Emanuele
Dezembro, Brasil… 2018
Como eu me irrito durante as compras de Natal, meu Deus do céu!
Deveria ser proibido entrar mais de cem pessoas em uma loja só. Raramente tenho a oportunidade de ver minha amiga Caroline, desde que ela ficou noiva. Ela é fotógrafa e, por trabalhar com seu noivo, quase não fica no Rio. No entanto, hoje ela está sendo a minha salvadora com as compras dos presentes da minha família e estou à beira da loucura.
O shopping está lotado, as lojas estão abarrotadas e não consigo achar a abençoada boneca que minha irmã pediu que eu comprasse para minha sobrinha, que virá passar o Natal conosco. Amber é filha da minha prima, Fabrícia. Elas residem em Boston, mas vêm passar alguns feriados aqui sempre que podem. O Natal é de praxe.
Ando, ando e procuro, sem sucesso. Paro num canto e ligo para Carol.
— Amiga, onde você está? Não encontro essa boneca nem sob reza forte! — choramingo.
— Estou na fila do caixa para pagar as roupas e vou te encontrar daqui a dez minutos! Você já perguntou a algum funcionário da loja? Às vezes, é só uma questão de logística. Você está cansada, deve ter passado pela boneca várias vezes e não viu — disse de forma calma, não sei como consegue se manter tão tranquila em meio a esse caos.
— Vou tentar encontrar alguém nessa multidão. Você pode estar certa, até daqui a pouco, tchau.
— Até.
Desligamos.
Cato o primeiro menino que encontro trajando o uniforme da loja e ele se desvencilha, assustado. Acho que minha cara não está muito boa.
— Oi… Menino, boa noite! — Forço um sorriso, o que é uma má ideia, pois ele recua mais dois passos. — Eu gostaria de saber onde posso encontrar essa boneca aqui — mostro o celular com a foto da tal boneca.
— Ah! — responde, parecendo aliviado e passa a mão no peito. — Está no corredor quatro, mas está saindo bastante. Sugiro que corra até lá, não tem mais no estoque — informa antes de se virar para ir embora.
— Qual é o corredor quatro? — me desespero, olhando em volta.
— O que tem um número quatro gigante em cima — aponta para as placas no alto dos corredores.
Mas que malcriado!
Voo até o corredor quatro e ali, sozinha na prateleira, está a boneca maravilhosa. Não há ninguém no corredor, até penso ser pegadinha. Observo desconfiada, no entanto, uma promoção relâmpago conduz as pessoas para o corredor dos slimes, seja lá o que for isso. Corro até a prateleira e, ao pegar a caixa, congelo. A boneca não sai do lugar.
— Mas que… — olho para trás e meu queixo cai. A boneca está presa porque duas mãos grandes seguram a mesma embalagem.
— Desculpe, mas eu preciso muito mesmo desta boneca — diz o cara mais lindo que já vi na vida, com um sorriso de arrasar.
— Sinto muito, só que se eu não voltar para casa com essa boneca, serei deserdada! — rebato, sem exageros.
Eu seria mesmo.
Nos encaramos por um momento.
— É para minha sobrinha — ele sorri e quase sinto vontade de entregar não só a boneca, como todos os acessórios caríssimos que vendem separados e ainda embalados para presente.
Foco, Emanuele!
— É para minha priminha que vem de Boston, sério, é questão de vida ou morte — dramatizo.
Ele não solta o pacote. Nem eu.
— Temos um impasse aqui. Não pretendo desistir, não faz ideia do quanto andei para encontrar isso — suspira e seu cabelo balança. Reparo em seus olhos verdes claros combinados com os cabelos dourados, o porte atlético e o sorriso perfeito deixam o homem irresistível. Ele é mesmo um gato.
— É, você está certo, temos um impasse mesmo. Pois eu também andei, sofri, quase apanhei e assustei um funcionário da loja, tudo por causa dela — aponto para a embalagem em nossas mãos.
— Eu acho que posso resolver para vocês — uma mulher desconhecida surge do nada e puxa a boneca de nossas mãos. — Deixa que eu levo! — uma piscadinha e sai correndo em meio à multidão.
Corro atrás dela e o bonitão vem atrás, mas, no fim, perdemos a usurpadora de bonecas de vista. Ofegante, apoio as mãos nos joelhos e o bonitão sorridente para ao meu lado.
— Dante Alvarenga — estende a mão.
— Emanuele Velasquez — respondo, recuperando o fôlego.
— Me desculpe — falamos em uníssono e rimos.
— Parece que vamos andar mais um pouco atrás daquela boneca — ele fala, olhando em volta.
— Ai, não posso acreditar… ela estava tão perto! — resmungo.
— Tem razão, mas parece que uma espertinha resolveu um impasse importante, eu não soltaria nem se me pagasse — afirma.
— Ah, então teríamos um caso de polícia, eu não tinha pretensões de desistir também, não depois do que passei e possivelmente vou passar de novo — lamento.
— Nos resta então trabalhar em parceria. Quem encontrar avisa ao outro, o que acha? — pega sua carteira e saca um cartão de lá.
— Pode ser, embora eu não acredite em milagres de Natal — murmuro incrédula.
Por que ele ia querer uma parceria com uma estranha que queria a boneca impossível tanto quanto ele?!
— Tome meu cartão. Sou dentista e acabei de abrir um consultório, ainda não tem muita visibilidade, mas estou começando agora. É uma versão smart de consultório dentário, pode ligar para esse número — dá de ombros e pego o cartão preto. Não consigo reprimir a careta. Há uma broca dourada desenhada, perfurando um dente ao lado do nome dele, não é muito convidativo. — O que foi, não gostou do cartão?
— Ahn… é que… bem, eu trabalho com propaganda e marketing… acontece que falar em ir ao dentista já deixa algumas pessoas um tanto amedrontadas e esse detalhe do seu cartão… — comprimo os lábios. — Só falta fazer o som da broca, é meio assustador.
— Eu disse para o Rodrigo que isso não daria certo — reclama, balançando a cabeça e o encaro confusa. — É o meu sócio.
— Ah, por que não tentam deixar mais clean? De repente, um cartão verde-claro com tons brancos, em vez da broca, um contorno do dente, algo assim — sugiro.
— Seria perfeito, acho que tive uma ideia — diz, de repente. — E se eu te contratar para cuidar dessa parte de marketing do meu consultório? Somos novos nisso, qualquer ajuda seria bem-vinda — passa a mão pelos cabelos de maneira casual.
Uau!
— Mas você nem me conhece… — rebato rápido demais.
— Hum, tem razão, mas desde quando precisamos ser melhores amigos para contratar alguém? — levanta a sobrancelha.
— Touche! — respondo. — Ok, fechado — entrego o meu cartão para ele, que observa e volta a sorrir.
— Belo cartão! Vamos combinar um almoço essa semana e falamos sobre o consultório. Boa sorte com a boneca, e se achar me avise que eu te aviso também — dá uma piscadela. — Foi um prazer te conhecer, Emanuele!
— Igualmente, Dante! — sorrio debilmente.
Mal sabia que minha história estava apenas começando.
Minha amiga me encontra minutos depois e conto o que aconteceu, inclusive, o convite para trabalhar com o bonitão.
Carol morre de rir.
— Só você mesmo, Manu! Quem sabe a chegada do bonitão não estremece sua vida? — começa, mas logo é interrompida por seu celular. Pela carinha que faz, é o noivo. Minha amiga é completamente apaixonada por ele.
E, de fato, é Ricardo. Deixamos as compras no carro e, enfim, nos despedimos.
Dezembro, atualmente… 2020 (dois anos depois de conhecer Dante)Aguardo pela minha vez no consultório de Dante.É dia 16 de dezembro, plena quarta-feira e isso está o caos. Tudo bem que seu consultório está sempre cheio, e não é apenas porque ele é um ótimo dentista. Dante continua um gato, daqueles que você olha e diz: “Deus deve ter gastado uma semana nessa maravilha!''. Hoje trouxe minha amiga que, de tanto ouvir falar do dentista dos sonhos, resolveu vir comigo. Não que Caroline precise, já que ela é linda e perfeita, mas como ela passava muito tempo com seu ex-noivo, nunca conheceu Dante pessoalmente.— Nossa, eu achei que você estava exagerando, Manu, mas dou o braço a torcer. Parece que você não é a única a nutrir um crush pelo dentista! — se senta ao meu lado no instante que vaga um lugar.— Não sei por que pensou que fosse exagero — abro um panfleto promocional que peguei no balcão.— Emanuele, você é a pessoa mais exagerada que conheço! — bufa e sorri. — Uau! Mui amiga és t
Minha amiga entrou em seguida e pediu que eu a esperasse para ir embora. Sentada no banco, fico encarando o panfleto, sem ver nada exatamente. Uma hora aconteceria. Dante é lindo, óbvio que se envolveria com alguém tão lindo quanto ele, apenas não esperava que fosse com alguém tão próxima a mim.Nunca vi uma consulta experimental de alguém que tem dentes perfeitos demorar tanto, sério, estou há uma hora esperando-a sair. E os pacientes que estão aguardando já começaram a reclamar. Algum tempo depois, ela sai da sala toda sorridente. Se as pessoas aqui pudessem destruir alguém com o olhar, minha amiga seria um monte de poeira!— Nossa! Se não te conhecesse, diria que acabou de colocar esses dentes… ah, espera, já eram seus antes de entrar lá! — zombo e me levanto, saindo do consultório. Carol veio logo atrás.— Ei, o que foi? Por que está tão aborrecida assim? — ela toca em meu braço e paro. — Está mesmo fazendo essa pergunta? — Cruzo os braços.— Ok, demorou um pouco, eu sei.— Um po
Dirijo de volta para casa com uma dor de cabeça absurda, ligo o rádio e só toca sofrência, nada contra, até gosto, porém, não estou no clima. A cada estação um ritmo diferente, mas as mesmas letras. Sozinho, solidão, amor não correspondido… aff, ninguém merece essa fossa! Nem com o covarde do Gilberto sofri tanto… Mentira, sofri demais. Contudo, não quero pensar naquele bandido. Acorda, Emanuele, você ainda é jovem, tem alguma beleza e anos pela frente. E sua amiga é a melhor pessoa para estar com o Dante, melhor ela do que qualquer outra!E, com esse pensamento, dirijo em paz até minha casa. É quando tudo acontece. Na porta do restaurante mais caro da cidade, o Palaccio Rizzo, está o casal mais lindo que vi na vida, aos beijos… Dante e Caroline estão se beijando. E não é qualquer beijo. É o beijo, de tirar o fôlego de qualquer expectador.Distraída e arrasada demais para ver um palmo à minha frente, ouço o som de alguém gritando e olho, mas é tarde demais, bati em alguma coisa.Apó
Dominic RizzoJusto na minha primeira semana aqui no país, me envolvi em um acidente. Me envolvi, não. Fui envolvido.Está certo que a responsável por isso é uma ruiva muito atraente, de uma beleza simples e diferente, que conta com cabelos acobreados, olhos azuis impressionantes e uma boca perfeita, daquelas que você quer morder, beijar e não largar mais. Ela não é uma beldade, porém, é perfeita! Foi estranho o que senti ao olhar para ela a princípio, sem falar que fiquei tenso quando vi seu carro ziguezagueando na rua e indo em direção ao meu Porsche, que acabei de tirar da garagem. Bem-feito para mim, poderia ter escolhido outro, mas tenho um apego ao meu Porsche.Para completar o triunfo da minha visita, Dante veio me dizer que ficará ficar noivo, mas acabou de conhecer a garota! Nada contra ela, que é uma tremenda gata, parece ser uma boa pessoa e, coincidentemente, é amiga da mulher que bateu no meu Porsche, a tal Emanuele. Um belo nome, que agora não sairá da minha cabeça, já q
Meu peito arde e meus olhos me traem. Lágrimas começam a correr pelo meu rosto. O que deu em mim? Deveria estar feliz por minha amiga, na verdade, estou feliz por ela e arrasada por mim. Que deprimente, se agarrar em um crush por longos dois anos, e sofrer quando ele encontra alguém.— O que foi tudo isso? — parado com os braços cruzados e me encarando com a expressão enigmática, Dominic indaga, arrancando-me do meu torpor. — O que foi o quê? — retruco, com a voz rouca.— Essa cena. Pareceu um término estranho, para você, ao menos — dá de ombros.— Não foi nada — me limito a dizer.— Ah, foi sim, e como foi. Eu diria que você é apaixonada por ele! Está bem escrito aqui, em negrito — se aproxima e toca suavemente em minha testa com um dedo, gerando um calorzinho na região. — Impressão sua. Vamos embora, temos muito que resolver — seco os olhos e começo a andar em direção a recepção. — Certo, se não quer contar vai dar margens para pensamentos livres — estende a mão em rendição e par
— Minha família perguntará sobre como nos conhecemos, tem algo em mente? — o encaro.— Podemos dizer que foi em um dos restaurantes da minha família — responde, simplesmente.— Sua família tem restaurantes? — arquejo.— Sim, o Palaccio Rizzo, das Massas Rizzo's, conhece?— Vocês são donos da rede Rizzo's? — sinto o suor escorrer em minhas costas. — Dominic Rizzo, claro! Como não liguei os pontos? Vocês têm mais de 30 restaurantes espalhados pelo Brasil, além das massas que vendem nos supermercados! — exclamo, tonta.— É isso aí! E alguns consultórios dentários inteligentes também, um dos meus irmãos é dentista e bucomaxilo e pediu minha ajuda. Hoje contamos com três consultórios, um, no Rio, outro em Santa Catarina, e o mais recente em Nova York — continua e pisco em choque.A família Rizzo é uma das mais influentes no país, suas massas são famosas no mundo inteiro…Fico divagando.— Eu acho que vou surtar… quase matei e estraguei o Porsche de um Rizzo! Meu Deus, nem me toquei no seu
Minha família está arrasada!Dominic foi embora cedo e precisei explicar que ele tinha coisas a fazer, acrescentando que sairíamos amanhã. Ótimo, as mulheres vão à loucura! Posteriormente, me despeço de todos e meu cunhadinho se oferece para me levar para casa, agora estou desmotorizada. Ele e Evelyn entraram em contato com a seguradora, Fernando é advogado e dos bons, então está cuidando de tudo, apenas preciso escrever com detalhes o que houve e encaminhar o relatório para ele.Meu cunhado me deixou em casa e foi para a dele, morávamos perto.Subo esgotada, tomo um banho morno e me deito na minha cama. No celular, digito para Carol.Eu:"Fala comigo...""Sério, Caroline. Estou ficando preocupada. Aconteceu alguma coisa?""Somos amigas há quanto tempo? Não se afaste de mim, estou aqui para você, me responde vai..."Desisto de esperar uma resposta e acabo dormindo, segundo ele, não posso me estressar.Como estou de atestado até os primeiros dias de janeiro, libero Rafa e Valquíria no
O jantar corre bem, me divirto com Adônis, que é bem engraçado e gentil. Ele começa a falar sobre o acidente.— Agora, falando sério, Emanuele, não precisa pagar o conserto do carro — diz de repente.— Está louco? É claro que vou pagar, meu cunhado vai me ajudar com a seguradora e vai dar tudo certo — estou torcendo para isso.— Ok, mas se por acaso der algum problema no processo, não precisa, foi apenas um pequeno amassado na lataria — sua despreocupação me dá uma crise de risos.— Um pequeno amassado que custa bastante dinheiro! — zombo e ele continua impassível.— Você não me disse por que bateu no meu carro, não tinha nada na rua que pudesse atrapalhar sua visão — franze a testa ao me fitar. Respiro fundo.— Acontece que eu estava… — quando decido contar, uma algazarra começa onde estamos, Dominic olha por cima do meu ombro e dá um sorriso maroto.— Hum, parece que vai conhecer a minha família antes do esperado, Raio de sol — diz simplesmente.— O quê? — guincho.— Acho que esquec