Capítulo Quatro

Por Hannah Luiza 

Macla, Carlinha e eu descemos o morro até a pracinha. Deixo Carlinha brincando no escorregador e me sento ao lado de Macla, que ainda está irritada com Bruna. Digo a ela que aquele projeto de “puta” nem vale o esforço do ranço. 

Conversamos mais um pouco, e minha amiga insiste para que eu vá ao baile hoje à noite. Mesmo dizendo que não estou com vontade, ela continua insistindo tanto que acabo cedendo, especialmente depois que ela reclama que faz tempo que não apareço.

Estávamos ainda conversando quando ouço o choro de Carlinha. Levanto-me rapidamente para socorrê-la. 

— Mamãe, eu e minha coleguinha caímos — ela diz, mostrando o joelhinho ralado. 

Compro uma garrafinha de água para limpar o machucado e coloco um curativo no local. 

— Você é uma boa mãe — comenta a mãe da outra menina, sorrindo. 

— Tento fazer o meu melhor — respondo, sorrindo de volta.

Carlinha pede para tomar um sorvete, e vamos até a sorveteria. Depois de saborear o doce, digo que é hora de irmos para casa. Ela protesta um pouco, mas acaba cedendo e pede para passar o resto do dia comigo, e eu concordo.

Quando chegamos em casa, vejo MT e Luizinho à minha espera.

— O que esses dois idiotas estão fazendo aqui? — resmungo, emburrada. 

— Haluzinha, o filho da puta do teu irmão veio aqui pra te pedir desculpa — Matheus se adianta para explicar, fazendo-me revirar os olhos.

— E você tá aqui pra quê? — aponto para ele. — Mais tarde levo a Carla lá pra sua casa.

— Pensei que você ia ficar com ela hoje.

— Depois de séculos, a rainha vai ao baile — minha amiga comenta, e eu lanço um olhar para que ela se cale.

— Ei, Halu, você não tem aula na faculdade hoje, não? — pergunta Matheus.

— Para de ser chato, Matheus! Deixa minha amiga curtir um pouco a vida — responde Macla, defendendo-me.

— A conversa não chegou no chiqueiro — Matheus rebate, olhando para mim em expectativa.

— Ah, vai se ferrar... 

— Chega! — interrompo. — Respondendo à sua pergunta, hoje não tem aula, e quem manda na minha vida sou eu, entendeu?

Ele ergue as mãos em sinal de rendição. Nesse momento, Carlinha pede para ir ao banheiro, e, enquanto a levo, peço que entrem.

Ao voltar para a sala, chamo Matheus para uma conversa. Conto a ele o que aconteceu com Bruna e como ela vem tratando Carlinha. Ele fica indignado e promete dar um jeito na situação.

Os “mortos de fome” pedem para que eu faça café, e eles mesmos compram queijo, presunto e pão para fazerem mistos. Sentamos na sala e começamos a conversar. Sinceramente, sinto saudade dos tempos em que éramos mais novos e ficávamos batendo papo até tarde.

Quando o relógio marca seis da tarde, Luizinho e Matheus se levantam para ir embora. Antes, porém, meu irmão se vira para mim:

— Halu, se liga nas roupas que vai usar, nada de muito curto — ele diz, me abraçando apertado.

— Me deixa em paz! A vida é minha, e eu faço o que quero — respondo, vendo ele sair emburrado.

— Seu irmão tá certo, Haluzinha — comenta Matheus, se aproximando e me dando um beijo rápido no canto da boca, pegando-me de surpresa. Ele sorri, e eu o acerto com um soco leve no braço.

Depois disso, pego minha filha nos braços, a abraço e prometo que amanhã passaremos o dia juntas. Macla diz que mais tarde aparecerá para se arrumar comigo, e eu decido descansar um pouco, pois a noite promete.

Assim que ajeito Carlinha na cama, volto ao meu quarto e me deito, mas o sono não vem fácil. A lembrança de Bruna me incomoda, e o beijo no canto da boca que Matheus roubou ocupa meus pensamentos. Tento afastar isso, me convencendo de que nós dois não temos mais chance e que talvez eu não confiasse nele novamente.

Não demora muito e ouço a campainha. Levanto devagar para não acordar Carlinha e vou atender.

— Oi, Halu! — Dona Tita sorri para mim. — Vim trazer umas broinhas pra você. Soube o que fez pelo menino lá de cima.

— Não fiz mais que minha obrigação. Meus pais não deixaram esse mundo protegendo este lugar para virar bagunça — digo, vendo-a sorrir ainda mais.

— Você se parece muito com sua mãe. Ela também pensava assim. Bom, só vim trazer isso mesmo, minha filha. Boa noite!

— Muito obrigada, Dona Tita.

Fecho a porta, volto para o quarto e deixo as broinhas sobre a mesa. Uma sensação estranha de nostalgia me envolve enquanto lembro das histórias dos meus pais e de como eles lutaram para proteger nossa comunidade. Isso aquece meu peito, mas também pesa com a responsabilidade que herdei.

Deito-me novamente, tentando relaxar, mas meus pensamentos vão para a noite que está por vir. Afinal, faz muito tempo desde a última vez que fui ao baile. Lembro de todas as vezes que Macla e eu dançávamos até o amanhecer. Talvez ela esteja certa. Não vou negar que uma parte de mim está animada para sair da rotina de faculdade e trabalho. Acho que mereço essa pausa.

Leia este capítulo gratuitamente no aplicativo >

Capítulos relacionados

Último capítulo