“Como nunca tive filhos, nem marido, já não tenho pais e, por isso, posso deixar todos os meus bens a quem bem quiser, deixo tudo o que possuo para minha sobrinha, Viviam Lavigne. Porém, os bens somente deverão ser transferidos para o seu nome quando esta se casar, ficando sob a tutela de meu irmão enquanto esta condição não se cumprir.”
Viviam não acreditava no que tinha acabado de ouvir, durante a leitura do testamento de sua tia Rachel. Como a tia pode fazer isso com ela? Colocar este tipo de condição? A tia sabia muito bem que ela sequer tinha um namorado! Que aos 25 anos de idade havia namorado apenas duas vezes, tendo saído ferida nas duas ocasiões. Que sequer tinha se relacionado sexualmente com mais ninguém além desses dois homens em sua vida. E um deles tinha saído do armário, ainda, depois que eles terminaram!É claro que, no fim do dia, a revelação de Leandro tinha sido até uma coisa boa, porque ele agora era seu melhor amigo. Mas não dá pra deixar de ter isso como um tipo de trauma na nossa história, não é mesmo? Ter feito sexo apenas com dois homens e um deles sequer ter apreciado!O senhor que lera o testamento se aproximou de Viviam e entregou a ela um envelope, que ela agradeceu e abriu imediatamente. Tratava-se de carta da falecida senhora, explicando suas razões para colocar aquela condição no testamento.O fato é que Rachel passara toda a sua vida solteira. Não se abrira para o amor e, como os tempos eram outros, nem para o sexo. Com isso, sua única família tinha sido formada pelo irmão Jensen, o cunhado Paul e Viviam, e talvez ela tivesse disfarçado muito bem, mas não era feliz. Nos últimos tempos, sentia falta de ter alguém com quem se deitar à noite, com quem fazer suas refeições, filhos a quem ensinar. Arrependia-se muito das escolhas que havia feito.“Minha pequena estrela, quero que saiba que houve alguém em minha vida. Um homem a quem amei muito! Mas eu era teimosa, orgulhosa, e me achava superior aos outros. Preferi minha fortuna, meu sucesso, minha fama, ao seu amor. Arranquei-o de minha vida e não há nada de que me arrependa mais.” Dizia a tia, em um trecho da carta.Viviam sentia um pouco de pena da tia. Devia ser difícil mesmo ser tão solitária! Porém, continuava não achando justo depender de encontrar alguém que ela amasse e a amasse de volta para poder receber a herança e, finalmente, largar o emprego de garçonete em uma lanchonete de NY e se dedicar completamente às suas paixões, que eram a música, a dança e o teatro. A tia tinha sido uma grande estrela do cinema. Ela deveria entender que a sobrinha precisava se dedicar, estudar, trabalhar arduamente.Esperar o príncipe encantado poderia levar tempo demais! Ela já tinha 25 anos, e quem começa na Broadway tão tarde? Se a tia era orgulhosa e teimosa, ela era dez vezes mais e ia colocar a mão naquela fortuna. Ela ia dar um jeito.GabrielOliveira tinha sido dispensado de mais um trabalho. Não sabia, de verdade, o que havia de errado com ele. Certamente, não era sua aparência, porque ele jamais havia tido problemas com isso. Ao contrário, as mulheres sempre suspiravam a sua volta e elogiavam as sardas, as covinhas, o sorrisinho meio de lado, a carinha de menino, mesmo aos 27 anos. Os elogios vinham tanto das mulheres mais velhas, amigas de sua mãe, Carol, quanto das garotas de sua idade, e até das mais novas, algumas amigas de seu irmão mais novo, que tinha acabado de completar 18.Então, não. Definitivamente, não se tratava de não ser bonito o bastante para os papéis. Talvez a dança, ou melhor, a falta de habilidade para ela? Sim, definitivamente devia ser a dança. Mas algumas peças para as quais ele tinha feito teste não tinham dança, não eram musicais. E nesses casos? Qual
“Tá certo! Fica tranquilo, que você vai ter essa grana logo.”“Beleza, então. Vou tomar um banho e capotar... To morto!”QuandoGabriel levantou o olhar e encarouLeandro, sabia que o amigo já tinha entendido que ele tinha mudado de ideia. As circunstâncias, que já eram desfavoráveis, tinham se agravado. Se ele não fizesse alguma coisa já, além de ter que sair do apartamento e voltar para Lima, com o rabo entre as pernas, ainda iria prejudicarFelipo, que tinha feito tanto por ele nos últimos meses, pagando não só o aluguel, como outras despesas da casa, que ele não estava nem cobrando.“Diz pra ela que eu topo, cara. Seja o que Deus quiser!” Alguma coisa dizia aGabriel que ele estava se metendo na maior roubada, mas também tinha uma parte dele que estava estranhamente otimista a respeito daquela negociaç
Então, ele, quase nervoso, mas usando todo o seu talento, segurou a mão dela, que a tirou, em um reflexo.“Viviam, você não acha que nós devemos chegar de mãos dadas?”“Ah... Er... Ah, sim, sim! Eu esqueci...” falou, gaguejando, sem graça.Ele sorriu, pegando a mão dela de novo, que, dessa vez, segurou a dele de volta. Ambos sentiram, imediatamente, uma sensação agradável, confortável, nova. Ambos desejaram, silenciosamente, poder continuar de mãos dadas por muito tempo, sentindo o contato da pele quente do outro.Mas logoViviam avistou seus pais e se lembrou do que estava fazendo ali. E se deu conta de que aquele homem encantadoramente lindo não estava segurando sua mão por um gesto de carinho, mas porque era parte do jogo de cena. A sensação maravilhosa daquela mão tão grande e forte segurando a sua n&
Além disso, ela conhecia a amiga o suficiente para saber que esta não estava sentindo prazer em mentir para a família e a maior parte dos amigos, só deixando de fora os dois mais próximos.Gabriel, por sua vez, não tinha com quem dividir o desconforto que estava sentindo. Ele ia passar à condição de casado e depois à de divorciado sem nem ao menos amar, realmente, uma mulher. É claro que depois ele poderia encontrar alguém, mas ainda assim não era agradável a situação. Ele ainda não tinha falado com os pais nem com o irmão justamente porque não queria fazer toda aquela encenação na frente deles. É claro que também não iria contar a verdade, porque a família nunca iria concordar com aquilo, mas quanto menos eles participassem, melhor.Além disso, ainda tinha que conviver com o seu pensamento esc
“Gabriel, não é isso.” Riu, sem jeito. “Você é jovem, é solteiro. Não juridicamente, mas nós sabemos que você é... Que nós somos... Solteiros.” Respirou fundo. “É normal você querer ficar com alguém e, como sou eu que estou aqui, agora, com você, pintou esse clima entre a gente. Mas é só isso e depois... Depois as coisas simplesmente vão ficar estranhas, então é melhor a gente nem fazer isso, tá?”Ele apenas olhou para ela, frustrado, e se levantou.“Aonde você vai?” Era ela quem estava irritada, agora.“Embora.”“Vai me deixar aqui?” Se era possível ficar mais indignada, ela estava.“Você pode vir, se quiser.” Ele disse, indiferente, e ela bufou, levantando também.Os dois não trocaram mais uma palavra essa noite, nem no táxi, nem no elevador do hotel, nem no quarto que dividiam. E foi assim que chegaram àquele momento, em que sua lua de mel chegava ao fim, sem lua alguma brilhando, pois uma chuva torrencial começara a cair logo depois de terem ambos adentrado o h
Era uma noite de sábado.Gabriel eViviam estavam na primeira festa a qual tinham resolvido ir juntos desde o casamento. Era aniversário de uma amiga de infância deViviam, ou melhor, de uma antiga vizinha com quem ela não se dava tão bem assim, mas que, talvez justamente por isso, ela queria que a visse em tão boa fase.Sim, boa fase! Afinal, agora que tinha dinheiro,Viviam dormia melhor, se alimentava melhor, se exercitava mais, tinha maiores cuidados com sua aparência, se vestia com mais bom gosto. Isso sem contar a presença de alguém alto, forte, bonito, cheiroso e com um sorriso fantástico, que Serena Lopez nunca saberia não ser seu príncipe encantado de verdade.Isso sem contar queGabriel estava no melhor dos humores e aceitava fazer tudo queViviam pedia, o que ela atribuía ao fato de ele ter, finalmente, conseguido um trabalho em uma peça
“Vivi, você sabe... Você é a coisa mais próxima de uma mulher que eu tenho na minha vida...”“Eu não sou uma coisa próxima de uma mulher,Gabriel. Eu SOU uma mulher...” Interrompeu, rindo dele.“Você entendeu, vai?” Retrucou, impaciente.“Uhum.” Ela voltou a misturar suas frutas e cereais matinais, enquanto ele passava geléia no waffle que ela tinha preparado especialmente para ele.“Eu pediria à minha mãe, mas ela mora longe e...”“Gabriel... Quer falar logo?” Estava ansiosa para saber qual era a missão feminina que ele teria para ela.“Eu preciso de ajuda para comprar umas coisas... Roupas e... Essas coisas.” Ela o olhou, balançou a cabeça, positivamente, e voltou a atenção para as frutas. “Principalmente para essa tal festa...”&
O falso casal se despediu de seu convidado e, se a situação já estava estranha, ficou ainda mais, porque, alheia a tudo, em razão da bebida, das lembranças do passado, do conforto que sentia na presença do velho amigo,Viviam abraçouFelipo demoradamente, carinhosamente.Aquilo era a gota d’água paraGabriel. Já tinha suportado demais!“O que foi tudo isso?” Disse, irritado, depois de fechar a porta e ver a mulher se jogando no sofá.“O quê?” Falou, surpresa.“O que foi isso,Viviam? Você dando mole proFelipo bem debaixo do meu nariz?”“Gabriel, você tá louco, eu não tava... E,Gabriel, você não é meu marido! Não de verdade. Se eu tivesse...” Acrescentou, com toda calma.“Eu não sou, mas ele acha que eu sou!” Estava cada vez