Louisa se olhava no espelho de corpo inteiro em seu quarto, analisando sua mais nova aquisição: um par de botas plataforma de cor branca com renda preta por cima, cobrindo todo o sapato, com exceção dos saltos, que eram pretos. As botas batiam em seus joelhos e ficavam bem demais com o vestido que Chris dera de presente a Lou. Aquele seria seu mais novo conjunto favorito; botas e vestido. Jogando o cabelo de lado, Louisa pensou como seria se fizesse o mesmo penteado de Zya, mas gostava de seu cabelo daquele jeito. Cansada de se admirar no espelho, Louisa sentou-se na janela, observando o celeiro. Estava escuro nele, o que indicava que Zya não chegara ainda. Já era tarde e todas as fábricas estavam fechadas havia algumas horas.
— Lou?
Louisa se virou rapidamente ao ouvir a voz de Chris. Ele estava parado na soleira da porta, com os tornozelos e os braços cruzados e sorria para ela. Fazia alguns dias que Louisa não o via, pois Marco o proibiu de receber visitas
— Gen, tão cedo? Estava esperando pelo menos mais um mês. — Dizia Saul.— Não posso mais esperar. Alguma coisa vai acontecer aqui e não quero estar presente. Vi uns caras estranhos mais cedo, como se fossem um tipo de exército, mas eram diferentes...— Jenna me disse. Bom, não posso forçá-lo a esperar. Tome o máximo de cuidado que puder, e cuide de Aiden. Você é o mais velho.— Só alguns meses mais velho. — Genesis o interrompeu.— Que seja, mas é mais velho e mais responsável. Mantenha a cabeça dele no lugar e tente não meter vocês dois em besteira. Não estarei lá para ajudar.— Eu sei... Só queria avisar para que você deixasse alguém cuidando da minha mãe, como disse que faria, Saul.— Me chame de pai. Já está na hora de começar a me chamar assim, não acha?O estômago de Louisa afundou ao ouvir o que seu pai dissera. Lembrou-se de todas as vezes em que Saul brigou com Henrik por caçoar de Genesis pelas costas dizendo que ele ha
Henrik acordou com o som de seu celular vibrando em cima da mesa de cabeceira de Louisa. Já era dia, mas o quarto estava afundado na penumbra, com as cortinas fechadas. Pegou o celular e desligou a chamada sem sequer ver quem era e o colocou de volta na mesinha. Esfregou os olhos e se voltou à Lou, que ressonava tranquila ao seu lado com o lençol cobrindo até metade do rosto. Lembrou-se gradativamente de tudo que ela havia contado na noite anterior e de como Lou estava com o emocional em cacos, tendo acabado de descobrir que tinham um irmão fora do casamento e ter sido ameaçada de modo tão maldoso por seu próprio namorado. Seu celular voltou a vibrar, forçando-o a atender. Pegou-o e se levantou rápido da cama, tentando não acordar Louisa. Saiu do quarto e fechou a porta atrás de si, notando como a casa estava silenciosa.Atendendo a insistente chamada, Henrik fechou a mão livre em punho ao ouvir aquela voz tão conhecida.— Henrik?— Chris. O que você quer? — Henrik
O sol havia nascido faria um bom par de horas. O gosto amargo da noite insone se instalou em sua garganta e ameaçava jamais deixá-lo. Chris revirava o celular nas mãos frias, repassando em sua mente as palavras de Lou. Não acreditava que até mesmo sua amizade de infância com Henrik ela estragaria. Ao chegar em casa na noite anterior, alguns flashes do dia de seu acidente o acometeram; momentos de luz azul intensa, o rosto de Louisa ora desesperado, ora admirado, eletricidade intensa nos braços delicados dela e dor, muita dor.Tentava entender o que diabos havia acontecido, mas nada plausível vinha à mente. Após algumas horas, Chris começou a deixar o ceticismo de lado e pensar mais além, em coisas mais fantasiosas, porém nada o fazia chegar a lugar algum. Um sentimento inominável tomava conta dele, expandindo seu peito a ponto de doer fisicamente. Não conseguia chorar, mas a vontade estava ali, batendo em seus olhos com força. Rangia os dentes dolorosamente, sentado no c
Já era quase noite quando Zya decidiu dar um passeio por Sunfalls. Havia ido trabalhar naquele dia, falou com o supervisor da fábrica e ficou sabendo que estavam de fato procurando por alguém muito parecido com ele, mas que não achavam se tratar Zya, disse o supervisor, pois o cara das fotos não era exatamente igual a ele, e ele não entregaria ninguém sem ter certeza. Zya sentira-se agradecido pela boa vontade de seu chefe, que o dispensou mais cedo por conta da quantidade de trabalho que já havia realizado naquele dia. No meio da tarde, já se encontrava em casa.O dia estava propício para o tal passeio e ele não perdeu tempo; caminhou devagar pelas margens dos campos de girassóis até chegar ao penhasco onde terminava Sunfalls. Aquele lugar ficava cerca de meia hora da cidade, afastado dela. Era vazio, sem casas – dando para se imaginar o porquê não tinha uma casa sequer ali – e muito alto. Lá embaixo uma faixa de terra árida se estendia antes de acabar em uma mata de ár
Aiden olhava pela janela do trem, vendo a paisagem passar rapidamente como um borrão verde, marrom e eventualmente cinza. Onde estavam já não era mais tão ensolarado e quente, mas não haviam chegado em Ghonargon; estava há uma hora de lá ainda. Ele sabia que Ghonargon era longe, só não imaginava o quanto. Genesis ressonava no banco à frente, sentado meio largado com o capuz da blusa de moletom sobre a cabeça cobrindo metade do rosto. Antes de sair, Aiden e Genesis separaram as roupas mais grossas que tinham e as puseram nas bagagens de mão, pois seria estranho saírem de Sunfalls vestidos daquele jeito. Aiden vestia calças jeans escuras e botas de cano alto marrons, completando com uma blusa estilo militar preta e luvas de couro. Genesis vestia um conjunto de moletom azul escuro e tênis pretos, simples. O dia já estava no fim e duas horas atrás começaram a sentir o frio enregelar seus ossos e embaçar as janelas do trem. Vestiram-se e esperaram pacientemente a chegada à Ghonargon.&nbs
Aiden e Genesis pararam em frente a um prédio pequeno com um elevador de carga de cor chumbo e uma porta de madeira que dava para um hall pequeno. O prédio ficava em uma rua estreita e escura, com calçadas desniveladas e um ou outro buraco no asfalto da rua. Havia mais prédios ali, quase colados uns nos outros, com apenas becos pequenos separando-os. De ambos os lados, ruas um pouco maiores e mais movimentadas levavam até eles o som ininterrupto de veículos e vozes.— Vamos entrar. Nosso apartamento é o de número nove, no terceiro andar. — Indicou Genesis.— Você já deixou tudo certo em relação ao apartamento?— Sim. Bom, na noite anterior à nossa ida, Saul perguntou se eu queria dinheiro e eu recusei. Mas quando fui pegar as cartas na manhã da nossa partida, em meio a elas havia um envelope recheado de dinheiro, com o nome dele escrito. Usarei esse dinheiro para pagar alguns meses de aluguel. Temos bastante agora.— Então, com quem devemos falar
Saul esperava todos saírem da igreja, permanecendo em pé no púlpito vendo aquele pequeno aglomerado de pessoas andando para fora, conversando animadamente. Ele se orgulhava de deixar as pessoas esperançosas e animadas com suas missas. Em pouco tempo, Saul se encontrava sozinho ali dentro; com exceção de uma pequena pessoa de longos cabelos claros e enormes olhos azuis.Louisa.Saul desceu do púlpito sorrindo para ela, unindo as mãos em frente ao corpo. Lou torcia as mãos no colo – como sempre fazia quando estava ansiosa ou com algum problema – e não o olhava nos olhos.— Lou! Gostou da missa de hoje?— Ah, sim. Foi muito boa.— Você queria falar comigo, não era?— Sim, e isso faz três dias, na verdade. — Respondeu ela, hesitando.Saul passou as mãos no cabelo, culpando-se por ter esquecido que sua filha precisava dele.— Me perdoe. Andei com coisas demais na cabeça ultimamente. Ainda quer falar algo?Louisa se s
O calor no quarto a fez acordar mais cedo do que de costume. Samira se arrastou para fora da cama, resmungando orações repetidas vezes enquanto andava pela casa de pijama – branco com bolinhas pretas. Os cabelos escorridos cobriam seu rosto envelhecido precocemente, com rugas e linhas de expressão que não deveriam estar ali. Samira não tinha muito em mente, apenas contava os dias desde a partida de seu filho e sobrinho. Deixaram um bilhete sem emoção e dois quartos vazios.— Me abandonaram... — Sussurrou ela, sem expressão.Samira se fechou no banheiro e ligou a torneira da banheira, enchendo-a com água quente. A cabeça cheia de pensamentos desconexos latejava fortemente, piorando a cada instante e a cada coisa nova na qual Samira pensava. Fora largada por Saul e pelo próprio filho, que não pensou nela nem por um momento e se fora para algum lugar que Samira não conhecia, pois sequer fora avisada.A banheira transbordava, alagando aos poucos o chã