Em pé na biblioteca da casa, Aaron examinava os livros na estante, enquanto o médico, sentado em uma poltrona próxima, terminava de tomar o suco de maçã trazido por um criado.
O frescor da sala e o silêncio contrastavam com o forte calor e o barulho das ruas movimentadas, pelas quais haviam andado durante a manhã.
– Cansou-se? – Ibn Russud por fim quebrou o silêncio.
Aaron negou.
– Ainda não conseguiria lutar, mas consigo caminhar perfeitamente.
O perfume das flores do final de verão os alcançava e uma brisa fresca fazia as folhagens do jardim farfalharem com um barulho suave.O olhar de Layla deteve-se em Aaron, absorvendo cada detalhe. Por que o maldito tentador tinha que ser tão bonito?, perguntou-se mais uma vez, escondendo um suspiro.O sol atravessava os galhos e iluminava parte do rosto dele, mesclando-se às sombras das folhagens acima. Ela amava aqueles traços e as chamas que ardiam nos olhos azuis. Desejava seus braços a envolvê-la novamente, os lábios deles juntos, sussurrando palavras de amor. Era com isso que sonhava por dias e noites sem fim. Contudo, parte dela tinha medo, alertando-a das consequências. Inúmeras lendas corriam pela região sobre casais que se apaixonavam, e todas terminavam em tragédia.– Sabe por que Layla é
Mais um conforto impensável em meu castelo… Aaron suspirou de prazer ao entrar na banheira de água corrente e morna, fornecida pelos aquedutos da cidade. Sobre o piso de mármore ao lado, criados deixavam potes com sabão e toalhas limpas. Ele pegou um deles e cheirou o conteúdo. Almíscar e mel... Sorriu ao pensar como seus companheiros do exército ririam se o vissem agora. Banhos diários e perfumados não combinavam com sua fama de guerreiro. Porém, decidira não mais voltar ao exército. Tudo o que importava agora era Layla. – Layla! – Aaron sussurrou o nome, ajoelhado ao lado da cama, no quarto iluminado pela luz do luar que atravessava a janela por onde havia entrado.Abrindo os olhos assustada, ela voltou-se na direção dele.–Aaron! Como têm coragem de entrar em meu quarto?– Precisava lhe falar… E a janela estava aberta.Ela sentou-se e fuzilou-o com o olhar.– Achei que estava distraindo-se com uma daquelas…Erguendo-se do chão, Aaron sentou-se na beirada da cama.– Estava na sala de banhos quando seu irmão entrou – interrompeu-a. – E depois Hiram trouxe as jovens!– E você não protestou? – Ela cruzou os braços e ergueu o queixo com um ar irritado.Segredos
No movimentado mercado do centro da cidade, as bancas enfileiravam-se mostrando uma quantidade enorme de livros expostos em seus balcões.Mais uma vez, Aaron acompanhara Layla enquanto ela seguia o médico e sua filha durante a manhã, e agora ambos passeavam pela cidade.– A universidade de Córdoba atrai estudantes de vários reinos – Layla explicava – inclusive cristãos – pontuou. –Além dos estudantes, filósofos, advogados, médicos e sábios de todos os tipos moram aqui. Por causa disto, o comércio de livros prospera.Ela parou diante de uma banca e cumprimentou o vendedor. Um homem de turbante branco e rosto enrugado.– Salaam Aleikum, Sidi Zayn. &n
A luz batendo em suas pálpebras fechadas os acordaram.– Já é manhã! – Layla soergueu o corpo, percebendo que ela e Aaron haviam dormido abraçados um ao outro. Mais uma vez ele invadira seu quarto durante a noite.Aaron levantou a cabeça, pestanejando e olhando para os lados, até lembrar-se de onde estava.– Por Dios! – murmurou, assustado com a possibilidade de descobrirem os dois juntos, e começou a se levantar.No entanto, Layla estava ali, os cabelos revoltos caindo sobre os ombros, os lábios avermelhados entreabertos, e ele não pode se conter.– Gost
Estendendo-se no sopé da serra, as ruínas tornavam o local lúgubre e melancólico, mesmo sob o céu azul e sem nuvens. Ninhos de pássaros encimavam as torres parcialmente caídas e pedras soltas espalhavam-se pelo chão.Yasi parou seu corcel, examinando o campo de relva baixa cercado pelas antigas construções. Duelos eram proibidos na cidade, mas não ali, fora das muralhas que a defendiam.– Hiram, ajude Aaron a se armar – pediu ao pajem.Depois fez um sinal de cabeça para que o mestre de armas e o escudeiro o acompanhassem, e cavalgou em direção à uma das pontas do campo.– Sidi… – O escudeiro aproximou-se e, desmontando, parou em pé ao seu lado. – Ouvi comentários de que Aaron é um dos melhore
De volta à biblioteca no palacete, Ibn Russud havia sido chamado e estava parado em pé ao lado de Yasi, que se sentava com os cotovelos apoiados sobre o tampo da mesa e esfregava as mãos no rosto com um ar desconsolado.–No coração dos homens há um deserto, onde ventos sopram devastando tudo – o médico disse. – Ódio, egoísmo, cobiça… Apenas o amor pode contê-los. O amor é como uma rosa entre as dunas de areia. É um milagre! E não há como se opor a ele, porque quem ama tem a alma tomada por um deus e aceitará até mesmo a morte se for preciso.– Mas e a honra? Família? A fé? – Yasi suspirou, encarando-o, a testa franzida em uma expressão angustiada.– O amor é ma
Algumas milhas além de Córdoba, entre as colinas e prados de grama alta, tendas, fogueiras e uma aglomeração de cavalos e homens armados formavam o acampamento do exército.Os mercenários os haviam acompanhado até perto e depois retornado pela estrada, provavelmente esperando alguns passantes incautos que pudessem assaltar ou molestar.Não eram mais do que bandidos, Aaron pensava, com o cenho cerrado aos vê-los darem às costas e afastarem-se. A antiga fúria ardeu em seu peito, e ele percebeu que já não odiava mais indiscriminadamente como antes. O ódio o iludira e o fizera considerar todos os árabes como inimigos, mas agora sabia ser isso uma mentira. Árabes ou castelhanos, não importava. Homens sem honra de ambos os lados viviam apenas em causa própria em busca de prazer e dinheiro.