— Tânia, estás bem? — perguntei caminhando ao seu lado pela rua estreita que nos levaria até a clínica.
Minha amiga me ignorou e continuou a cantar. Faziam exactas duas horas que eu tinha me encontrado com ela e de certeza não estava nos seus melhores dias.
—"This is for my father, from the older brother of your children made of three
(Isto é para meu pai, do irmão mais velho de suas crianças feitas de três)Yeah you’ve been so good to us and showed us how to live and taught us to be free
(Sim,você tem sido tão bom para nós e nos mostrou como viver e nos ensinou a sermos livres)But when mother told you that she didn’t love you all these bridges hit the sea
(Mas quando mãe lhe disse que ela não ti amava todas essas pontes caíram no oceano)So you built another one and helped us cross it even though you were in need
(Então você construiu uma ou— Hoje você fará a segunda ultrassonografia, que se chama "ultrassom com translucência nucal". Eu acho que o nome já permite entender o objectivo do mesmo, que é avaliar as primeiras estruturas fetais e um líquido que se acumula na região da nuca. — Qual é a necessidade de avaliar esse líquido? — perguntei já mais calma, pois era algo bom saber que primeiro seria um diálogo.— É necessário porque é através dele que se detectam anomalias cromossómicas como por exemplo Síndrome de Down. Isso quando o líquido está em excesso.— Quais são as chances de esse líquido estar em excesso? — me movi desconfortável com a revelação.Algo me fazia pensar que minha gravidez não seria normal ou saudável. Por eu ser nova, eu acreditava que, ou a gravidez teria algum risco, ou o bebé nasceria com alguma doença.— Talvez 1 em 300. Não é porque você é nova que seu bebé terá mais chances de desenvol
Os dias passavam e mesmo assim, eu ainda me perdia na estranheza que foi ter que reagir a aquela ultrassonografia. Parecia que ainda acreditava que não estava grávida e nem sabia, até que os batimentos do feto se fizeram sentir e o meu coração tinha também se esquecido de funcionar com normalidade.Depois da Clínica, eu e Tânia fomos para a escola renovar nossas matrículas, oque também me fez pensar como seria ir para escola com a barriga que parecia crescer mais a cada dia que passava. Para além disso, tinha a minha mãe que não suportava mais mentir para meu pai e tinha isso como o principal motivo da sua preocupação naqueles últimos dias.Por fim tinha o facto de ela querer procurar o Weben, alegando que tinha lhe dado tempo para pensar no que fez e voltar para assumir suas responsabilidades. Como não tinha feito, ela lhe obrigaria a fazer.Eu estava a confusão em pessoa. Para mim o ano tinha iniciado com um peso sobre minhas cost
11 de Fevereiro Tinha algo naquelas férias,—talvez um misto de aborrecimento com tensão, risadas, diversão, choros e com tristezas—que fez com que fossem contra todas minhas expectativas.Eu estava à um dia do início das aulas, com o uniforme limpo, novo e engomado, com o cabelo organizado, material escolar novo, talvez com o psicológico minimamente preparado para tudo oque vinha pela frente, só me faltava uma coisa: coragem e vontade para sair de casa.Naquele exacto dia eu completaria 4 meses, uma semana e um dia de gravidez. Seria chocante demais dizer que eu tinha começado a me familiarizar com tudo aquilo? Pois era isso que eu sentia. Estava no processo de aceitação e sem que eu mesma percebesse, fui criando uma relação
Segunda-feiraAquela gravidez me fazia pensar que eu era um cágado na vida anterior, pela forma tão lenta que eu funcionava. Estava de frente para o espelho, com os cotovelos doloridos porque tentava fazer um rabo de cavalo bonito havia aproximadamente 10 minutos. Ou saía de lado, ou de frente; ora saía de trás, ora da ponta, mas nunca do meio da cabeça. Se isso responde a uma possível pergunta: não, eu não consegui fazer um rabo de cavalo e estava quase atrasada.— Ah! — choraminguei e atirei o elástico para o chão com a pouca força que me restava.Ao olhar para o espelho, me deparei com uma Evie diferente. Ignorei o facto das mechas estarem a cobrir quase toda minha cara e me encantei com a minha organização. Não me via daquela forma desde a semana de avaliações finais.O cheiro de novo que meu uniforme exalava, se misturava com meu novo perfume com aroma de caramelo
5 de Março, Terça-feiraOs dias, como sempre, passavam na mesmíssima rotina. Nada digno de entusiasmo, excepto pelo facto do meu amor pelo feto só aumentar. Já não era algo tão novo, me perdia em situações que nunca me imaginei inserida. Estranhas, tão engraçadas quanto adoráveis.Por um lado aquilo era bom. Meus amigos e minha mãe ficavam mais aliviados por saber que a minha gravidez não era mais um peso para mim. Mas por outro, aquilo preocupava minha mãe. Preocupava porque eu já não me importava tanto em esconder.Acreditava que se não fosse pelas viagens frequentes que meu pai fazia, já estaria envolvida nas tristes consequências dos meus atos.Alguns dos meus colegas notaram a minha estranheza e se atreveram a perguntar oque acontecia, mas eu não dava nem um sim e nem um não. Apenas distribuía "talv
Do lado de fora da sala de desenho, o desespero me fazia saltitar e fazer coisas estúpidas somente para ter a atenção de Cleyton, que precisou que uma colega o cutucasse para que me notasse.— Peça para sair, é urgente. — movimentava meus lábios com vagar e exagero para que ele os lêsse facilmente.Me encarou meio despercebido e depois passou a alternar seu olhar de mim ao quadro enquanto acenava para que eu saísse dali. Bem, meu nome é Evie Lerda Paruque.— Estamos em aulas, quer oque?— surgiu na porta um homem de cabelos pretos, brancos e crespos, óculos de grau, baixo e dono de uma postura impecável.— Boa tarde, professor. Desculpa interromper, mas posso falar com Cleyton? É urgente. — juntei as mãos e afinei o tom de voz para tentar comovê-lo com meu pedido.— Estamos em aulas! —tentou fechar a porta na minha cara mas meu pé impediu e tive que optar pela "desculpa vergonhosa".
Depois do banho, passei loção pelo corpo e desodorante nas axilas. Para absorver a fonte da minha angústia, coloquei absorvente e escolhi um vestido amarelo, largo, comprido e de tecido fino para que me sentisse confortável. Por fim calcei as pantufas da minha mãe e fui para a cozinha em busca de algo para comer.Um prazer que eu sentia em estar limpa, era cheirar a sabonete de flores com loção de laranja e óleo de abacate. Pelo menos aquele cheiro não me dava náuseas, muito pelo contrário, me fazia querer juntar tudo num prato e comer.Arrastei as pantufas pelo chão da cozinha até estar de frente para o fogão, tinha só uma panela que abri e tinha batatas, ovos, cenouras, cebola, couve, feijão verde e repolho. Tudo cozido. Me preocupei em temperar tudo aquilo e comer, mas quando estava para colocar as mãos na massa, meu telefone tocou.Me apressei em voltar para o quarto e assim que coloquei as mãos no aparelho, vi que era uma
Narro esta história de um tempo meio distante, mas ainda me pego em pensamentos desesperados na busca pelo exacto momento em que tudo começou a sair dos eixos. Num dado momento, pareceu que formou-se um tornado com um simples estalar do dedos, se aproximou da minha vida e eu nem vi. Devia estar ocupada demais com minha meninice que se perderia no meu passado em pouco tempo. Desarrumou tudo e como é sabido, um tornado leva sempre algo consigo.Os comentários maus e os olhares tortos aumentaram e se expandiram. Eu não era condenada e gozada somente na escola. Diziam-me que em rodas de senhoras, em alguns salões da zona e até no hospital no qual minha mãe trabalhava, eu e minha mãe eramos o motivo de comentários ofensivos. Algumas vinham deitar suas opiniões na minha cara, com repúdio, sem ao menos se importar com oque aquilo me faria sentir. Nunca desejei tanto me livrar da minha gravidez como naqueles dias.Buma das deprimentes manhãs, minha mãe entrou no meu q