Desperto na mesma posição em que fiquei ontem, mas agora estou completamente coberta pelo lençol e Dylan nem ao menos me chamou para ir para a cama. Me sento, entretanto, meus músculos do pescoço protestam, tento virar minha cabeça para o lado, o que só acaba por piorar a dor.
Me levanto e vou para a cozinha onde pego a caixa de remédios, tomo um Advil e subo para o quarto, meus olhos se arregalam ao constatar a hora pelo relógio na cabeceira. Já são quase nove horas! Não há mais chances de ir para a escola. Vou para o banheiro e tiro o lençol jogando-o no canto do chão e ligo a água. Ao entrar, meus músculos do pescoço relaxam na água quente e acabando com a tensão. Saio do banheiro e coloco minha casual calça jeans e uma blusa branca, penteio meus cabelos e deixo-os secar naturalmente. Desço para a cozinha e encontro Dylan olhando pensativamente para a geladeira e por um momento fico confusa. Onde ele dormiu? — Bom dia, Eve — Ele diz quase cantando e sorri — Como você está? — arqueio a sobrancelha, Dylan parece estar novinho em folha, resultado de uma noite bem dormida. — Estou com torcicolo. Por que não me acordou para ir para a cama? — Você estava em um sono profundo, então aproveitei a cama da sua mãe! — Gay, muito gay! — E eu reparei que as cobertas dela têm cheiro de lavanda e não a sexo! — Dylan! — repreendo-o, mas o sorriso é maior e eu acabo rindo da sua constatação. — Por falar na sua mãe, onde está a dona Linda? — Você sabe, voando, e ela acaba ficando sem tempo para fazer sexo, por isso sua roupa de cama está cheirando a lavanda — Se eu falar de sexo com outra pessoa que não seja com Dylan eu fico envergonhada, vermelha, pegando fogo, mas com ele é diferente, sempre pude compartilhar meus receios com Dylan — E David? — pergunto, mudando de assunto. — Está bem, ficou triste porque eu o deixei dormir sozinho — David é namorado de Dylan já faz um longo tempo e a história de ambos não foi um mar de rosas. O começo foi complicado, a família de Dylan não o aceitou por ser gay e foi expulso de casa ainda adolescente. Já éramos amigos e eu e minha mãe o acolhemos na época, ele morou um tempo conosco até que conheceu David, o homem que tirou seus pés do chão. No início David ficou com ciúmes por causa da nossa amizade, mas com o tempo ele compreendeu que uma amizade como a nossa é bela e rara. Eles foram embora no começo do ano passado para conhecer um pouco das riquezas do mundo, agora voltaram e estão morando juntos. David é cinco anos mais velho que Dylan, é formado em Direito e é uma pessoa realmente legal, eu simplesmente o adoro. Enquanto isso, Dylan ainda tem que terminar o colegial junto comigo. — Por que você não o chamou para dormir aqui também? — Ele falou que teve um dia estressante e cheio. — Está pronto para qualquer dia esbarrar com a sua família? — Dylan faz uma cara de quem chupou limão azedo e não gostou. — Acho que isso irá acontecer a qualquer momento, mas não poderia me importar menos, eu finalmente me sinto realizado. — Eu vejo — Me lembro claramente de dois anos atrás e é maravilhoso vê-lo bem, eu compartilhei de sua dor por não ser aceito por sua sexualidade pela própria família, que deveria compreender que as vezes não almejamos o futuro que eles planejaram para nós. — Ele me pediu em casamento — Dylan confessa com um largo sorriso em seu rosto. — Me diga que você aceitou?! — Claro que aceitei, em parte foi por isso que nós voltamos, além de querer voltar para onde eu cresci, queria contar para a minha melhor amiga que ela será minha madrinha! — Eu vou ser a madrinha? Já marcaram a data? — pergunto perplexa. — Ainda não, porém vamos em breve, já que atingi a maior idade. — Dylan, estou tão feliz por você! — dou a volta na mesa da cozinha e abraço-o apertadamente — Obrigado por não me acordar para ir à escola — sussurro sorrindo em seu ouvido. — De nada, Eve — Nos afastamos e o observo alegremente. Dylan vai se casar! — Primeiro dia de volta à escola e já está faltando — brinco. — Não é como se eu gostasse de estudar. — Sei — arqueio minhas sobrancelhas em sua direção, não era um grande segredo que Dylan nunca gostou de estudar. — Hoje nós vamos sair para jantar e queremos que você venha junto. — Acho melhor não ir, esse é um momento que vocês dois precisam estar juntos a sós. — Você sabe que nunca atrapalha, Eve! Nós dois queremos saber o que tem acontecido nessa cidade, além disso queremos saber se você deu o seu cartão “V” — sinto um calor rastejar por minhas bochechas — Ah, meu Deus, Everly! Você deu? — Dylan praticamente grita. — É obvio que não! — Então por que você ficou vermelha? — No começo da semana fui a praça para desenhar e esbocei um homem, ele se chama Joshua e me deu seu número, deixou claro que se eu quisesse desenhá-lo novamente, poderia ligar. — Eve, isso foi uma indireta bem direta! — Ele é mais velho. — Esse é um pensamento totalmente ultrapassado. — E... — Há algo mais? — Ele é nosso professor de cálculo! — Oh senhor! — Ele coloca suas mãos na boca abismado, mas logo tira e sorri — Vai ser como aqueles romances de professor e aluna que eu leio. — Definitivamente não! Dylan, eu não sou esse tipo de pessoa, acho que nunca me submeteria a algo do tipo. — E se não fosse nosso professor? — Então eu poderia considerar. — Eu preciso conhecer ele! — Amanhã você irá e eu estou tão feliz por você estar de volta — digo, tentando mudar de assunto desesperadamente — Não ficarei mais sozinha. — Boa hora para voltar para Montesano, não? — Boa hora, Dylan. [...] — Por que você está me dando isso? — pergunto para Dylan quando ele coloca o quinto copo de uma bebida adocicada de cor rosa. — Porque você precisa ter novas experiências como qualquer adolescente — olho para Dylan e em seguida para David, eles estão girando e rindo de algo. — Dylan, eu acho melhor essa ser a última — ouço a voz repreensiva de David e eu pego o canudinho com os meus lábios e começo a beber a bebida enquanto assisto os dois. — Eu estou bem, David — Na verdade acho que nunca estive tão bem! — Você não irá se sentir assim amanhã, querida — Abro um sorriso mostrando todos os dentes. — Dylan vai cuidar de mim! [...] O despertador soa tão alto, parece um animal morrendo! A primeira coisa que percebo é que tudo dói. Bato no despertador e ouço um estrondo que me acorda rapidamente, o maldito despertador caiu. Cambaleio até o banheiro e me olho no espelho, pareço a mulher do Frankenstein. Então me lembro da escola. Tenho que ir para a escola! Tomo banho o mais rápido que eu consigo e visto jeans, uma regata e blusa de frio junto do tênis. Ouço uma buzina e pego a bolsa, pelo menos não terei mais que pegar ônibus. Entro no carro e olho para Dylan. — Você está uma droga ou sou só eu? — Eu estou belíssima, acho que é só você — deito minha cabeça no banco e fecho os olhos, mesmo assim ela não para de doer. — Você parece estar com uma dor de cabeça assassina. — Por que você me deu tanta bebida ontem? — Ele me olha claramente divertido. — Porque você precisava ter o seu primeiro porre! — Bem, eu não quero um desses nunca mais! — Desgraçado! Chegamos à escola no momento exato em que o sinal soa e ando lentamente até a primeira aula de cálculo. Infelizmente Dylan não está nessa sala comigo e me deixa na porta com um beijo na testa. Olho para a sala e vejo Joshua me olhando atentamente, os seus olhos parecem estar em chamas ou talvez seja apenas impressão minha. Vou até o meu lugar, me sento e deixo o material em cima da carteira. Joshua começa a ministrar a matéria, porém minha mente caótica não consegue prestar atenção, a dor em minha cabeça se torna tão grande que coloco minhas mãos nela e sinto o suor molhá-las. Meu estômago começa a dar reviravoltas e sinto ânsia, saio correndo da sala sem me importar com os risos que me acompanham, empurro a porta do banheiro me enfiando em uma cabine e começo a vomitar, até que sinto alguém segurar meu cabelo em um rabo de cavalo. — Coloque tudo para fora, Everly — A voz diz. Ah não! Joshua! — Vá embora! — digo, tentando afastá-lo com a mão, mas começo a vomitar novamente, suas mãos vão para minhas costas em uma espécie de carinho. Apesar de estar vomitando praticamente as minhas tripas, ainda sinto arrepios com o seu toque. Dou descarga e Joshua coloca na minha mão vários pedaços de papel. Limpo minha boca e passo reto por ele sem olhá-lo nos olhos, dirijo-me a pia, onde enxaguo minha boca tentando me livrar do sabor amargo. Ao me virar encontro Joshua com uma expressão assassina, como se quisesse me matar. — Você bebeu ontem? — Sim — sussurro, prevendo que serei repreendida. — Não deveria, ainda é uma menina muito nova. — Eu sei — Se você... — vejo-o apertar as mãos em fúria. — Se você? — repito, incentivando-o a me dizer o resto. — Nada. Vá para a enfermaria e veja se tem algum analgésico, pois tenho certeza de que você está com dor de cabeça. Não faça isso novamente e traga-me as anotações, isso pode me dar sérios problemas — Ele se vai, me deixando sozinha. [...] Joshua Vejo Everly chegar com um menino, ele lhe dá um beijo na testa e isso me deixa com uma fúria interior massacrante, se eu não posso tê-la, então ninguém pode! Ela se senta em seu lugar, mas parece estar distante. Confirmo isso ao vê-la saindo correndo da sala e vou atrás dela, pausando a aula. Vejo-a entrar em uma cabine no banheiro e começar a vomitar seu estômago para fora, e isso comprova o que pensei me deixando nervoso. Ao cuidar dela quase falo uma besteira. Se você fosse minha... Mas Everly nunca será.
Quando o intervalo chega já me sinto melhor devido ao analgésico. Não voltei mais para a sala de aula, fiquei em “observação”, o que foi completamente desnecessário, e assim que o sinal soou, a enfermeira insistiu para que eu comesse algo e me deu um discurso sobre bebidas alcoólicas, completamente desnecessário também, pois eu NUNCA MAIS ficarei bêbada novamente na minha vida! Fui em direção ao refeitório, peguei uma bandeja e coloquei o hambúrguer mais “saudável” que a escola insiste em dar, peguei um mini bolinho e uma caixinha de suco. Busco por Dylan no refeitório e encontro-o sentado no fundo acenando para mim igual uma bicha louca, tento não começar a rir e ando até a mesa. — Eve! Você definitivamente parece melhor! — Agora estou melhor já que vomitei todas as minhas tripas para fora — digo sarcástica. — Você vomitou na sala? — Dylan faz uma expressão de “Oh meus Deus!” como se fosse uma grande coisa. — Na verdade, eu saí correndo e meu “professor” veio atr
Muitas vezes dizem que o destino brinca com você, sempre achei isso uma puta idiotice, quem acredita em destino? Sinceramente? Eu não. Mas fico me perguntando repetidamente qual foi a intervenção maldita que colocou um homem correndo no parque, o homem que eu desenhei, o homem que é a droga do meu professor! Ok, não é para tanto assim, eu acho. O pior é que desde então eu não paro de pensar nele, o que é totalmente errado. Errado também é eu ter escondido em meu quarto um retrato nu, acho que a minha mãe teria um enfarto assim que olhasse, ainda mais por saber que foi um homem, mesmo que ‘gay’, me retratou. — Everly, onde você está? Preciso da sua atenção aqui — A conselheira começa a estalar os dedos na minha frente e saio dos meus pensamentos. — Me desculpe — murmuro — Sobre o que a senhora estava falando? A conselheira é uma mulher já em seus sessenta anos, cabelos pretos pintados na altura do pescoço e acima do peso, ela suspira profundamente como se não qu
— Você está bem, Everly? Congelo em minha risada, na verdade eu e Dylan congelamos, ele olha para trás de mim e arregala os olhos. Eu definitivamente conheço essa voz. Viro-me para trás e deparo-me com um Joshua, sua preocupação está estampada na sua face. — Você está bem, Everly? — pergunta novamente, olho-o de cima abaixo, ele está vestindo roupas casuais, uma calça jeans surrada que já viu dias melhores, uma blusa de linho branca e tênis. Joshua arqueia a sobrancelha esperando por uma resposta. — Nós estamos bem, senhor Joshua — Dylan intercepta vendo que eu estou no mundo da lua, ele se coloca ao meu lado praticamente se colando em mim, vejo Joshua tencionar, mas seus olhos não demonstram nada — Na verdade, eu e Eve vamos a sorveteria. — Vamos? Acordo e olho para Dylan. Nós vamos? Olho para a sorveteria. Bem pensado Dylan! — Você gostaria de tomar sorvete com a gente? — arregalo meus olhos para Dylan. Que porra de ideia é essa? Olho para Joshua esp
Everly 1 semana depois. A prova é colocada na minha mesa, espero o professor Joshua se virar e entregar as provas dos outros alunos e finalmente encaro o papel na minha frente. 2. Eu tirei 2. Meus ombros desmoronam para baixo como se o mundo tivesse caído sobre eles. Como vou para a faculdade? O que vou fazer para me formar? Esfrego as mãos em meu rosto tentando aliviar a frustração que sinto dentro de mim, está mais para um vulcão prestes a entrar em erupção. O sinal soa, parece que Deus ouviu meus pensamentos, porque o que eu mais quero é sair daqui, chegar em casa e enterrar meu rosto no travesseiro. — Everly, espere um minuto, por favor? — paro minha quase corrida para a saída, outras alunas que estão saindo olham para mim com óbvia inveja. Danem-se elas. Danem-se todos. Volto-me para Joshua, ele espera os outros alunos saírem para então ficarmos sozinhos. — Everly, sua nota não foi... — Não o deixo terminar e explodo. — Não foi boa! Eu sei! Eu
Ele quer que eu o desenhe agora? Eu dormi no apartamento do meu professor, faltei a aula, e ainda continuo no apartamento dele. O quão maluca eu sou? Ao invés de ir embora, estou aqui, vestindo uma roupa sua, e olhando-o sem saber o que dizer. — Eu quero que você me desenhe. Assinto, foi essa a proposta. — Você pode se sentar no sofá — encontro minha voz. Ele assente, vai até o sofá e eu vou até sua pequena mesa onde está minha bolsa. Tiro meu caderno de artes e um lápis próprio para desenhos. Pego uma cadeira da mesa e coloco bem distante de Joshua. Decido não apenas pintar seu rosto, somente pegar metade do seu tórax e ir subindo. Não sei quanto tempo exatamente fico desenhando, minutos, horas, eu não sei, apenas me dou por satisfeita quando fica pronto e fico feliz com o resultado. — Acabei! — digo vitoriosa. Joshua, no mesmo instante sai do sofá e entrego-o a folha, ele olha por um bom tempo e sorri de um modo que deixou todo o meu corpo arrepiado
Por Everly Abro a porta de casa, vejo minha mãe na cozinha e praticamente vou correndo ao seu encontro. — Nossa filha, calma — Ela ri da minha alegria, mas está mais para alivio, alivio que minha mãe voltou viva para casa, odeio que ela trabalhe de aeromoça, infelizmente não temos muitas opções. — Estava com saudades, mãe — abraço-a apertadamente. — E o trabalho? — conversei com minha mãe sobre o trabalho e ela não agiu muito bem a princípio, mas aceitou, já que não passa muito tempo comigo, contudo, disse que iríamos conversar mais sobre isso. — E a escola? — fico tensa, pois hoje mesmo eu faltei, coloco um sorriso no rosto tentando disfarçar a mentira. — A mesma coisa de sempre — E eu não estou mentindo, a única coisa que mudou foi o professor gostoso de cálculo — O que você está fazendo de comida? — pergunto tentando mudar de assunto. — Carne ao molho madeira, sei que você ama — Realmente amo. — Vou tomar um banho e já desço para ficar com você, te amo e que
Por Joshua. — Então maninho, me diga o que tem de bom nesse fim de mundo? — arqueio a sobrancelha pelo modo de falar de Joss. Para mim esse fim de mundo está sendo até bom, pelo menos ninguém me conhece aqui, apenas sou o professor Joshua — Aqui é tranquilo Joss, não é como loucura da cidade grande — Joss sempre gostou de loucura, deve ser por isso que ela é meia doidinha. — Isso é chato! Mas me diga como vai o emprego? Melhor do que eu podia esperar... — Como se não soubesse, Joss. Dei aula até para você — reviro os olhos — Dou aula para uma classe cheia de adolescentes que não sabem o que querem da vida e que não tem a decência de ao menos tirar uma nota razoável — Não é como se eu fosse um modelo de aluno quando era adolescente, mas consegui passar na prova de seleção da faculdade, uma das provas mais difíceis que já fiz na vida e consegui a bolsa de estudos. Meus pais poderiam pagar pela faculdade, porém quis provar para mim mesmo que depois do tempo difícil que tive, que
— Eve, abra a porta! Quero saber se você irá comigo na casa da senhora Evelin! A voz da minha mãe parece vir de longe, não sei quanto tempo exatamente eu estava deitada na minha cama encarando o teto que não tem nada para me oferecer. — Já entendi que você não vai, guardei o jantar que você não comeu! Com isso ouço passos se afastando e a porta batendo, não consigo parar de pensar no que aconteceu assim que sai do apartamento do meu professor. Era tão errado, mas ao mesmo tempo pareceu certo. Como vou encara-lo amanhã? Era para estar fazendo companhia a minha mãe que vai voltar ao trabalho, passar o máximo de tempo com ela, mas estou muito longe, estou viajando nas sensações sentidas a pouco tempo, a sensação que ele me fez sentir... É viciante, e eu quero mais. Não sei ao certo quando durmo, apenas acordo com o barulho do meu despertador no meu ouvido anunciando um novo dia, tenho que me despedir da minha mãe e também tenho medo do colégio informar sobre as minhas falt