Minha cabeça doía, até o meu dedo mindinho doía, fiquei consciente de que meu corpo inteiro doía.
- Ela está acordando.
A luz branca machucava os meus olhos. Com muito esforço consigo deixar uma pequena brechinha aberta e aos poucos passos a enxergar sombras, tudo estava embaçado e desfocado. Percebo que o local tinha como cor predominante o branco. Olhei a minha mão e tinha um fio que ligava ela ao tubo de soro. Eu não sabia como eu sabia, mas aquilo ali era um hospital.
Pisquei algumas vezes até os meus olhos se acostumarem com a claridade. O que será que aconteceu comigo?
Será que bati com o carro? Meus pais vão me matar se eu tiver estragado o carro novinho.
Aos poucos percebi um vulto ao lado da cama. O vulto foi criando forma e desembaçando e finalmente pude ver um rosto. Era um senhor de aparência cansada. Provavelmente o médico.
Eu abri a boca para falar, mas não saiu som algum. Onde estava a minha voz? Com muito esforço consegui fazer com que a minha voz passasse pela minha garganta ressecada.
- Onde estou? Como vim parar aqui? - perguntei sentindo o desespero tomar conta de mim.
- Olá! Sou o Dr. Mário. Do Hospital Italiano de Buenos Aires. Poderia me falar seu nome? – Estou sentido cheiro de problemas.
- Annalucia Swan Boston – falo como se fosse a coisa mais óbvia do mundo. Até porquê é. Não é?! Pelo menos para mim.
- Tem certeza? – esse médico só pode está tentando me enlouquecer.
- Sim! – afirmo com convicção.
- Seu estado civil? – Será que ele vai querer saber os números dos meus documentos também? Porque eu sinto muito, mas nunca os decorei.
- Solteira – vai me passando pela cabeça que este médico pode estar tentando flertar comigo. Esses médicos de hoje são todos uns safados.
- Poderia falar sua idade? – a cada pergunta dele tudo fica mais estranho. Quer dizer eu estou em um hospital, aconteceu alguma coisa comigo. Ele já não deveria saber sobre tudo isso?
- Tenho 15. Por favor, me fala o que está acontecendo? – Pedi sentindo meu desespero aumentando.
- Fazem 7 meses que você sofreu um acidente de carro e não temos certeza, mas tudo indica que você acabou se esquecendo do que aconteceu nos últimos anos. Mais especificamente os últimos 12 anos. – Nossa!!! Pelo menos eu estava certa sobre a história do acidente.
– Espera! – Falo em choque. Se passaram 12 anos. – Volta a fita. Você está querendo me dizer que não me lembro de 12 anos da minha vida? – ele somente balançou a cabeça positivamente. Que médico simpático. – Como você me fala uma coisa dessas assim?! – A partir desse momento estou mais do que desesperada. Estou entrando em pânico.
- Annalucia, preciso que se acalme. – O médico comandou firmemente, como se estivesse dando ordens à uma criança. - Irei chamar o seu marido – Marido? COMO ASSIM MARIDO? Será que estou casada com o Benício? Nós namoramos, ou melhor, namorávamos, mas não sabia que duraria tanto.
Paro o meu pensamento quando o médico volta com o... Samuel? Que merda é essa? Solto uma gargalhada extremamente ofensiva, até mesmo nervosa. Como ele quer que eu me acalme desse jeito?! Isso só pode ser brincadeira.
- Não, não e não! Liana? Dafine? Podem parar com a brincadeira. – Falo bem nervosa. Isso não pode ser verdade.
Eu odeio esse babaca.
- Annalucia, eu entendo. Está nervosa, que... – Ele parece triste, mas ainda é um babaca que eu odeio.
- Não. Você não entende, ninguém entende. – Seu idiota estupido!
- Annalucia, sabemos que é difícil. Então vá descansar. – o doutor fala saindo do quarto, enquanto Samuel permaneceu me encarando.
- O que é? – Pergunto a ele em um tom rude.
- Eu... só estava com saudades. – Meu Deus. Ele é louco? Usou drogas? Bebeu? SAUDADES?! Até onde sei Samuel me odeia tanto quanto eu o odeio, ou até mais.
- Samuel, você está bêbado? Drogado? Ficou louco de vez? – ele só ficou lá, me olhando, parecia que iria chorar.
Aí, será que fui muito grossa?! Bem. Não me importa.
- Samuel, olha. Me desculpa. Você pode me deixar sozinha? – ele balança a cabeça positivamente e sai.
Nossa, que droga eu andei ingerindo? Pra eu me casar com ele. O cara mais galinha que eu conhecia. Isso não pode estar acontecendo. Esse acidente veio em boa hora, foi uma segunda chance para eu concertar as merdas que andei fazendo. Sério, me casar com o cara que eu mais odeio não faz sentido algum. Ele sempre foi um babaca, ignorante e grosso comigo.
Ah, quando eu sair daqui terei que ter uma conversa não muito agradável com a Liana e a Delfina. Como minhas melhores amigas elas deviam impedir que eu fizesse esse tipo de merda.
Acordo novamente algumas horas depois tentando pôr minha cabeça no lugar. Vamos, Annalucia. Respira. Tudo poderia ser pior. Você poderia estar morta, poderia ter um filho com esse louco... olha a parte boa, existe separação, é só pedir o divórcio e pronto. Adeus Samuel.- Filha, você está bem? – minha mãe entra no quarto vindo me abraçar.- Como aconteceu? – Pergunto de braços cruzados e ela entende do que estou falando.- Vocês se apaixonaram, eu até estranhei. Sempre me falou que o odiava. Quando você me falou que estavagrávida eu tive vontade de matar você... – eu a interrompo- O-O QUE NÃO... NÃ – Falo tudo embolado, meio gaguejando. Não acredito Deus, o que foi que eu te fiz?Eu não tinha nenhuma lembrança. Senti os pelos dos meus braços arrepiarem e um
AnnaluciaSaio da consulta com a psicóloga um pouco zonza. Eu tenho três filhos. Porra Annalucia. Três filhos com aquele babaca. Olha as besteiras que você andou fazendo. Vai ser muito mais difícil me livrar dele do que eu estava pensando.Enquanto a psicóloga falava comigo eu tinha total convicção de que ela estava falando da vida de outra pessoa.Minhas lembranças não tinham voltado, nenhuma nova memória. A todo o momento ela descrevia uma mãe amorosa, uma esposa dedicada, uma trabalhadora competente e uma adulta responsável.Em minha cabeça eu sou uma adolescente de 15 anos, rainha da pista de patinação do Jam & Roller, namorada do Benício, estudante do primeiro ano do Blake South College junto às minhas duas melhores amigas, Liana e Dafine. Eu não estou pronta para enfrentar uma vida diferente des
AnnaluciaNada, absolutamente nada, nem a conversa com a psicóloga, nem a conversa com Samuel. Nada me preparou para o primeiro encontro entre mim e as crianças. Nada me preparou para o turbilhão de sentimentos que tomou conta de mim ao olhar os três em pé, ali em frente a porta.Harry vem correndo e me abraça gostosamente, eu envolvo meus braços ao redor daquele pequeno corpo e sinto o cheiro gostoso de bebê, ele descansa o rostinho na curva do meu pescoço e se aninha ao meu colo. É tão bom sentilo assim que sinto que ele não deveria sair dali nunca mais.- Senti tanto a sua falta mamãe. - Sônia corri até mim e me abraça também. - Papai disse que você estava viajando, que precisava de um tempo sozinha para descansar. - ela se afasta um pouco e olha nos meus olhos. - Não viaja de novo mamãe, eu pensei que
Flashback12 anos atrásEra impossível pensar outra coisa enquanto eu olhava Samuel andando pelo corredor com o nariz empinado com duas vadias a tira colo.- Olha se não é a Olivia Palito. - Ele disse vindo em minha direção.Embora hoje em dia eu tivesse peitos tamanho M e ostentasse orgulhosamente um corpinho 36 Samuel foi a única pessoa que nunca esqueceu meus "apelidos" de infância.- O que você quer idiota? - Perguntei com raiva.- Fiquei sabendo que seu encontro de ontem não aconteceu. Que pena, não? – Ele fala e as duas vadias gargalham.- É? E ficou sabendo como? – Caio no seu jogo, não consigo evitar, ele me irrita.<
Flashback on12 anos atrás- Mas mãe, eu não consegui uma carona para festa eu preciso que você me leve. – Já estou pronta com meu vestido preto e saltos. Sem chances de eu não ir nesta festa.- Não vai dar Annalucia. Estou saindo, seu pai tem um jantar importante e já estou atrasada para pega-lo. Tchau. Se for sair não chegue tarde. – Ela bate à porta da frente.Droga, o que vou fazer? Cogito chamar um táxi, mas a volta será complicada para conseguir um o local é meio afastado e Benício está na Itália para o enterro de alguém, não vai a festa. Pedi uma carona com a Liana, mas o Samuel está sem carro então eles vão de carona com outras pessoas. Olho para a mesinha da entrada e vejo a chave do carro do meu pai.Por que não? Não deve
Eram 07:00 quando Mônica chegou para buscar as crianças para o colégio. Segundo ela essa era uma das minhas funções, mas não sei mais dirigir então passei o papel.Me despeço de Josh e Sônia com beijos e abraços rápidos. Ambos estavam com pressa para ir ao colégio.Crianças. Humpf.Peguei Harry pela mão e estava o levando em direção ao carro de Mônica.-Mamãe. - Ele chama minha atenção.- O que bebê? - Me abaixo para ficar a sua altura e olha-lo nos olhos.- Não quero ir para escola mamãe. Quero ficar com você. - Ele diz fazendo o bico mais lindo que já vi na vida.- Mas você tem que ir meu amor. Você não está com saudades do seus amiguinhos? - Nesse momento seus olhinhos encheram de agua e meu coração doeu.- Não
Eu tentava evitar, Samuel também, mas as nossas discussões estavam cada vez piores e as crianças começaram a nos ver discutindo de vez em quando. A falta de carinho entre a gente também chamava a atenção e de vez em quando ouvíamos um “você não vai beijar a/o mamãe/papai?”.Meu pai passou aqui mais vezes durante a semana, sempre contando histórias do quanto Samuel é maravilhoso, Dafine estava igualzinha. Os dois estavam em pânico pelo divórcio e avisei aos dois que foi só uma ideia que cogitei, mas que não iria me precipitar, o que deixou os dois visivelmente aliviados.Mônica pegou algo no ar e foi me visitar na empresa uma vez. Como a mulher maravilhosa que é, ela teve muito tato, mas deixou bem claro para mim que não está feliz com tudo que está acontecendo entre Samuel e eu e que isto está afetando
- Benício!- Olá Annalucia! Que bom que se lembra de mim. – me encolho como sempre faço quando escuto a palavra lembrar, mas me recomponho, levanto e estendo a mão para ele.- Em que posso ajudá-lo? – Pergunto enquanto nos cumprimentamos. – Sente-se por favor.- Eu trabalho para a despegar.com, setor de marketing e propaganda e estamos precisando de um novo comercial – Benício começa falando.- Wow despegar maior agência de turismo da América Latina. Nada mal Benício. – Brinco com ele. – Mas vamos continue. O que está procurando?Benício começa a falar todas as suas ideias e começo a fazer anotações. O plano é bom. Minha mente enche de ideias e já passo para o papel. É um projeto grande, vou precisar da ajuda da Jazmin ainda não confio em mim.Embora tenha visto alguns