Malia
— E como foi o teu dia? — Pergunto quando ele termina de comer. Eu ainda estou na metade do meu prato.
— Foram duas reuniões de manhã, uma com um autor que está no ranking de mais vendidos na a****n e tem tudo para dar certo na editora. Depois te passo o contato dele para que comecem a trabalhar — ele passou a mão no cabelo que deixou crescer nos últimos meses e fez permanente para que ele ficasse ondulado e olha para o telefone pousado na mesa. — A outra foi só para acertar o próximo romance que vamos lançar. O resto foi revisão atrás de revisão. Estou verdadeiramente cansado.
— Então vamos embora, por favor, preciso descansar também — termino de comer, vendo ele arrumar as coisas para irmos embora.
Quando entramos no carro, não me demoro a baixar o banco e puxar o meu tapa olho que está sempre guardado aqui no carro pra mim, é a maneira perfeita de descansar até chegar em minha casa. Noto as luzes acesas e sei que George está em casa, então hesito em sair do carro e Malik percebe.
— Respira fundo, estarei a uma chamada se precisares de mim, vida — dá um beijo na minha testa, respiro fundo e saio do carro.
Por que os dias não podem ser sempre assim para mim? Seria muito melhor se tivesse ficado com alguém que me trata tão bem quanto ele ao invés de ficar com alguém que se sente intimidado pelas minhas conquistas e prefere me ver miserável do que bem.
A primeira coisa que percebo são as coisas espalhadas pela sala, ele sentado no sofá com o teste na mão e com uma cara nada boa. Começo a cogitar a ideia de ligar para Malik naquele mesmo momento, ele não deve estar tão longe assim.
— Que brincadeira é essa? De quem é esse teste? — Ele pergunta sem olhar para mim, num tom de pura irritação. — QUE PORCARIA É ESSA? — Me assusto com o grito dele e dou um passo para trás. A cada passo que ele dava para frente, eu recuava, me mantendo longe o suficiente dele, até porque é óbvio o quão alterado ele está. — Eu espero sinceramente que esse teste não seja teu.
— Eu… eu…nós…nós, sempre fizemos sexo sem nenhuma prevenção, aconteceu, eu não tinha como controlar.
Eu falo baixo, gaguejando, sentindo o meu corpo tremendo por completo e com os olhos cheios de lágrimas. Eu não queria chorar, queria ser forte, por mim, por esse bebê, mas as gotas de água escorrem sem que eu perceba.
— E OS REMÉDIOS? A DROGA DOS REMÉDIOS?
George atira o teste na parede atrás de mim e avança mais um passo, ficando a poucos centímetros de mim. Meu coração b**e ainda mais forte, imaginando o pior para aquele momento. As minhas mãos tremem, enquanto mantenho os olhos nele. No último ano tem sido essa a minha vida, discussões, eu sendo a culpada de tudo, me sentindo cada vez mais exausta e vendo a minha energia ser arrancada por uma pessoa tão podre quanto ele.
— Como pode uma pessoa ser tão estúpida, eu não quero filhos, nunca quis. Não quero criança nenhuma na minha casa, tirando a minha paz, sempre deixei isso muito claro, mas nem para os seus ouvidos servem — quando diz isso, George aperta a minha cabeça entre as mãos e pressiona contra a parede.
Essa é a verdadeira causa das minhas constantes dores de cabeça. Talvez a falta de comida e de água aumentem, mas é sempre George o maior provocador delas. Ele não pode me bater porque apesar da pele negra, eu ainda sou alguns tons mais clara e toda marca é visível. Porém, isso podia mudar a qualquer momento e só de pensar nisso, sinto inveja de todas as mulheres decididas e corajosas o suficiente para saírem de relacionamentos assim com a cabeça erguida.
Uma vez ele apertou o meu braço com demasiada força e ficou a marca certinha da mão dele, bem como um hematoma que permaneceu no lugar por semanas. Fui obrigada a usar roupas de mangas longas, e ali ele percebeu que corria risco e por isso passou a apertar a minha cabeça ou puxar o meu cabelo, que como ele dizia “já parece um ninho, um puxão não faz diferença”.
— É bem capaz dessa criança nem ser minha e sim do teu amado Mal — um gemido de dor escapa de mim quando ele aperta mais a minha cabeça e puxa o meu cabelo ao mencionar o nome do Malik. — Do jeito que ficam juntos não me admiraria que ele te comesse naquele café ou na editora não é? Afinal tu és o tesouro dele, certo?
George pressiona o meu corpo contra a parede e puxa a minha cabeça batendo uma, duas, três vezes contra a parede. As lágrimas já correm livremente pelo meu rosto, escorrendo pelo meu pescoço. A minha voz fica perdida no fundo da minha garganta e os meus pulmões falham. Respirar se torna difícil e sinto o meu corpo pesado.
— Essa criança não vai nascer, amanhã eu procuro uma clínica ou alguém que possa fazer isso e depois vai ficar tudo bem, meu amor. O nosso amor vai continuar igual e de quebra não vamos precisar suportar o choro de ninguém — ele solta o meu corpo devagar e eu acabo no chão, sem forças para levantar, sem coragem para falar, sem força para agir.
Fico deitada ali, pelo que pareceram horas. Quando finalmente levanto, todo meu corpo dói. Não tenho mais lágrimas para derramar. Só quero sair daqui, eu também não queria esse bebé, mas acreditei que ele seria uma salvação, que seria a nossa reconciliação, finalmente eu teria o meu sonhado casamento ao fim de 15 anos, nós seríamos todos felizes. Eu só queria ser feliz, é errado pedir tanto por isso?
Fico debaixo do chuveiro até sentir o meu corpo melhor, me enrolo numa das toalhas que deixo no quarto de banho mesmo e vou ficar na sala. Não quero entrar no quarto, não quero fazer barulho, não quero uma nova situação.
Ligo a TV e ponho dorama. Adoro assistir dorama água com açúcar, daqueles extremamente fofos e românticos. Gosto de ler romances, porque isso a minha vida tem de menos, então nada como viver os romances alheios.
Malia“Você devia procurar uma clínica que fazer o aborto”“Encontrei na internet uma receita que vai nos ajudar a ficar livres dessa criança”“Conheci alguém que faz esse trabalho ao domicílio”Passei toda a semana ouvindo comentários desse género. Ele falava aquilo cada vez que cruzava comigo e tudo o que eu queria era me livrar dele. Queria que tudo aquilo acabasse. Por que preciso passar por isso? Por que não posso simplesmente ser feliz como outras mulheres grávidas são? Parece que é impossível isso acontecer para mim. Não houve nenhum dia em que a minha cabeça não latejou, tirando o meu foco de tudo o que devia fazer e me desconcertando muito mais. Os meus olhos arderam durante todos esses dias, me obrigando a passar água fria neles e até mesmo gelo. E no meio disso tudo, fiz o que sempre faço quando estou estressada, comprei livros. Quinze livros para ser mais exata, sei que vão me dar parte do descanso que preciso e pelo menos fazer com que a minha cabeça fique bem mais cal
MaliaA minha mãe entra no quarto com uma travessa de bolo de chocolate, e antes mesmo dela chegar, a minha barriga ronca e consigo sentir o bolo úmido se derreter na minha boca. Assim como acontece com todos os bolos dela. Quando cheguei, ela estava na cozinha, fazendo o bolo, afinal de contas, eles dois são velhos que adoram doce, formigas quase reformadas. Devia ligar para os rapazes e contar que tem bolo de chocolate, nós sempre lutamos por esse bolo quando éramos crianças e mesmo agora fazemos isso. Seria muito bom escutar o tom de voz deles perdendo o brilho, no momento que eu contasse tudo para eles. Pego na travessa com uma vontade imensa e como com uma colher, nem espero pelo prato que o meu pai foi pegar, é como pegar toda a minha infância e colocar numa travessa, que saudade desse bolo. — Mãe, acho que vou morar com vocês novamente, mas só se você fizer esse bolo todos os dias.Mesmo sem ver a minha boca, consigo sentir o quanto ela está suja, coberta pela cobertura mar
MalikAs meninas marcaram um brunch e podiam muito bem ter pago garçons, mas não, a mão de obra barata é sempre a melhor. Malia, Andreia e Teresa são amigas desde a universidade, Adam namora a Teresa desde o primeiro ano, e Thomas pediu a Andreia em namoro no ano passado, após anos na friendzone. Fiquei extremamente feliz vendo aquilo acontecendo com ele, afinal de contas pelo menos um que saiu de lá.Fomos obrigados a trabalhar como garçons não remunerados, com direito a roupas iguais, calça social preta, camisa preta e gravata laço rosa. Elas podiam ter pagado alguém, mas não, decidiram que seríamos nós, ao invés de nos chamarem para participarmos com elas. Quando chego a casa dos Hawthorne, pensando que teria que esperar que a Lili ficasse pronta, me deparo com ela na porta já pronta. Malia entra rápido no carro, mantendo um sorriso em seu rosto. O vestido rosa que ela usa vai até o meio das coxas grossas que tanto adoro, mesmo observando tudo à distância, sem poder tocar nelas.
MalikJá tive todo tipo de sonhos com essa mulher e não posso dizer que eram os mais puros e bem-intencionados. Na minha cabeça, já comi essa mulher em todas as posições possíveis, mas ficaria imensamente feliz se tudo acontecesse na vida real.O mais triste nisso tudo é olhar para ela e perceber que esse brilho tem se apagado pouco a pouco, que toda aquela essência maravilhosa e energia ilimitada estejam esgotadas. A cada dia que passa, ela se torna mais estranha, triste e meio vazia, e isso me mata aos poucos. Sempre acabou comigo. Não sei mais que artimanhas, truques, planos usar para que ela deixe esse idiota, que tudo o que faz é sugar a vida dela, a deixando exausta da vida e sem o brilho que ela costumava ter. E é justamente nesses momentos que penso no quanto ela seria feliz se estivesse comigo. Não confio naquele idiota para nada, e por causa disso faço questão de levá-la à casa sempre, tratar com muito carinho, mimá-la e sempre me esforço para que aquele idiota perceba que
Malia— Deixa que te mostro bem quem é a bruxa, seu filho da mãe — Andy grita a última parte, mais alto do que alguma vez vi vi ela fazendo, e tudo porque nessa altura, o Malik já está praticamente fora da casa— Sou mesmo filho da minha mãe, agora, se você não tem mãe isso é um problema teu, minha filha — nesse momento a Andy faz outro arremesso, que não falha e bate certinho na cabeça dele. — Ai, Thomas, desiste dessa bruxa pelo bem da tua vida, isso é um ser do mal, eu te amo tanto, Tommy, não posso perder você desse jeito — ele rasteja em direção aos rapazes e abraça os joelhos do Tommy, choramingando.— Mas também, Mal, custava deixar a Lili beber? Te falta amor à vida — ele tenta chutar o Mal, mas escorrega e cai nele no mesmo momento em que a Tessa resolveu puxar o cabelo do meu amado amigo.— Sinceramente, passaram tantos anos, mas parece que vocês continuam todos umas crianças e o Mal ficou pior, é capaz de um dia quando ficarem grávidas pegarem ranço do Mal e as crianças na
MaliaO meu reflexo no espelho em nada se compara ao que outrora foi. Sempre me achei muito bonita, sempre gostei de ver em mim a luz, o brilho que as pessoas diziam ver, mas agora, agora parece que tudo morreu. Não tenho mais o brilho que costumava carregar e que as pessoas costumavam apreciar, não tenho mais o brilho que via no espelho todos os dias, sendo intensificado pelo sorriso enorme que estava sempre preso nele. Porém, agora não tenho nada disso. Perdi alguns quilos nesses anos, nada alarmante ou problemático. Sou boa com maquiagem e por isso sempre que estou com um aspecto cansado me esforço para o esconder, reforçando a maquiagem ao ponto de tornar as minhas emoções irreconhecíveis. Eu não quero incomodar ninguém com a vida que escolhi, preciso saber lidar com isso, e apesar de contar algumas coisas para a minha mãe, ainda é difícil falar sobre tudo, ainda mais quando tudo o que ela fez foi me alertar sobre as escolhas que estava fazendo. Com certeza, seria uma grande co
Anos atrásEu vou casar com essa mulher, definitivamente.Tudo bem que pode parecer apenas um desejo de criança, a primeira paixoneta, mas eu tenho tanta certeza que é ela. E se em algum lugar do mundo, alguém me disser que não é ela, farei de tudo para garantir que é comigo que ela fica. Vou casar com ela um dia. Adoro a forma como a pele dela brilha ao sol, destacando a sua beleza de todas as maneiras possíveis e impossíveis. Adoro a forma como o cabelo volumoso, repleto de cachinhos, se espalha pela sua cabeça a deixando mais linda do que ela já é, sem contar que sempre gostei de brincar com eles. Ela tem o sorriso mais lindo que eu já vi, mesmo com esse aparelho ridículo. Ela é tão educada com toda gente que me dá um nervoso, porque sei que provavelmente não sou o único que pensa nela dessa maneira. Os outros rapazes podem se aproveitar dessa simpatia toda que ela tem e detesto isso, só de pensar já me deixa nervoso. Eu preciso ser o único, porque no auge dos meus 14 anos perce
Malik Dias atuais— Ai, ai, ai. Levantei, acordei, estou vivo — mesmo com essas palavras, não paro de sentir os golpes da almofada sobre a minha cabeça. — Para, mulher, ai, a minha cabeça.Com tantas maneiras de acordar uma pessoa que existem, ela foi justamente escolher usar a agressividade para o fazer. Parece que não posso dormir em paz nem mesmo na minha casa. Qualquer pessoa mais frágil do que eu, estaria morta com aqueles golpes. — Esqueceu que tem trabalho? — Escuto a voz da minha amada mãe, que neste momento não acho que seja tão amada assim, aos berros e a dor na minha cabeça só aumenta. Não devia ter bebido tanto na noite passada e se soubesse que ela me acordaria desse jeito, de certeza teria moderado. — Levanta dessa cama agora, menino estúpido. São quase 8 horas, sua peste.Levanto num rompante quando ouço o horário ser dito, eu preciso estar na editora antes das 8, tenho 2 reuniões marcadas logo pela manhã e a primeira será logo às 8 horas. Se eu atrasar, correrei o