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Olhei mais uma vez para meu quarto para ter a certeza que não estava esquecendo de nada. Era isso... esse quarto ia ser marcado por toda a minha vida e eu ia sentir falta.

— O café está na mesa — Callen falou encostado no batente da porta.

— Eu já desço — fitei meu irmão.

— Vai ser legal lá, só não tenta pensar muito no lado negativo — sua voz era calma e baixa, era até estranho ouvi-lo dessa maneira.

— Oww, está tentando me consolar?! — brinquei com uma voz de bebê.

— Você é... impossível — movimentou as mãos como se estivesse tentando conter sua raiva e eu gargalhei passando meus braços por volta de seu pescoço para um abraço.

— Obrigada, pirralho — agradeci e mesmo se desvencilhou dos meus braços bravo.

— Eu não sou um, pirralho — gritou das escadas e eu o segui.

— Panquecas de mirtilo com compota pra você e panqueca de aveia e banana para o seu irmão — mamãe colocou o prato na minha frente — o seu preferido.

— Obrigada mãe — falamos em conjunto.

Fitei a cadeira que papai geralmente sentava, estava vazia. Estranho, o pai gosta que as refeições sejam em família, raramente falta a uma.

— Aonde está o papai? — perguntei ainda com a boca cheia.

— Seu pai está colocando as malas no porta-mala e não fale de boca cheia, é falta de educação — repreendeu mamãe.

Enquanto todos comiam as panquecas que a mamãe tinha feito, não pude deixar de pensar que essa seria a última refeição nessa casa, somente essa.

— Hora de ir — papai anunciou — as malas já estão no carro.

Na hora de sair, mamãe trancou a porta da casa e eu fiquei olhando para árvores sem conseguir me despedir da minha vida que eu tinha aqui. Mamãe me fitava esperando eu dar o primeiro passo.

— Faremos isto juntas, bebê — estendeu a mão.

Eu segurei sua mão e juntas caminhamos até o carro que já estava ligado só nos esperando. Enquanto mamãe sentava na frente eu sentei atrás ignorando as piadas secas do meu irmão ou até mesmo a música animada que se ouvia. Coloquei então meus fones de ouvido para ouvir as minhas músicas que no momento não eram nem um pouco animadas.

[...]

— Querida, chegamos — minha mãe acariciou meu rosto e eu sai do carro coçando a bochecha.

Olhei para o grande jardim na frente da nossa mansão, todo bem cuidado com a grama bem verdinha, flores para todo o lado e tinha uma árvore bem grande que faria um boa sombra e eu nem preciso falar que o externo da casa era bonito parecia até ter passado por uma reforma.

Já no interior, a casa era moderna sempre usando tapetes, enfeites, resumindo, usufruindo de tudo o que uma casa rica tinha direito. Mamãe me levou até o meu velho quarto que de velho não tinha nada.

— Eu mudei um pouco seu quarto, sei que sua cor preferida é amarela, também queria que parecesse com o seu antigo quarto, pra se sentir mais em casa — explicou delicadamente.

— É lindo — fui abraçá-la — obrigada mãe.

— Tudo por você, bebê — retribuiu o abraço — o uniforme e o uniforme reserva da sua nova escola está no closet e você começa amanhã.

— Okay.

— Agora, a viagem foi longa, eu vou descansar, se quiser alguma coisa peça

para a governanta — saiu raspando seus saltos no chão.

Continuei o tour pelo meu quarto entrando no banheiro e logo depois no closet, quase tive um ataque da quantidade de roupa que estavam lá, a quantidade de produtos de rosto e corpo no banheiro, ou até mesmo as quantidade de joias, eu não usaria nem a metade daquelas joias em um ano. Será que tudo era meu?

Desci as escadas para procurar alguma coisa pra comer, afinal a viagem tinha durado quase um dia e eu só havia comido uns quantos salgadinhos o que não matou nem um terço da minha fome. Abri a geladeira procurando queijo e pão.

— Precisa de alguma coisa senhorita García? — apareceu alguém me dando um susto — perdoe-me, não era minha intenção lhe assustar.

— Tudo bem — coloquei o pão na mesa estranhando tanta formalidade.

— Deixa que eu faço — pegou o prato da minha mão gentilmente.

— Sem querer sem grossa, mas quem é você? — arquei a sobrancelha não gostando de ter uma intrusa.

Talvez fosse uma empregada a julgar pelo uniforme, mas eu ainda não gostava que os outros fizessem coisas por mim, sabia eu fazer, tinha mãos, e mesmo se não tivesse uma mão ainda saberia fazer sozinha.

— Eu sou a governanta dessa mansão, zelo para que tudo esteja no controle — recitou a frase já decorada, ela parecia até um robô.

— Legal, mas eu quero saber o seu nome.

— Meu nome é Dally.

— Eu sou Brianna, então por favor não me chama de senhorita García, apenas de Brianna.

— Mas senhorita García, não posso fazê-lo — respondeu — aqui está o seu pão, se quiser algo mais, é só chamar por mim.

Saiu da cozinha toda reta e eu arquei a sobrancelha, essa coisa de me chamar pelo sobrenome era muita etiqueta pra minha pessoa ainda que nunca tenha gostado verdadeiramente do meu nome.

Papai disse que foi a minha mãe que escolheu. Parece que ele perdeu no cara ou coroa, por isso não escolheu o meu nome, mas acho que não perdi nada. Ele me disse, que se tivesse tido a honra de escolher meu nome, eu me chamaria de Zelly, que é o nome da minha avó, o que é ainda pior que o meu nome.

Ao voltar pro quarto, ainda consegui me perder umas duas vezes pelos extensos corredores idênticos que só tinha espelhos e mais espelhos, se for assim, vou ter que começar a andar com um mapa nessa casa, pelo menos até conseguir me encontrar sem me perder.

[...]

Ajeitei a mochila no ombro nervosa, abri a porta que indicava ser a secretária e respirei fundo tentando o máximo manter a calma e educação.

— Oi, bom dia meu nome é Brianna García, sou a nova aluna.

— Só um minuto — pediu a senhora velhinha e rechonchuda enquanto olhava concentrada no computador — aqui está, querida — entregou a folha com todos os meus horários.

Alguém abriu a porta novamente e apareceu uma garota que parecia bem mau humorada. Olhei discretamente para seu desalinhado uniforme notando meias listradas ao invés da meias brancas que teriam que vir até à panturrilha ou ao joelho, mas as listras era vermelho e preto que não era de acordo com o uniforme.

— De novo Alicia? — a senhora que até então falava comigo, olhou para a garota que acabara de entrar a repreendendo.

— De novo, Constance, mas eu só estava usando umas meias listradas — resmungou entregando um papel.

— Sabe que é contra as normas não usar o uniforme corretamente — a senhora entregou um papel depois de escrever alguma coisa — uma hora de detenção.

A garota resmungou uns palavrões baixinhos que não consegui identificar e se encaminhou para a porta batendo o pé fundo, até achei que ela poderia abrir um buraco com a força que ela fazia.

— Alicia — chamou a senhora e ela parou de andar esperando a velhinha rechonchuda falar — você pode levar a novata para conhecer a escola, por favor?

Ela fechou a cara não gostando da ideia, mas assentiu. Pelo pouco que havia descoberto sobre essa Alicia é que ela era durona, mas acima de tudo sentia afeto pela senhora rechonchuda, do contrário teria recusado o pedido da mesma, se bem que não acho que ela conseguiria, a senhora parece ser bem gentil.

— Como daqui a pouco vai tocar, eu te mostro na hora do almoço, por enquanto vou só te mostrar aonde fica a sua primeira aula — explicou e eu assenti — me mostra o seu papel.

Eu mostrei e ela começou a caminhar para uma direção.

— É aqui — apontou para a sala — boa sorte, você vai precisar.

Entrei na sala recebendo vários olhares, não que tivessem incomodados por eu ter atrapalhado a aula, acho que era mais porque pareciam curiosos. Eu entreguei o papel para a professora e me sentei numa cadeira, a professora continuou a explicar e eu ignorei os olhares apenas prestando atenção.

[...]

As aulas passaram e eu suspirei aliviada, mesmo tendo dificuldades para encontrar todas as salas, não cheguei atrasada, o que era bom, eu odiava ver as pessoas me encarando.

— Aí, novata — Alicia se aproximou de mim — vamos, com sorte, depois de te mostrar a escola, talvez eu consiga pegar a sobremesa — ela andou até o exterior da escola — eu não sei como eram as coisas na sua antiga escola, mas aqui as coisas são diferentes, a escola inteira está dividida em grupos, as patricinhas — apontou para as arquibancadas — os atletas — apontou para um grupo que entregava panfletos sorrindo pra todos que os viam — os rejeitados, os nerds, os góticos e muitos outros grupos.

— Você pertence a que grupo? — perguntei interessada.

— Aos rebeldes sem causa, e não, você não vai andar no meu grupo, só estou te falando para arrumar um grupo para não ficar sozinha nessa escola infernal — entramos na escola novamente.

Alicia me mostrou as salas, a biblioteca, os armários e por último ficou a cantina.

— Toma cuidado com quem se mete, você não vai querer passar o ano inteiro sendo zuada pela escola inteira, por isso eu sugiro que procure bem.

— Então eu vou me sentar ali — olhei para um grupo de garotas que pareciam simpáticas.

Alicia olhou para mim de cima a baixo e negou com a cabeça.

— Aí você vai virar o Zé Ninguém dessa escola, não pode aparecer lá e se sentar.

— Porque?

— Primeiro que você não tem o padrão de uma patricinha e segundo que elas tirariam sarro de você — explicou — elas não são simpáticas, vai por mim, são todas cruéis que só se importam com dinheiro e popularidade.

— Posso me sentar com você?

— Foi mal, garota, mas você não é bem o que procuramos no nosso grupo — saiu andando para uma mesa distante.

Olhei em volta sem saber onde sentar. O pior de tudo era que todas as mesas estavam ocupadas. Queria eu que meu irmão estivesse aqui. Ele sentaria do meu lado. Decidi deixar a bandeja e caminhar para a máquina de comida, comprei um croissant e um suco e sai procurando um lugar sossegado para ficar. A biblioteca até agora parecia o lugar mais indicado.

Sentei entre as prateleiras e peguei o meu livro preferido dentro da mochila. O país das Neves de Yasunari Kawabata, minha escritora preferida.

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