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Filha da Luz
Filha da Luz
Por: Diana Mendonça
Capítulo Um - Parte Um

‘’ Os anjos recolhem sempre um pouquinho do brilho de quem ama, para durante a noite enfeitiçarem as estrelas. ’’

                                                Sirlei L. Passolongo

Minhas asas batiam com o fluxo do vento. O ar suspirava e rodopiava ao redor de mim, fazendo cócegas em minha pele de marfim. 

Eu me sentia livre. Um pássaro que parecia que havia acabado de sair de sua gaiola e agora poderia ir para onde quisesse. 

Esse era o meu engano. 

Eu não estava livre. Não estava indo para onde eu queria. Algo dentro de mim ressoou, como uma dor. Algo que estava em peito há muito tempo guardada. Diferente de meus irmãos, eu tinha um pensamento um tanto peculiar sobre nossa criação. 

Criado apenas para serviço do Céu. Tudo soava extremamente pesado para alguém que ouvisse de fora. 

Eu estava indo para mais uma missão. Para cuidar de mais alguma pessoa especial que necessitava de meus cuidados. Mesmo, tendo opinião diferente dos meus irmãos, eu adorava meu trabalho. Anjo guardião, bem não só isso, como o líder de todos eles. Só que o problema começava ai... Na pequena palavra opinião. 

Mas, não era hora para aquilo. Não naquele momento. 

Sorri. Os arcanjos haviam falado dessa menina. Ela era o que diríamos, nós celestiais, de uma pessoa especial. O nome dela era Olívia, ela acabava de receber dons especiais. A vidência era algo difícil de lidar. Ainda por que muitas poucas pessoas conseguiam ganhar esse dom divino.

Muitas pessoas ganhavam dons e os desenvolviam. Raras eram às vezes, mas sim, elas adquiriam isso para poder ajudar as outras pessoas. Bem, era isso o que Nosso Pai queria, mas nem sempre as pessoas usavam isso para bem. E era ai onde eu teria que entrar.

Por não ser um dom fácil e muito poderoso, eu teria que ajudar essa pequena a seguir pelo caminho da Luz, do que das trevas.

Eu era um anjo guardião, não do mais baixo patamar entre as divisões dos anjos, mas, também não a mais alta. Eu apenas recebia ordens a cada vez que minha missão acabava. Com dois mil anos de idade, isso para mim já é rotina. 

Durante vários períodos de minha vida, houve guerras, lutas e sempre uma nova geração de humanos. Há apenas mil anos, os especiais foram surgindo cada vez mais, um a cada dois séculos, três a cada um, e assim mais. E eu e mais alguns de meus irmãos, era ordenado para proteger essas pessoas que não eram mais que humanos, porém que recebiam um dom especial se não mais. 

Essa menina da qual, fui designado para protegê-la e orientá-la, era uma simples menina como qualquer outra. Porém ela sofria muito por coisas que haviam acontecido recentemente. E ela era muito fechada, mas compreensiva e atenta ao seu redor, com um olhar sensitivo que raras pessoas têm. Perdidamente apaixonada por um garoto de seu colégio, um que a fazia sofrer mais do que ela já sofria. Isso tudo com apena quinze anos.

Quando os arcanjos passaram todas as informações, vi que ela era diferente. Que ela merecia se tornar ainda mais especial. Ela já se destacava entre os humanos por ser inteligente, bonita e muito meiga. Mas, ela sofria. Silenciosamente e sozinha, mas sofria. Pelo amor intenso não correspondido e pelos pais que nunca estavam de acordo. 

Bem, mas eu queria conhecê-la. Cuidar dela e transformar a vida dela, como eu havia feito inúmeras vezes com outras pessoas. 

Por ser anjo, eu tinha vários poderes. E assim eu poderia ajudá-la a encarar tudo isso, e pelo que eu sabia durante sua vida ela havia tido algumas premonições por sonhos, e ela não imagina que isso só está começando...

Usando meu escudo, que era uma película que se formava ao redor de meu corpo, para que ninguém me visse, pousei suavemente ao lado da janela dela, no quintal, e suspirei. 

Vamos lá. Pensei. 

Ainda com a camada de invisibilidade atravessei espiritualmente a janela, que estava fechada, e entrei no quarto dela. Claro, que eu tinha a informações, como endereço, nome, idade e até qual era tipo de sangue dela. Nunca se sabe o que vai precisar. 

Olhei ao redor. O quarto era simples. Decorado nas cores rosa e roxo que toda adolescente gosta. Os móveis também eram simples na cor mogno. 

Sorrindo olhei seu mural de fotos, com várias dela de seus amigos e familiares... E então meus olhos pousaram nela deitada sob a cama. 

Os cabelos dourados espalhados pelos travesseiros eram compridos e lisos. Parecia da cor do sol ao crepúsculo. Ela tinha pele alva, tão branca que reluzia levemente com a luz de seu abajur ligado ao seu lado. O corpo pequeno, provavelmente pela baixa estatura, enrolado em um edredom rosa, macio. Os lábios cheios estavam entreabertos, ressonando de leve. Ela parecia normal aos olhos comuns. Mas, se olhasse de perto, notava-se as marcas de noites mal-dormidas pelas olheiras, as palpebras levemente avermelhadas, denunciava que ela havia ido dormir chorando, e apenas uma ou duas horas, mesmo sendo quase amanhecer, as mãos fechadas em punhos, obviamente ela estava tendo algum pesadelo.

Algo em meu peito me tocou. Tão profundo que cheguei a dar dois passos para trás e esbarrar na cômoda, o que causou um pequeno ruído. 

Olhei para Olívia, e seus olhos ainda estavam fechados, e ela ressonava de leve. O que havia me feito sentir essa queimação tão agradável no peito? Essa sensação intensa que me deixava completamente... Vivaz ou seria sensível a sentimentos estranhos? Ou de nunca mais querer sair do lado de minha protegida?

Foi então, que ela abriu os olhos, que ainda estavam inchados e vermelhos. Um aperto me deu, imaginando o quanto ela devia ter chorado. 

Mesmo estando completamente neutro ao ambiente, meus lábios se moveram em um sussurro mudo e me coloquei próximo a sua cortina, e ela levemente começou a tremular, mas não era ela que tremia, e sim eu. Os olhos dela eram do mais vivído dourado. Como ouro derretido. Quente. Trêmulo. E marcante. Rara as vezes que vi algo tão lindo. E tão terrível, pela dor que emanava deles. 

Imóvel, senti-a procurar ao redor do quarto com os lindos olhos dourados, e então voltar e colocar a cabeça no travesseiro. Ela fechou-os mais uma vez e tentou voltar a dormir. Mas, com minha sensibilidade vi que ela não conseguiria. Seu corpo estava agitado. Ouvia seu coração bater tão rápido como um passarinho. Sua respiração levemente sobressaltada.  

Travei uma luta interna entre ir ou não. Entre me aproximar e colocar ela sobre seu acalento, fazer com que ela dormisse melhor. Mas, no fundo eu sabia que queria. Não só por ela, como por mim. Queria ver Olívia de perto. Queria sentir seu cheiro, como ela soaria, uma humana para alguém como eu.

Sem qualquer ruído fui até ela, e coloquei minha mão sobre sua testa. Ela suspirou mais tranquila, e voltou a dormir em apenas segundos. Fechei meus olhos e calmamente, sem nenhum movimento brusco, fixei meus pensamentos aos seus e suavemente busquei seus sonhos pela minha mente. Imagens do mar alcançaram meus olhos e fiquei mais aliviado. Ela sonhava em estar caminhando pela praia com um vestido azul.

Sem me conter passei a mão por sua bochecha, e recolhi uma pequena lágrima que ela deixará cair antes de voltar a adormecer.  

  

  

        

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