A dor da perda.
É, ela é maçante, é terrivelmente destrutiva, e é, sem sombra de dúvidas, uma das piores que já senti em toda a minha vida. Não me importo com as lágrimas, deixo que elas rolem pelo meu rosto, sem freio, tentando expurgar tudo que está destroçado mas, no fim, é impossível. Ele se foi. Carter se foi e tudo que tenho vontade de fazer é partir com ele. Será que é possível? Há alguma chance de me juntar a ele naquele caixão e nunca mais respirar? Não sei... — Pequena, nós precisamos ir. — A mão do meu chefe toca meu ombro. Sinto meu estômago embrulhar com o pensamento de ter que deixar meu eterno amor enterrado aqui. Mas novamente… Há alguma forma de fazer diferente? — Eu vou ficar um pouco mais. Não se preocupe. — Como não me preocupar? — Suspira, cansado e tão triste quanto eu. — A chuva está aumentando e logo estará escuro. Preciso que venha comigo, Kalid. Por favor. Meus ombros caem junto com as lágrimas e mais uma vez me vejo perdida em pensamentos. Perdida na vida. Completamente sem rumo e sem saber o que fazer de agora em diante. Perdi meu rumo, minha base, o único que me entendia, e não sei como vou conseguir sobreviver. Talvez, não consiga mesmo, e tudo bem também. Já estou cansada pra cacete. — Não vou sair daqui! — decreto baixinho, me abaixando para ficar de joelhos na terra remexida que se torna lama. Agora o corpo dele está lá embaixo, e nada, nada pode mudar isso. Eu falhei. Falhei com Carter, como jurei nunca mais falhar. — Pode deixar. Eu levo ela pra casa — outro alguém resmunga. Não quero erguer a cabeça para procurar a voz que se torna "nova" à minha audição, e não preciso de fato fazer isso. Sei quem se juntou a nós, e sei que o quero o mais longe possível. — Não sei se é uma boa ideia, Logan. — Não tem essa de ser ou não boa ideia. Ela precisa voltar para casa. Eu a levo. É tão fácil dizer, não é? É tão simples para o filho da puta falar que devo retornar para a minha m*****a casa quando sei que nunca mais vou ouvir a risada de Carter ecoando pelos corredores dela. Nunca mais vai ter nós dois. Nunca mais serei inteira. Não serei mais... eu. — Ninguém vai me tirar daqui. Estão me ouvindo? Ninguém. E se você se acha homem suficiente para fazer isso, Logan, eu digo que não é. Você não é homem porra nenhuma. — Me levanto irritada porque sei que quero socar alguma coisa. Quero poder bater em alguém, culpar uma pessoa, ou simplesmente fazer uma merda muito grande para receber algum tipo de punição. Isso seria eficaz para dar jeito na dor? Eu conseguiria me curar agindo como uma menina rebelde? Logan respira fundo e sou obrigada a prestar atenção nele. — Eu tentei, de todas as formas, tirar ele de lá com vida. Solto um riso sem vida. Seu murmúrio sôfrego não me convence. — E não conseguiu! Você não conseguiu salvar o seu melhor amigo. Acha então que vai conseguir me livrar desses demônios? Você? Logo você, Baker? Minha vontade é de chegar perto de Logan e estapear sua cara, mas com a presença de nosso superior, me contento a só lançar um olhar de desprezo e dar as costas para os dois. Certo... talvez haja algo eficaz para me tirar desse cemitério. Talvez e, apenas talvez, a presença de Logan seja tão pior quanto a morte de Carter. Não consigo ficar perto dele em situação alguma. É possível ainda odiá-lo com tanta força? Agora mais do que antes? De passo em passo vou afundando meus pés na lama do cemitério. Com pressa, caminho para longe de onde o corpo do meu noivo está agora coberto por terra. Noivo… Ele me pediu em casamento duas semanas antes do bombardeio. Eu aceitei, mas não pude sequer começar a planejar a cerimônia. Aqueles malditos terroristas acabaram com tudo, e eu, mais uma vez, falhei. Agora é pra valer. Agora tenho um motivo real para desistir. Nada mais faz sentido e, se algum dia fez, eu não sei o que significa, nem mesmo como é. Acabei de perder o amor da minha vida, e não, não sinto vontade alguma de reagir ao mundo de nenhuma forma. Só quero me enfiar em uma bolha e esquecer até mesmo quem sou. E claro... Quero nunca mais ter que ver Logan Baker na minha frente. Essa tortura não vou mesmo aguentar. Essa é capaz de me arruinar por completo.Eu, sinceramente, não sei o que significava "estou seguindo em frente" para Kalid Clarkson. Destruir sua casa inteira, deixar móveis quebrados, e desaparecer por mais de cinco meses era seguir em frente? Bom, então eu precisava voltar a me situar no vocabulário da mulher. Seguir em frente deveria ser, no caso dela, aceitar ajuda profissional e também a minha. Sabia que não tinha moral alguma com ela, principalmente porque Carter morreu em meus braços, mas estava disposto a ajudá-la. Eu deveria tê-lo salvado de alguma maneira, mas, não consegui. O Afeganistão é um lugar complicado. Em todo caso, Kalid não podia ser tão mais complicada do que a guerra. Ela teria que aceitar um ombro amigo – nem tão amigo assim. Meus olhos se voltaram para o chão do quarto quando, de mansinho, a diarista que contratei saiu para fora dele. A poeira podia ser vista pairando no ar, mas nada era mais assustador do que o sangue que encontrei nos lençóis da cama que pertencia aos dois. Ela ha
Como era possível sentir um vazio tão grande no peito? Dentro de mim, tudo se encontrava oco, escuro e sem um pingo de emoção. Cinco meses pareciam não serem suficientes para fazer a dor passar, e mesmo assim eu estava tentando lutar contra ela, diferente de tudo o que as pessoas pensavam. Porque sim, eu sabia que pensavam, sondavam e diziam que eu estava prestes a morrer. Não era verdade. Eu estava destruída, mas não me mataria. Não indo contra cada vontade de Carter. Ele queria que eu fosse feliz de alguma forma, e hora ou outra acho que conseguiria fazer isso. Mas, no momento, precisava apenas me manter distante do mundo. Com os olhos focados na tela da televisão, ouvi o apito do alarme tocar e rapidamente peguei o controle para mudar a função e visualizar as imagens das câmeras. Uma caminhonete preta toda envelopada passou pela ponte de madeira há menos de dois minutos, e eu queria não ter reconhecido ela, mas sabia muito bem que enfim o idiota tinha me encontrado.
• PASSADO • A quinta dose de vodka desceu pela minha garganta assim que perdi mais uma rodada. Fiz careta e revirei os olhos para Kalid. Aquela diaba sempre achava alguma brecha para me fazer beber. Ela sempre tinha uma pergunta bem elaborada ou uma informação que acabava com a minha reputação em segundos. Se bem que, minha reputação não era lá tão grande coisa. — Eu nunca transei com mais de duas pessoas que estão aqui nessa roda — Michael, ex namorado de Kalid, argumentou de propósito para atingi-la. Sim, eu amei, mas também pude ver a fúria de Carter aparecendo de repente. — Vocês homens podem contar vantagem por isso, não é? — Fechou a cara para ele mas não abaixou a cabeça. — Então eu também posso. Transei sim com mais de dois, até mais de três, e posso dizer que você foi o mais decepcionante. O alvoroço de zombaria surgiu de imediato e eu acabei rindo. Kalid e mais algumas pessoas beberam as doses de vodka e, dessa vez, pelo menos dessa vez, não tive que fazer iss
Até que número eu deveria contar para me manter paciente? Dez bilhões seria suficiente? Não... Não com Logan na minha casa, invadindo os meus dias. — Não tem porra nenhuma na geladeira. Você está há quantos dias sem se alimentar direito? Parei olhando para o céu ensolarado e até cheguei a pensar na pergunta. Talvez três, ou quatro dias. Não me recordava muito bem. — Estou saudável, pode ter certeza. — Eu te ouvi dizendo isso quando a gente era mais novo, até que um dia o Carter precisou te levar às pressas para o hospital porque estava desnutrida. Soltei a fumaça do cigarro pela boca e olhei de soslaio para Logan. Ele odiava cigarros. Odiava com todas as suas forças, e era exatamente por isso que eu estava fumando na varanda logo pela manhã. Provocar o homem sempre seria o meu hobby preferido. — Você ainda se lembra de muita coisa, não? — Me lembro de você chutando o meu saco, me lembro de que você espalhou pra todo mundo a mentira de que perdi a virgindade com outr
• PASSADO • As pessoas corriam apressadas quase trombando umas nas outras, me fazendo rir ainda mais. Chamaram a polícia, e agora o som alto tinha cessado, as garotas não mais dançavam alegres, e os jovens que tinham um alto teor de substâncias ilícitas em suas veias tentavam passar pelos policiais sem serem notados. Eu avisei, mas ninguém quis me escutar. — Se eu descobrir quem foi o filho da puta, juro que vou arrancar o pau! Olhei para Michael e tentei não mostrar os meus dentes enquanto ria de sua decepção. Julgava que, no meio das pernas do responsável por aquilo, não havia pênis algum, e sim uma boceta da qual ele já havia provado, como sempre gostava de proclamar. Tinha sido ela, com certeza tinha. Não deixar que Kalid fosse para sua festa de aniversário foi um tiro no pé, agora o garoto teria que lidar com as consequências dessa tamanha desfeita com sua ex. — Eu tenho a leve impressão de que, se ela te mandar ficar de quatro, você fica — provoquei, e logo após beb
Mas que saco! Eram só nove horas da manhã e eu já estava tendo que ingerir umas duas mil calorias apenas para agradar o senhor certinho, que insistia em dizer que eu tinha perdido peso. E se tivesse mesmo? Era normal. Logan sabia que era normal. Ele sabia muitíssimo bem como era normal.— Odeio ovos no café da manhã! — Revirei o alimento no prato, e fiz careta. Era mentira, eu amava comer ovos, mas para infernizar Logan eu falaria qualquer coisa. — Há, no mundo, alguma coisa que você não odeie? Sério, existe algo que você ame, ou que você adore? Porque às vezes eu penso que você mesma se odeia, então, repito a minha pergunta… Há alguma coisa que você não odeie?Deixei minha postura suavizar e recostei no estofado macio da poltrona. É, eu odiava bastante coisa, mas muitas outras se salvavam desse meu sentimento, com certeza. — Amo marshmallow assado. O homem umedeceu os lábios e sorriu com cinismo.— Mas o que tem pra você comer agora é um café da manhã saudável, então, por favo
Eu não gostava de Kalid Clarkson, mas não gostava ainda mais de quem tinha a coragem de tentar fazer ela passar raiva além de mim. Maggie e Michael foram uma pequena parte de um pesadelo. Se ousassem retornar para arruinar a mulher de alguma forma, iam acabar conhecendo um lado meu que não costumava mostrar com frequência. — Uísque não vai te ajudar com a dor — pontuei, vendo ela servir mais um copo generoso de bebida. — Sua voz no meu ouvido também não vai. — Tem certeza disso? — sussurrei de propósito, bem perto de seu rosto.Kalid fez menção de se virar, mas permaneceu parada de frente para a pia da cozinha. Seus olhos, no entanto, me devoravam com ferocidade. Sabia que se ela pudesse, enfiaria um tapa em minha cara. — A forma como você pede por um tapa é bem interessante.Não falei?Sorri me afastando e acabei caminhando até a porta da frente, olhando para o lago próximo que refletia a luz do sol enquanto alguns patos pairavam pela superfície da água. — Vai voltar comigo, o
[8 anos antes] Quando cheguei no quarto após trombar com Logan no corredor, avistei Maggie e Carter juntos, mais especificamente, fodendo no chão.Foi isso que deixou Logan Baker com a cabeça soltando fumaça. A garota estava de quatro. Tinha o vestido levantado até a cintura e um dos seios estava para o lado de fora. Não havia sinal algum de calcinha, o que significava que ela não estava usando uma em momento algum da nossa festinha. Carter, que investia contra ela, de joelhos sobre o tapete, me viu parada na porta e sorriu safado.— Achei que você não ia vir, amor. Ele umedeceu os lábios cheios sem deixar de se movimentar, e a loira me olhou com tesão, deixando de apoiar uma das mãos no chão para me chamar com o indicador.— Vem, Kali! Eu deveria ir. Deveria me juntar a eles e fazer aquilo também, mas não encontrar o colar estava me deixando extremamente inquieta, então apenas sorri sem graça para os dois. — Esqueci de apagar as luzes! Já volto.Ouvi o resmungo deles, mas bat