— Amara, o que...
— Espere um segundo! – O interrompo, entro na dispensa e saio de lá com duas abóboras nas mãos. As coloco no balcão ilha e pego duas facas pequenas e afiadas no faqueiro perto da pia. Sento-me onde estava e entrego uma das facas ao feérico, que me encara confuso de testa franzida. — É uma tradição dos mortais. Eles celebram o Samhain como as bruxas, mas o chamam de halloween. – Puxo uma abóbora para mim e indico que ele faça igual com a outra. Ambas grandes e laranjas. — Só que é mais sobre doces e fantasias e menos sobre rituais e magia. Sim, eu sei. Hipócritas.
— Totalmente. – Terence concorda e pega sua abóbora. — Vamos assassinar abóboras?
— Não, bobinho! – Rio e arregaço as mangas do suéter. Bato com a faca na fruta. — Vamos esculpir rostos nelas! Um triangulo para o nariz, mas a boca e os olhos você pode fazer como quiser, dependendo se sua abóbora é alegre ou assustadora.
— Os mortais são estranhos. – O feéri
Acordo com a luz do sol ferindo meus olhos e preciso piscar algumas vezes para enxergar ao meu redor. Aquecida e confortável na poltrona onde adormeci, meu corpo se nega a fazer qualquer movimento por pura preguiça. Olho para fora, o céu azul e sem nuvens, os pinheiros apontados para cima majestosamente e a sinfonia animalesca acompanha o clima frio, apesar do sol. Quanto tempo eu dormi? Sinto algo macio sobre mim conforme desperto e recupero os sentidos e enrolo o xale – que costuma ficar no braço do sofá da sala – nos dedos. Pandora se espreguiça entre minhas pernas cruzas e pula para o chão. Mas como... — Você acordou! – Terence fala e me assusto ao vê-lo de pé em frente a uma das estantes do meu cômodo favorito. Meu cômodo, minha sala, minhas coisas. — Pensei ser melhor deixa-la dormir depois de ontem. A propósito, Dáhlia ligou e disse que a floricultura não vai abrir hoje, porque vão exterminar as pragas. – Ele franze a testa para si mesm
— Eles nunca subestimaram o poder de uma fada sequer. – O feérico passa a procurar outra página de anotações com a primeira na mão. — Sabiam que seus títulos vinham com ameaças prontas para suas vidas e tudo o que possuíam de valor e poder. Até Endaria sabia. Mesmo com tanta magia, decidiram se prevenir. Por isso, separaram as chaves. — Isso faz muito sentido, na verdade. – Aceito minha idiotice e praguejo por ser tão lenta em raciocínio e estratégia. Deveria saber, deveria antecipar ações e pensamentos e sinto a vergonha queimar, por ter parado de treinar as habilidades que meu pai levou anos para me ensinar. — Eu ainda não entendi. Não sabemos onde elas estão e não podemos perguntar aos lordes onde as esconderam. — Talvez, onde, seja somente uma das perguntas que precisaremos responder. – Terence agora segura três folhas nos dedos e se encosta na beirada da mesa, analisando-as. Os papéis amassados e borrado em alguns cantos com pingos de vinho e t
Estamos sentados nas cadeiras com vista para o lago nos fundos da casa há duas horas. Pandora está aninhada entre as minhas pernas cruzadas e tenho um cobertor sobre os ombros. Terence acendera um amontoado de lenha na pequena e concava lareira de três apoios entre nós e passamos os minutos jogando conversa fora sobre ambos os mundos e suas divergências. Sua boca se meche e meus ouvidos o escutam, mas tudo e que consigo pensar é que ele me acha atraente o bastante para cogitar me levar para a cama. Tenho muitas outras qualidades bem grandes, também. A voz dele ecoa em minha mente com as palavras de antes e despertam os nervos de todo o meu corpo com um certo calor agradavelmente incômodo. Jamais me deitei com um feérico em Illinea, porque jamais havia me interessado por um deles, apenas por mortais. E nunca descobri o motivo dessa atração tentadora pelos humanos que surge dentro de mim sempre que conheço alguém interessante. O primeiro que conheci aca
— Acho que devemos entrar. – Sugiro já caminhando para as escadas. — Temos muito o que descobrir sobre as chaves. — Uau! Você sabe mesmo estragar um momento. – Ouço seus passos me seguindo e olho por cima do ombro. — Isso não foi um momento. – Franzo a testa subindo o primeiro degrau. — Se acredita mesmo nisso, então tudo bem. O feérico passa por mim e entra na casa. Paro na entrada por um segundo ao reparar na pequena cesta em formato de abóbora, apoiada num curto pilar de gesso. O restante dos doces estão ali. Suspiro para eles e vejo Terence desaparecendo para dentro da sala dos Amarimentos. Essa momento foi de cem a zero muito rápido. Devolvo o caramelo na cesta. Assim que entro, fecho a porta e Pandora desliza entre minhas pernas com seu ruido costumeiro de raposa. A pego no colo e a acaricio no pescoço indo para a cozinha. Encho seu potinho de frutas silvestres e a solto no chão para se alimentar. — Pro
— Você me encontrou. – Digo quase que em um murmúrio. — Poderia facilmente ter me matado e roubado o colar e entregado a Duvessa, para cair nas graças dela e mesmo assim, ficou aqui. – Minha língua faz menção de embolar as palavras e umedeço os lábios piscando repetida e rapidamente. Seguro seu olhar no meu, firme, como se o prendesse a mim. — Ficou, mesmo não tendo certeza de nada, mesmo sabendo que eu não confiava em você nem por um segundo. E ainda está aqui, mesmo após descobrirmos tudo isso. – Quero ver a verdade estampada neles, quero ver o que está oculto por trás do dourado hipnotizante. — Por que? O feérico suspira e para de me tocar, endireitando a postura e desviando os olhos para longe dos meus. — Está certa em tudo o que disse. Em cada detalhe. – Seus dedos tocam a madeira da mesa duas vezes e seu maxilar se tensiona na quietude curta que se segue. — Mas, eu não tenho interesse em cair nas graças da sua irmã e
A floresta voa do lado de fora da janela do carro como um borrão de verde e marrom e o preto do asfalto da estrada.— Amara, devagar! Pode ser apenas outra ameaça sem nexo! Como tem certeza de que é ela? – Terence pergunta ao meu lado, precisando elevar a voz sobre o ronco do motor. Ele segura o painel com uma mão, mantendo o equilíbrio com a tamanha velocidade.— Não me peça para ir devagar quando a vida de uma pessoa que eu amo está nas mãos de Duvessa! – Respondo no mesmo tom, as mãos firmes no volante e as jutas dos dedos brancas. — Ela disse que a atacaria e atacou e agora está como Dáhlia!— Sua irmã pode estar te manipulando como antes!Viro o queixo para olhá-lo e posso ouvir meu sangue pulsando nos ouvidos e acelerando meu coração desesperado.— Para o bem dela, espero que tenha raz&atild
Meus olhos seguem para uma das portas estreitas da varanda, aberta e a cortina balança, preguiçosa com o vento da noite. Porém, eles focam nas silhuetas paradas a frente dela. Duvessa segura uma afaga contra o pescoço de Dáhlia, a camisola ensanguentada, mas nada que justifique todo aquele sangue lá em baixo, – mais uma cordinha puxada em minha mente confusa e encantada – apenas um corte na bochecha e outro no lábio inferior. O sangue escorrendo e manchando a seda branca do traje de dormir. Marcas de arranhões avermelham a pele dos antebraços e as unhas de minha irmã estão fincadas no ombro esquerdo dela, mantendo-a presa contra a feérica. Dáhlia tentou lutar.— Não faça isso! – Imploro e engulo as lágrimas. Meu estômago se revira com o sorriso perverso no canto da boca carmim de Duvessa ao pressionar a ponta da lâmina na
— Amara! – Terence desce atrás de mim, assim que pulo do banco do motorista e bato a porta do carro com toda a raiva acumulada. O ignoro conforme cambaleio pelo caminho de pedrinhas até os degraus, os subo e entro em casa. O sinto me perseguindo pelas salas e pela cozinha. — Amara, espere! – Agarro um copinho de cristal pequeno e cilíndrico no armário e uma garrafa de tequila aberta na geladeira. Meu braço é envolvido pelos dedos dele e sou forçada a me virar. — Você pode se acalmar, por um minuto? Por favor, pelas quatro Luas! — Não me diga para me acalmar! – Solto-me bruscamente e a mão que segura o copinho b**e de encontro com a beirada do balcão de pedra polida. Ele se estilhaça e ruído faz meu coração saltar no peito. Encaro os cacos de cristal quebrado no chão por um instante, ouvindo minha respiração acelerada no silêncio do momento. — Ótimo! — Praguejo para o universo, apoio a garrafa no balcão e me abaixo para juntá-los. — Você se