Capítulo 2

Kathy

Ouvir o despertador estava sendo uma tortura.

No último mês estive dormindo no máximo cinco horas por noite e com muito custo Lissa me convenceu a ficar na boate, a primeira semana eu terminava meu expediente na lanchonete e ia direto para a boate para ensaiar os passos na barra de pole dance, os primeiros dias foram desastrosos e voltava para casa cheia de contusões pelo corpo devido aos diversos tombos que tomava tentando me equilibrar numa sandália de salto enorme para depois tentar me equilibrar na barra.

Meus ensaios eram aguardados, pois arrancava risadas em todos que trabalhavam ali, inclusive de Lissa, que me dava total apoio e me fazia acreditar que conseguiria aquele feito impossível. Comecei a me apresentar após quinze dias de treinamento. Quando subi naquele palco no primeiro dia, a única coisa que eu queria era sair correndo, me sentia como um pedaço de carne exposto a lobos famintos, mas no final da noite todo aquele constrangimento foi recompensando e o valor que consegui era o triplo do que ganhava de gorjetas na lanchonete.

Os dias foram passando e estava me familiarizando com aquele ambiente, as meninas que trabalhavam lá eram legais e estavam sempre dispostas a me ajudar. Rick, o dono, era ranzinza e tratava todas como mercadoria, a nossa sorte era ter Dona, a dançarina aposentada que nos ensaiava e que claramente tinha um caso com Rick, ela era bondosa e sempre discutia com ele para nos defender.

Lissa era quase uma estrela do lugar, tamanho foi meu choque quando ela me contou que saia com alguns caras que frequentavam o local por uma quantia significativa de dinheiro, algo que eu nunca seria capaz de fazer.

Na minha primeira semana dançando tive o desprazer de conhecer Hector ele era um cara visivelmente atraente, alto, porte atlético, de cabelos loiros e olhos de um azul hipnotizante, sempre dava gorjetas altas e segundo Philip, ele era um homem poderoso e a garota que abrisse a as pernas para ele ganharia na loteria.

No começo pensei que ele fosse um cara legal, sempre com um sorriso simpático, porém, tudo mudou no dia que ofereceu uma quantia significativa para que dormisse com ele, e quanto me recusei, Hector me agarrou enquanto me xingava de vadia suja. Foi necessário que Theo, um dos seguranças para contê-lo, nos dias que se seguiram a situação foi ficando pior, ele fazia questão de me tocar no meio das apresentações e eu sabia que de nada adiantaria falar com Philip.

Na verdade, tudo que mantinha ali era o dinheiro. Estava exausta, mas continuava pelo simples fato de saber que aquele dinheiro estava pagando o aluguel e logo em poderia custear mais um mês no tratamento de Maddie e quem sabe até me mudar para um lugar melhor.

Não fui capaz de contar para minha mãe como estava conseguindo o dinheiro que estava nos dando esperança. Não que ela fosse julgar o meu trabalho como dançarina, contudo, era melhor que ela acreditasse que eu trabalhava como hostess de um famoso restaurante, era uma desculpa para chegar bem maquiada em casa e a encontrava acordada por causa das dores.

— Bom dia, mamãe. Acordada a essa hora? — falei enquanto passava rapidamente por minha mãe no corredor e procurava pelo carregador do meu celular.

— Acordei as quatro horas e não consegui pegar no sono novamente — Se aproximou depositando um beijo em minha bochecha.

— Mamãe, à senhora tem sentido alguma dor? — questionei e guardei o carregador na bolsa.

— Não, tem dias que não sinto nada — mentiu. Eu a conhecia bem o suficiente para saber quando ela escondia suas dores de mim para não me preocupar — Fiz café — disse e foi em direção a cozinha.

— Está faltando algum remédio? — conferi o horário.

— Não, querida. Ainda tenho todos.

— Maddie está bem? — senti o coração apertar, pois nos últimos dias não tinha me encontrado com minha irmãzinha, ela estava dormindo quando eu saia assim como quando chegava.

— Ela fala o dia todo de você, acho que tem sentido sua falta.

— Esse final de semana ficarei em casa, tenho ganhado muitas gorjetas — menti, abaixando o olhar e me senti mal por enganá-la. O que ela pensaria de uma filha que dança seminua para homens de todas as idades?

Por mais que fosse difícil fazer tudo aquilo, no final valeria a pena. Eu poderia dar uma vida melhor para elas e quem sabe até ter uma.

— Preciso ir, mamãe — fui até ela e lhe dei um beijo na bochecha — Qualquer coisa me ligue! — gritei antes de fechar a porta atrás de mim.

Nos últimos dias eu cochilei todo o percurso até chegar aos Dick's, por sorte nunca havia parado em outro lugar. O dia estava nublado, e diferente da maioria das pessoas, eu amava dias assim e por um momento acreditei que o universo estava conspirando ao meu favor. Mesmo com toda correria, ainda fazia questão de cumprir todos os meus horários na lanchonete, as gorjetas diminuíram muito, mas não estava disposta a abrir mão do que ganhava ali.

Eram quase seis e meia quando terminei o meu turno na lanchonete e me preparei para ir para a boate, meu corpo estava dolorido devido ao esforço e a falta de descanso dos últimos dias.

Lissa havia deixado o trabalho no Dick's e estava ganhando muito mais na Ange Sensuel. Ainda ganhava muito saindo com alguns caras ricos e ficava preocupada com o fato dela sair com homens tão poderosos, tinha medo de que algum deles pudessem lhe fazer mal.

Eu esperava o ônibus ouvindo It's My Life de Bon Jovi quando um Mercedes branco com vidros escuros parou quase em cima da calçada me deixando assustada, o vidro fumê desceu lentamente e tamanha foi minha surpresa ao ver quem o conduzia.

— Gatinha, entra aí — Lissa abriu a porta do passageiro enquanto eu tentava raciocinar como ela estava em um carro como aquele.

— Ei, entra. Vamos juntas para a Ange.

Antes que ela começasse a gritar, entrei e me sentei. O banco de couro era tão confortável que eu poderia dormir ali sem problema algum.

— Gostou? — perguntou se referindo ao carro enquanto acelerava, me fazendo procurar rapidamente pelo cinto de segurança.

— Sim, é lindo, quando o comprou? — perguntei curiosa.

— Amiga, Fred me deu. Acredita?! — Fred, esse era o nome do cara com quem ela estava saindo, ele era frequentador assíduo da boate e pelo que ouvi, era dono de uma enorme rede de bancos do estado, parecia ser um cara legal, senão fosse pelo fato de ostentar uma aliança de ouro enorme na mão esquerda.

— Ele simplesmente me deu com um enorme laço vermelho em cima, ainda não estou acreditando! Acredita que ele se ofereceu para pagar a minha faculdade?

— Uau! — foi tudo o que consegui dizer. Lissa era minha única amiga naquela cidade e me preocupava com sua segurança, sair com homens casados não me parecia muito seguro.

Assim que chegamos à boate fomos direto para o camarim fazer nossa maquiagem e penteados. Sempre coloquei a peruca azul e usá-la me fazia acreditar que era outra pessoa quando estava no palco, uma outra eu.

— E então, o bonitão que te secou não apareceu mais? — perguntou enquanto colocava um cílio postiço fazendo-me lembrar do único cara que me chamou a atenção desde o dia que comecei a trabalhar ali.

— O que? Quem? — Me fiz de desentendida enquanto pressionava o spray fixador de maquiagem no rosto, não queria falar sobre o homem que conseguiu mexer comigo com um simples olhar.

— Não se faça de sonsa, Kath. Eu sei que você ficou interessada, senão tivesse, você não teria comentado comigo — Me olhou com deboche. Não me interessei de fato, até porque nenhum homem me despertava interesse desde o desastre com Eddie, não gostava de me lembrar de um dos piores dias da minha vida e do quanto ele havia sido babaca ao me deixar ir para o hospital sozinha após ter tirado a minha virgindade e por terminar comigo por mensagem no dia seguinte.

Sim, o homem era bonito, não podia negar, parecia ser bem mais velho que eu, mas tinha um charme inegável e uma aparência máscula. O rosto era quadrado com maxilares desenhados assim como a boca e um nariz proporcional. Os seus cabelos eram castanhos penteados para trás e sua pele era levemente bronzeada, não pude prestar muita atenção ao seu corpo, mas com toda certeza era um homem forte.

Naquela noite nossos olhares se cruzaram enquanto me movimentava na barra e o que foi simplesmente diferente, porém, em questão de segundos ele desviou o olhar, foi em direção ao fundo da boate com uma postura altiva e arrogante que me fez acreditar que ele não era do tipo que se interessava por dançarinas de pole dance.

Balanço minhas cabeça para espantar esses pensamentos, provavelmente não vou vê-lo novamente.

Me concentrei na minha fome e no quanto meu estômago estava doendo. A última vez que havia comido algo foi no meu intervalo, não comprava comida na rua para economizar e mamãe sempre deixava o meu jantar na geladeira para esquentar quando chegasse. Peguei uma barra de cereal que já estava a um bom tempo na minha bolsa e comi, aquilo tinha um gosto horrível, mas faria com que aguentasse até o momento de chegar em casa e não desmaiar no palco.

— Blue, já vamos começar — Georgia disse, uma das garotas que também dançava ali. Blue era o apelido que Philip usava ao se referir a mim por causa da peruca azul e da mecha da mesma cor no meu cabelo.

Subi no palco e comecei a minha performance. Eu buscava ser o mais sensual possível, mas todas as vezes que algum homem se aproximava para me tocar, automaticamente ficava tensa e limitando os meus passos de dança na barra.

Estava no meio de uma dança quando Hector chegou e se aproximou do palco com um sorriso nefasto no rosto, ele parecia mais alterado que o normal, a maneira como me olhava me dava calafrios, e para o meu azar a boate estava praticamente vazia sendo o único a ficar próximo do palco assistindo a minha apresentação.

Olhei para Dona, ela assentiu com a cabeça permitindo que eu deixasse o palco. Logo que desci da barra senti a mão de Hector agarrando meu calcanhar e me fazendo cair sentada.

— Você vem comigo, garota. Não vou mais esperar para enterrar meu pau nessa sua bundinha, não se faça de difícil — Sua voz soou amedrontadora e aquelas palavras me fizeram sentir calafrios — Esse joguinho de se fazer de difícil não faz mais sentindo.

Ele me puxou e me tirou do palco. Olhei ao redor e vi que nenhum dos rapazes da segurança se movia. Tive a certeza de que ninguém viria me ajudar. Philip havia deixado claro que Hector era importante demais para ser contrariado, olhei em direção aos palcos a procura de Lissa que por azar não dançava no momento.

— Me solte! Me deixa em paz, por favor! — gritei, tentando me soltar do seu aperto em meu braço.

— Chega de joguinhos, Blue, não vai ser de graça. Vou te pagar muito bem — Ao ouvir aquelas palavras a minha única reação foi fechar minha mão livre e desferir um soco em seu nariz.

— Sua vadia! Vou te dar uma lição! — levou a mão ao nariz limpando o sangue que escorria.

— Me solta, Philip, por favor! — As lágrimas escorriam pelo meu rosto e a essa altura minha maquiagem devia estar borrada.

— Acho que seria interessante que o senhor soltasse a garota — Uma voz grave fez com que me virasse e dei de cara com o "cliente bonitão" como Lissa havia o apelidado com uma cara de poucos amigos.

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