A Atualidade de Tempos Modernos

Recentemente, tive a felicidade de rever o filme “Tempos Modernos” de Charlie Chaplin, desta vez, em família. Ver um filme de humor em casa nos traz a possibilidade de maior descontração. Além do divertimento possibilitado pelo filme, temos o riso solto causado pelas graças dos familiares que com risos ou comentários participam do filme trazendo mais uma camada de humor. É claro que esta participação prejudica, um pouco, a observação do filme, especialmente quando se tem criança em casa. Os pequenos vibram verdadeiramente e, por isso, são ótimos termômetros do que funciona. É claro que Chaplin não precisa de avaliação. Ao contrário, ele é um grande professor, sobretudo para quem como eu estuda o humor.

Assim como assisti o filme, tenho a pretensão de escrever com o mesmo nível de desprendimento.

Embora eu não fosse nascida quando o filme foi realizado, senti saudade. Fiquei saudosa deste tipo de narrativa cômica, nada apelativa. O filme mostra a realidade do trabalho fabril e várias consequências da Revolução Industrial, bem como a intensificação do ritmo de trabalho com a introdução da linha de montagem. Ainda assim, rimos verdadeiramente, sem ficar com aquele sentimento “que horror, estou rindo dessa coisa horrível”.

O mais incrível é que Tempos Modernos é de 1936, mas continua sendo atual. O capitalismo continua por aqui e o trabalho continua adoecendo muitas pessoas. Quando nos rebelamos ou somos confundidos com rebeldes, sofremos as consequências e a prisão continua sendo uma delas. Porém, Chaplin nos ensina a sorrir mesmo nas situações mais difíceis, mesmo quando perdemos e temos que recomeçar. O riso é pura resistência!

É uma forma de dizer “sou flexível, posso até ser dobrada, mas me recuso a quebrar”. Isso não quer dizer que não vou ficar pirada de vez em quando ou de vez em sempre, porque para resistir também é importante ter um certo deslocamento da realidade ou do que é nos imposto como real. E quando acreditamos nesta “realidade” com capa de verdade, ficamos presos na temporalidade do relógio (desconfio que as horas não são reais e tenho um tempo só meu). Pretendem nos tocar como gado, como se fosse possível tirar um copo de leite ou um bife de nossa alma. Como o trabalho é cada vez mais intelectualizado, hoje em dia, além do risco de perder a mão numa máquina, há o risco de perder a esperança e a alegria. Nosso professor Chaplin não deixará!

Quando você se confundir e escolher a porta de saída, quando pretende entrar, disfarce e tente servir um prato com pato (adoro rimas, foi irresistível rsss). E se a dança do momento quiser te transformar num bobo, improvise e mostre sua própria composição. O riso virá daquilo que você acredita que vale a pena rir.

Quase fiquei com vontade de ser crítica de cinema para falar das cenas do restaurante de forma mais técnica. Mas a vontade já passou e chamo atenção somente para a riqueza do humor físico. Chaplin é engraçado somente com sua expressão facial. Adoro humor físico. Vejo que ele sempre usa técnicas de repetição com intensificação. Isto é, em cada repetição os eventos são intensificados. Por exemplo, se ele quase cai, essa quase queda se repete de forma cada vez mais perigosa. Conclusão, rimos nervosamente. A Sétima Arte e o humor devem ser eternamente gratos ao cinema mudo e a este grande artista que mesmo após a introdução do som no cinema consegue nos fazer rir com um personagem generoso e genuíno.

Um momento de muita diversão aqui em casa, foi quando Carlitos conseguiu ser contratado para trabalhar como vigia noturno numa loja de departamentos. Alguém muito desastrado jamais deveria usar patins, mas no cinema sempre acontece o contrário. E nesta cena fiquei imaginando que parecemos mais protegidos quando não conhecemos os riscos que nos aguardam. Sempre achei que Deus protege de forma mais especial as crianças, os bêbados, os loucos e os inconsequentes. E vendo esta cena, minha crença foi reforçada, embora tenha rido e sofrido todas as vezes em que ele quase caiu. É muito estranho isso, a força de atração do perigo parece maior quando se sabe qual é o risco.

Contudo, em alguns momentos, precisamos mudar e abandonar o que nos é conhecido ou querido. Chegam as lágrimas e a tristeza, mas o melhor remédio é sorrir esperando o sol que certamente brilhará amanhã. E com o coração mais esperançoso, no dia seguinte tomamos café da manhã ouvindo a música Smile na voz de Nat King Cole.

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