A brisa do mar acariciava meu rosto enquanto observava Alice brincar nas ondas. O sol começava a se pôr, tingindo o céu de laranja e rosa, como uma promessa de novos começos. Havíamos chegado ao nosso novo lar, e por um breve momento, a sensação de alívio tomou conta de mim.Mas à medida que a luz do dia diminuía, a realidade de minha decisão começou a se assentar sobre meus ombros.Alice pulava nas ondas, rindo e gritando com a alegria contagiante das crianças. Seu cabelo molhado colava-se em seu rosto, e seu sorriso iluminava a praia como o sol que se despedia. Eu queria que aquele momento durasse para sempre. Queria guardar aquela imagem em minha mente, como um farol em meio à tempestade.Mas a dúvida ainda me acompanhava.Eu me perguntava se havia feito a escolha certa. Deixar para trás minha vida anterior significava não apenas me afastar de Isaías e Fernanda, mas também abrir mão de um mundo que conhecia tão bem. Um mundo que, embora complicado e doloroso, ainda trazia me
Deixei escapar um suspiro profundo enquanto continuava a encarar o vazio diante de mim, como se ali, naquele chão polido e desgastado pelo tempo, pudesse encontrar as respostas para as perguntas que me atormentavam.As lembranças surgiram sem aviso, como se estivessem apenas esperando o silêncio da manhã para se infiltrarem e me lembrarem do que deixei para trás.As lembranças…Era uma tarde quente, e o cheiro de grama recém-cortada se misturava com o som das nossas risadas, minhas e de Isaías, ecoando pelo quintal. Havíamos escapado de nossas responsabilidades por um tempo, fugindo para o lugar onde sempre nos sentíamos seguros. Deitados lado a lado, Isaías repousava a cabeça sobre os braços, olhando para o céu, como se, entre as nuvens, houvesse um caminho secreto para a liberdade que tanto desejávamos, mas que ainda não sabíamos como alcançar.Inesperadamente Isaías me olha daquele jeito que rouba todo o meu ar, com uma intensidade que dissolve qualquer resistência. Seus lábios
Ainda era estranho viver num bairro tão movimentado. Aquele vai e vem constante, os vizinhos sempre acenando, e, claro, a quantidade de crianças correndo para todos os lados… Às vezes eu ficava perdida. Mas Alice? Para ela, esse lugar parecia encantado. Em pouco tempo, ela já estava entrosada com as outras crianças, e eu, vendo aquele sorriso que eu tanto amava, sentia um alívio silencioso. Ela estava se sentindo em casa.Uma tarde, enquanto a buscava na escola, um grupo de pais me cercou, e entre eles, Luana. Ela tinha uma fala fácil e um sorriso tão presente que era impossível não notá-la. Ao lado dela, Tomás, seu marido de olhar tranquilo, logo puxou conversa sobre a rotina do bairro e sobre como as crianças crescem rápido demais.— Você vai ver, Alby — disse Luana, com a familiaridade de quem me conhecia há anos, quando na verdade nos falamos pouquíssimas vezes. — Logo vocês serão arrastadas para todos os eventos daqui. Festa de vizinhos, piqueniques, tarde das famílias,
Eu já estava tentando há dias. A cada ligação que fazia, o tom da linha parecia mais frio, mais distante. Até então, meu nome se tornara um peso quando era pronunciado por Alby, mas essa distância… essa ausência completa… não. Ela não era Alby. Não era o seu jeito dela de lidar com os problemas. Ela sempre enfrentou tudo de cabeça erguida, até mesmo minhas ações mais insensíveis. Mas agora… nada.Levantei cedo, decidido. Era um dia chuvoso, quase melancólico, e me parecia adequado, já que a sensação que me acompanhava ultimamente era de perda. Eu não queria admitir, mas, em algum lugar lá no fundo, eu sabia que as coisas estavam fugindo do meu controle. E isso não era algo com que eu soubesse lidar bem.Ao chegar à casa delas, encontrei a rua deserta. Não havia uma alma sequer, nem a energia vibrante de Alice correndo pelo jardim. Os brinquedos, antes deixados pelo quintal, estavam empilhados e amontoados como se nunca tivessem sido usados. O balanço, que eu mesmo instalei
Era uma manhã de domingo, o tipo de manhã que eu e Alice costumávamos reservar para nossos passeios no parque. Ela adorava brincar nos balanços e correr pela grama, e eu adorava vê-la rir, com aquele sorriso que iluminava tudo ao redor. Era nosso pequeno pedaço de paz, onde todas as minhas preocupações pareciam distantes.Enquanto Alice corria até os balanços, eu me sentava num banco próximo, aproveitando o silêncio. Foi então que notei uma figura familiar atravessando o parque. A princípio, achei que fosse apenas uma coincidência, mas, ao me ver, ela parou. E, com um olhar surpreso e um sorriso hesitante, aproximou-se devagar.— Alby? É você? — A voz dela soou suave, carregada de surpresa.Meus olhos se fixaram nela, reconhecendo cada traço, cada detalhe. Era Amélia. Uma velha amiga. Ou melhor, alguém que um dia fora isso. Ela fazia parte do meu passado, de um tempo que eu estava determinada a deixar para trás.— Amélia… — murmurei, forçando um sorriso, embora soubesse que a
Eu já estava exausto antes mesmo de o dia começar. Era como se, desde que Alby e Alice haviam desaparecido do meu alcance, minha vida tivesse virado um teatro de absurdos. E o diretor principal desse show trágico era Fernanda, a mulher que parecia ter uma habilidade sobrenatural para consumir a minha paciência.Naquela manhã, eu mal tinha colocado os pés na empresa quando meu telefone começou a vibrar insistentemente. "Fernanda" piscava na tela. Suspirei, sabendo que ignorar não resolveria. Ela era como um cão de caça; se eu não atendesse, ela apareceria no meu escritório.— O que foi, Fernanda? — atendi, tentando manter a voz firme, mas não muito irritada. Afinal, quanto menos emoção eu mostrasse, menos incentivo ela teria para continuar com essa obsessão.— Isaías! Você não vai acreditar! — ela exclamou, com aquele tom afetado que já me causava calafrios. — Fui ao mercado hoje de manhã, e tive a sensação de estar sendo seguida. Não acha que isso é suspeito?Eu me encostei na
Hoje era um daqueles dias raros em que a vida parecia dar uma trégua. O sol brilhava sem vergonha alguma, um convite perfeito para um churrasco ao ar livre, com a leve brisa que balançava as folhas das árvores e parecia, de alguma forma, varrer um pouco do peso que eu carregava. Eu não me lembro da última vez que me senti assim, tão… leve.— Vai querer mais um pedaço, Alby? — perguntou Luana, acenando com uma espátula e um sorriso largo. Ela estava com um avental sujo de gordura, rosto suado, e parecia tão feliz e tranquila que me contagiava.— Ah, claro! Só estou esperando vocês pararem de falar para eu poder atacar! — respondi, rindo.Era bom estar cercada de amigos de verdade, pessoas que chegaram a tão pouco tempo, mas que pareciam me conhecer a vida toda. E hoje, eles estavam ali, prontos para encher o meu prato de carne e a minha alma de risadas.Peguei um copo de caipirinha, e o azedinho doce do limão com o açúcar fez minha boca se encher d’água. Luana fez para nós, uma be
Eu só queria um pouco de paz. Mas, ultimamente, isso parecia impossível com a presença constante – e sufocante – de Fernanda. Se ela não estava ligando, estava mandando mensagens. E, quando não respondia, era capaz de aparecer na minha porta sem o menor aviso. Era como se ela se alimentasse das minhas reações de irritação e cansaço, sempre pronta para criar uma nova cena.Hoje, acordei com o som da campainha. Abri a porta e, claro, lá estava ela: toda produzida, com um sorriso forçado e uma expressão de quem, de alguma forma, acreditava que eu ficaria feliz em vê-la.— Isaías! Trouxe café pra gente! — Ela estendeu um copo de café para mim com uma energia quase assustadora para aquele horário.Eu nem sabia como responder. A última coisa que eu queria era tomar café com ela. Mas antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, ela já estava entrando.— Fernanda, eu não pedi café. Aliás, eu realmente não tenho tempo para isso agora — disse, tentando controlar o tom de voz.Ela ignorou c