SONHADORA

Cinco anos depois...

 

AVA THOMPSON

 

Eu estava em um sono profundo, mas algo insistia em me tirar do estado letárgico em que me encontrava.

— Ava! Acorda!

Diante daquelas palavras, meus olhos se abriram, mas o arrependimento veio logo depois. Uma forte claridade incomodou minha retina e, antes que eu cogitasse em fechar os olhos novamente, a voz da minha tia se fez presente.

— Levanta agora! Sua preguiçosa.

Levantei num pulo. As feições dela eram algo espantoso, bufando de tanta raiva, e com um giro rápido nos calcanhares, ela deixou o ambiente. Olhei para o lado e minha irmã certamente já havia ido para a escola. Clara tem apenas 13 anos. Mesmo sendo somente sete anos mais velha, é como se fosse minha filha, pois passamos por momentos muito difíceis. Há 8 anos, quando nossos pais faleceram no trágico acidente de carro, eu tive que esquecer toda a dor que estava sentindo e me manter forte por ela, que acabou ficando em um estado depressivo, já não havia mais brilho em seus olhos, como se ela quisesse desistir de viver. Amélia, por ser a única parente mais próxima que tínhamos, acabou sendo responsável pela nossa guarda. Logo, quando meus pais morreram, ela nos tratava muito bem, mas alguns meses depois tudo mudou, tanto ela quanto seu esposo vivem reclamando que precisam pagar as contas.

Desde então, eles me tratam como se eu fosse um nada. Conforme fui crescendo, os insultos ficavam piores, no entanto, jamais levantaram as mãos para me bater. Contudo, seria muito melhor do que as palavras e as humilhações. Embora já tenha vinte anos, foi estipulado na época pelo juiz que ela seria minha tutora até atingir a maioridade, algo que vai mudar daqui alguns dias, já que irei completar vinte e um anos. Não me Foi permitido fazer uma faculdade, mas assim como minha mãe, tenho o dom para cozinhar e amo a gastronomia. No meu tempo livre, sempre estou assistindo vídeos e aprendendo tudo que posso para que um dia eu me torne uma Master Chef. Quem sabe trabalhar na rede de Restaurantes Romano e proporcionar uma vida melhor para minha irmã. O que vem à minha mente é o rosto do homem que tem ocupado meus pensamentos. Nunca tive um namorado e muito menos beijei alguém na vida, porém, quando vi a foto de Vincenzo Romano, senti meu coração batendo descompassado no peito. Não conseguia desviar meus olhos da tela à minha frente. Ele era, definitivamente, o homem mais avassaladoramente lindo que eu já tinha visto na vida. Era um homem nem gordo, nem muito magro, porém forte e media em torno de um metro e oitenta. Seus cabelos eram mais negros que as asas da graúna; lembro imediatamente de quando estava estudando com a Clara, aves originárias da América do Sul, e vi a foto do pássaro exótico. Observei que seus olhos eram lindos, com sua íris em um tom de castanho. Sua barba baixa e preta como ébano faz um belo contraste com seu rosto perfeito. Sempre sinto um formigamento nas pontas dos dedos, desejosa por saber se aqueles pelos negros de sua barba seriam grossos, como aparentava, ou se seriam macios ao toque.

Clara diz que me vê como um príncipe encantado que um dia será o meu salvador, mas talvez seja apenas admiração por tudo o que tenho acompanhado do legado da família Romano. Vincenzo não é apenas o homem mais bonito que já vi nesta vida, ele é alguém tão bonito por dentro quanto por fora, pois há inúmeros relatos de como ele tem ajudado várias instituições que, com sua ajuda, têm mudado a vida daqueles que tanto necessitam.

 

A única coisa que acho estranha é o fato de um homem tão bonito não ser casado e tão poucas fotos dele serem vistas ao lado de alguma mulher que não seja sua mãe, Amber Romano, uma grande socialite que ascendeu socialmente não por se casar com Lorenzo Romano, mas por ser uma renomada estilista americana. Clara certamente deve ser sua maior admiradora, já que não sei a quem ela puxou mais. O que antes começou com pequenos rabiscos, hoje posso dizer que minha irmã leva jeito para a coisa, pois seus desenhos estão cada dia melhores.

 

Deixo as lembranças e as lamentações de lado e vou correndo para o banheiro. Minutos depois, já estou arrumada. Deixo meu quarto e sigo até a sala, onde os dois já estavam me esperando.

 

— Vamos! — disse meu tio Logan, que, embora seja casado com tia Amélia, desde criança meus pais me fizeram chamá-lo de tio.

 

— Cadê as caixas? — questiono.

 

— Toda a mercadoria já está dentro do veículo — tia Amélia esclarece.

Passos largos foram dados em direção à porta e, instantes depois, já dentro do carro, ele foi colocado em movimento. Desde os meus treze anos, sempre vou com eles até o centro da cidade para vender os potes de doces. Enquanto os tios ficam dentro do veículo, atendendo aos telefonemas, eles me entregam a mercadoria e eu a levo ao destinatário. Ainda me lembro da primeira vez que fui entregar a caixa e um homem enorme me deu muito dinheiro. Mesmo sendo tão pequena, eu disse para ele que era muito, afinal, um simples pote de doce não poderia ser tão caro.

 

Quando entreguei o dinheiro ao tio Logan e disse que o homem tinha pago muito mais, eles me explicaram que a mercadoria vinha de outro país, por isso o valor era aquele. Até hoje, não consigo entender o porquê de todos os clientes serem homens e jamais terem permitido que eu provasse os doces, já que, segundo eles, a mercadoria é somente para os clientes.

 

De tanto que ficávamos curiosas, numa certa manhã de domingo, quando Clara acordou e foi até a cozinha, encontrou um pote em cima da mesa e minha tia logo surgiu em seu campo de visão. Ela disse que nós duas poderíamos comer e confesso que era muito delicioso. Talvez por esse motivo, sempre eram as mesmas pessoas que compravam.

 

Afasto os devaneios de lado assim que chegamos ao nosso destino. Respiro fundo, pois hoje não é mais um dia diferente dos que tenho sobrevivido. Uma rotina árdua, faça chuva ou sol escaldante.

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