Ao abrir os olhos, os senti arderem muito, tudo a minha volta parecia girar e os fechei novamente. Respirei fundo tentando me concentrar, mas a dor de cabeça era um forte obstáculo para qualquer tentativa de concentração.
Abri os olhos novamente.
Escuridão.
Ouvi passos perto de mim, o barulho da grossa cortina sendo movida permitindo que a luz do sol entrasse pela janela.
— Bom dia, filha! Como você está se sentindo hoje, melhorou?
— Estou com muita dor de cabeça, mãe... Para que abrira janela? — Respondi com um resmungo.
— Porque esse quarto estava muito escuro e já é hora de levantar, mocinha! Marquei uma consulta com o Doutor Rodrigues hoje.
— Ah, não, mãe!
— Não adianta reclamar! Você tem que ver o que está acontecendo contigo, não é a primeira vez que desmaia e acorda como se estivesse com a maior das ressacas.
— Tá, eu vou, faço qualquer coisa para acabar com essas dores de cabeça!
Respirei aliviada, embora ainda me sentisse zonza. Então, graças a Deus, fora tudo um sonho! Minha mãe estava ali, parada em frente à cama e preocupada comigo, com aquele olhar que só as mães têm quando um filho está doente. Aproximou-se de mim e pousou sua pequena e delicada mão em minha testa para verificar se estava com febre. Sorriu ao confirmar que minha temperatura estava normal. É incrível o dom que as mães têm de saber a temperatura usando apenas as mãos, e, mais incrível ainda, a agradável sensação de alento que sentimos quando elas fazem isso.
Entregou-me um copo com água e um analgésico que engoli fazendo uma careta.
— Argh! Que gosto horrível, esse remédio sempre se esfarela antes de engolir! Detesto remédios!
— Já está bem grandinha para fazer careta ao tomar remédio, não acha? Afinal, amanhã você completará 18 anos. Ande, desça e vá tomar seu café da manhã, marquei a consulta para as dez horas e não deve se atrasar!
Levantei, mas ainda mais preguiçosa que de costume. Lavei o rosto e me olhei no espelho. Mal me reconheci. Estava pálida e as olheiras estavam ainda mais fortes do que o normal. Apliquei um pouco de maquiagem para disfarçá-las e desci. Meu irmão já estava sentado devorando um sanduíche de queijo.
— Anne, você está com uma cara horrível, parece uma bruxa! — Disse com a boca cheia.
— Obrigada, idiota! — Respondi dando-lhe um tapa na nuca. — E você é meu duende de estimação, nanico!
Aquela cena era apenas mais uma manhã normal em nossa família. Papai já tinha saído para trabalhar, pois saía sempre bem cedo para seu escritório no centro da cidade. Um executivo muito talentoso e importante na empresa onde trabalhava, embora eu nunca tenha entendido muito bem o que ele fazia por lá e nunca me interessei em perguntar. Mamãe era dona de casa, embora tenha herdado uma grande soma de dinheiro de vovó, que morreu antes de eu nascer.
Mamãe era uma mulher muito bonita, mas de saúde muito delicada e, por conta disso, raramente sai de casa. Meu irmão era um idiota como todos os irmãos caçulas, mas sempre o amei mesmo assim.
Fazer o que, né? Ninguém é perfeito!
Embora tenha passado a noite com febre, o vi entrando no meu quarto e me olhando enquanto eu dormia, até mesmo imitou nossa mãe pousando a mão sobre minha testa, preocupado comigo. Talvez irmãos sejam assim mesmo, a gente gosta, mas são irritantes.
Cheguei ao consultório do Doutor Rodrigues quinze minutos atrasada, apesar das advertências de mamãe. Achei que chegaria a tempo, mas o trânsito estava terrível. Passei meia hora parada em um trajeto que geralmente levava dez minutos!
Depois que a atendente confirmou meu nome, me dirigi ao lugar que ela indicou. Joguei-me pesadamente na cadeira da sala de espera que estava vazia e podia ouvir som de água corrente no consultório mais próximo.
Estava aborrecida e entediada pensando no problema do trânsito da cidade, quando a porta da salinha se abriu e um homem saiu de dentro dela. Fiquei petrificada! Minha boca automaticamente se abriu e ficou desse jeito, aberta, como uma idiota.
Vocês precisam entender que eu estava de fato chocada! O homem a minha frente não era o Doutor Rodrigues, era simplesmente o homem mais bonito que eu já tinha visto em minha vida! Para tornar tudo mais estranho, ele era também o homem dos meus sonhos. Não me refiro ao "homem dos meus sonhos" romântico, ou a um tipo de príncipe encantado. Refiro-me ao homem com quem eu tinha sonhado nas vezes em que desmaiei. Era ele! Com um pouco mais de corno rosto, é claro, e o corte de cabelo bem mais moderno, mas sem dúvidas, era ele!
Será possível alguém sonhar com uma pessoa que nunca conheceu de fato?
Cabelos e olhos negros, pele alva, sobrancelhas bem-feitas pela natureza, alto, lábios deliciosamente perfeitos.
O homem olhou para mim com um sorriso malicioso nos lábios, seus olhos tinham o mesmo fascínio que exerciam sobre mim em meus sonhos.
— Desculpe-me, sou novo aqui e vim buscar uma caixa de luvas. Meu nome é Ezequiel, comecei a trabalhar na clínica ontem.— Ele estendeu a mão enquanto falava e eu hesitei antes de aceitá-la.
De alguma forma, meu primeiro instinto me mandava repelir aquela mão. Tudo aquilo parecia surreal, e ao finalmente cumprimentá-lo, senti o toque frio e firme.
Olá, me chamo Anne! Tenho uma consulta marcada com o Doutor Rodrigues, a atendente me disse que ele estaria aqui.— Disse é? Que estranho... Ele não veio trabalhar hoje, está doente e tirou o dia de folga.— Que droga! — Eu disse por impulso. — Ninguém me avisou e eu vim para cá à toa!— Eu posso te atender, se você não se importar de ser atendida por um médico diferente. Vejamos o que posso fazer por você, não tenho nenhum paciente no momento. Como sou novo aqui, minha agenda está bastante livre.Que voz! Confesso que estava satisfeita com a ausência do doutor Rodrigues, nem sequer queria ir ao médico, e logo que chego, descubro que meu médico não cuida direito nem da própria saúde, que fará da minha! Mas o seu substituto é um homem jovem, misterioso e atraente, quem rejeitaria? Só podia ser coisa do destino!— Se não for problema para você...Na verdade eu não queria vir, mas minha mãe insistiu muito.— As mães às vezes são super protetoras. — Ele comentou sorrindo.— A minha "às ve
— Para de palhaçada, Anne! A secretária já te falou isso. Ele já tinha certa idade, teve um acidente e não resistiu. Melhor marcarmos com algum outro médico. Ainda temos que descobrir por que está tendo esses desmaios.Sem dizer nada, fui para meu quarto. Estava muito confusa. O que realmente aconteceu na clínica? Aquele homem, qual era mesmo o nome dele? Ezequiel...Peguei o telefone ansiosa e liguei para a clínica. Inventei um nome qualquer e pedi a atendente para marcar uma consulta com o Doutor Ezequiel.— Doutor Ezequiel? Tem certeza que é esse o nome? — Claro que tenho certeza! — Por que as atendentes tratam os clientes como se fossem retardados? OU será que tem gente que realmente chama pelo nome errado? — Desculpe-me, senhora, deve haver algum engano, não temos nenhum médico aqui com esse nome. Gostaria que lhe indicasse um de nossos médicos em plantão?Confusa e sem saber o que pensar sobre toda aquela situação, tentei me lembrar de tudo que tinha acontecido. Levantei e peg
— Não estou escondendo nada! — Respondi emburrada. — Se eu estivesse saindo com alguém, você seria a primeira a saber!De repente, Nanda segurou meu braço com excitação evidente nos olhos.— Amiga, não olha agora, mas aquele calouro lindo está vindo em nossa direção. Ele que te segurou ontem quando você desmaiou! Tão romântico que te invejei e desejei estar morrendo só para ele me segurar também!Por que as pessoas insistem em nos sobressaltar pedindo para que não viremos o rosto, de uma maneira que obviamente não teremos como obedecer? Lógico que na mesma hora virei o rosto e dei de cara com o rapaz em questão! Alto, pele morena-clara, cabelos e olhos castanhos. Ao perceber que falávamos dele, deu um meio sorriso, desses que os homens tímidos dão abaixando a cabeça e apertando um pouco os lábios. Na hora, confesso, me senti embaraçada, mas não tem visão mais fofa de um homem bonito do que essa!— Oi, meninas! Tudo bem com vocês?— Tudo bem comigo, — Respondeu Nanda prontamente. — é
Amir parou o carro em frente a uma mansão no bairro mais seleto da cidade, e antes mesmo que batesse, a porta se abriu. Um homem de meia-idade e aparência distinta o examinou e, parecendo aprovar o que via, chegou o corpo para o lado, dando passagem para que o jovem recém-chegado pudesse entrar.— Boa noite, senhor Borislav, Lorde Barrington lhe aguarda na biblioteca. — Disse o antiquado mordomo ao fechar a porta atrás de si. — Me acompanhe, por favor.— Boa noite, Jorge! Como está o humor do nosso Lorde hoje?— Seu tio parece estar de bom humor, senhor.Não era a primeira vez que Amir era recebido naquela mansão. Costumava frequentá-la muito quando criança. Lorde Barrington foi casado coma falecida irmã de sua mãe, o tornando seu tio por afinidade, embora Amir não tivesse nenhum título de nobreza. Lorde Barrington também era um dos integrantes do conselho dos Élderes, que era o grupo de líderes dos clãs mais poderosos, visando regular, fiscalizar e manter a ordem e a paz. O clã de L
Narrativa de AnneAcordei animada, lavei o rosto e desci correndo as escadas. Meus pais e meu irmão estavam na cozinha me esperando e assim que entrei cantaram parabéns para mim. Até meu irmão me abraçou! Eu me sentia muito especial em momentos como aquele em família, razão pela qual amava aniversários. Tomei um farto café da manhã, preparado por minha mãe especialmente para mim com tudo o que eu mais gostava antes de ligar para Nanda. Precisava que ela viesse me ajudar com a arrumação da festa. Ela veio logo que pôde e assim que chegou me perguntou sobre Amir.— E aí, amiga, como foi ontem com o gato do Amir?— Nada demais, Nanda. Não sei o que você esperava que acontecesse.— Amiga! Não é possível que você não tenha reparado no jeito que ele te olhou! Parecia ter encontrado um baú de tesouro! Deve ser algum complexo de príncipe que amparou a princesa... Saí de fininho para vocês se acertarem e nada aconteceu? Eu esperava novidades picantes!— Boba! Pois ele foi bem normal. Parecia
O pior sobre mim é que eu não sou muito discreta, e acho que ele percebeu o meu olhar para seu peito, porque deu um meio sorriso e apertou os olhos me encarando e disse:— Espero que não esteja vestido inapropriadamente...— Claro que não! — Respondi de pronto. — Não era a sua roupa que eu estava reparando.Como eu disse antes, não sou nada discreta. Ele sorriu e ofereci a ele uma cerveja.Ele bebeu um gole da cerveja e olhou em volta.— Acho que fui o primeiro a chegar. — É o que acontece quando somos pontuais hoje em dia. Venha, vamos sentar.Seguimos até o sofá da sala onde sentei ao lado dele.— Precisa de ajuda pra alguma coisa? — Não, é só uma festinha simples, já deixamos tudo pronto. Falando nisso, quer comer alguma coisa? Tem sanduíches e os salgadinhos ainda estão quentinhos...— Não, obrigado! Estou bem aqui. Nos olhamos me silêncio por alguns instantes e senti o olhar dele se tornando mais intenso, até que ele ergueu a mão e tirou uma mecha de cabelos da frente dos meu
— Hey! Acho que agora é minha vez de dançar com o Ezequiel! — Disse Rose nos interrompendo com as feições mostrando contrariedade ao nos ver juntos.A frieza com que ele a olhou me causou calafrios. Ele a acompanhou em seguida, mas não sem antes me prometer que continuaríamos nossa conversa mais tarde.Enquanto ela o arrastou para um canto qualquer, eu segui um tanto desnorteada para a varanda que era separada do salão por uma porta de vidro dupla que estava aberta, pois precisava de ar puro e fresco. Sentei em uma cadeira tentando entender o que estava acontecendo comigo e dar sentido as palavras daquele homem. Depois de um tempo, decidida em esperar até que tal conversa ocorresse para fazer perguntas, passeia observar os convidados.Ezequiel, sem dúvidas, foi a atração da festa. Todos pareciam encantados com a personalidade dele, seguro, intrigante e muito bonito. Apenas duas pessoas não estavam em volta dele como satélites o tempo todo, uma delas era eu e a outra, Amir.Amir pareci
Amir observava cauteloso os movimentos de Anne. De repente, sentiu uma forte sensação de apreensão. Sabia que alguma coisa estava prestes a acontecer, ainda que não soubesse exatamente o que seria. Seus olhos encontraram com os de Anne, ela também sentia, não tinha como adivinhar o que essa sensação significava, mas ele notou que ela também estava inquieta. Era uma sensação com a qual ele já estava acostumado: a aproximação de um deles. "Vladmir deve ter enviado um de seus lacaios e tal lacaio deve estar nas proximidades." Pensou.Anne foi atender a porta, alguém tinha chegado. Sem que ela percebesse, Amir se posicionou por trás de seus ombros, apreensivo, para que pudesse ver quem tinha acabado de chegar. Foi tomado de surpresa ao ver entrar Ezequiel Vladmir em pessoa. Não era o que os Élderes esperavam. Lorde Barrington havia sugerido que ele talvez enviasse um dos seus, mas estar presente pessoalmente era muito audacioso. Seria possível que Lorde Vladmir acreditasse tão intensame