O que fizeram comigo, me criou.
É um princípio básico do universo, que toda ação gera uma reação igual ou oposta.
V de vingança.
— Então, amigo, surpreso em me ver? — Miguel perguntou arrumando a camisa social. Pegou um copo de uísque, colocou uma dose e virou de uma vez. — Sim, estou vivo, não sou um fantasma, nem fruto da sua imaginação — o rapaz se aproximou de Lucas devagar, com um sorriso falso.
Sua vontade era de falar tudo, o acusar e mandá-lo para a cadeia, mas ele precisava seguir à risca o seu plano. O ex-amigo precisava pagar por tudo que fez, não só com ele, mas com todos.
Lucas estava tão surpreso em vê-lo, sua boca estava aberta em formato de “O”, os olhos, cobertos por uma fina camada de lágrimas, estavam grudados em Miguel, , e o seu rosto estava pálido. Por mais que ele quisesse articular alguma palavra, ela não saía. Recordou do seu desespero pela falta dos Alazar, então tudo se encaixou, todo aquele tempo era por causa dele. O rapaz engoliu em seco, sua cabeça girava e dúvidas surgiam.
O que será que Miguel faria com ele?
De certo, o acusaria e o faria ser preso, mas que provas Miguel tinha contra ele?
Lucas sabia que nenhuma, então um grande sorriso surgiu em seus lábios. Por mais que Miguel tentasse, não o colocaria na cadeia, Lucas tinha a vantagem.
— Não me dará as boas-vindas, Lucas? Eu voltei e dessa vez é para ficar — Miguel disse abrindo os braços e apertando-o contra o seu corpo num abraço que deveria ser feliz, mas que era de puro desprezo.
— Você… você, está vivo? — perguntou olhando a poucos centímetros de Miguel. Seu olhar era intenso e desafiador.
Lucas o segurava pelo cotovelo e encarava o antigo amigo. Por mais que sua mente já começasse a fazer planos para eliminá-lo, ele estava ainda surpreso.
— Sim, estou! Não me sente? — Miguel o olhou e mais uma vez abriu um sorriso falso.
— Sim, mas é que… o que aconteceu? Onde estava? — dissimulado, como somente ele, começou a enchê-lo de perguntas.
— Não me recordo, na verdade — respondeu Miguel. — A única coisa de que me lembro, é que estávamos no caribe e íamos velejar, daí acordei numa ilha deserta e permaneci lá por anos, sem saber quem eu era — disse se sentando novamente no sofá onde estava, antes de Lucas entrar. — O que me recordo é isso, perdi a memória. Sente-se, por favor! Vamos conversar.
— Mas, mas...
— O médico disse que levei uma pancada forte na cabeça e que o meu lobo temporal teve um coágulo. Não sabem se eu vou recuperar a memória do acidente, mas eu me lembro de toda a minha vida, Lucas — disse Miguel. — E me sinto grato, poderia ter morrido. Sabemos os riscos que coágulos em artérias cerebrais podem causar.
— Isso é...
— Eu sei. Não consigo me lembrar de muita coisa da nossa viagem — Miguel soltou um suspiro. — Lembro agora quem eu sou, o que fazia da vida, das pessoas, mas a viagem é um grande borrão. Poderia me contar o que aconteceu? — o rapaz se ajeitou na cadeira, cruzou as pernas e levou a mão direita ao queixo.
— Eu... eu... quanto tempo faz que voltou? — Lucas perguntou, ainda desconfiado.
— Passei dois meses em tratamento no Panamá e voltei tem alguns dias — ele resumiu tudo, não queria que Lucas soubesse muito sobre a sua volta, na verdade, não era nem para ele saber disso ainda, não antes de Malú.
— Malú já sabe que você está vivo? — Lucas sentia um ódio crescendo dentro de si. Sua vontade era de matar Miguel com as próprias mãos e se certificar de que, dessa vez, ele morreria.
— Sim — foi o que Miguel disse, apenas. Ele percebia o modo como Lucas o olhava e sabia que, se ele pudesse, o mataria. Miguel sorriu. Lucas não teria esse prazer. — Me diga, Lucas, o que aconteceu quando saímos para velejar?
Lucas franziu o cenho, buscava em sua memória a desculpa dada a todos, incluindo a polícia, sobre o acidente.
— Bem..., a gente saiu para velejar em volta da ilha, no Caribe — Miguel assentiu com a cabeça —, estávamos no barco, na proa, sentados, tomando umas cervejas e conversando em comemoração à nossa formatura — Lucas acrescentou. — Nos assustamos quando escutamos um estrondo e vimos uma fumaça escura começar a sair do motor do barco. Ficamos mais desesperados quando vimos as chamas. Você então se levantou e acho que devido ao álcool, ao sol do Caribe e o movimento tão rápido..., ficou tonto e caiu, bateu a cabeça com muita força no piso — ele deu uma pausa em efeito dramático para Miguel, mas o rapaz sabia que tudo aquilo era mentira, lembrava-se bem do que aconteceu. — Você começou a sangrar! Por mais que eu tentasse te acordar, não conseguia. — Lucas secava algumas lágrimas falsas que caíam em sua face. — As chamas avançavam, então eu me desesperei, peguei um bote e pulei na água. À medida que me afastava, via o fogo tomando conta do barco, até que ele explodiu.
— Não me viu quando me levantei, ou quando gritei por ajuda? Por que me deixou lá? Por que não me trouxe junto com você?
— Você não se levantou, eu teria visto! Eu não conseguia te erguer, Miguel! — mentiu ele, com seu falso desespero. — Achei que estivesse morto. Queria ter o levado e foi um dos meus maiores arrependimentos ter feito o contrário. Se eu tivesse me esforçado mais, você não teria passado por tudo que passou — Lucas fingia um choro convincente. Se Miguel não o conhecesse, diria que tudo aquilo era verdadeiro. — Me perdoe, me perdoe! — exclamou, aumentando o nível de fingimento usado naquela encenação
— Tudo bem, Lucas — disse Miguel, se esforçando para esconder o nojo e a raiva que sentia naquele momento, enquanto sua mente se perguntava como podia existir alguém tão dissimulado como aquele homem. — Não chore, eu estou vivo e bem, estou de volta e vou seguir minha vida de onde parei, meu amigo… — acrescentou, sentindo espinhos rasgarem sua garganta de dentro para fora ao proferir a palavra amigo.
Miguel se levantou da poltrona e se sentou ao lado de Lucas em um dos sofás da ampla sala de estar. Ele passou a mão esquerda nas costas dele, que chorava compulsivamente. Então o rapaz se virou e abraçou Miguel, que se obrigou a não repelir o gesto. Ele sabia que o amigo era um bom ator, então decidiu continuar dando corda, para que no final, pudesse se enforcar com ela.
Mais cedo ou mais tarde, Miguel se vingaria e veria seu rival sofrer. O homem sorriu ao pensar no dia em que Lucas pagaria por tudo que fez a ele e a todos em sua volta. Tudo valeria a pena.
— Ah, mamãe, não é assim — Miguel soltou Lucas ao escutar a voz da irmã entrando em casa.
— Claro que é, Bea — Joseane falava animadamente com Beatriz, porém, parou no meio da sala ao ver Lucas. — Lucas? O que faz aqui?
—Oi, Joseane, Bea, como estão? — perguntou limpando as lágrimas fingidas e olhando para as duas.
Joseane abriu a boca para falar algo, mas Miguel fez que não com a cabeça e tomou frente. Ela não poderia pôr o seu plano por água abaixo assim, na primeira oportunidade.
— Mamãe, Lucas veio ver vocês e acabamos nos reencontrando, não é o máximo?
— Miguel, eu...
— Por favor, aceite! — ele disse em seu ouvido quando a abraçou.
Joseane era contra o plano de Miguel. Por ela, expulsaria Lucas, iria à polícia e contaria tudo, porque o que ele fez não tinha perdão, além de que era um crime grave. Mas a mulher pensou rapidamente no filho sozinho por oito anos, perdido na ilha deserta, então forçou um sorriso quando o rapaz a soltou e olhou para Lucas.
— Oi, querido, tudo bem com você? — perguntou, abraçando Lucas.
— Por que não me falaram sobre o Miguel? Por que me deixaram aqui, sozinho? — exigiu saber.
— Oras, Lucas, eu... — Miguel olhou para a mãe e Joseane mudou o tom, soltando Lucas e indo para o outro lado da sala, fingindo arrumar algo na estante — não sabíamos se era o Miguel realmente. Como eu falaria isso para você, dando falsas esperanças depois de oito anos... OITO ANOS... não seria justo, não é mesmo?
Beatriz deu um abraço rápido em Lucas e saiu da sala. Ela não conseguiria ser tão fingida como a mãe. Era o irmão dela, prometeu não se intrometer e se desse, ajudaria. Mas queria distância de Lucas e se e pudesse, deixaria sua família o mais longe possível daquele crápula. Porém, sabia que cada um tinha o direito de agir como quisesse, então respeitou a decisão do irmão.
— Eu queria estar com vocês no momento do reencontro — disse Lucas, vendo Beatriz sair da sala e subir as escadas. — o que houve com a Bea?
— Não ligue para ela, só está cansada. — Joseane olhou para Miguel. — Vou deixá-los a sós, acho que tem muito o que conversarem. Com licença — acrescentou a senhora, logo se afastando.
Lucas estranhou a forma com que Joseane e Beatriz o trataram, estavam frias e distantes. Antes de Miguel voltar elas não eram daquele jeito. Miguel, percebendo a confusão de Lucas, tratou de chamar a atenção dele, passando seu braço direito pelo pescoço do ex-amigo e o levando para o sofá.
— Vem, vamos conversar, quero que me conte tudo que perdi nesses últimos anos — Miguel sorriu.
Ele sabia que a vingança era um dos sentimentos que se instalara dentro de si desde que despertou naquela ilha. Sabia que ela poderia corroer a sua capacidade de raciocínio e levá-lo a ações totalmente impensadas. Sabia também que teria danos emocionais, pois a intensidade e forma com que estava levando aquele sentimento era dura e amarga. Porém, necessitava daquilo para que sentisse que a justiça foi feita. E para isso, se fosse necessário se destruir no caminho, faria sem pensar duas vezes.
— Mas eu não consigo, Miguel, simplesmente não dá — Beatriz disse, se deitando em sua cama com os olhos cheios de lágrimas.— Eu te entendo, mana — Miguel disse, se deitando ao seu lado e pegando sua mão. — Sei que não foi fácil, mas...— Não! — ela gritou. — Não me peça para pensar em você! Não tem ideia do que passei aqui com a mamãe e o papai, de como eu via a nossa família ser destruída porque sentíamos a sua falta, de como papai se afundou na bebida e a mamãe dias e dias em cima de uma cama, deprimida — Beatriz se levantou, apontando o dedo para Miguel.Miguel respirou fundo. A irmã tinha razão, fazer com que ela o ajudasse era pedir muito. Bea odiava Lucas tão ou mais do que ele, mas vendo-a naquele estado de nervos só fez a vontade de se vingar que existia de
MALÚ acordou mais cedo naquela sexta-feira, tomou seu banho tranquilamente e havia saído do banheiro quando o telefone tocou. Era Bea do outro lado da linha, pedindo para levar o sobrinho à escola. Ela achou aquilo estranho, ainda mais porque a cunhada já estava em frente à sua casa. Não que Bea não tivesse aquele costume, pelo contrário. Ela sempre fazia aquilo, porém, combinavam durante o dia com antecedência. Escutou a campainha de casa, então desceu as escadas e foi abrir. Abraçou forte a cunhada. Ela a tinha como uma irmã.— Maicon está descendo.— Ok.— Como todos estão? — Malú disse, indo para a cozinha.— Todos bem, muito bem.— Que bom, fico feliz. Já tomou café?— Sim, comi algo antes de sair. — Ela se sentou na cadeira da cozinha.— Tia, tia, tia..
Sunlight comes creeping inIlluminates our skinWe watched the day go byStories of what we didBrids - Winks MALÚ estava sem fôlego. Os beijos de Miguel a deixavam sem ar. Ela ainda não acreditava que ele estava ali, sonhou tanto com esse momento, que não conseguia acreditar. Tê-lo em seus braços novamente era indescritível.— Miguel... — ela sussurrou o seu nome entre o beijo.— O que foi? — Miguel parou e a olhou.Malú tinha um sorriso doce nos lábios e isso fez com que o seu coração se aquecesse. Miguel não sabia como aguentou tantos anos sem a sua amada. Aquele sentimento que havia dentro dele era o mesmo de quando começaram a namorar, era algo puro, genuíno, que aquecia e fazia bem.— Vamos para o quarto — ela disse saindo dos braços
Breaking every chain that you put on meYou thought I wouldn’t change but I grew on yah'Cause I will never be what you wantedThis fire, (this fire), this fireJonathan Roy - Keeping Me AliveSe você pudesse deter um desastre, você deteria? Ou deixaria acontecer?— Doutor Lucas, Doutor Lucas! — Lucas voltou a si com Caroline chamando por ele. Ouviu o barulho do monitor cardíaco acusando a morte da paciente.Ele olhou ao redor. Sua cabeça parecia que explodiria. Olhou para as suas mãos cheias de sangue. A direita tremia. Ele soltou o bisturi e se afastou da mesa de cirurgia, não entendia como fora parar ali, estava na casa dos Alazar com... com Miguel, então depois tudo se apagou.— Doutor Lucas — ela o chamou mais uma vez. — Declare a morte da paciente. — Seus olhos foram para o r
Would you take the wheelIf I lose control?If I'm lying hereWill you take me home?Jess Glynne - Take Me HomeBEATRIZ estava parada na frente do espelho de sua casa, olhando-se dos pês a cabeça. Seu novo uniforme era um macacão azul, tinha listras cinza nos joelhos, cintura e nos braços, elas brilhavam no escuro e nas laterais eram de um tom de laranja vivo. As botas eram pesadas. Ela sorriu. Sabia que sua mãe não apoiava aquela ideia, mas era aquilo ou se mudar, pois ela não conseguia ficar perto de Lucas, não depois do que ele fez com seu irmão e sua família.Ela foi tirada de seus pensamentos com Maicon, que entrou correndo no quarto da moça e a olhou dos pés à cabeça.— Uau! — ele disse encarando a tia. Tinha a boca em forma de O e olhos brilhantes.— Que foi, moleque? Nunca
There is a house built out of stoneWooden floors, walls and window sillsTables and chairs worn by all of the dustThis is a place where I don't feel aloneThis is a place where I feel at homeThe Cinematic Orchestra - To Build A HomeMIGUEL acordou sentindo beijos pelas costas. Um sorriso foi crescendo em seu rosto. Era tão bom se sentir assim: Amado.Ele se virou, encarou Malú e sorriu. Ela subiu nele e o beijou com paixão, ainda não acreditava no que aconteceu. Tê-lo ali com ela era a realização de um sonho que há muito carregava dentro de si. Achou que nunca mais sentiria a felicidade que sentia naquele momento, era uma coisa crescente dentro do peito, parecia que seu coração ia explodir.— Bom dia, meu amor! — disse após soltar os lábios dele.— Bom dia, minha vida. Acordou cedo — ela s
FALCÃO andava de um lado para o outro, estava nervoso e cansado. Às últimas vinte e quatro horas foram difíceis e cansativas. Recordou o horror dentro daqueles túneis fétidos, as pessoas mutiladas, as crianças mortas com os corpos empilhados como sacos de batatas. Ainda tinha a história de Miguel, tudo o que ele passou desde que foi deixado para morrer naquele iate...Será que a maldade de Lucas não tinha fim?O que mais ele faria para que seus planos dessem certos?Olhou para Donna e se sentiu profundamente culpado por ela. Todos aqueles aparelhos e tubos saindo dela. Talvez, se ele tivesse prestado mais atenção em Lucas, poderia ter evitado tudo aquilo. Suspirou pesadamente e seus olhos se encheram de lágrimas.Os exames de Donna estavam ruins, ela tinha anemia, ossos quebrados que mal foram curados, uma gestação sem nenhum acompanhamento médi
All that I ever wasIs here in your perfect eyes,they're all I can seeSnow Patrol - Chasing Cars MIGUEL estava olhando o filho dormir. Depois de muita conversa e choro, o menino disse que estava cansado e com dor de cabeça, então ele o levou para o seu quarto. Assim que o colocou sobre a cama, foi puxado e abraçado pelo pequeno, que adormeceu tão rápido grudado ao pai. O rapaz se sentiu grato pelo menino compreender tudo tão fácil e concluiu que Maicon era realmente fantástico.Encarou o filho, que dormia em cima dele. A forma como respirava, o jeito como seus olhos se remexiam, inquietos por causa dos sonhos, a forma como seus cabelos caíam em seu rosto, sua boca carnuda...Maicon era mesmo muito parecido com Miguel quando pequeno e notando isso, o rapaz afagou a cabeça do filho e pensou que tudo que estivesse