Chris levava Louisa para sua casa após as aulas, passando da uma hora da tarde. De mãos entrelaçadas, eles andavam pela rua onde Chris morava. Aquele fora o último dia de aula e então estavam oficialmente de férias. Lou saltitava ao lado dele, usando o vestido que ele dera de presente para ela havia alguns meses. O vestido era preto de alças finas, com rendas na saia. Era simples e não tinha muitos adornos, mas Lou o adorou tanto que Chris sentiu que aquele fora o melhor presente que poderia ter dado a ela. Louisa gostava de usá-lo com seu par de all star vermelhos, pois o contraste de cores do vestido e dos tênis era lindo aos olhos dela. Seus cabelos estavam presos em uma trança frouxa posta por sobre o ombro direito.
— Meu pai não irá gostar nada de saber que estou indo para a sua casa, sozinha com você. — Comentou Lou, sorrindo um pouco.
— Não vou roubar sua virtude nem nada do tipo, só estou te levando lá para ter um tempo com você. De preferência sem o Henrik
Zya caminhava sem pressa pela cidade, procurando conhecê-la. Já era noite e ele voltava para o celeiro, cansado. A noite estava fresca e não havia ninguém por perto, então Zya arriscou tirar a blusa de mangas compridas, vestindo apenas a regata preta que usava por baixo dela. Zya soltou os dreadlocks, deixando-os estendidos ao longo das costas e jogados de lado, de modo que um lado de sua cabeça ficasse livre deles, com uma parte raspada à mostra onde uma sombra de cabelos pretos aparecia. Zya se cobrou mentalmente sobre comprar uma lâmina de barbear no dia seguinte para dar fim ao cabelo que começava a crescer.Caminhando tranquilamente pela cidade, que deveria ter mais ou menos umas dez ruas, Zya descobrira que só as principais eram asfaltadas; todas as outras eram de terra, inclusive a rua de seu novo endereço.Ele repassava mentalmente os planos para sua nova vida naquela cidade enquanto andava: no dia seguinte, iria ao lugar onde o pai do Chris trabalhav
Louisa mantinha a cabeça deitada na cama, ao lado de Chris. Estava sentada naquela cadeira desconfortável o dia inteiro, tendo se levantado apenas para ligar para sua mãe e contar o que aconteceu. Jenna dissera que esperaria Saul chegar em casa e então iriam vê-los, após avisar Marco.Chris não corria perigo, mas ainda não acordara. Louisa não podia contar a verdade nem por um decreto, e teve de inventar que Chris havia entrado em contato com um fio grosso cortado na estrada. Sem maiores detalhes, ela se fechou para a equipe médica, que cuidou de Chris o melhor que puderam com tão poucas informações. Ele estava sedado e tinha curativos por todo seu peito. Chris ressonava tranquilo, deliciosamente alheio à tudo. Louisa desejou poder estar sedada também.Sua cabeça explodia com tantas especulações, perguntas e tudo o mais relacionado ao que acontecera mais cedo. Como era possível que ela, Louisa Newton, a menina mais normal da cidade mais monótona da Terra, tiv
Saul preparava, na mesa da cozinha, o que falaria naquele domingo na igreja. Anotava algumas ideias em um bloco de papel fino com pautas pretas enquanto lia algumas passagens bíblicas. Saul ouvia Jenna assistir TV na sala, alguma novela melosa a qual ele não tinha o mínimo interesse. Ele não conseguia se concentrar no que estava fazendo, pois tinha a cabeça cheia de outras coisas, como Louisa e a quase morte de seu namorado, o inquilino novo e Samira. Erguendo os olhos para o relógio da cozinha, Saul viu que era tarde, mas sabia que àquela hora alguns garotos treinavam lacrosse na escola, pois de noite o clima ficava mais fresco, facilitando o jogo.Fechou a Bíblia e descansou a caneta em cima do bloco de papel, levantando-se da cadeira. Apagou a luz ao sair da cozinha e parou aos pés da escada, observando Jenna sentada ao sofá sorrindo sozinha para a televisão, totalmente entretida na tal novela. Os cabelos claros dela estavam presos em um coque simples e desleixado e e
Fazia quase cinco dias inteiros desde que Zya chegara a Sunfalls. Muitas coisas haviam acontecido naquele pequeno tempo, como Zya ter conseguido um emprego na mesma fábrica de Marco, onde trabalharia com o tratamento e produção de metais. Não era um trabalho muito bom, e ele não ganharia muito bem, mas já era algum progresso. Zya não tinha a menor experiência com metais, mas era isso ou não sabia o que mais poderia fazer. Quase não tinham oportunidades em Sunfalls, e metade da população de lá ia às cidades vizinhas trabalhar.No dia anterior, Zya fora ao mercado para abastecer sua pequena casa. Comprou comida, itens de higiene e de limpeza. Já havia arrumado suas coisas no guarda-roupa e não tinha mais afazeres, decidindo cozinhar um pouco. Faria algo simples, como espaguete e batatas fritas. Pôs-se a fritá-las enquanto a massa e o molho cozinhavam. Após alguns minutos, tudo estava pronto e Zya sentou-se à pequena mesa para comer.Distraído, dava garfadas pequenas
Ambos estavam no final da rua, andando a passos rápidos. Passaram pela avenida principal de Sunfalls, em frente à sorveteria de Jenna, que deveria estar nos fundos dela almoçando – pois não estava no balcão. A rua era longa, mas logo estavam na próxima. Sunfalls tinha poucas ruas, e era composta por terras extensas e vazias, ocupadas por milharais ou fazendas. Era possível percorrer todas em cerca de uma hora, andando em velocidade moderada. Louisa pululava ao seu lado, feliz e calada, aproveitando a companhia quieta de Zya.— E o que você fazia lá em Ghonargon? — Indagou Lou.— Muita coisa. Defina o que quer saber exatamente. — Sorriu ele.— Ah, trabalho, diversão...— Ainda assim, assuntos um pouco vagos. Eu trabalhava com algo que você não vai querer saber e me divertia com coisas que você não iria querer ouvir sobre.— Nossa, Zya. Duvido que você tenha feito coisas tão chocantes assim. — Respondeu ela, rindo alto.Zya lembrou-se de
— Bom, eu jogo lacrosse no time da escola, tenho dezessete anos, gosto de comer muitas coisas.— Muitas coisas tipo tudo. — Complementou Louisa.— Não é verdade. Aquela coisa estranha que você faz, por exemplo, eu não consigo engolir nem ferrando.— O quê? — Perguntou ela, confusa.— Aquela espécie de hambúrguer de tofu, sei lá o que é aquilo. E geralmente você queima a frigideira quando faz.Louisa encarou Henrik, com os lábios entreabertos. Não achava que cozinhasse tão mal como ele estava dizendo.— Aquilo é panqueca... — Respondeu Lou, baixinho.Repentinamente, Zya gargalhou alto, pensando na tal panqueca disfarçada de hambúrguer de tofu. Tudo bem que ele não era nenhum Chef de cozinha, mas sabia se virar muito bem. Louisa cruzou os braços e ergueu uma sobrancelha dourada.— Você diz isso porque nunca comeu comida de reformatório, Henrik. — Comentou Zya, rindo.— Então você já esteve
— Alice?— Do País das Maravilhas.— Por conta do cabelo claro e a estatura medíocre? — Ela riu.— Não só fisicamente, mas sua curiosidade também, que consegue se exceder à dela. E sua estatura não é medíocre, eu gosto assim.— Já me disseram que pareço com ela, mas nunca criticaram tanto minha curiosidade. — Respondeu Louisa, rabugenta.— Não fique brava, só não sou do tipo “livro aberto”. Gosto de guardar para mim algumas coisas.— Imagino como deve ser conviver com você, como namorar ou morar na mesma casa sem poder perguntar nada.Louisa ergueu o queixo, confrontando-o petulantemente. Zya sorria largamente, divertindo-se com as reações de Lou às suas restrições.— Quer dizer que já imaginou como seria namorar comigo?Lou sabia que ele iria dizer algo do tipo; estava aprendendo rápido como lidar com Zya e o que esperar dele. Ou pelo menos era o que ela pensava.— Clar
Chris voltava à consciência aos poucos, começando por escutar os sons ao seu redor; um bip insistente de alguma coisa bem perto de sua cabeça, uma respiração pesada e masculina. E mais nada. Com estas exceções, um silêncio pesado reinava ali, onde quer que ele estivesse. Espalmando as mãos, Chris sentiu um colchão macio e lençóis esticados e arrumados abaixo de si. Sentiu estar coberto até a cintura e algo cobrindo a pele do peito. Chris notava que sua boca estava seca e a garganta arranhando, dolorida. O corpo todo parecia travado e tenso, louco para se movimentar nem que por um segundo apenas. Ao abrir os olhos, percebeu que estava em um quarto afundado na penumbra, com mobília branca – assim como qualquer outra coisa ali. Chris percebia que não conseguia focalizar nada ainda, e sua visão se encontrava embaçada.Uma torrente de sensações o invadiu, confundindo-o. Medo, fome, agitação, dor – muita dor – e coisas que ele sequer sabia dizer direito o que eram. Aquele bip