Oásis

A noite, Donatello e Carlo subiam as escadas para entrar na Oásis, a boate que era um dos poucos negócios legítimos que Puzzo administrava. O lugar era um ponto de encontro para homens em busca de prazer e mulheres dispostas a oferecer isso em troca de presentes caros, todos sabiam que qualquer mulher que frequentasse o Oásis podia ser comprada.

Ao ver as mesas cheias de homens bêbados, com duas ou três mulheres os acompanhando, Don imediatamente pensou que Flora jamais colocaria os pés naquele lugar. Ninguém notou a presença dos homens e eles subiram até a área VIP.

— Me surpreende você continuar mantendo sua identidade em segredo. Eu no seu lugar já teria espalhado por todos os lados que sou dom da maior máfia italiana. — Carlo comentou erguendo os braços ao falar sobre a organização.

— E é por isso que você não duraria um mês. Sabe que o negócios mudaram. — ponderou, tentando manter-se tranquilo com o primo, não queria que ele o visse como inimigo. — Falando em negócios, te chamei aqui porque…

— Espera, espera, espera — o cortou repetindo as palavras rapidamente. — não podemos falar de negócios sem nem mesmo tomar um drink. — vendo que Don iria se opor ele continuou. — Eu sei do seu código de não beber ao falar de negócios, mas eu sou seu primo, não há com o que se preocupar. — Carlo sorria mostrando todos os dentes amarelados.

Donatello não confiava nele, na verdade não confiava em ninguém, mas a repentina visita de Carlo o deixou em alerta e sua fuga em se explicar também. Por isso preferia seguir o jogo do primo e tratá-lo bem para ver onde iriam chegar, pediu duas doses de Campari e esperou o primo tomar antes de iniciar o assunto.

— Então, primo, o que o trouxe tão repentinamente para cá? Esperava te ver só daqui dois meses.

— Santini me pediu para ser seus olhos quando você for executar o Marconi. — Carlo esperava uma reação, mas Don permaneceu inexpressivo. — Ele não confia que você cumprirá sua parte, já que você acredita na inocência do Marconi.

— Tenho meus motivos para acreditar que Marconi não está envolvido na morte de Rute, mas nem por isso deixarei de fazer o necessário para manter a paz. — Donatello se levantou e pôs as mãos nos bolsos. — Não darei a Santini um motivo para pedir por vendetta.

— E está corretíssimo, primo, mas temo que seu desejo por paz está longe de ser realidade agora que desprezou LeBlanc. — Carlo segurava o copo segurando um sorriso, era um homem sem lealdade, que corria para o lado mais forte e achava que Donatello em breve perderia seu posto.

— Eu estava dentro do código, Carlo, LeBlanc não cumpriu um acordo, eu poderia até tê-lo matado, mas não fiz isso para não dar mais motivos à Santini. Se ele não concorda com isso, então diga a ele para convocar uma reunião com todas as famílias para revermos o código. — Donatello falou com a voz baixa e grave, que soou assustadora o bastante para calar seu primo.

Convocar todas as famílias era um evento único e significativo. Angelo Santini não se atreveria a propor algo assim sabendo da popularidade de Puzzo. Donatello não teria se tornado o maior chefe da máfia italiana se não tivesse apoio e aliados, homems mais velhos sentavam para ouvir seus conselhos, pedir favores e fazer negócios. Santini não tinha o poder necessário para derrubá-lo e ambos sabiam disso.

— Bom, eu não vim aqui apenas para falar de negócios, também quero me divertir.

Donatello dispensou o primo e ficou, assistia a apresentação de pole dance no palco principal, mas sua mente pensava em outras coisas, planejava seus próximos passos, seu primo estava certo sobre Ângelo Santini não gostar de LeBlanc ter saído e ele precisava ter cuidado, Santini não era forte o suficiente, mas Donatello não era santo e tinha seus inimigos, como se não bastasse, a inveja e ganância eram motivos mais que suficientes para que se voltassem contra ele.

Decidiu que iria aproveitar sua viagem à capital para fortalecer os laços com Ferdinando Savoia, o dom da máfia romana. Também achou que seria bom adiatar seu casamento com Flora, cabia a ele manter a única Callegari sobrevivente viva, ela era sua melhor chance de conseguir respostas sobre o que aconteceu no passado.

— Donatello Puzzo… como pôde vir nos visitar sem avisar? Eu teria no mínimo separado uma boa garrafa de champanhe. — Keila Lombardi se aproximou, a mulher era a gerente do estabelecimento de Puzzo, vestia-se com roupas curtas e de marca, mas colocou um casaco de pele. A loira abusava da maquiagem que de fato lhe dava alguns anos a menos. Sentou-se na cadeira antes ocupada por Carlo e acendeu um cigarro.

— Não vim para me divertir, Keila. Estou noivo. — respondeu após alguns segundos observando a mulher.

— E esse não deveria ser um motivo para comemorar? Esse lugar é procurado justamente pelo sigilo absoluto. — falou com um meio sorriso em seu lábios tingidos de vermelho. — Eu sei que não foi por isso que veio, vi Carlo saindo com três mulheres e espero que no mínimo ele pague a conta dessa vez.

— Hoje ele está por conta da casa, Keila. Veio a mando do Ângelo.

— E você o trata bem? Se eu não te conhecesse, diria que está sendo bobo, mas algo me diz que você tem um plano em mente.

Donatello demorou a responder, gostava de ser cauteloso com as palavras, principalmente com pessoas ambiciosas. Keila o trairia se seu cargo na Oásis fosse ameaçado. Disso ele não tinha dúvidas.

— Só estou evitando uma guerra, um líder precisa saber quando é hora de manter a paz. — respondeu. Keila apagou o cigarro, se levantou e fechou a janela que dava para o palco, seu olhar estava sério e ela se aproximou se abaixando para falar próximo ao ouvido do homem.

— Você não tem por onde fugir, Don. Entram muitas pessoas por aqui e eu ouço muita coisa, estão falando que Santini trabalha para alguém maior, alguém que quer te destruir. Estou te dando um conselho de amiga, não brinque com o Ângelo e não confie em ninguém.

— Obrigado pela dica, Keila, mas você não disse nada que eu já não saiba. Então se souber de algo mais, é melhor dizer logo. — ela se afastou, se sentando na poltrona vazia novamente.

— Dizem que é o homem que matou seus pais.

— Meus pais? Está dizendo que foi um único mandante? — aquela sim era uma informação nova e Donatello lamentou não ter pensado nisso antes, também percebeu que não devia ter se alterado, não devia demonstrar que foi pego desprevenido.

— Você tem a única Callegari viva em suas mãos, por que não pergunta a ela sobre o homem com uma cicatriz? — Keila se levantou para sair, mas Donatello segurou seu pulso.

— Não use meias palavras comigo, Keila. Diga logo! — a mulher se assustou com a violenta e repentina aproximação do homem, ela considerou o que sabia e precisava decidir de que lado ficaria naquela disputa. Lembrou-se do pai de Donatello e percebeu que devia isso ao herdeiro.

— Seu pai disse certa vez, que antes de desmaiar no ataque, viu um homem, vestindo roupas elegantes, pegar a menina debaixo da mesa, ele disse que a garota o reconheceu e foi até ele sem medo. Quando se virou, viu que o homem tinha uma imensa cicatriz no rosto. Seu pai acreditava que ele era o mandante, mas nunca conseguiu encontrá-lo. Pensava que só a garota podia dizer.

Flora cada dia mais se tornava peça importante naquele quebra-cabeça. Restava saber de que lado ela estava.

— Como sabe disso? — ele questionou, mas já tinha uma ideia.

— Você sabe bem como eu cheguei na posição que estou. — ela olhou para a mão de Donatello ainda segurando seu braço e ele a soltou. — Mandarei a Nice vir, você está precisando relaxar.

A mulher saiu, deixando Donatello com uma nuvem de pensamentos tumultuosos. Sentia que estava chegando num grande impasse, que sua união com Flora traria à tona antigas questões. Era hora de resolver as pontas soltas que seu pai deixou e como sempre ele precisava estar um passo à frente de seus inimigos, então antes da tal Nice chegar, ele fez uma rápida ligação.

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