Eu estava sentada na pequena mesa da cozinha, cercada por papeis e alguns brinquedos de Alice que agora preenchiam os espaços vazios da nossa nova vida. Nosso apartamento era acolhedor, sim, mas havia sempre essa sensação inquietante de um refúgio temporário. Por mais que tentasse me acostumar, não conseguia ignorar a pontada de saudade que teimava em me lembrar de tudo que deixei para trás. E, junto com a saudade, a dúvida me atormentava. Quando o telefone tocou, me pegou de surpresa, me fazendo quase saltar da cadeira. Olhei para a tela, um número desconhecido, mas algo me disse que eu devia atender. Respirei fundo e levei o telefone ao ouvido. — Alô? — minha voz saiu hesitante, mas me esforcei para soar firme. — Alby, sou eu, Dr. Moon. Desculpe incomodar, mas precisamos conversar — a voz grave dele trouxe um aperto imediato ao meu peito. Minha testa franziu, e uma sensação gelada subiu pela minha espinha. — O que aconteceu? Está tudo bem? — perguntei, tentando manter
Minha rotina tinha virado uma verdadeira montanha-russa de emoções. Fernanda, com sua energia intensa e comportamento impulsivo, havia transformado meus dias em um pesadelo. A cada nova ideia absurda que ela surgia, eu me sentia mais perto do limite. Mal conseguia me concentrar no trabalho, e a tensão já estava afetando minha sanidade.— Não é possível que você tenha encomendado um vestido de noiva sem me consultar! — explodi, passando a mão pelos cabelos, numa mistura de frustração e incredulidade.Ela estava ali, na sala, cercada de pacotes e catálogos de casamento, totalmente alheia à gravidade da situação.— É um sonho, Isaías! E eu não posso esperar para realizá-lo — ela respondeu, com um brilho nos olhos que só aumentava minha irritação.— Um sonho? Fernanda, nós não estamos nem juntos! Não percebe que isso é loucura? — tentei controlar a raiva que fervilhava dentro de mim, mas minha voz saiu mais alta do que pretendia.Ela fez uma careta, se levantou, e colocou as mãos nos q
A semana parecia interminável, e a pressão de tudo que estava acontecendo com Fernanda parecia que ia explodir no meu peito a qualquer momento. Tentar lidar com isso em meio ao trabalho, à minha própria vida, estava me exaurindo. Tudo o que eu queria era um pouco de paz, mas parecia um pedido impossível. Então, uma manhã fria trouxe uma reviravolta que eu não esperava.— Isaías, é a Fernanda. Eu não estou bem... Preciso que você venha aqui, por favor — a voz dela parecia fraca, mas havia um tom de urgência que me fez sentir um aperto no estômago.Vesti-me às pressas, saindo de casa com uma preocupação que eu não conseguia esconder. Ao chegar ao hospital, fui recebido pelo caos: médicos e enfermeiros corriam de um lado para o outro, um clima pesado pairava no ar. Quando finalmente a encontrei, ela estava deitada numa cama, com o rosto pálido e uma expressão de dor que era difícil de ignorar.— O que aconteceu? — perguntei, sentindo a preocupação transbordar na minha voz, mesmo com
A luz do sol entrava pela janela da sala, refletindo-se nas paredes brancas e criando um ambiente alegre. Porém, essa sensação de felicidade foi abruptamente substituída por uma sombra quando recebi a ligação da professora de Alice.— Alby, houve um acidente. Alice se machucou no escorregador e precisamos que você venha para o hospital — a voz da professora soava preocupada, e meu coração disparou.A imagem de Alice caindo do escorregador, com a expressão de dor estampada no rosto, invadiu minha mente. A pequena tinha apenas cinco anos e já enfrentava um mundo repleto de desafios. E, como guardiã/tutora, eu queria estar ao lado dela em cada momento, especialmente nos difíceis.Cheguei ao hospital em um turbilhão de emoções. O cheiro do álcool e dos produtos de limpeza invadiu minhas narinas enquanto eu procurava Alice na sala de emergência. Quando finalmente a encontrei, estava sentada em uma maca, com um curativo no braço e o olhar distante, como se estivesse lutando contra as l
Os dias passaram como um borrão, com a rotina de Fernanda me mantendo em um estado constante de alerta e cansaço. A cada nova excentricidade dela, meu cérebro parecia entrar em um modo de sobrevivência. Mas, naquele dia, algo inesperado aconteceu. Eu estava sentado em um café, tentando me concentrar em um relatório que precisava revisar, quando meu telefone vibrou na mesa.Era Raúl, um amigo próximo da época em que eu e Alby estávamos mais juntos. Fui pego de surpresa ao ver o nome dele na tela. Desde que Alby e Alice desapareceram de nossas vidas, Raúl tinha sido uma das poucas pessoas que ainda tentava entender o que estava acontecendo.— Isaías! — a voz dele soou animada, mas havia uma tensão que não consegui ignorar. — Você não vai acreditar no que eu descobri!— O que foi, Raúl? — minha mente imediatamente se alertou. Havia uma mistura de esperança e apreensão.— Eu estou em viagem e parei em um café numa cidade pequena para esticar as pernas, e… — ele hesitou, como se qui
O sol estava se pondo quando decidi que não poderia esperar mais. A ansiedade pulsava em meu peito como um tambor, a batida ecoando nas paredes do meu ser. Raúl havia me dado uma informação preciosa: Alby e Alice estavam em um parque, rindo e se divertindo, e a ideia de vê-las me fazia sentir um misto de esperança e medo. Peguei o carro e dirigi sem rumo, mas meu destino era claro. O parque que Raúl mencionou não era muito longe de onde eu morava, algumas cidades a frente, cerca de uma hora e meia de carro. E assim peguei a estrada. A cada curva que passava, a expectativa crescia. As vozes de Fernanda, com suas perguntas incessantes, se tornaram um ruído distante. Ela não parava de ligar, mas a cada chamada, eu simplesmente ignorava. Não tinha espaço para as maluquices dela naquele momento; minha mente estava focada em Alby e Alice.Assim que cheguei ao parque, estacionei o carro e saí, tomando um profundo fôlego para me acalmar. Será que as encontraria ali? No entanto, est
Os dias haviam se transformado em uma rotina confortável para mim e para Alice. O trabalho na loja trouxe uma nova vida para minha existência, um ritmo que eu não sabia que precisava. No entanto, mesmo em meio a esse novo cotidiano, algo começava a perturbar meu espírito inquieto. Uma sensação estranha, como se estivesse sendo observada, me acompanhava frequentemente.Era uma tarde tranquila, e o sol brilhava com um calor gentil. Alice estava brincando no parquinho em frente à loja, seus risos ecoando na brisa leve.Eu estava atrás do balcão, organizando algumas mercadorias, mas minha mente se desviava constantemente para o exterior. Algo não estava certo.Eu olhei pela janela e a vi, tão feliz, tão livre. Mas algo em meu íntimo me dizia que não estava sozinha. Olhei ao redor, observando os passantes e as crianças correndo, mas não conseguia identificar a fonte daquela inquietação. Era como se alguém estivesse me observando com atenção, avaliando cada movimento, cada respiraçã
A brisa suave da manhã entrava pela janela, trazendo o cheiro fresco do orvalho. Alice estava em seu quarto, entretida com seus brinquedos, sorrindo e brincando como se nada tivesse acontecido. O acidente na escola havia sido um susto, mas agora, depois de algumas semanas, ela parecia completamente recuperada. A vida, de alguma forma, havia retornado ao seu curso normal, mas uma sombra de saudade e arrependimento se instalava em meu coração.Eu a observava de longe, admirando sua alegria inocente. Entretanto, a imagem de Isaías se instalava em minha mente, mais vívida do que nunca.Ele sempre fora uma presença constante em nossas vidas, especialmente nos momentos em que a dor e o medo ameaçavam nos consumir. Eu desejava que ele estivesse aqui agora, cuidando de Alice como sempre fez, com seu jeito calmo e acolhedor.— Olha, Alby! — Alice chamou, balançando um de seus brinquedos coloridos. — Vem brincar comigo!Eu sorri, mas o desejo de me aproximar de Isaías era mais forte do qu