Cap 2. Encontro?

Gustavo

Quinta feira de noite e mais uma vez viramos a noite trabalhando. Isso já estava ficando cansativo.

Quando pensamos em abrir uma empresa eu sempre pensei que eu seria o CEO de filmes, andando com carros esportivos, ternos, relógios caros, mulheres e tudo mais, mas a única coisa que fazemos agora é trabalhar mais do que antes. 

— Vou dormir um pouco em casa. — Eu disse cansado olhando para o relógio que já marcava quase cinco da manhã.

Felipe e Rafael, meus dois sócios me olharam sem importância.

Felipe era meu amigo desde a primeira série, crescemos juntos e não vejo minha vida longe dele. Rafael nós conhecemos na época da faculdade e estamos junto até hoje.

Quando decidimos montar uma empresa de TI, pensamos que seria muito fácil, mas isso virou noites e noites trabalhando para entregar os projetos e pagar as contas.

Não tínhamos funcionários ainda, porque o dinheiro mal pagava as nossas despesas. Por isso também que eu dividia um apartamento com o Felipe e Rafael ainda morava com os pais.

— Gustavo, você também recebeu uma carta da nossa antiga escola? — Me perguntou Felipe quando me levantei para tomar uma água.

— Sim, parece que eles vão ter um dia de ex-alunos. — Dei de ombros desinteressado.

— Ex-alunos? Nunca vi isso no Brasil. — Comentou Rafael pensativo.

Estávamos no nosso escritório que estava de pernas para o ar. Rafael e Felipe estavam dividindo uma mesa e eu estava dividindo a mesa com as caixas.

Tínhamos que nos mudar logo e a nossa ideia era pegar algo mais bem localizado e que desse credibilidade ao nosso negócio.

— É um dia em que alguns ex-alunos vão falar como estão bem na vida para que os mais novos tenham esperanças de não morrer de fome. — Brincou Felipe nos fazendo rir.

— E vocês foram convidados para palestrar? — Perguntou nosso amigo incrédulo com a boca aberta.

— Não, mas alguns já aproveitaram isso para organizar um reencontro da turma. Vão dar uma festa. — Dei de ombros. Eu não tinha a menor vontade de ir.

Não tenho boas lembranças do ensino médio.

— E nós vamos, é claro. — Felipe disse confiante.  

— Me exclua disso! — Pedi na mesma hora pegando meu casaco.

— Você vai. Têm muita gente ali que precisamos rever e esfregar na cara que temos uma empresa só nossa. — Felipe parecia doido por encrencas.

Eu teria que viajar para a nossa cidade natal para isso. Não temos nem tempo nem dinheiro.

— Uma reunião dessas deve ser divertido. — Rafael comentou animado. — Sempre me perguntei o que a galera do ensino médio se tornou na vida.

— Você pode vir conosco. — Felipe sugeriu animado.

— Eu não vou! — Eu disse mais uma vez.

— Claro que você vai. Alicia vai estar lá.

Alicia é uma prima do Felipe que eu dei uns beijos na época da escola e hoje está noiva de um mauricinho que estudava conosco. Um cara que não perdia uma oportunidade de nos zoar e nos tirar do sério.

— Faz anos que não vejo a sua prima.

— Exato. Ela te trocou pelo Pedro. — Ele reclamou com uma careta e Rafael parecia animado com a conversa. 

Ele já tinha ouvido tudo sobre o Pedro, capitão do time de futebol da escola que tinha um pai rico. Ele só estava na escola pública, pois repetiu de ano na escola chique dele e o pai o colocou em uma pública para aprender uma lição.

— Você não pode deixar o Pedro pegar a sua garota. — Brincou Rafael se divertindo as minhas custas.

— Alicia nunca foi "minha garota". Só demos uns beijos no ensino médio e nem chegou a um mês. — Tentei explicar pela milésima vez.

Já tínhamos tido essa conversa antes e todas as vezes ela não terminava muito bem para mim.

— Ninguém beija um de nós e depois fica noiva de um mauricinho. Temos que dar uma lição neles. — Felipe insistiu.

— E a lição seria ir lá e dizer "Estou com várias dívidas e não consigo nem pagar o aluguel direito, mas uai, eu tenho uma empresa." — Brinquei fazendo os dois expressarem uma careta. 

— Você pode aparecer com uma mulher bem bonita e esfregar na cara deles. — Felipe insistiu mais uma vez.

E o que isso iria resolver? Aliás, não tenho nada para me vingar ou querer mostrar alguma coisa para aquele idiota.

— E ainda pode usar isso para tirar seus pais do seu pé sobre o assunto. — Emendou Rafael animado com o rumo da conversa.

— Quantas vezes eu tenho que falar que namorar dá muito trabalho? Mulheres são confusas e você têm que ser romântico o tempo inteiro e ficar dando satisfação de tudo. — Resmunguei enumerando os problemas femininos.

— Você nunca achou a pessoa certa. Só isso. — Rafael me encorajou e revirei os olhos.

— Você pode arrumar alguém legal, sem compromisso. — Se apressou a dizer. — E podemos falar para a sua mãe que você está perdidamente apaixonado, assim vai finalmente parar de pensar que você é gay. — Felipe sugeriu.

— Não tenho problemas com ela pensando que sou homossexual. — Declarei. — Tenho dois amigos gays e ela gosta mais de vocês do que de mim. — Confessei e eles deram de ombros como se aquilo não fosse nada.

Eu não estava mentindo. Ela realmente gosta mais deles.

— Mesmo agora que ela começou a te apresentar os filhos das amigas? — Me lembrou Rafael e fiz uma careta.

Minha mãe acha que como nunca apresentei nenhuma namorada para eles, que eu sou gay e de uns tempos para cá ela começou a me apresentar os filhos homens das amigas dela. Acho que tentando me arrumar um encontro.

— Eu vou para casa dormir duas horas e já volto. — Dei o assunto por encerrado. — E nada de encontros. — Completei antes de sair e bater à porta atrás de mim e escutei a risada dos meus amigos.

Era para ser uma saída triunfal, mas foi mais para meus amigos rindo da minha cara e eu com uma careta lembrando do filho da vizinha que minha mãe me apresentou na Páscoa.

Assim que cheguei em casa me joguei na cama e dormi por três horas antes do relógio tocar e eu ir tomar um banho para voltar ao trabalho.

Nosso apartamento estava uma bagunça, acho que não limpamos a casa de verdade faz pelo menos duas semanas e já vejo cuecas do Felipe pelo chão.

Essa vida de CEO não está muito boa. Quando os carros esportivos e ternos caros vão chegar? Parar de pegar o metrô lotado no horário de pico já ajudava.

Corri para o centro da cidade, de metrô, porque não tenho dinheiro para um táxi e pagar estacionamento todos os dias fica muito caro.

Hoje tínhamos que fazer uma visita a um escritório na paulista, onde achávamos que o aluguel iria valer a pena trazendo mais clientes por causa da localização.

Quando cheguei no prédio Felipe já estava saindo e tirando a gravata parecendo desconfortável.

— Desculpe, dormi um pouco mais do que o previsto. — Me desculpei envergonhado, mas Felipe dispensou minhas desculpas com um gesto.

— Já vimos o escritório e gostamos. Vamos fechar. — Ele parecia animado com a informação e assenti.

Eles sabiam o que estavam fazendo e eu confiava totalmente neles para qualquer coisa.

— E Rafael? — Perguntei o procurando ao redor.

— Foi para uma reunião com um potencial cliente. 

Fomos juntos almoçar em um restaurante bem simples e que a comida era tragável e barata ali perto, afinal, avenida Paulista é tudo muito caro ou fastfood e Rafael se juntou a nós quando estávamos terminando.

— Deu certo? — Perguntei assim que ele se jogou na cadeira ao nosso lado.

— Sim, mas o projeto vai ser puxado. — Ele respondeu e fiz uma careta desanimado antes de roubar uma batata frita do seu prato.

— Uma notícia boa sempre vem acompanhada de uma ruim. — Reclamei mais comigo mesmo do que com eles.

Prevejo mais e mais noites sem dormir em um futuro próximo.

— Nós temos uma notícia boa e que não tem notícias ruins envolvidas. — Felipe comentou animado e logo Rafael abriu um sorriso.

— Manda! — Pedi animado comendo a última batata.

— Arrumamos um encontro para você. — Felipe me respondeu animado e meu sorriso murchou na mesma hora.

Ele realmente disse mesmo a palavra "encontro"?

— Me diz que você está brincando. — Pedi frustrado olhando de um para o outro sem acreditar nos meus ouvidos.

— Ele não está brincando. Ele já até falou com a pessoa por mensagem de texto. — Rafael respondeu olhando o cardápio fingindo interesse e parecendo se divertir com aquela conversa.

— Vocês me inscreveram em um site de encontros? — Perguntei irritado.

Eles não tinham esse direito. Eu não quero mulher no momento. Já tenho muito com o que me preocupar.

— Claro que não. Você nos mataria se fizéssemos isso. — Felipe respondeu dramático ainda com um sorriso no rosto e me deixou mais aliviado. — Achamos um anúncio muito bom de encontro lá no prédio que visitamos e achamos que era a solução perfeita para o seu problema.

— Mas que merda de problema eu tenho? — Perguntei ignorando a parte de uma maluca que deixou um encontro em um prédio na avenida Paulista.

— Você não pode ir à festa da escola sozinho. — Felipe explicou como quem fala com uma criança.

E com essa frase me senti com quinze anos novamente, tentando arrumar alguém para a formatura porque a pessoa que eu queria levar não estava mais falando comigo.

— Eu não me importo. — Respondi sobre a festa. Eu nem queria ir. — Cancele com essa maluca. Que mulher em sã consciência iria se submeter a isso? — Perguntei mais para mim mesmo do que para eles.

— Uma com amigas tão malucas quanto nós. — Rafael respondeu com um sorriso malicioso e fiquei curioso. — Não tinha foto, nome nem nada sobre ela. Só um número de telefone.

— Estou falando com a amiga dela. — Felipe mostrou o celular em um perfil sem foto, mas não me deixou pegar para ver a conversa.

Ótimo que arrumaram uma maluca e com amigas que precisavam estar em manicômio. 

Maluca ou desesperada. Prefiro pensar que é maluca, porque as desesperadas são as piores. Grudentas e só sabem falar do gato.

— Cancele! — Pedi mais uma vez tentando fazer minha pior cara. — Sem contar que quem iria querer sair daqui e ir passar o final de semana em outro estado para um encontro as cegas? — Perguntei não querendo olhar a conversa no celular dele.

— Ela disse que isso não vai ser um problema. — Felipe deu de ombros ignorando meu pedido. — Ela também não pediu seu nome e foto, então vai ser as cegas para todo mundo. 

— Eu não vou sair com uma desconhecia que deve ser ou incrivelmente chata ou terrivelmente feia. — Reclamei jogando o guardanapo na mesa para fazer drama, mas só consegui fazer os outros dois rirem.

— Acho que você não tem mais escolha. — Rafael comentou abrindo a conversa do Felipe no celular e mostrando que eles já tinham combinado até mesmo o local e horário que iriamos nos encontrar.

Amigos como eles eu não preciso de inimigos.

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