Siena ainda podia escutar os sons da madeira batendo vigorosamente contra a parede. Era como um assombro da noite anterior, que sempre voltava a atormentar os sonhos de uma noite que ela quase não dormiu.
Ainda debruçada sobre a poça de sangue seco da cama, que fora jogada brutalmente em meio a madrugada longa, siena embarcou em um sono profundo.Ela ainda conseguiu ouvir o momento em que o monstro ordenou que ela se limpasse e saísse do quarto, mas estava incapaz de mexer as pernas.O som da porta se arrastando no tapete luxuoso a alertou. Ela rapidamente ergueu o corpo, temendo que tudo se iniciasse mais uma vez. Os olhos dela caíram de vergonha quando a empregada a observou.Os olhos frios nem mesmo pareciam surpresos pela visão desastrosa da garota de olhos azuis meigos, mas havia uma certa pena na forma como a senhora olhava para ela. – É melhor você comer um pouco. – A senhora foi ríspida.Siena não conseguia entender o porque, embora tentasse imaginar todas as teorias possíveis. – A senhora conhece uma mulher chamada Irina?A velha exibiu uma careta de insatisfação assim que ouviu aquele nome. Assemelhava-se quase a sentir dor. A sua mãe?- Minha mãe? – A jovem arregalou os olhos. As coisas finalmente pareciam fazer algum sentido. E Siena entendeu que a m*****a mulher havia substituído a filha do destino de torturas, enquanto gozava dos luxos que o dinheiro do Sebastian Black poderia proporcionar.Por alguns segundos, a jovem se esqueceu de que estava completamente nua, apesar do frio. A sua doença deixava qualquer hematoma ainda mais intenso, e não demorou para que a velha senhora percebesse.- Deus meu! Menina, você esta bem?Siena finalmente olhou as marcas roxas espalhadas pelo corpo, e a dor física que sentia não pareceu sequer chegar perto da dor no coração. Era como ser rasgada ao meio e ressuscitada mil vezes, apenas para passar pelo mesmo ciclo de destruição.- Não, eu não estou bem! – ela gritou. – Eu quero sair daqui!- Se acalme. É melhor que tome um banho e coma um pouco. Eu preciso trocar esses lençóis.- Não! Eu não vou tomar banho nenhum. Eu preciso sair dessa casa agora.- Você não pode sair. O Sr. Black deu ordens para que a senhora ficasse no quarto até segundas ordens. – A velha mulher ainda era irritantemente calma.Siena arregalou os olhos desesperados. Ela ainda não podia acreditar que havia se metido em uma desgraça tão grande que nada no mundo poderia salva-la, além da verdade.- Ninguém vai me impedir de sair dessa casa. Eu vou para onde eu quiser. Eu não sou escrava daquele homem.- A senhora se casou com ele, e assinou aquele contrato. Por acaso o leu?Siena paralisou, enquanto ondas de choque invadiam o corpo magro. O cabelo ruivo longo estava embaraçado, ela quase não se sentia humana, depois da noite infernal, que aquele homem a usou como um animal perverso.- Contrato?- Sinto muito, senhora Pax, mas se vendeu por que quis. Estava mais interessada na fortuna do Sr. Black, e pelo que vejo, aplicou um belo golpe da barriga!Siena sentiu o corpo inteiro congelar. Era isso. Ela estava condenada a sofrer o martírio. Se ao menos tivesse lido o contrato firmado com aquela m*****a senhora... Mas ela estava desesperada demais por dinheiro. Ela precisava quitar a divida antes de prosseguir com o tratamento, e agora, sequer conseguia sair de casa para ir até o hospital.Tanta luta para sobreviver ao destino cruel da doença, e ela sentia que morreria definhando aos poucos, presa aquele quarto, como a escrava de um homem sádico.- Não apliquei golpe nenhum. Eu só quero ir embora! – A jovem chorou, desesperada por alguma ajuda.Ela se jogou nos pés da senhora, e tocou os pés estranhamente calejados demais. Havia cicatrizes que subiam pelas pernas idosas, por baixo da saia. – Saia dai, menina! Isso não vai te redimir das atrocidades que fez. Nada te perdoaria por tudo!- O-oque eu fiz? – Os olhos de Siena estavam completamente inundados de desespero quando olharam para cima, encontrando como resposta, apenas a frieza da mulher.A senhora era bondosa demais para chuta-la no rosto, mesmo naquela posição desfavorável, mas a verdade é que a vontade parecia cada vez mais intensa e tentadora. – Ora, se levante e vá para o banheiro. O Sr. Black não vai gostar de chegar e ver você toda suja desse jeito.- Eu não posso mais fazer isso. Eu não quero mais dormir com ele, por favor... – Ela implorou, desesperada por alguma ajuda para fugir do destino que a aguardava em algumas horas. – Ele é um monstro. Você não vê o que ele fez comigo?A senhora praticamente escaneou o corpo da jovem franzina, e o olhar de desdém a atingiu em cheio. Não havia um único sentimento de remorso nos olhos daquela senhora, como certamente não deveria haver para o seu chefe também. – Ele não é um monstro. O Sr. Black é um homem muito bom.- Ele é um monstro sim. Você não vê? Como pode não enxergar... Olhe só o que ele fez para mim. Ele foi tão...A senhora contorceu o rosto, sentindo a irritação cada vez mais intensa. Ainda assim, a voz que saiu dela parecia tão pacifica quanto no momento em que entrou no quarto, carregando a bandeja com a refeição que a jovem sequer merecia. – Acredite em mim quando digo que ele foi muito bondoso com você. Qualquer outro homem nessa cidade teria dilacerado você e depois compartilhado com pelo menos mais meia dúzia de homens. Agora vá tomar um banho e pare de lamentar pelo destino que você implorou para ter!O corpo inteiro da Siena estremeceu. Como ela poderia ter alguma ajuda se todos a odiavam? A única saída daquele lugar seria contar a verdade, mas talvez seu marido não acreditasse nela. Talvez a forma autoritária com a qual ele lidava com tudo só a fizesse morrer mais rápido, por que ela tinha certeza: ele odiava ser enganado.Tudo que ela pode fazer foi chorar. Então, ela se virou e andou em direção ao banheiro do quarto, sem ouvir as reclamações da velha senhora, a proibindo de usar aquele cômodo específico.Siena não a ouviu, enquanto ligava o chuveiro. A dor no meio das pernas praticamente a torturava tanto quanto a noite de terror. Era como se ainda pudesse sentir o latejar dele, dentro dela, e enquanto se banhava, mal podia tocar na parte intima machucada.A jovem Robins chorou de desespero. Ela sabia que não suportaria outra noite, e tinha certeza de que desfaleceria se ele a tratasse da mesma maneira, outra vez. Ela ainda antecipava cada som vindo do quarto, temendo que ele pudesse chegar a qualquer momento para machuca-la mais uma vez.Siena forçou a abertura da porta, mas estava trancada. Ainda assim, ela não podia desistir. A mulher não ficaria parada, esperando que aquele homem a usasse como um animal no cio mais uma vez. Então, os olhos aflitos focaram na única janela aberta para o lado de fora da mansão. Não havia qualquer roupa capaz de esconder a sua nudez, mas ela buscou pela camisa do homem que a odiava, e repudiou o cheiro. Em qualquer circunstância, a jovem preferiria a morte a ter o perfume daquele homem exalando tão próximo ao corpo dela mais uma vez, mas naquele instante, ela aceitaria qualquer coisa se pudesse impedi-la de sentir o toque das mãos ásperas. O coração dela já antecipava que a queda doeria mais do que ela esperava, mas não seria tão terrível quanto as estocadas que aquele monstro daria nela, se a encontrasse tentando escapar. Então, ela olhou aflita para baixo, esperando que se aquilo a machucasse, que ao menos ele a deixasse em paz por algum tempo. Siena fechou os olhos e pulou. Ela e
O corpo inteiro se estremeceu de medo. ‘Vamos ver como é sentir a carne se partir’, ainda ecoava sob a mente atormentada da jovem mulher. Se ela ao menos soubesse quem era a Pax, jamais teria se envolvido naquela situação, mas agora era tarde demais. Ela já não podia fugir do próprio pesadelo. Siena não poderia fugir do destino que a aguardava, como um tormento que parecia nunca acabar, e Siena não poderia fugir do destino reservado a Pax. O que aquela mulher havia feito na cidade para que fosse odiada com tamanha intensidade? Siena não obteve respostas, embora seus olhos clamassem por elas. Mesmo assim, foi amarrada pelos pulsos e arrastada até a cidade. A notícia de que a jovem havia mentido sobre a gravidez havia se espalhado por todos os lugares, e ninguém sentiria pena dela. Os risos dos homens que a arrastavam como um animal pareciam ofensivos, e ela temia a própria sorte. Foi a primeira vez que ela realmente pensou sobre a proposta absurda do antigo noivo. Foi a primeira vez
Siena ainda manteve os olhos suplicantes, mas não parecia surtir qualquer efeito. Aquele homem de ferro não transmitia emoção alguma. Os olhos cor do mar profundo continuavam parados, a encarando. As pessoas ocupadas nem mesmo pareciam tê-lo notado ali, mas de toda forma, Siena sabia que ele nunca a ajudaria. Mais um golpe, e ela não reagiu. Ela não podia sentir mais nada. Estava completamente imersa na frieza dos olhos daquele homem para perceber qualquer coisa ao redor. Ela não sentia nada, nem mesmo a forma como o maldito agressor colocava um dedo nela. Não havia nada se passando por sua mente além do pensamento repetitivo do qual ela não podia entender: Como um homem seria capaz de permitir que sua esposa fosse usada por outro homem? Sebastian havia sido o primeiro a tocar nela, e as lembranças daquela noite ainda causavam dor ao coração como queimaduras recentes. Ele ainda não esboçava qualquer reação, e por isso, a jovem interrompeu o contato. Ela não podia ver o momento em q
– Não entendo por que ainda continua ao lado dela, Sebastian. Deveríamos ser nós dois agora. Eu deveria estar vivendo isso com você, não ela.Ele estava extremamente impaciente, passando as mãos pelo cabelo perfeitamente liso. – Eu sei disso. – Os olhos levemente puxados a encararam com severidade. Ele sentia dor, e não podia explicar o porque. Aquele sentimento que parecia ter sido superado voltou com toda a brutalidade, pronto para soca-lo um milhão de vezes no mesmo lugar. – Eu não teria me casado se soubesse que... – Que o que? – A mulher arregalou os olhos. – O que aquela m*****a mulher fez agora? Ela te acusou outra vez? Sebastian a encarou. Toda a severidade dos anos em que passou na cadeia ainda ardiam como brasas em chamas, prontas para incendiar tudo ao redor mais uma vez. O peito ardia em uma dor que jamais seria curada. – Ela era virgem! – Ela é virgem... Sebastian, isso é maravilhoso. Agora você pode se separar da m*****a e ainda vai ser inocentado. Nós podemos ficar ju
Ela abriu os olhos. A dor lancinante fez a pobre Siena Robins desejar ainda estar dormindo. Ela deslizou o corpo contra os lençóis macios da cama e instantaneamente arregalou os olhos. O coração parecia desesperado. Ela levantou o lençol colocado cuidadosamente sobre suas costas e encarou a nudez que estava escondida por baixo das cobertas. Um calafrio violento percorreu o corpo inteiro da Siena Robins. Ela ainda sentia fraqueza e sabia que não deveria demorar para começar a tomar os remédios receitados pelo médico, mas nem mesmo poderia compra-los. Como sair de casa se todo o mundo parecia odiá-la? Ela rastreou todo o quarto, buscando pelo marido. Ele não estava em lugar algum. Siena respirou aliviada, embora não saiba como havia chegado até aquele quarto. Tudo na memória dela parecia ter se apagado completamente. Quem se arriscou para ajuda-la? Alguém havia conseguido abusar dela quando ainda estava inconsciente? Havia tantas dúvidas que precisavam de respostas. Uma senhora invadi
Sebastian Black terminou de assinar os papéis. Ele ainda precisava revisar tantas contas da propriedade, mas não podia se concentrar em nada. Os olhos ainda viajavam para a figura bela e ruiva, deitada em sua cama. O que ela estaria fazendo longe dele? No que estava pensando? Desejava fugir mais uma vez? Não, ele não devia estar pensando nela daquela forma tão inocente. Ele deveria desejar trucidar cada pedaço daquele corpo, e destruir sua alma em um milhão de pedaços, como ela havia feito com ele a tempos atrás. O gosto amargo ainda surgia em sua boca toda vez que fechava os olhos. Os gritos de pavor naquele lugar maldito, e os dias em que passou nas solitárias, temendo que nunca mais saísse de la, ainda o atormentava. Toda vez que ele tentava dormir, sua mente passava a acreditar que ele ainda estava naquele poço escuro e úmido em que havia sido colocado sem nenhuma distração, e tudo que podia fazer foi riscar a parede com as unhas machucadas ou dormir. Dormir... Ele não sabia se c
As feridas dele jamais podiam ser curadas, mas da Siena também não. Ela dormia pacificamente, sonhando com seu marido e o sonho da primeira noite. Sebastian Black ainda era como um anjo. – Sebastian... – Ela disse, exibindo um largo sorriso em seguida. Ele franziu as sobrancelhas. Um gesto incomum para um rosto sem emoções como o dele havia se acostumado a ser. O homem se aproximou e analisou as roupas. Ela usava apenas uma camisa dele. Usada. Ela ainda tinha seu cheiro, como se acabassem de ter uma noite de amor. Era ofensivo, mas ainda adorável... Não, Pax não era adorável, apenas traiçoeira. Ela sabia bem como deveria o encantar, e ele percebeu isso. Mas aquele cabelo ruivo e volumoso espalhado pelo travesseiro o desconfigurou do estado de ódio. Ele não conseguiu se mexer por alguns segundos, até que a mão grande não conseguiu conter o impulso de tocar nela. Ele afastou as mexas de cabelo do rosto delicado. Siena Robins exibiu uma expressão de dor, mas ainda estava dormindo. Aqu
– E-Eu... Eu não sei... Eu não tenho joias. – Ela disse. Ele finalmente exibiu um breve sorriso, mas foi tão rápido que Siena Robins pensou ter imaginado coisas. Ela estava febril, só poderia ser... O Sr. Black não sorriria para ela. Ele simplesmente não sorri para ninguém. – Ah, você não sabe? – Ele parecia saborear cada sílaba, enquanto se aproximava dela. O terror se instalou nos olhos da Siena e não a deixaram por nada. Ela manteve o mesmo semblante de pavor, e as bochechas tão avermelhadas que parecia ter sido estapeada no rosto. – N-Não! Ele ainda se manteve próximo demais, e ela sabia que seria perigoso. – Você acha que eu sou idiota? – N-Não... – Mas Siena parecia hesitar. Ela ainda não sabia qual resposta deveria ser a certa. Ela não sabia de nada naquele inferno. – Então por que você empenhou a minha palavra nas lojas? – Ele encostou os lábios no pescoço fino e doce. – Por que, Pax... Por que você prometeu que eu pagaria os seus luxos? Ela podia sentir o hálito quente