— Infelizmente, a vida não é tão justa assim.
— Yohan, já és adulto o suficiente para ter consciência da responsabilidade que estará nas tuas mãos e tenho cem porcento de certeza que não confiarias em alguém que não é casado para fazer negócios. Falar com pessoas costuma ser exaustivo de mais para ter que suportar uma única pessoa a dizer a mesma coisa há mais de duas semanas. Ser adulto não implica, com toda a certeza, ter que abdicar das minhas escolhas e das coisas que tomo com seriedade somente para cumprir caprichos disfarçados de tradições. — Pelo contrário, se a pessoa demonstra ser alguém de confiança, por que deixaria de fechar negócio somente por não ser casada? — Sabes muito bem o porquê, é tradição…— É tradição — dizemos simultaneamente e ele fecha a cara mais uma vez. — Mas que tradição é essa que obriga pessoas a casar? Que tradição é essa que não coloca a conduta da pessoa na primeira linha de observaçãpo para gerir a família? Que tipo de tradição é essa que não pode esperar que eu encontre a mulher com quem de
— Achas mesmo que ficar a olhar para o teto vai resolver alguma coisa? Levanta daí, sua mandada, vamos fazer algo feliz, sei lá, tomar um sorvete, pegar alguém antes da porcaria toda acontecer. Que seria de mim sem essa menina? O entusiasmo da Lisha me deixa sempre com uma mão atrás, como é que irei tomar sorvete sendo que preciso organizar as minhas coisas hoje para sair desse apartamento amanhã e ir para casa dos meus pais esperar pelo bendito casamento? — Preciso arrumar as minhas coisas — levanto da cama e abro as portas do armário antes de a expulsar da minha cama. — Tu podes ir, manda fotografias. O casamento está marcado para o fim de semana, logo no sábado em que teria a saída com as meninas e tive que cancelar por “motivos de saúde” deixando somente a menina do cabelo vermelho a par de tudo, senão teria a minha vida acabada. — Não deixa a falta de juízo te dominar, anda, vamos, depois venho e te ajudo a arrumar essas malas, uma vez que nem no teu casamento estarei — os ol
Casamentos deveriam trazer felicidade para todo mundo. A união de duas pessoas que escolheram amar-se para a vida toda deveria ser uma coisa perfeita. A cerimônia entre as cerimônias, em que duas famílias se unem na maior alegria e duas pessoas se unem com o propósito de construir a própria família, com a promessa de que cuidarão sempre um do outro, em que os nossos irmãos estão tão felizes quanto nós estamos. Só que não é exatamente assim. — Se alguma coisa acontecer contigo, por favor, liga para mim, estarei sempre disponível para correr e te tirar dos braços de um idiota que não sabe tratar a minha princesa. Ver as lágrimas descerem pelo rosto de Karina pelo reflexo do espelho, fez fisgadas dominarem todo o meu corpo, como se fosse mais difícil ver ela mal que me casar com um completo estranho. Viro para olhar diretamente para elas. — Não te preocupes, estou bem treinada e qualquer coisa é só vocês me encontrarem em uma delegacia que estarei lá disposta a cumprir uma pena — nós
— Olha só, ele não é esse ogro que eu estava pensar que ele seria, mas não vamos aqui colocar esperanças ainda porque pensei a mesma coisa de um certo ser e olha — Karina chega perto com duas taças de champagne e o sorriso acolhedor que ela sabe dar. — Ele não é gostoso? Olha só para ele e é mais alto que tu, cheira bem, parece educado e simpático, um daqueles cavalheiros que desenhas. — Karina… — O quê? Menti? — Toma o champagne em um gole antes de cruzar os braços e substituir o sorriso acolhedor por um olhar atento. — Ele de facto é muito gostoso e cheira muito bem e parece educado e mais essas coisas que tu disseste, contudo, ele não se encaixa no perfil dos cavalheiros que eu desenho — ela faz cara de desentendida e tira outra taça de champagne da bandeja que passa por nós na mão do garçon. — Os cavalheiros que desenho são realmente as perfeições e ele tem defeitos, os meus cavalheiros não têm defeitos e isso os torna ainda mais perfeitos. Eles são tudo o que as mulheres quere
Como é que ele pode querer passar o resto da vida comigo, ter filhos e um monte de baboseiras e ao mesmo tempo não me tocar? Como assim? Parece até que sou um fantasma aqui, existo mas para conversar sobre coisas super repetitivas como o que foi que eu comi, se comi bem, se passei bem o dia e acabou, cada um no seu canto, ele com o focinho naquele computador, aparentemente mais atraente que eu ou no tablet, e claro, eu com a companhia do kindle que a minha irmã mais velha fez questão de lembrar que uso as vezes. Dois dias aqui. Dois longos dias, sem contar o dia que chegamos porque tivemos uma conversa longa sobre o que gostamos e o que detestamos e quem somos de verdade, mas depois desse dia mais nada. Tudo sumiu, as conversas boas sumiram como se nunca tivessem existido. Como é que isso é possível? A lua de mel não deveria ser a melhor parte de um casamento? — Onde raios aquele ser está? Ninguém, para além de mim, permanece neste apartamento enorme por muito tempo, nem mesmo a pe
Yohan Wreckel Como posso fazer as coisas funcionarem entre nós dois? Ela parece distante, difícil de alcançar. Nenhum de nós casar, mas creio que podemos fazer um esforço para funcionar. Como? — Ah, ela é tão impossível, mas tão linda e espontânea. Como raios posso fazer isso funcionar? De repente, a sala fica quente e passar as mãos pelo meu pescoço ó aumenta o calor e saber que estou há três dias sem conversar devidamente com a minha própria esposa piora as coisas. Ainda mais agora que ela está a todo o momento com aquele livro nas mãos, em todo o lado, quarto, cama, banheiro, chão, sofá, até mesmo por cima dos chinelos que deveriam estar nos pés dela. Ele consegue ser estranha e ao mesmo tempo interessante. A porta abre devagar e a cabeça de sempre aparece para dar mais um dos tantos avisos, sejam reuniões ou até mesmo chamadas. — Uma chamada, senhor — permaneço calada enquanto senhorita Martin mantém os braços a frente do corpo e agarra as mãos segurando o nervosismo. — A sen
Alana Onwell Tudo bem que reclamei por não ter atenção suficiente na lua de mel e que ele precisa, no mínimo, ficar em casa e suportar a cara da mulher, que nas palavras dele, vai gerar os filhos dele, mas não há necessidade nenhuma de deixar as minhas pernas bambas sem nem tocar em mim. — O que é que estás a fazer?Não é usual ele estar em casa a uma hora dessas em plena quinta-feira e ainda mais sem camisa com tudo de fora e perfeitamente definido.Quais são os defeitos desse ser para além de ser um grande sem noção? — A cozinhar — ele responde com a maior calma e lança um daqueles sorrisos maravilhosos que não parou de lançar para mim durante toda a festa do casamento. — Dormiste bem? — Tu sabes cozinhar? E que horas são para estares a cozinhar? Permaneço apoiada no balcão observando os movimentos das suas mãos. O sorriso desaparece aos poucos e dá lugar à uma feição de dúvida. Ele consegue ser ainda mais lindo, como? — Claro que sei cozinhar, morei sozinho por muito tempo, um
— Vamos para o ginásio — Yohan levanta do sofá em que passamos mais de uma hora abraçados assistindo Single´s Inferno, deixando um espaço vazio atrás de mim. Estava tão confortável.— Vais para o ginásio? Pensei que não me deixarias sozinha — desligo o computador e fecho antes de levantar e olhar bem nos olhos dele. Ele não seria capaz de quebrar a promessa que ele acabou de fazer. — Não acredito que era uma promessa de algumas horas somente. — Alana, ouve o que eu disse e vou repetir para ouvires bem, ok? Vamos para o ginásio — ele olha para mim com as mãos na cintura e cara evidente de espanto. — O vamos é para eu e tu, não somente eu porque vamos, na nossa língua, implica a existência de duas ou mais pessoas. Por que estou a ser chamada para ir para o ginásio? Por acaso pedi para isso acontecer? O clima de ginásio me afasta de todas as maneiras possíveis, parece que nem é possível respirar de tanto sufoco por estar no meio de pessoas tão suadas enquanto podia estar na minha casa,