04

João Gonzalez

Não pensei que seria difícil convencer o senhor Nogueira de que a nossa parceria poderia ser um pouco maior. Um jantar não seria suficiente para entrarmos em um acordo justo para ambos.

Ele não parecia estar contente, nem sequer com o nosso jantar, ou talvez não quisesse estar na minha companhia. O que mais poderia fazer para deixá-lo feliz? Queria descobrir!

- Quero propor um outro acordo. Sabe senhor Nogueira, não gostaria de sair hoje desse jantar sem uma conclusão dessa nossa pequena reunião.

Não queria ser chato ou algo assim, mas sair do México e não voltar com todos os contratos assinados que pensei que conseguiria, não era uma opção, era para ser uma certeza. Preparei-me para recomeçar do zero se fosse preciso nossa conversa, no entanto, algo chamou atenção dele em outra direção.

- Nogueira, não acredito que te encontrei depois de anos! Meu Deus, você continua o mesmo!

Respirei fundo, olhando para quem tinha acabado de nos interromper. Surpreendentemente reconheci ela, era aquela senhora do hotel que conheci no mesmo elevador. Fora alguns segundos para que reconhecesse também sua acompanhante, como sendo a camareira.

Ela parecia diferente do que recordava, provavelmente era devido ao vestido de babados e cabelos soltos. Evitei olhar muito para elas, não tinha como piorar as coisas ou tinha? Que coincidência bizarra era aquela? O que aquelas duas faziam juntas? E justo naquele restaurante? Aquilo me deixou desconfortável.

- Gabriela, fico feliz em revê-la após todos esses anos! E essa jovem é sua neta? Por que não sentam conosco? Somos dois cavalheiros solitários. Não concorda senhor Gonzalez?

Eu não concordava e muito menos queria que elas ficassem conosco! Era um jantar de negócios e não uma festinha entre amigos!

- Fiquem à vontade para se juntar a nós. - respondi, para não ser antipático.

Nunca gostei quando as coisas não saiam exatamente como eu havia planejado. Não queria aquelas duas companhias a mais naquele jantar. Era meio embaraçoso estar novamente com aquela camareira que me deixava nervoso, devido ao que acontecera antes no meu quarto.

- Venha, querida, sentaremos com esses dois homens gentis. Agradeço por nos convidarem, estaríamos jantando sozinhas essa noite, e agora estamos muito bem acompanhadas.

Um meio sorriso cínico saiu dos meus lábios para a senhora. Olhei para sua acompanhante e acabei fazendo careta sem querer. Pedi mentalmente para que ela não notasse o desprazer que era.

- Faço questão em pagar o jantar para as duas. Fiquem à vontade para pedir o que quiserem. A minha recompensa será a companhia das senhoritas.

Olhei para o meu prato de comida, para não perceberem a minha cara de desgosto. O senhor Nogueira era para estar resolvendo um acordo comigo sobre negócios, e não estar flertando aquelas duas, porque era essa impressão que eu tinha

- Você pode pelo menos fingir que está alegre? - a camareira perguntou discretamente para mim, ousando repousar sua mão sobre a minha perna. Fiquei bem assustado, retirei rapidamente sua mão de cima de mim.

- Deveria fingir alegria? Você não entende como está sendo difícil toda essa situação pra mim. Não entendo toda sua ousadia ao repousar sua mão na minha perna, isso foi muito inapropriado, ainda mais, para uma senhorita como você. Sei que não estamos no hotel e que você esqueceu as formalidades, mas, por favor, não exagere! - sussurrei para que somente ela ouvisse e disfarcei sorrindo.

Apesar dos anos de várias idas e vindas ao Brasil, ainda não estava acostumado totalmente com a maneira que eles tinham liberdade. Ela nem sequer me conhecia e obviamente sua atitude me deixou assustado.

- Apenas queria que você ficasse à vontade. Sinto que tem um clima muito pesado entre nós. Desculpe, irei respeitá-lo, me mantendo quieta e na minha.

Senti-me aliviado por ela ter entendido que era melhor manter distância de mim. Não era um encontro entre casais aquele jantar. Era para ser um jantar de negócios, todavia, transformou-se em outra coisa. Estava me irritando muito.

Após as duas pedirem alguns pratos, o clima amenizou um pouco, pelo menos, para o senhor Nogueira, que parecia se divertir com a forma que aquela jovem contava suas histórias, dos sufocos que havia passado até aquele momento na cidade grande.

- Uma vez acabei indo parar em um bairro muito distante que conhecia sequer por ter pegado o ônibus errado. É que às vezes, sou meio atrapalhada, sabe? Mas nada que eu não tenha conseguido me virar bem. - contou rindo e engasgou-se logo em seguida, com um pedaço de frango.

Desesperei-me. Não gostava de presenciar situações difíceis, como, por exemplo, aquela com ela na minha frente. Senti medo por ela. Levantei-me da cadeira e puxei ela, tentando desengasga-la. Fui por trás do seu corpo, apertando o seu estômago com meus braços.

- Senhorita, põe pra fora, anda!

Quando o pedaço de frango voou sobre a mesa, soltei ela imediatamente. Meu rosto queimou. Foi vergonhoso, pois, todos que estavam presentes, nos olhavam. O que poderia fazer? Não agir? Ter deixado ela morrer?

- Agradeço o seu socorro, entretanto, você não deveria ter me apertado tanto. Agora a comida toda que comi quer voltar para trás...

Ela saiu correndo e eu voltei a sentar na cadeira. Passei diversas vezes as mãos pelos meus cabelos. E se ela vomitasse até morrer no toalete? Perguntei-me preocupado. Sabia que não conseguiria ficar em paz sem ter notícias, portanto, resolvi que o melhor era ir atrás dela.

Não me importei que a senhora Gabriela e o senhor Nogueira pensassem coisas erradas de mim. Ela talvez precisasse de ajuda e eu queria ajudá-la, devido o que causará, após apertá-la tanto. Caminhei até o toalete.

- Você está bem do outro lado? - perguntei, batendo na porta, sem invadir seu espaço.

- Perdi toda a minha janta e caí no meu próprio vômito, fora isso estou ótima! - resmungou.

Sem pensar direito, adentrei o toalete feminino. Por quê? Porque fiquei receoso de que ela pudesse ter se machucado ao cair no seu próprio vômito. Vê-la suja e de certa forma humilhada, aumentou minha aflição.

- Seu braço está sangrando! Devemos ir ao hospital imediatamente! Venha comigo, serei cuidadoso para que não piore a situação, caso tenha fraturado algum osso...

- Não! Solta meu braço! Não sei de onde você é, mas não será um arranhãozinho desses que vai me matar!

Não compreendia o porquê aquela revolta toda dela. Pensei que ela ficaria agradecida, por ter alguém querendo ajudar e não o contrário. Eu não sabia o que fazer, ela estava discutindo comigo. Por que tanto aborrecimento em uma moça tão pequena? Não aguentei ouvir tudo calado sem merecer.

- Eu não queria estar passando por nada disso, nesta noite, que era para ser um jantar de negócios! E olha no que tudo isso se transformou, em uma grande confusão! A senhorita está complicando as coisas ainda mais. Como voltarei para aquela mesa de jantar sabendo que você a qualquer momento pode cair dura no chão? Não entendo vocês brasileiros, sinceramente eu não entendo!

Desabafei minha frustração. Obtive toda a atenção dela, enquanto surtava nervoso.

- E eu tenho culpa dos seus problemas? Não tenho! Estou acostumada com coisas piores. Por favor, para de me olhar como se você estivesse conversando com alguém que vai morrer! Estou muito viva! Dá o fora desse banheiro agora! Cai fora! E não fala mais comigo por essa noite!

Não retruquei e aceitei seu pedido. O ambiente não era para discussões. Ela não era nada agradecida, então, era melhor me retirar mesmo. Quando saí do toalete feminino retornei a mesa e inventei uma desculpa qualquer e me despedi do Senhor Nogueira e daquela senhora.

Do lado de fora do restaurante, os meus seguranças me aguardavam. Estranharam meu mau-humor, no entanto, mantiveram-se profissionais. Entrei no carro alugado, retornando para o hotel, me sentindo um derrotado, após uma noite terrível.

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