Era uma manhã de domingo, o tipo de manhã que eu e Alice costumávamos reservar para nossos passeios no parque. Ela adorava brincar nos balanços e correr pela grama, e eu adorava vê-la rir, com aquele sorriso que iluminava tudo ao redor. Era nosso pequeno pedaço de paz, onde todas as minhas preocupações pareciam distantes.Enquanto Alice corria até os balanços, eu me sentava num banco próximo, aproveitando o silêncio. Foi então que notei uma figura familiar atravessando o parque. A princípio, achei que fosse apenas uma coincidência, mas, ao me ver, ela parou. E, com um olhar surpreso e um sorriso hesitante, aproximou-se devagar.— Alby? É você? — A voz dela soou suave, carregada de surpresa.Meus olhos se fixaram nela, reconhecendo cada traço, cada detalhe. Era Amélia. Uma velha amiga. Ou melhor, alguém que um dia fora isso. Ela fazia parte do meu passado, de um tempo que eu estava determinada a deixar para trás.— Amélia… — murmurei, forçando um sorriso, embora soubesse que a
Eu já estava exausto antes mesmo de o dia começar. Era como se, desde que Alby e Alice haviam desaparecido do meu alcance, minha vida tivesse virado um teatro de absurdos. E o diretor principal desse show trágico era Fernanda, a mulher que parecia ter uma habilidade sobrenatural para consumir a minha paciência.Naquela manhã, eu mal tinha colocado os pés na empresa quando meu telefone começou a vibrar insistentemente. "Fernanda" piscava na tela. Suspirei, sabendo que ignorar não resolveria. Ela era como um cão de caça; se eu não atendesse, ela apareceria no meu escritório.— O que foi, Fernanda? — atendi, tentando manter a voz firme, mas não muito irritada. Afinal, quanto menos emoção eu mostrasse, menos incentivo ela teria para continuar com essa obsessão.— Isaías! Você não vai acreditar! — ela exclamou, com aquele tom afetado que já me causava calafrios. — Fui ao mercado hoje de manhã, e tive a sensação de estar sendo seguida. Não acha que isso é suspeito?Eu me encostei na
Hoje era um daqueles dias raros em que a vida parecia dar uma trégua. O sol brilhava sem vergonha alguma, um convite perfeito para um churrasco ao ar livre, com a leve brisa que balançava as folhas das árvores e parecia, de alguma forma, varrer um pouco do peso que eu carregava. Eu não me lembro da última vez que me senti assim, tão… leve.— Vai querer mais um pedaço, Alby? — perguntou Luana, acenando com uma espátula e um sorriso largo. Ela estava com um avental sujo de gordura, rosto suado, e parecia tão feliz e tranquila que me contagiava.— Ah, claro! Só estou esperando vocês pararem de falar para eu poder atacar! — respondi, rindo.Era bom estar cercada de amigos de verdade, pessoas que chegaram a tão pouco tempo, mas que pareciam me conhecer a vida toda. E hoje, eles estavam ali, prontos para encher o meu prato de carne e a minha alma de risadas.Peguei um copo de caipirinha, e o azedinho doce do limão com o açúcar fez minha boca se encher d’água. Luana fez para nós, uma be
Eu só queria um pouco de paz. Mas, ultimamente, isso parecia impossível com a presença constante – e sufocante – de Fernanda. Se ela não estava ligando, estava mandando mensagens. E, quando não respondia, era capaz de aparecer na minha porta sem o menor aviso. Era como se ela se alimentasse das minhas reações de irritação e cansaço, sempre pronta para criar uma nova cena.Hoje, acordei com o som da campainha. Abri a porta e, claro, lá estava ela: toda produzida, com um sorriso forçado e uma expressão de quem, de alguma forma, acreditava que eu ficaria feliz em vê-la.— Isaías! Trouxe café pra gente! — Ela estendeu um copo de café para mim com uma energia quase assustadora para aquele horário.Eu nem sabia como responder. A última coisa que eu queria era tomar café com ela. Mas antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, ela já estava entrando.— Fernanda, eu não pedi café. Aliás, eu realmente não tenho tempo para isso agora — disse, tentando controlar o tom de voz.Ela ignorou c
Era uma manhã ensolarada quando cheguei à loja. O aroma fresco do café recém-passado misturava-se com o perfume das flores que enfeitavam a entrada, criando uma atmosfera acolhedora. A loja, um pequeno refúgio de encantos e detalhes cuidadosamente selecionados, estava repleta de cores vibrantes, cada produto contando uma história única. Era aqui que eu me sentia em casa.Assim que entrei, fui recebida pelo som da campainha da porta e pelos sorrisos dos colegas. O clima era sempre leve e animado. O proprietário, Carlos, estava no caixa, organizando alguns documentos e acenando para mim.— Alby! Que bom que você chegou! — Ele exclamou, iluminando o ambiente com sua energia contagiante. — Temos algumas novas mercadorias que você precisa conferir.A empolgação em sua voz era contagiante. Desde que fui contratada, cada dia na loja era uma nova oportunidade de aprender e crescer. Os desafios se tornaram parte da rotina, e eu me divertia em cada interação com os clientes, ajudando-os
Alice estava dormindo profundamente, seu corpo pequeno e frágil escondido sob os cobertores quentes. A luz da lua filtrava-se pela janela, iluminando suavemente o quarto. No entanto, em seu mundo imaginário, a escuridão se aproximava, transformando a tranquilidade em um campo de batalha entre medos e inseguranças.Em seu sonho, ela se via em um lugar familiar, mas distorcido. Era o parque onde costumava brincar com os pais, mas agora estava envolto em uma neblina espessa, e as risadas que uma vez ecoavam agora eram substituídas por sussurros distantes. Alice tentava chamar por eles, mas sua voz soava abafada, como se estivesse presa sob água.— Mamãe! Papai! — ela gritou, mas a neblina parecia engoli-la, isolando-a em uma solidão aterradora. Seus pequenos pés correram pelo gramado, mas a paisagem parecia mudar a cada passo que dava, tornando-se um labirinto sem fim.De repente, a neblina se dissipou, e Alice se viu diante de uma cena perturbadora. Seus pais estavam lá, mas não e
Sentei-me no carro, o volante praticamente moldado pela pressão de meus dedos, tão intensamente o segurava. Eu me sentia perdido, preso entre a ansiedade e a frustração, incapaz de desfazer esse nó que parecia me consumir de dentro para fora. As batidas do meu coração ecoavam em cada giro da chave de ignição, o motor roncando como se fosse a única coisa que me mantivesse ainda em movimento.Tentei ligar para Alby e Alice inúmeras vezes nos últimos dias, mas era como se elas tivessem se dissolvido no ar, uma ausência pesada, constante, impossível de ignorar. Eu me vi murmurando para mim mesmo:— Onde elas estarão?Passei as mãos pelos cabelos, frustrado. Conhecia Alby, ou pelo menos acreditava que sim. Era possível que ela, de repente, sumisse sem deixar rastro? Levando minha sobrinha, que agora dependia de mim tanto quanto eu dependia dela?A ideia de esperar me dilacerava, então fiz a única coisa que podia. Dirigi até a loja onde Alby costumava levar Alice. Algo dentro de mim
Eu estava sentada na pequena mesa da cozinha, cercada por papeis e alguns brinquedos de Alice que agora preenchiam os espaços vazios da nossa nova vida. Nosso apartamento era acolhedor, sim, mas havia sempre essa sensação inquietante de um refúgio temporário. Por mais que tentasse me acostumar, não conseguia ignorar a pontada de saudade que teimava em me lembrar de tudo que deixei para trás. E, junto com a saudade, a dúvida me atormentava. Quando o telefone tocou, me pegou de surpresa, me fazendo quase saltar da cadeira. Olhei para a tela, um número desconhecido, mas algo me disse que eu devia atender. Respirei fundo e levei o telefone ao ouvido. — Alô? — minha voz saiu hesitante, mas me esforcei para soar firme. — Alby, sou eu, Dr. Moon. Desculpe incomodar, mas precisamos conversar — a voz grave dele trouxe um aperto imediato ao meu peito. Minha testa franziu, e uma sensação gelada subiu pela minha espinha. — O que aconteceu? Está tudo bem? — perguntei, tentando manter