Capítulo Três 

Por Hannah Luiza 

Pulei da moto ainda em movimento e vi o menino com um buraco de bala nas mãos. Ainda bem que ele está vivo.  

— Carlinho, o que está fazendo? — pergunto, me aproximando do menino.  

— Ladrãozinho não se cria aqui — Matheus responde com um baseado na mão.  

— Ele é só uma criança e estava com fome. Não precisava disso tudo! Era só ter dado uma advertência.  

— Halu, tu não pode proteger a favela inteira. — Meu irmão me olha friamente.  

— Solta ele agora! — olho para meu irmão.  

— Qual foi? Acha que manda em alguma porra aqui?  

— CARLOS LUIZ CHAVES, SOLTA ESSE MENINO AGORA!!  

Olho para meu irmão e vejo que ele está drogado. Toda vez que mistura entorpecentes, perde um pouco a razão, dificultando o diálogo.  

— Sai daqui, Halu! — ele diz, apontando a arma para o menino. Em um ato de valentia vindo de onde não faço ideia, entro na frente.  

— Se vai atirar nele, terá que atirar em mim primeiro.  

— Mas que caralho, Halu, sai da frente agora!  

— Não! — olho dentro dos olhos do meu irmão. Sei que um dia essa valentia vai acabar me levando ao cemitério, mas o que posso fazer se é mais forte do que eu?  

Ele destrava a arma e eu permaneço no lugar. Ele põe o dedo no gatilho e aponta para a minha testa. Continuo ali, olhando dentro de seus olhos, o coração aos saltos, o medo mais forte a cada segundo. Mas, antes que ele possa atirar, Matheus toma a arma de sua mão.  

— Fumou baseado estragado, mano? Não se aponta ferro pra família.  

Com as palavras de Matheus, ele me pede desculpa, mas nem me dou ao trabalho de responder. Peço ao boca de sacola que desamarre o menino e me leve ao postinho. Chegando lá, peço que atendam o menino enquanto vou em casa falar com a mãe dele. Ao saber que seu filho está vivo, ela me abraça, e os soluços de seu choro descontrolado chacoalham a nós duas. O agradecimento dela é genuíno; seu alívio me faz ter arrepios. Eu a entendo perfeitamente. Pego dinheiro e vou até o mercadinho da dona Claudia, faço compras para a moça e peço que o entregador leve em sua casa. Volto para o postinho e, com o menino já medicado, o levo para casa, mas antes passo na farmácia e compro todos os remédios que ele irá precisar.  

— Valeu, tia! Achei que ia pra vala. — O menino fala e olho para ele.  

— Como se chama, menino?  

— Vini.  

— Vini, não precisa roubar. Quando precisar de alguma coisa, é só me procurar.  

— Foi mal ter roubado o computador, tia. Meus irmãos estavam precisando de leite e não tinha comida em casa.  

E infelizmente esse é o lado negativo das comunidades: a falta de assistência. É muito triste ouvir uma criança dizer que rouba por necessidade.  

— Agora, tem alimentos na sua casa. Me prometa que irá estudar e ser alguém melhor.  

— Obrigado, tia! O computador está bonzinho, não estraguei.  

Cheguei à casa de Vini, e sua mãe estava na porta o esperando aflita. Logo que o vê, ela o abraça. Depois dá um tapa em seu rosto e o abraça novamente, chorando ao presenciar a cena de mãe e filho. Me sinto uma intrusa e começo a me lembrar dos meus pais. Uma lágrima solitária escapa de meus olhos e eu a limpo rapidamente; é sempre doloroso lembrar deles. Os dois olham para mim e eu aceno com a cabeça, voltando para a minha casa.  

Tinha acabado de tomar banho quando ouvi alguém esmurrar a minha porta. Assim que atendi, minha amiga se jogou em meus braços. Logo em seguida, ela me deu um soco no braço.  

— Posso saber o motivo da agressão?  

— Você quer morrer, sua peste? Caralho! Que susto que tu me deu! O Gigante foi lá na padaria e falou o que tinha rolado lá no topo. Ficou doida? Já pensou se seu irmão aperta o gatilho? Já perdi uma irmã e não vou perder outra.  

— Ei, relaxa! Estava tudo sob controle. Sabia que ele não apertaria o gatilho. — Sei que é mentira o que estou dizendo, mas ela não precisa saber.  

— Não é bem assim que fiquei sabendo. — Ela me olhou severa.  

— Nunca mais desafie os bandidos, mesmo que esses sejam o MT ou Luizinho.  

— Não posso prometer. — Digo sincera.  

— Se você morrer, eu te ressuscito só para te matar de novo.  

Abraço minha amiga e a chamo para ir na casa do Matheus buscar a Carlinha para um passeio. Na hora, ela aceita. Chegamos à casa do Matheus e encontramos Bruna, que começa a se achar a dona da casa.  

— Como as vadias entraram aqui? — Ela pergunta com as mãos na cintura.  

— A Halu tem a chave. — Minha amiga diz.  

— Pode passar a chave para mim, puta. — Bruna abriu a mão esperando que eu desse a chave a ela.  

— Você me chamou de quê?  

— Além de puta, está surda?  

— Olha aqui, sua galinha de despacho de macumba, ninguém fala assim com minha amiga, não.  

— Relaxa, Macla, não estamos aqui para brigar. Onde a Carlinha está?  

— Na puta que pariu! — Bruna está começando a me tirar do sério. Já estava me preparando para responder quando Carla desce as escadas correndo.  

Assim que me vê, ela me abraça.  

— Mãe, você veio me levar para passear?  

— Claro, minha princesa! Ainda vamos tomar sorvete com muitas bolas.  

— Você não iria conseguir tomar um sorvete tão grande. — Diz Carla em sua inocência.  

— Mãe?! — Debocha Bruna. — Você foi a corna da história e ainda aceita ser chamada assim?  

— Não se mete comigo, não se mete com a Carla e não se mete na minha história. Porque, caso você faça isso novamente, não responderei por mim. Ficou claro para você?  

Olho para ela bem séria, e ela se cala na hora. Bruna é aquele tipo de vadia que só se garante com seu grupinho ou com macho.  

— Deixa minha mãe em paz, sua bruxa feia. — Carlinha diz a Bruna, que fica puta.  

— Olha aqui…  

— Cala a boca! — grito com Bruna, que mais uma vez se cala. Desço à altura de Carlinha e chamo a sua atenção. Ela me abraça e pede desculpa.  

Pego a mão de Carlinha para sairmos e sou interceptada por Bruna e sua mão estendida. Tento me afastar para sair, mas ela entra em minha frente mais uma vez.  

— O que você quer, boneca de voodoo? — digo bem séria, ponderando dar um murro na cara dela.  

— Já disse que quero a chave.  

— Vai pra puta que pariu. — A empurro e descemos. Bruna me faz gastar todo o meu autocontrole. Vou conversar com Matheus sobre essa puta barata.  

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