1. Uma boa notícia!

Oito meses se passaram, e as cicatrizes ainda doem como se tudo tivesse acontecido a poucos dias. Meu quarto se tornou meu habitat natural, tenho passado mais tempo nele depois que saiu do trabalho.

Uns canalizam sua dor na bebida, em festas e namoros descompromissados, mais eu?! Eu me isolei de tudo e de todos, mergulhei profundamente nos livros de romances com finais felizes, para ameniza minha dor.

Pois, que o meu final feliz já era, apesar de agora apenas acreditar que o amor, os finais felizes só existam mesmo nos livros e, um deles me ensinou que uma mudança de ambiente pode ajudar a superar e cicatrizar as feridas do coração.

Pego o telefone na cabeceira da cama, absorvo o ar com veemência e o libero morosamente antes de buscar pelo número de Léah, minha irmã que vive na Alemanha a sete anos.

— Oi, Léah como você está? — Indago assim que ela atende o telefone.

— Oi mana, estou óptima e você como tens passado? — Questiona ela com um tom de voz preocupado.

— Ah, mais ou menos, tentando me curar antes que essa ferida se torne crónica — confesso melancólica.

— Eu…sinto muito, — murmura, depois de uma curta pausa, — porque você não vem passar uma temporada aqui? Não tem nada melhor que viajar para esquecer uma desilusão amorosa.

Léah não é muito de rodeios, fala o que pensa, por isso nos entendemos, ela sempre desejou que a visitasse, passasse uma temporada junto dela, mas toda vez dava uma desculpa qualquer e recusava.

Era muito difícil pensar na possibilidade de me afastar nem que fosse por um pouco da minha família. Agora tomar essa decisão me foi tão fácil.

— Esse é o motivo que me faz te ligar… — digo hesitante.

— Você finalmente vai aceitar meu convite? Não brinca? — grita entusiasmada sem aguardar por uma resposta.

Volto a pôr o telefone no ouvido depois de o ter afastado dos gritos de Léa.

— Simmm, — respondo com a mesma intensidade na voz, me deixando contagiar pelo seu entusiasmo.— Olha estou pensando em ficar por tempo indeterminado — digo cautelosa.

— Não tem problema nenhum, você e sua família me acolheram quando mais precisei, agora me sinto muito feliz por poder fazer o mesmo…, SIMON SAIA DAÍ JÁ — ordena Léah ao seu filho que já está com 2 ano e oito meses, — desculpe Niah, esse miúdo não para quieto, o que eu dizia mesmo? Ah você tem um sentido de oportunidade excelente...

— Porque dizes isso? Levanto uma sobrancelha, curiosa.

— É que nesse momento na empresa onde trabalho a vaga para diretor de criação está desocupada e o meu chefe me incumbiu de fazer as entrevistas com possíveis candidatos à vaga e, eu devo selecionar apenas três portfólios, para que ele mesmo escolha o candidato perfeito, cito suas palavras.

— Espera..., — digo surpresa, me levanto da cama e fico em pé, — você ainda trabalha como assistente de rh na agência de publicidade metamorfose? Nãao, — exclamo levando a mão desocupada a boca e, volto a me sentar na beira da cama.

— Simmm… — respondi Léah, feliz da vida.

— Nãaao… — continuo

— Simmmm, que mulher sortuda você é né?! Mas é claro que não podemos comemorar nada ainda…. Vá só me envia o seu portfólio, agora – ordena, eufórica.

— Aaaaaaaah, — abafo meu grito com a almofada. — Ok, eu tenho tudo organizado no pc, aguarde que eu já te envio.

Caminhando até ao escritório/biblioteca que fica no mesmo corredor entre o meu quarto e o quarto da Quezia.

— Tchau meu bem, te amo, falamos depois.

— Também te amo de milhões Niah, beijos.

Tenho a mania da organização, tudo no meu quarto está organizado nos mínimos detalhes e aqui no escritório não é diferente, os documentos os livros físicos estão organizados por gênero e ordem alfabética e no computador a mesma coisa.

Por isso não demoro para achar o portfólio, assim que entro nos ficheiros do pc. Abro o correio eletrônico e anexo o documento e clico enviar. Uma nova vida me espera, sussurro, segundos depois recebo a confirmação de que o e-mail foi lido, não demoa ela responde.

***

Raios de sol, invadem meu quarto, denunciando a fragilidade dos cortinados azuis, me recordando de que preciso levantar para ir entregar meu último trabalho, mesmo desejando fica aqui deitada o dia todo, vou apresentar o site que criei para uma empresa de artigos desportivos.

Caminho a passos lentos até ao banheiro, me espreguiçando e esfregando os olhos ainda com sono, o som da água fria a escorrer por todo meu corpo, me relaxa e sem notar minha mente me faz regressar até aquele dia.

— O fruto do nosso está a caminho, papai e mamãe já estão ansiosos demais.

— Eu sempre soube que esse relacionamento não chegaria tão longe, era bom demais para ser verdade — disse uma das convidadas.

— Ela é muito achada lhe mereci — balbuciou a outra entre risos.

Levo um susto quando ouço batidas na porta e me dou conta de que estou a vários minutos presa em pensamentos com a água jorrando em mim sem parar.

As pressas me cubro com a toalha amarela com bordados de borboletas, saio do banheiro, ao voltar para o quarto dou de cara com a Nilza, sentada na beirada da cama, olhando fixa para o quadro de foto em tamanho médio, eu vestida de noiva. Mantive o retrato aí, como um lembrete de que nunca mais cairia na farsa de amor de qualquer um.

— O que você está fazendo aqui? – Indago ao mesmo tempo em que retiro um conjunto nos guarda roupas e o jogo na cama.

— Eu precisava falar contigo – encurta nossa distância — já se passou tanto tempo, por favor me deixa explicar, eu realmente queria ter-te contado mais…, eu não consegui, eu não podia te contar.

Nilza segura minhas mãos e noto seus olhos triste cheios de arrependimento e angústia

— E agora vai me contar? — Questiono olhando-a nos olhos com os braços cruzados abaixo dos seios, aguardando sua resposta.

— Me desculpa eu não posso, — confessa olhando para o chão, depois de uma longa pausa.

— Então o que você quer me explicar? Não entendo, olha peço que saias, — aponto para a porta. — Não venha mais aqui, não quero ver você, e nem quero saber o motivo de ter me escondido isso. Sai por favor, — deblatero, apontando para a saída, ela tenta dizer alguma coisa, mas se cala, a passos hesitantes caminha até a porta, com os olhos marejados e sai.

Bato a porta com violência, me sento na cama e tento ao máximo não chorar, porque só agora ela decidiu vir me importunar com essa m*****a explicação que ela não pode dar?

Termino de me vestir e desço, paro no meio da sala, vejo Quezia arrumando a mesa do pequeno almoço, Quelson está assistindo alguma coisa na tv e mamãe está na cozinha. Me sento sem lhes dirigir uma palavra se quer, «quando estou assim prefiro ficar calada, para não mágoas ninguém com as palavras» ela para o que está fazendo e me olha confusa, sem entender minha atitude.

— E a agora qual o seu problema?

Sinto a raiva invadir-me assim que meus ouvidos captam sua pergunta, que diante do que ocorreu a alguns minutos é estupida e provocadora. Poso o garfo no prato com tanta força que provoca um breve barulho irritante, levanto-me e pela primeira vez desde que desci do quarto encaro suas órbitas castanhas como as minhas, aperto as pálpebras por breves segundos e solto um suspiro.

— Você está realmente me perguntando isso? Estás a brinca né? Quezia, mamãe, vocês as duas, ou melhor os três, — aponto para meu irmão sentado no cadeirão da sala, e no mesmo instante ele interrompe minha fala.

— Não tenho nada a ver com isso, não me inclua — diz por fim.

— …. Vocês sabem de como está sendo difícil para mim superar aquele maldito dia, eu fui clara em dizer que não queria ver ninguém que me faça lembrar da humilhação que passei, principalmente ela, — deblatero. — Porquê permitiram que ela entrasse no meu quarto, se você quer manter a tua amizade com ela tudo bem, mas não me obrigues novamente a falar com essa hiena? — Aponto o dedo para Quezia que me olha perplexa.

Faço uma breve pausa, renovo o ar dos pulmões e voltou a me sentar já com os olhos marejados apoiando a cabeça nas duas mãos.

— Eu avisei — sussurra, Quelson para as duas.

— Niah, me desculpe — pedi enquanto se senta perto de mim — é que você nunca nos disse o motivo de estar zangada com ela eu... — faz uma breve pausa — achei que fosse algo do momento, por causa do que você experenciou, você não fala com ninguém, nos sempre fomos confidentes, só queria fazer alguma coisa para te anima, só queria, quero minha bolinha de gude de volta. — Quezia encurta mais nossa distância, contorce os lábios para baixo, olho para ela e noto seus olhos castanhos vivos umedecidos.

Mamãe está parada na porta da cozinha com a cabeça inclinada para o lado, o pano rosa da louça pendurado no ombro, ela olha para nós em silêncio, com o celebrante triste. Ficamos todos em silêncio, por alguns segundos, ainda de cabeça baixa, lembro de como eu e ela éramos confidentes, cúmplices, falávamos sobre qualquer coisa, e nunca decidíamos nada sem consultar uma a outra.

Quando comecei a namorar com Bráulio nosso relacionamento de melhores amigas irmãs mudou, nunca tinha tempo para ela, nunca estava atenta para ouvi-la, e agora me dou conta do quanto esse relacionamento me distanciou dela. O quanto deve ser difícil para ela me ver neste estado de desanimo, eu não posso culpa-la, e isso só mostra o quanto ela me ama.

— Mamãe, vem cá não fique assim, — digo ao me levantar.

Estico a mão para que ela se aproxime.

Horas depois, estamos todos saindo, cada um para o seu destino. Eu e Quezia vamos trabalha e Quelson vai para a faculdade.

***

Ao final do dia, chego a casa exausta depois de resolver os últimos pendentes do trabalho e da viagem. Mamãe está fazendo o jantar, dou-lhe um beijo e subo para o quarto, tomou o meu banho de água fria, como gosto, quando termino me jogo na cama onde acabo adormecendo de toalha amarrada.

Acordo com o som estridente do telefone, me vergo rapidamente em direção a cômoda ainda meio zonza, pedindo que seja meu pai ligando. Bato os cílios com força de modo a enxergar melhor o nome na tela do aparelho, me levanto num pulo e franzo o cenho quando consigo ler o nome de Bráulio.

Fico triste e irritada ao mesmo tempo olhando por segundos para a tela me perguntando se devo ou não atender, depois da última conversa o que mais ficou por dizer? «Chamada perdida» leio. Agora sem sono nenhum e perturbada com essa ligação ponho uma roupa bem largada lavo o rosto. Faço menção de sair do quarto, ouço o telefone tocando novamente, Bráulio, dou um suspiro longo e fecho os meus olhos antes de atender.

— O que tenho que fazer para me deixares em paz?

— Niah você vai viver fora do país?

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