Nas Sombras do Crepúsculo
Nas Sombras do Crepúsculo
Por: Skylar K. Shawn
Prólogo

O disparo estilhaçou a quietude da manhã, ecoando pela clareira como um trovão. Por um instante, o tempo pareceu suspenso — até o canto dos pássaros sumiu, engolido por um denso e expectante silêncio.

A floresta transformou-se num teatro de tensão.

Os mercenários avançavam em passos medidos, dedos nos gatilhos, olhos varrendo a vegetação em busca do menor sinal de vida, cada sombra parecendo esconder uma ameaça, cada galho quebrado, uma armadilha.

No entanto...

— Ele está morto — declarou um deles, sua voz resoluta, quase satisfeita. — Ninguém sobrevive a um tiro tão certeiro.

Mas quando chegaram ao local onde Tupã caíra, encontraram apenas folhas amassadas e lama salpicada de vermelho.

— Onde ele está? — perguntou outro, o tom carregado de tensão.

O líder do grupo, um homem de rosto endurecido e cicatrizes profundas, estreitou os olhos, estudando o ambiente em volta.

— Se escafedeu! — Sua voz era grave, carregada de frustração. — Olho vivo! Esse desgraçado não é como os outros macacos!

Entre as sombras da floresta, Tupã deslizava como um espectro, seu corpo colado ao chão, escondido entre raízes e arbustos, cada movimento uma luta contra a dor latejante em seu peito, insistente como uma segunda pulsação.

O tiro não o matara, mas deixara sua marca: uma ferida na lateral do corpo que sangrava devagar, ameaçando roubar-lhe as forças gota a gota.

Ao seu redor, a floresta parecia respirar, sussurros ecoando em sua mente, palavras incompreensíveis que, no entanto, o guiavam como uma invisível bússola. Raízes se torciam para abrir caminho, folhas caíam para cobrir seus rastros, e as sombras se estendiam. Como mantos protetores.

Com mãos trêmulas, ele cobriu a pele com lama e folhas úmidas, tentando sufocar o cheiro do sangue que poderia delatá-lo. A respiração era pesada, quase um rugido nos ouvidos, mas nos olhos brilhava uma chama obstinada — a promessa de que não cairia ali, não enquanto pudesse rastejar.

— Ainda não — murmurou ele para si mesmo, a voz rouca e tensa. — Ainda não acabou.

Um lampejo de escuridão e dor.

E então, suas percepções começaram a oscilar. Entre o presente e algo além, flashes de luz dourada invadiam sua mente. Ele via árvores gigantescas que pareciam alcançar os céus, figuras indistintas que o observavam, os olhos brilhantes, e sussurros ancestrais que ecoavam como canções de tempos esquecidos.

A floresta não era apenas seu escudo — era também seu juiz. Cada passo, cada obstáculo, parecia fazer parte de um teste oculto, uma prova que ele ainda não compreendia por completo.

Após uma caminhada que se arrastava como uma eternidade, suas forças o traíram. As pernas cederam, e ele desabou ao lado de uma formação rochosa, onde o musgo cobria as pedras como um tapete úmido. Foi então que a visão surgiu: uma gruta escura, sua entrada semioculta entre sombras e raízes retorcidas.

A cavidade parecia sussurrar seu nome, convidando-o com uma promessa ambígua de abrigo. Um refúgio duvidoso, sim, mas o único à sua frente.

Ao despertar, Tupã notou que não estava mais sozinho.

Pequenas criaturas o rodeavam, seus olhos brilhando como vaga-lumes. Suas peles lembravam cascas de árvores, e seus movimentos eram velozes e curiosos. Eram os Chaneques, pensou Tupã, os travessos protetores espirituais da floresta. Apesar de sua aparência peculiar, Tupã sentiu que não havia ameaça neles.

E então ele a viu.

Uma figura alta e graciosa emergiu das sombras, quase etérea em sua presença. Ela era deslumbrante, cabelos que pareciam feitos de folhas douradas e olhos que brilhavam como a luz da lua. Sua pele tinha o tom das árvores ao entardecer, e sua postura era ao mesmo tempo imponente e serena.

— Tu chegaste até aqui, guerreiro — disse ela, sua voz suave como o vento entre os galhos. — Mas algo me diz que tua jornada não terminará sem consequências, ó escolhido.

Tupã tentou se mover, mas a dor em seu corpo o prendeu ao tecido de junco que revestia o chão musgoso.

— Quem és tu? — ele perguntou, sua voz fraca, mas carregada de curiosidade.

— Eu sou Ceiba, guardiã das árvores sagradas e mãe desta floresta. — A dríade ajoelhou-se ao lado dele, seus olhos fixos nos dele. — Tu fostes escolhido pela própria terra para cumprir um destino maior.

Conforme falava, Ceiba estendeu a mão sobre o ferimento de Tupã. Ele sentiu um calor profundo espalhar-se por seu corpo, como se a energia da floresta fluísse por suas veias.

— Estás gravemente ferido — continuou ela, sua voz calma, mas firme. — Eu posso curá-lo, plenamente. Mas há um preço.

Tupã franziu a testa, seus pensamentos turbilhonando.

— Que preço?

Ceiba inclinou-se para mais perto, os olhos dela refletindo algo antigo e insondável.

— Tornar-se meu Dryan. Um guardião eterno da floresta, ao meu lado, cuidando das árvores e das terras sagradas. Tua vida será dedicada a proteger o equilíbrio, e tua alma será atada à minha para sempre.

As palavras dela pairaram no ar, carregadas de uma gravidade que fez o coração de Tupã vacilar.

— Eu não posso — disse ele finalmente, a voz entrecortada pela dor e pela emoção. — Tenho uma missão. Tenho alguém que preciso proteger.

Ceiba sorriu suavemente, mas havia tristeza em sua expressão.

— O amor é uma força poderosa, guerreiro. Mas a floresta também é tua família. Sem ela, tu não sobreviverás. Nem aqueles que tu amas.

Os Chaneques em volta murmuraram em concordância, seus olhos fixos em Tupã, como se esperassem sua decisão.

Ele fechou os olhos, sentindo o peso esmagador da escolha à sua frente. A floresta havia sido sua aliada, seu refúgio. Mas a ideia de abandonar Yara, de renunciar sua missão, era um sacrifício que ele não sabia se poderia suportar.

A tensão no ar era quase tangível, o destino de Tupã pendendo por um fio.

Ele intuía que, qualquer que fosse sua escolha, nada jamais seria o mesmo.

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