Jeff
Desci do carro e para minha sorte a chuva havia diminuído. Ela percebeu minha aproximação e se levantou rapidamente, passou a mão pelo rosto para esconder as lágrimas e borrou ainda mais a maquiagem carregada que usava.— Fica longe de mim — falou com a voz trêmula e raivosa.— Ei, fica tranquila, só quero conversar. — disse tentando acalmá-la.— Não tenho nada para conversar com você — respondeu grosseiramente. Foi quando mais uma vez tive o deslumbre dos seus olhos, eles tinham uma cor indecifrável, castanhos com alguns tons esverdeados que no momento faiscavam.— Qual o seu nome? — perguntei.— Blue — respondeu cruzando os braços e cobrindo a estampa engraçada da sua blusa amarela que não consegui decifrar.— Seu nome de verdade. Acho que ninguém se chame Blue — falei coçando a nuca e tentando ser descontraído.— A filha da Beyoncé se chama Blue — cruzou os braços — Cara, o que você quer comigo?— No momento, só saber o seu nome.— Olha, se você quer que eu te agradeça por ter me defendido lá dentro, já te digo que não vai rolar — Ela abriu a bolsa e começou a procurar por algo.— Mas se eu não tivesse impedido...— Toda essa confusão me fez perder o emprego e tenho uma mãe e uma irmã doente para cuidar. Então, se você não tivesse se metido, eu ainda teria o meu emprego.— Garota, aquele imbecil estava te machucando, só quis te ajudar — tentei argumentar.— Que bela ajuda, não é mesmo? — deu uma risada debochada.— Podemos conversar em outro lugar? Acho que posso te ajudar.— Eu não vou a lugar algum com você — empinou o nariz.— Acho que você deve ter percebido que não tenho intenção alguma de te fazer mal. Poderia me dar um voto de confiança pelo menos? — senti a chuva antes fina começar a engrossar — Vamos conversar em outro lugar, te garanto que você está segura comigo. Meu nome é Jeff Sparting, pode pesquisar sobre mim no G****e, te garanto que vai estar segura comigo.— Podemos conversar aqui. O que você quer? — A chuva se intensificou.— Aqui? Você tem certeza? Vamos acabar pegando um resfriado.— Certo, vou com você — disse passando por mim e batendo seu ombro contra meu braço — Mas vou deixar uma coisa bem claro... — Se virou para mim — Eu não vou transar com você.Não pude conter o riso. A última coisa que queria com aquela garota era sexo. As palavras de Rick e mamãe sobre levar alguém para mostrar para Bervely que estava bem havia entrado na minha mente e eu estava prestes a pagar aquela garota para que ela fingisse ser minha namorada. O objetivo real não era só mostrar para Bervely que eu estava bem com outra pessoa, era fazer com que ela sentisse ciúmes e percebesse o quanto ainda me amava.— Pode confiar em mim, aquele é o meu carro, pode tirar foto da placa e enviar para alguém de confiança — apontei para o meu Porsche.Ela me olhou desconfiada, mas caminhou comigo até o carro.— Entre — falei após destravar o carro e ela me olhou desconfiada mais uma vez.— Só posso estar ficando louca — bufou, abriu a porta e entrou.Ela se encolheu no banco e era perceptível o seu desconforto.— Pode confiar em mim, não vou te fazer mal — comentei na esperança de que ela relaxasse.— Katherine — murmurou.— O que? — questionei.— Meu nome é Katherine, mas pode me chamar de Kath, meu nome é grande demais — disse sem me olhar e colocou o cinto de segurança em seguida.— Muito prazer, Katherine. Sabe de algum lugar aqui perto que podemos conversar? — perguntei dando partida e manobrando para sair dali. Fiquei satisfeito por ela ter me dito o seu nome, era sinal de que estava se sentindo um pouco mais segura na minha presença.Ela deu de ombros, pegou o celular e começou digitar.— Pode ser no Burger King que fica logo no final da outra rua. Estou com fome.Assim que descemos no restaurante, percebi que ela tremia de frio, pensei em lhe dar o meu blazer, porém, me lembrei que ele estava ensopado devido à chuva que tomei ao sair da boate.— Podemos sentar ali? — perguntou apontando para um canto mal iluminado da lanchonete.— Podemos sim, claro.— Você vai comer? — me encarou e pude ver melhor o seu rosto devido a iluminação do local que não era muito boa, mas em comparação com as luzes da boate, estava ótimo.Era uma garota bonita, tinha um olhar marcante que casava perfeitamente com seu rosto fino simétrico e sua boca rosada delineada naturalmente. E mesmo com a maquiagem borrada, ela ainda chamaria a atenção por onde quer que passasse. Percebi que minha ideia não seria tão ruim, com certeza Bervely ficaria incomodada com a beleza da garota e surtaria de ciúmes.— Ei cara, te perguntei se você vai comer — disse me dando um tapa seco no braço.— Não, eu não estou com fome — passei a mão por cima de onde ela me acertou, a garota tinha uma mão pesada.— Certo, então você pode sentar lá e guardar o meu lugar — falou entrando já fila onde havia apenas um garoto de uns quinze anos na sua frente.— Pegue, é só aproximar da máquina de cartão — saquei o meu cartão da carteira para que ela pudesse pagar pelo o que comprasse.— O que isso? — questionou.— É o meu cartão para você pagar — estendi em sua direção novamente.— Ficou doido? Eu posso pagar pelo meu lanche! Vai se sentar antes que alguém pegue o lugar!Achei melhor não discutir, caminhei até a mesa indicada e me sentei sobre a cadeira de plástico. Não me recordava de como era uma rede de fast-food, a última vez que frequentei um lugar como aquele eu ainda era um adolescente.Esperei por alguns minutos até ela surgir com uma bandeja com batatas fritas, um hambúrguer de tamanho generoso e uma pepsi. Sem cerimônia alguma ela pegou o hambúrguer e deu uma mordida satisfatória.— Você pode me falar a sua idade? — perguntei fazendo uma prece aos céus para que ela fosse maior de idade— Tenho 19, quase 20. Por que? — respondeu com a boca cheia e eu quase sorri aliviado.— Apenas fiquei curioso.— Sei, e você? Qual sua idade?— Tenho 35.Ela me fitou com os olhos arregalados enquanto mastigava, pensei que ela fosse dizer algo pela reação, contudo, ela deu outra mordida no hambúrguer.— Então Katherine, você pode me falar um pouco mais da sua mãe e irmã? — Quis quebrar o gelo.— O que quer saber? — deu um gole no refrigerante.— Você disse que elas estão doentes. O que elas têm?— Minha mãe tem "ELA" Esclerose lateral amiotrófica e minha irmã tem leucemia. Com o dinheiro que eu ganhava trabalhando na Ange, ia conseguir custear o tratamento das duas.— Você gostava de trabalhar naquele lugar? — perguntei curioso pela sua resposta.— Na Ange? — soltou uma risada melodiosa — Não, nem um pouco, mas as gorjetas eram ótimas, não sei o que vou fazer agora — abaixou o olhar.— Sinto muito — Foi a única coisa que consegui dizer. No fundo, acho que ter perdido aquele emprego foi a melhor coisa que aconteceu. Era visível a sua infelicidade em estar dançando na frente de homens que a viam como uma mercadoria.— Sabe, o dinheiro não está fácil, minha mãe não pode trabalhar mais por causa das dores — molhou uma batata no catchup — Ela era uma ótima costureira, antes não sobrava dinheiro para os remédios, porque ela dizia que os de Maddie eram prioridade, mas no último mês consegui comprar todos com o que ganhei dançando.— Maddie? É a sua irmã? Que idade ela tem? — perguntei sentindo um aperto no peito, ela não era só uma garota como qualquer outra. Katherine certamente já havia passado por coisas que nenhuma outra da sua idade sequer pensou em passar.— Ela tem oito e é muito inteligente. Você quer? — Me ofereceu a metade do sanduíche mordido ainda com a boca cheia. Sua irmã tem a idade que Marianne tinha quando partiu, saber disso fez com que eu ficasse ainda mais interessado em ajudá-la.— Não, obrigado. Estou tentando não comer carne — respondi e ela voltou a comer.— Eu tentei ser vegana uma vez, mas desmaiei no segundo dia — limpou o resquício de molho no seu rosto com um guardanapo de papel — Você disse que poderia me ajudar. Como?— Tenho uma proposta para te fazer.— Eu disse que não vou transar com você — fechou a cara e fez menção de se levantar.— Calma, Katherine — toquei seu braço — Minha proposta não envolve sexo. Eu quero contratar você para um tipo diferente de trabalho.— Não estou gostando disso.— Me deixe terminar, por favor — praticamente implorei — Quero contratar você para que finja ser minha namorada e me acompanhe em alguns eventos.— Você é maluco — balançou a cabeça e gargalhou.A encarei seriamente.— Você está falando sério?Balancei a cabeça positivamente.— Você já se olhou no espelho? É o tipo de cara que não precisa pagar ninguém para fingir ser sua namorada, você pode conseguir uma namorada num estalar de dedos.— Não quero uma namorada de verdade, quero alguém que finja.— Acho que tem álcool nesse refrigerante — olhou para o copo.Respirei fundo e contei toda minha história com Bervely, falei do quando ainda amava minha ex-mulher, do quanto estava arrasado por ela estar noiva de outro e que precisava de alguém para fazê-la sentir ciúmes.Ela ouviu tudo com uma expressão enigmática e parecia se segurar para não rir em alguns momentos.— Não seria mais fácil você ir atrás da sua ex-mulher e pedir para ela não se casar? — levantou a sobrancelhas como se estivesse dizendo o óbvio.— Eu tentei. Você é a minha última esperança, Katherine.— Olha, valeu pela conversa e por ter me defendido, mas acho melhor você contratar uma modelo ou uma atriz, tenha uma boa noite — pegou a sua bolsa e se levantou.— EU PAGO 100 MIL DÓLARES! — falei a plenos pulmões e ouvi o barulho de algo caindo no chão. Vi que um dos atendentes havia deixado uma bandeja cair no chão ao se assustar com o meu momento de insanidade.Olhei na direção de Katherine e vi que ela me encarava com uma expressão indecifrável.KathyEu tentava processar tudo o que aconteceu em poucas horas. Jeff me defendeu de Hector e fui jogada para fora da boate como se fosse lixo. Certamente aquela seria a noite mais movimentada da minha vida! Queria que Judith pudesse me ver agora, ela sempre dizia que eu era careta e ficaria surpresa em saber o quão movimentada a minha vida estava, não nos falávamos há dois meses, ela mudou o número do telefone, também visualizava meus directs no Instagram, não respondia e eu dizia a mim mesma que ela só estava ocupada demais com a faculdade.Agora eu estava parada perto da porta de saída do Burger King tentando digerir novamente tudo aquilo o que Jeff falou. Por que um homem como ele queria me contratar para fingir ser sua namorada? Ele só podia ser maluco e o melhor que eu tinha a fazer era ir para casa.— EU PAGO 100 MIL DÓLARES! — Ele gritou, me fazendo paralisar no lugar — Ele só podia estar brincando! Ouvi o barulho ensurdecedor de uma bandeja de metal que um dos atendentes der
Kathy— Você mora aqui? — Ele perguntou olhando mais uma vez para o meu prédio antes de estacionar.— Sim, foi endereço que te dei, não foi? Algum problema?— Problema nenhum, só parece um pouco perigoso — respondeu sem graça. Eu sabia muito bem o quanto meu bairro era perigoso e como meu prédio era horroroso.— Eu disse que não precisava me trazer — tirei o cinto de segurança e abri a porta para sair dali ao perceber que tinha me equivocado ao pensar que ele fosse um cara legal, mesmo possuindo muito dinheiro — Se quiser, pode desistir do combinado, percebi que você está desconfortável — disse assim que sai.— NÃO! — Ele quase gritou, me assustando — Não é o que está pensando, é que é um lugar um pouco perigoso.— É o que posso pagar. Tenho que ir, estou exausta.— Tudo bem, não deixe de me contatar amanhã, nossa primeira aparição juntos vai ser daqui três dias — falou segurando firme a direção do carro.— Tudo bem, dois dias, já passou da meia noite — senti um frio na barriga.— Iss
Jeff Eu estava esperando uma mensagem ou ligação de Katherine desde o momento que acordei depois de três horas de sono naquela manhã com a Maddie berrando, estava começando a odiar aquela coisa que todos diziam ser revolucionária. Me levantei e caminhei como um zumbi para o banheiro, não estava com ânimo nenhum para a academia e certamente Patrick me ligaria para falar o quanto estava sendo irresponsável com meu corpo. Eu estava arrependido de passar boa parte da madrugada pensando se meu plano de deixar Bervely com ciúmes daria certo.Entre uma reunião e outra, olhava meu celular na esperança de que Katherine tivesse me contatado, mas nenhuma das chamadas e mensagens de números desconhecidos pertenciam a ela. Acreditei que poderia ligar para o telefone fixo, e toda vez que minha secretária me contatava para passar uma ligação, sentia um frio na barriga. Ela não poderia ter desistido, eram 100 mil dólares em jogo e depois de ver o lugar que ela morava, tive plena certeza de que pre
KathyEu pensava em Jeff enquanto voltava para casa e em como ele era estranho. Não um estranho ruim, mas um estranho que o fazia diferente da maioria dos homens. Jamais imaginaria que qualquer outro homem fosse capaz de contratar alguém para fazer ciúmes na ex-mulher para que ela desistisse de se casar com outro, ainda mais um homem que poderia conseguir qualquer mulher sem ter que gastar um centavo por isso. E lá estava eu mais uma vez lembrando do quanto Jeff era bonito.Toda vez que o pensamento sobre a beleza dele vinha a minha mente, eu automaticamente afirmava a mim mesma um sonoro não. Mesmo que ele fosse o homem mais bonito e charmoso do universo, eu jamais me interessaria.Cheguei no meu prédio e subi as escadas correndo, ansiosa por um tempinho com as pessoas que mais amava no mundo.— Kathy, você veio cedo. Eba! — gritou empolgada e tentou se levantar do sofá, lugar onde ela vivia maior parte do tempo depois que consegui assinar Netflix com o dinheiro extra da boate. Sei q
KathyHavia chegado cedo na lanchonete. Organizei alguns pratos e fiz alguns cafés, o movimento estava muito baixo e David estava preocupado com a diminuição de clientes no decorrer dos últimos dias, os únicos horários em que ficava cheio era no almoço.As gorjetas estavam cada vez menores e procurava não reclamar, não estava sendo fácil para ninguém, aparentemente a crise financeira estava batendo na porta de todo mundo. Eu só conseguia pensar nos remédios de Maddie e com o aluguel, pois só com o meu salário não conseguiria arcar com tudo. Por um momento me senti tentada a ir pelo caminho mais fácil, voltar até a boate e implorar pelo meu emprego de volta ou até me mesmo ligar para Jeff e dizer que iria fazer parte daquele plano ridículo, mesmo que o plano fosse apenas para me humilhar.Eu estava a uma meia hora espirrando e como o movimento estava fraco, David pediu para que organizasse o depósito, este que parecia que tinha uma década que ninguém o limpava. Peguei alguns materiais
JeffEsperava Katherine encostado no meu carro e estava esperançoso. Ela saiu do lugar pisando duro. Agora sem o uniforme, usava uma calça jeans que parecia dois números maior do que deveria usar e uma camiseta preta com um alienígena estampado, qualquer pessoa do meu convívio que me visse com alguém vestido daquela maneira acreditaria que eu havia surtado de vez.— Você vai ficar parado aí me olhando ou vai me levar para casa? — alfinetou, me olhando com os olhos faiscantes.— Vamos — fui em direção a porta do passageiro, abri para que ela entrasse e realmente não entendi o porquê de ter feito isso.— Tão cavalheiro — revirou os olhos debochando e preferi ignorar.— É um hábito.Enquanto dirigia, Katherine permaneceu calada e estava começando a ficar tenso.— Me diga Katherine, quais são suas exigências? — perguntei curioso.— Não sei como dizer isso, mas se você quer que eu finja ser sua namorada, vamos ter que fazer isso direito, porque minha mãe vai começar a me questionar quando
KathySubi as escadas rapidamente. Assim que abri a porta, dei de frente com minha mãe com os braços cruzados e uma feição de poucos amigos.— Oi mamãe — fui em sua direção lhe abraçar.— Não me venha com “Oi mamãe”, Katherine, quem te trouxe? — Me perguntou e se afastou.— Mamãe!— Nada de mamãe, quem era o grã-fino que te trouxe, Katherine? Eu posso ser burra, mas sei que aquele carro daria vinte apartamentos desse. Vi pela janela quando você desceu daquele carro. Pode começar a falar — torceu o nariz e fez um semblante assustador.Eu teria que contar para minha mãe sobre Jeff , ou melhor, mentir sobre esse namoro. Estava planejando contar no dia seguinte durante o café da manhã, porém, a curiosidade da dona Teresa fez meu plano ir por água abaixo.— Então mamãe, conheci uma pessoa.— Katherine, você não está fazendo coisa errada? Pelo amor de Deus! — Se jogou no sofá com as mãos na cabeça.— Não mamãe! Conheci o Jeff na lanchonete e nos apaixonamos.— Jeff é o nome do homem que tro
Kathy— Kathy — Maddie estava na sala e me viu assim que entrei carregando um pouco das sacolas.— Oi, ursinha — falei com um sorriso amarelo.— O que aconteceu com você? Você está igual uma princesa... — sussurrou com olhinhos brilhantes.— Pode me ajudar com essas sacolas? — lhe entreguei algumas sacolas que não eram pesadas.Assim que coloquei todas as sacolas para dentro, minha mãe surgiu no corredor com os olhos arregalados.— O que é tudo isso, Katherine? — perguntou brava.Eu precisava inventar algo rápido, e para piorar, faltavam apenas alguns minutos para o horário que combinei para Jeff me buscar.— Mamãe, irei comparecer em alguns eventos com Jeff e ele achou interessante comprar algumas roupas e sapatos para usar — dei o meu melhor sorriso.— Katherine, isso vai acabar mal — coçou a cabeça.— O que vai acabar mal? A Kath tá linda, não é mamãe? — Maddie perguntou me salvando, ela não iria entrar em uma discussão na frente da minha irmãzinha.— Está mesmo, filha. Ela está lin