Capítulo 2

New York, Manhattan, East Village.

[ Visão de Aya Millenis]

"— Você é uma p**a! — o grito de minha mãe me faz chorar ainda mais, ergo minha mão até meu rosto e com certeza ele está vermelho, arde muito, ela nunca me bateu com tanta força.

— Não acredito que fez isso, Aya! — meu pai fala decepcionado e irritado — Te disse para não mentir para mim! 

— M-mãe, pai... — minha voz sai embargada por causa do choro — Me deixa explicar, não… não foi assim que aconteceu....

— Cale-se! — ordena e eu me calo na mesma hora — Eu fui claro com você, Aya! Você envergonhou toda a sua família! Você é uma desgraça para os Millenis! Sua existência...

— Não, não, não... — balanço minha cabeça freneticamente em negação, receber um soco no estômago deve doer menos do que ouvir isso.

— Você me humilhou, humilhou a sua mãe e a sua irmã, desgraçou com o nosso nome....

— Ela não é mais a minha filha! — minha mãe o corta e sua fala doe mais que o tapa que me foi dado há poucos instantes.

— Mãe por favor.... — tento me aproximar, não posso aguentar ser rejeitada dessa maneira.

— Não encoste em mim! — suas mãos me empurram, me desequilibro do salto e caio de bunda no chão.

— A partir de hoje, você não faz mais parte da nossa família, a gente te renega! Sua vagabunda! — meu pai aponta o dedo na minha cara, o choro entala na minha garganta — Te dei do bom e do melhor, e mesmo assim você não pensou duas vezes antes de mentir e nos expor a humilhação pública, jogando o nosso nome do lixo, você para nós é um nada! E nem volte para minha casa, o que você achava que tinha lá não é seu, quem comprou foi eu e sua mãe e vamos queimar, a única coisa que você vai levar é a roupa do corpo.

— Ela não merece nem isso!

— Não mãe, por favor.... Para! Para...

Não importa o quanto eu peça, o ódio nos olhos de minha mãe cortam minha pele como facas afiadas. Ela puxa as finas alças do vestido as rasgando, tento impedi-la, mas recebo mais um tapa em meu rosto. Os gritos dão lugar aos soluços, e como se queimasse sinto o tecido sendo rasgado, meus seios ficam expostos, tento cobri-los a todo custo. A vergonha que sinto é tanta.

— Você não vale um centavo furado, te criamos da melhor maneira possível! Te educamos com o melhor! Mas você é uma vadia escrota de quinta categoria, uma....

— Para por favor... — mesmo com os joelhos tremendo, me levanto enquanto seguro os rasgões para esconder a nudez de meus seios — Aquela não sou eu, por favor acreditem em mim... E-eu nunca faria nada para os envergonhar assim, aquela mulher no vídeo não sou eu, por favor...

— O chão é o seu lugar! Sua escória imunda! — minha mãe me empurra usando mais força que antes. O contato de minha testa com o chão danificado da quadra faz o sangue escorrer por minha testa e o corte arde.

— Vamos embora, já perdemos tempo demais nesse muquifo.

— Não por favor, não façam isso comigo, acreditem em mim, por favor... — seguro no vestido de minha mãe que chuta a minha mão, meu pulso lateja." 

Fecho meus olhos com força para espantar essas lembranças, mas infelismente, por mais que eu lute, a medida que vou me aproximando da empresa, sou atiginda por mais memorias dolorosas:

“É o último dia de outono, o chão está coberto com várias folhas de cores diferentes, a entrada do inverno estava muito próxima. Respiro fundo, o quarto semestre está sendo muito puxado, mesmo sendo estudiosa, até eu estava tendo dificuldade em algumas matérias. Preciso espairecer. Decidi estudar em lugar diferente, queria respirar o ar puro, então resolvi ir para a pracinha perto da faculdade, sentei no banco de madeira e tirei o livro e caderno da mochila junto com uma caneta, mas, assim que abri o livro na página marcada, bicos finos de salto na cor preta entram no meu campo de visão, ergo minha cabeça e o olhar de minha mãe distila nojo em minha direção.

— Onde roubou esse livro?  — fala ríspida.

Eu nada respondi, apenas abaixei minha cabeça, lembranças do dia do baile me invadem e respiro fundo.

— Pelas suas roupas e a direção que chegou aqui, você veio da faculdade de New York, como conseguiu entrar lá? Já sei, se deitou com todos da direção para conseguir uma balsa, num é? Só poderia, do jeito que é uma...

— Vo...Você não tem o direito de se intrometer na minha vida e nem de fazer nenhuma especulação errada sobre...

— Vadia não tem vida, sem vender o corpo você nunca conseguiria entrar lá, também deita com os alunos para ter onde dormir? Você é um porca imunda, com certeza já deve estar com várias DSTs.

Sem cabeça para ouvir, começo a arrumar as coisas dentro de minha mochila, melhor voltar para a residência dos Stevens, mas ela me atrapalha e j**a tudo chão, pisando logo em seguida, amassando o livro caríssimo que Dona Carmem me deu.

— Por... Por que fez isso!? — me ajoelho no chão tirando o livro debaixo dos saltos dela.

— Você não é digna de ler esses livros nem de pisar naquele lugar, você é apenas um vadia que transa com qualquer um e ainda faz vídeo para se expor na frente de todos!

— Eu não fiz nada disso! —falo com a voz embargada e me levanto do chão, abraço forte o livro sobre meus seios.

Minha bochecha arde, mais uma vez, essa é a terceira vez que ela me b**e, as lágrimas caem, eu mereço esse tapa, não importa o quanto eu lute contra, sempre serei derrotada por minha mente.

— Seu lugar é num prostíbulo, limpando o chão com a língua. Uma vadia sem valor nenhum, nunca mais ouse aparecer na minha frente, pare de estragar a paisagem com sua presença promíscua.

Ela vira as costas e começa a caminhar se afastando, sinto meus joelhos fraquejarem, mas antes que eles alcancem o chão, ela se vira novamente em minha direção e me olha de cima a baixo, mesmo não tendo feito nada de errado, estou me sentindo suja diante dos seus olhos.

— Você deveria estar morta — suas palavras me machucam — Ou melhor, nem deveria ter nascido, assim não seríamos submetidos a vergonha de ter você manchando o sobrenome Millenis.

Suas palavras me cortam, não consigo mais aguentar o peso de meu corpo e desabo no chão, mais uma vez as lágrimas caem grossas de meus olhos.” 

Chacoalho minha cabeça para tentar espantar mais uma vez essas lembranças, hoje não é dia para isso.

Após estacionar o carro e caminho até as portas de vidro fumê, sinto meu coração acerelado. As portas se abrem, são exatamente sete e meia da manhã, daqui a meia hora a empresa entra em pleno vapor, sei que todos os gestores já estão reunidos para conhecerem a nova funcionária na sala da presidência, respiro fundo. Com passos firmes entro na caixa de metal e aperto o botão do último andar, em menos de dois minutos as portas se abrem e dou o primeiro passo para mais uma nova fase.

Eu não quis nenhum cargo que tivesse que ficar a frente de nada, e por ser só uma simples funcionária não deveria ser apresentada a toda gestão da empresa, mas senhor Gustam insistiu, ele quer mostrar no que a filha rejeitada se tornou, então aqui estou eu.

Sinto meu coração batendo forte, como se estivesse para sair de dentro do meu peito, preciso me manter fria e centrada, não posso vacilar. Suspirando mais uma vez, abro a grande porta de vidro fumê da sala do senhor Gustam. Entro de cabeça baixa, estou vestindo uma saia lápis de cor preta e uma blusa social de cor gelo, saltos agulha pretos e cabelos soltos que batem na minha bunda. Ergo minha cabeça, observo com satisfação os olhos arregalados e descrentes de meus pais.

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