Liana
Uma voz imponente interrompeu...
— E nem será, antes de conversarmos! — Aquele era o dono da fazenda, seu olhar em nossa direção foi intimidador. Diferente do outro, ele era meio esnobe e tinha uma postura de rico medíocre. Barba grisalha e cheirava muito bem, além de ter um corpo bem forte. — Mandem buscar o Théo na escola, já está na hora e eu preciso entrevistá-la agora! — Sim senhor, com licença Liana. — Disse o capataz, antes de sair e dar uma última olhada para mim. — Entre, vamos até meu escritório! Subimos as escadas, ele ao menos abriu a porta para mim e indicou uma cadeira. — Já sabe como funcionará o trabalho, duas a três horas diárias de aulas no período da tarde. Meu filho é um bom menino, não costuma dar trabalho para aprender. — Posso fazer uma pergunta? — Minha dúvida o fez finamente parar de olhar meus papéis e olhar o meu rosto. — Diga! — Por que ele deseja aprender alemão? Uma viagem ou... — Não! Nada que importe dizer, faça seu trabalho e seja o mais discreta possível. Meus peões costumam cortejar em demasia, poderá sair em suas folgas e se quiser ir até a cidade, peça ao motorista com antecedência. — Estou contratada? — perguntei, observando aquele homem que parecia pensar em tudo, menos no que acontecia dentro da sala. — Acho que sim, claro se meu filho a aceitar! Eu já ia sair da sala por completo, mas o ouvi atender uma ligação. — Vou te ver essa noite, posso? Esqueça esse ciúme estúpido, a professora nem é tão jovem ou bonita. Fechei a porta, encontrei a empregada. — Conseguiu? — Acho que sim, mas só terei certeza quando conhecer o menino! — Ele é um amor de criança. Entrei no quarto, o menino demoraria alguns minutos para chegar e eu queria ficar livre do desprazer de ver aquele cara novamente. Eu nunca me importei com a opinião de um homem desde que perdi o único que amei, mas aquele tom esnobe dele me fez sentir ódio. — Coroa idiota e orgulhoso! Só quero ganhar meu dinheiro e não me importa o que ele pense... Na hora do almoço, fui chamada para comer na cozinha com os demais empregados e ouvi o menino correr para subir as escadas e apenas muito tempo depois, eu o conheci. Estava em um balanço, sozinho no quintal embaixo de uma imensa mangueira e pensativo... e eu o balancei e nos olhamos de repente. — Oi Théo, como vai? — Estou bem! A senhora vai me ensinar a falar em alemão? Eu sorri e fiquei na frente dele. — Vai se dedicar a aprender? — Claro que sim, quando eu encontrar minha mãe quero poder conversar com ela. — Sua mãe? — perguntei. — Eu já disse que sua mãe morreu, tem que aceitar Théo. — Bruce chegou novamente sem se denunciar. — Ela está viva, eu te ouvi falar com ela... Théo saiu correndo nos deixando a sós, ouvindo o velho balanço no vento. — A mãe dele está morta e evite esse assunto com ele, certo? — Sim senhor! Ruim com os empregados, rude com o filho! O que mais posso esperar de George Bruce? Eu segui para dentro da casa e ouvi o garoto chorar dentro do quarto dele. Parei na porta e hesitei por um momento antes de falar: — Posso entrar? Ele me olhou, mas não disse nada. Respirei fundo e entrei devagar, fechando a porta atrás de mim. Me abaixei ao seu nível, fazendo contato visual com ele. — Eu vim de longe para ensinar você. Se me deixar sozinha, entenderei que não me quer aqui e irei embora! Théo continuou com a cabeça entre as pernas, claramente resistindo à minha presença. Já estava me virando para sair do quarto quando ouvi sua voz sussurrar: — Espera! Me virei rapidamente, surpresa e, ao mesmo tempo, esperançosa. Um sorriso tímido surgiu em meus lábios enquanto ele me permitia ficar. Aproveitei o momento para observar a decoração incrível de super-heróis que preenchia o quarto dele, um sinal de sua personalidade e imaginação vibrante mesmo em sua timidez. — Ele não me deixa conhecer minha mãe! Deus, eu não saberia o que responder aquele menino e agora agradeço ter sido proibida de falar sobre aquele assunto. — Por que não me mostra seus brinquedos e seu quarto? Ele parece o cenário de um filme... Depois posso começar a te ensinar algumas palavras em alemão, certo? Limpando o rosto molhado em lágrimas, ele assentiu, um sorriso de inocência se formou no olhar dele e começou a me mostrar um monte de brinquedos. O que parecia faltar em afeto, estava sobrando em bens materiais e até um celular moderno ele tinha. — Você gosta da sua escola? — perguntei, olhando um pôster do super-homem. — Gosto, mas não dessa casa! Seria legal ter um amigo aqui para ajudar a salvar o mundo comigo. — Convide seus amigos para vir aqui, há tantos lugares para brincar. — Meu pai não deixaria... — Com licença, trouxe o seu lanche Théo. — disse a empregada com uma bandeja na mão. Lanchei com ele, Théo era carente de alguém para conversar... Logo percebi pelas palavras que mal terminavam antes de iniciar outras, em uma tarde, eu já sabia que ele precisava de amigos, afeto, rotina, presença do pai, limites, valorização e se sentir amado de verdade.BruceCheguei em casa e me deparei com Pedro flertando com a candidata que eu entrevistaria. Eu sabia desde sempre, era burrice minha contratar uma mulher para o cargo de professora!Théo tem me enlouquecido com sua obstinação e cada ano que passa eu o controlo menos. Durante toda a minha vida, lutei para que ele nunca descobrisse sobre meu passado, nem o da mãe dele. Mas um dia, um maldito dia, ele me pegou ao telefone com minha mãe e ouviu quando eu disse que sua mãe estava viva, tinha nacionalidade alemã e nunca havia pisado em solo brasileiro. Desde então, ele tem feito de tudo para aprender o idioma, na esperança de encontrá-la.Saí da fazenda ao entardecer, dirigindo meu carro pela estrada de terra que conheço desde criança. O sol se punha ao horizonte, coloquei uma música sertaneja para tocar enquanto avanço na estrada. Elena, adora a vida luxuosa que eu propicio e nunca aceitou viver comigo na fazenda por odiar o mato e vida rural. Ela é bem mais jovem que eu, tendo apenas vin
BruceAcordei do transe que a visão dela me causou e fui para o meu quarto, uma mulher na flor da idade... No alto de sua meia-idade e sem um namorado para apagar aquela fornalha em forma de corpo? Eu não sou de ferro, me vi excitado pela professora que recém contratei e dando total razão ao ciúme de Elena. Tomei um banho, eu deveria estar farto sexualmente porque Elena sempre me deixava sem forças e claro, propositalmente... não sabe ela, que o passado de intensas cenas seguidas me conferiu um desejo insaciável, acabei batendo uma para Liana e gozando deliciosamente ao imaginar um desfecho diferente do nosso encontro na cozinha. Aquele dia havia terminado de uma forma bem diferente dos últimos tempos, Elena e eu estamos juntos há quatro anos e era totalmente novo desejar uma mulher que não fosse uma das parceiras de cena que tive no passado. Deitei na cama, alisei o tecido fino de cetim e adormeci rapidamente. Dia seguinte... Eles estavam se preparando para sair, José ia levar Li
Liana Acabamos chegando muito tarde por causa do bloqueio na estrada, essa nem foi a pior parte... O pior foi constatar o show de ciúmes da mulher dele ao nos ver chegando, sinto que vou enlouquecer de ódio daquelas insinuações. Com que direito ela pensa que tenho algum interesse nesse homem? Eles saíram para discutir bem longe de mim e agradeço, Théo e eu ficamos juntos no quarto dele e o ajudei com as atividades da escola e estudamos algumas cores em alemão. — Faz tempo que Elena e seu pai namoram? — Me arrependi depois da pergunta. — Sim, muito tempo. Eu não gosto dela, é metida e chata! Sorri contidamente, mudei de assunto e mais tarde eu estava sentada na varanda, observando Théo brincar sozinho com um carrinho de brinquedo. O vento balançava meus cabelos, e o silêncio da fazenda só era quebrado pelo som das rodinhas do brinquedo deslizando pelo chão de madeira. Depois de um tempo, senti vontade de puxar assunto novamente com ele. — Théo, o que você mais sente falt
Liana Ele sai colocando a maçã sobre a mesa, fico feliz por conseguir isso. Théo ficará muito feliz e o menino logo aparece com a mochila nas costas...— Tomou seu café da manhã? — pergunto, ajudando-o com as coisas que levaria.— Sim Liana, minha lancheira está pronta! Pode ir comigo e com Pedro até a escola?— Oh meu amor, não posso ir dessa vez... Mas prometo que irei te levar outro dia!— Bom dia, professora! — A voz quase cantada de Pedro nos interrompe, me viro para ele.— Bom dia, Pedro. — Digo, observando-o entrar para tomar um cafe na cozinha.Théo sai em direção à entrada da casa, onde o motorista o esperava para levar à escola. Aproveito o ensejo para sair da cozinha e evitar um pouco os olhares do capataz que me deixaram um pouco desconfortável. As empregadas também pareciam forçar algo entre nós dois e eu quis evitar.Subi e peguei uma bolsa que havia preparado para levar até a cachoeira, perguntei a um dos peões que estavam selando um cavalo:— Bom dia, pode me dizer pa
LianaThéo me emocionou com o cartão, por um momento esqueci a vergonha que passei antes. Não sei como sairei desse quarto após ter entrado na casa seminua!O tempo passa, tento evitar as pessoas da casa e esperar que Bruce volte ao trabalho ou sair de carro para resolver algo fora, mas nada disso acontece e ouço a voz dele pela casa com a mãe.— Liana, o almoço está servido! — Ouço uma das empregadas me chamar, não adianta ficar aqui dentro, cedo ou tarde terei que me explicar.Saí do quarto, Théo me encontrou pelo caminho e disse que queria me apresentar à sua avó. Meu corpo queima, mas ele me leva pela mão até a mulher... Ela parece manter uma expressão serena e eu sei que a minha cara deve estar denunciando o medo que sinto.— Essa é minha avó, Ivone! E ela é a Liana...— Muito prazer, senhora! — digo, engolindo em seco.— Já nos conhecemos há uns minutos, mas foi um encontro meio... Tenso.— O que aconteceu? — Théo pergunta.— Nada de mais, meu amor, vá brincar um pouco que Liana
LianaPenso que estou sendo boba, quem sabe ele possa me dar um pouco de alegria e distrair a mente.— Está bem, mas falarei com Bruce!— Ele vai permitir! Te pego amanhã às oito...— Tá!Um encontro, há tantos anos, não sei o que é isso. Nem quero pensar nesse passeio como algo a dois, quero ver a cidade e conhecer as pessoas daqui. Pedro sai, me deixando sozinha e terminando de arrumar tudo...— É bom ver que sabe qual é seu lugar aqui nessa casa!Era Helena.— Nunca tive dúvidas disso, senhora...Terminei e saí deixando-a por lá. Théo já tinha ido para a cama. Fico feliz que Ivone esteja aqui para dar um pouco de amor materno a ele... Esse menino precisa muito!Saio um pouco, sinto a brisa da noite tocar meu rosto e ouço os animais da fazenda antes de entrar para seguir até meu quarto. Assim que me viro, esbarro em Bruce e ele me toca os braços, alisando-os e me soltando em seguida.— Eu te chamei para conversar mais cedo, mas Helena insistiu em vir e atrapalhou meus planos. — Se
LianaA caminho desse lugar, ainda penso no que descobri sobre George Bruce e isso me deixa inquieta.— Algum problema, Liana? Parece tão pensativa!— Me perdoe Pedro, não quero ser uma má companhia para você essa noite...— Eu preciso ser sincero. Quero me aproximar de você de verdade.As palavras dele me deixam envergonhada, sinto que talvez não devesse ter aceitado vir até aqui. Ele claramente confundiu isso com um interesse que eu não sinto por ele!Chegamos ao lugar, a praça estava lotada e havia muitas barracas vendendo comida para todos os gostos. Pedro me puxa pela mão, parece ter visto algum conhecido.— Boa noite, essa é Liana. Professora do menino Théo na fazenda!— Muito prazer! — era uma senhora bem simpática, nos cumprimentamos com um aperto de mão.— Ela é muito bonita mesmo, você não exagerou nos elogios, filho!Sorrimos, me dei conta de que ela é a mãe dele. Ficamos por perto, crianças correm e começam alguns fogos anunciando o show de uma banda local. Pedro me convid
BruceHelena não queria ir à festa na cidade, não posso negar a mim mesmo que estou fazendo por causa de Liana. Pedro e ela juntos!Assim que chegamos ao local os encontro, em uma sintonia que me incomoda. Dançando juntos como se já se conhecessem há muito tempo, talvez eu tenha idealizado outro padrão de comportamento para ela. Deve ser como todas as outras, que se encantam por qualquer homem que as elogie...— Eu quero ir embora! Esse lugar fede a pobre!— Elena, acabamos de chegar...— E eu nem sei por que viemos, você nunca gostou desse tipo de festa. Me faz pensar que só veio porque quer vigiar os empregados.— Me poupe Elena, você sabe que tenho ambição de entrar na política. Preciso estar nessas festas e ser visto!— Esqueça esse lugar... você prometeu que deixará tudo isso para trás, podemos ir para casa agora?Suspiro irritado, mas Elena está certa e não tenho mais nada a fazer aqui. Liana e Pedro certamente têm planos para depois da festa, ajeito meu chapéu e seguimos para c